Acórdão nº 452/21 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 452/2021

Processo n.º 198/2021

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A. intentou contra B. uma ação declarativa, pedindo a declaração judicial de ser este (o réu) o seu pai. Contestou o réu, invocando a exceção da caducidade do direito do autor e impugnando os factos. O autor replicou, pugnando pela improcedência da caducidade e invocando, a esse propósito, a desconformidade constitucional da norma que estabelece o respetivo prazo. Em primeira instância, a ação foi julgada procedente.

1.1. Desta decisão apelou o réu para o Tribunal da Relação do Porto.

1.1.1. Na pendência da apelação, faleceu o réu, sendo habilitados como seus sucessores C. e D. (os ora reclamantes).

1.1.2. Por acórdão de 16/10/2017, o Tribunal da Relação do Porto julgou a apelação improcedente.

1.1.3. Desta decisão recorreram os réus (habilitados) para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), através de um recurso de revista excecional.

1.1.4. Por acórdão do STJ de 13/03/2018, foi julgada procedente a exceção da caducidade e, consequentemente, foi concedida a revista e os réus (habilitados) absolvidos do pedido.

1.1.5. Transitado em julgado o acórdão de 13/03/2018, o autor interpôs recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, invocando oposição de julgados.

1.1.6. Por acórdão do Pleno das Secções Cíveis do STJ de 17/09/2020, decidiu-se:

“[…]

A Resposta Uniformizadora

Em face do exposto considera-se dever uniformizar-se a jurisprudência deste Supremo Tribunal, quanto a quem compete provar que uma ação proposta nos termos do n.º 3 do art.º 1817.º do CC, foi intentada depois de decorrido o prazo de três anos aí previsto nos seguintes termos: nas ações de investigação de paternidade, intentadas nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 1817.º do CC, compete ao Réu/investigado, o ónus de provar que o prazo de três anos referido no aludido normativo, já se mostrava expirado à data em que o investigante intentou a ação.

*

Da Aplicação ao acórdão recorrido

Como resulta do acórdão recorrido, por se considerar que cabia ao A. provar que a ação fora intentada dentro dos três anos posteriores ao conhecimento das circunstâncias que o determinaram a propor a ação e este não ter conseguido fazer a prova de tal facto, julgou-se esse non liquet desfavorável ao A. e declarou-se a caducidade do direito de investigar, revogando-se o acórdão da Relação que julgara procedente a referida ação, por entender, tal como aqui se decidiu, que o ónus de alegar e provar os factos demonstrativos de que a ação foi intentada decorridos mais de três anos sobre os factos que justificaram a ação competia ao réu e não o tendo demonstrado e tendo por seu turno o A. demonstrado a paternidade biológica do investigante, impõe-se julgar procedente o recurso, revogar o acórdão recorrido e repristinar a deliberação constante do Acórdão da Relação.

Dispositivo

Nestes termos e pelos fundamentos invocados:

a) Concede-se provimento ao recurso, julgando-o procedente por verificada a existência da contradição jurisprudencial e aplicando o segmento uniformizador à situação apreciada no acórdão recorrido, revoga-se o mesmo e repristina-se a deliberação constante do acórdão da Relação.

b) Custas pelos recorridos.

c) Uniformiza-se a Jurisprudência nos seguintes termos: nas ações de investigação de paternidade, intentadas nos termos da al. b) do n.º 3 do art.º 1817.º, ex vi do art.º 1873.º do CC, compete ao Réu/investigado, o ónus de provar que o prazo de três anos referido no aludido normativo, já se mostrava expirado à data em que o investigante intentou a ação.

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.2. Notificados do acórdão do Pleno das Secções Cíveis do STJ de 17/09/2020, os réus (habilitados) dele pretenderam recorrer para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

1.2.1. Por despacho de 26/11/2020, foram os recorrentes convidados a completar o requerimento com os elementos previstos no artigo 75.º-A, n.ºs 1 e 2, da LTC em falta, designadamente a identificação da peça processual em que foi suscitada a questão de inconstitucionalidade.

1.2.2. Em resposta, os recorrentes esclareceram que pretenderam interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e que a questão de inconstitucionalidade foi “aflorada” nas alegações de recurso de revista.

1.2.3. Por despacho de 07/01/2021 o recurso para o Tribunal Constitucional não foi admitido, porquanto, em suma: (a) do requerimento referido em 1.2. não consta qualquer referência à alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC; (b) o recurso não seria admissível ao abrigo da referida alínea, uma vez que o STJ não recusou a aplicação de qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade; e (c) também não é admissível ao abrigo da alínea b), uma vez que os recorrentes não suscitaram a questão de inconstitucionalidade perante o STJ.

1.2.4. Desta decisão reclamaram os recorrentes para o Tribunal Constitucional – reclamação que deu origem aos presentes autos.

1.2.5. No Tribunal Constitucional, foi proferido o Acórdão n.º 281/2021, no sentido do indeferimento da reclamação e consequente confirmação da decisão reclamada. Assentou tal decisão nos fundamentos seguintes:

“[…]

2.3. Entendeu-se na decisão reclamada que os recorrentes, ora reclamantes, não observaram o ónus previsto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC: prévia suscitação da questão de inconstitucionalidade.

Neste ponto, os reclamantes usam uma formulação dúbia: ora se referem a uma decisão ex novo do STJ, ora afirmam que a questão foi “aflorada” nas alegações de revista excecional. Todavia, a primeira afirmação não se confirma e a segunda nem se confirma nem é relevante.

2.3.1. Quanto à suscitação da questão de inconstitucionalidade nas alegações de revista excecional, importa notar, antes de mais, que não ocorreu.

Nas alegações (fls. 277/279), os réus (habilitados) limitaram-se a invocar aquela que, na sua tese, é a melhor interpretação do disposto no artigo 1817.º, n.º 3, do Código Civil e a citar jurisprudência relevante nessa matéria, sem qualquer referência (ou “afloramento”, para usar a expressão dos reclamantes) a questões de inconstitucionalidade, muito menos a questões de inconstitucionalidade normativa – em nenhum momento foi suscitada uma questão de inconstitucionalidade por referência a uma norma adequadamente delimitada formal e substancialmente.

Sem prejuízo de se sublinhar essa objetiva omissão, a suscitação de uma questão de...

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