Acórdão nº 01829/15.0BEALM de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1829/15.0BEALM Recorrente: “Infra-estruturas de Portugal, S.A.” (que integrou, por fusão, a “EP – Estradas de Portugal, S.A.”) Recorrida: “A…………….., S.A.” 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada como Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade acima identificada como Recorrida, anulou a liquidação oficiosa que a esta foi efectuada pela “EP – Estradas de Portugal, S.A.”, da taxa prevista no art. 15.º, n.º 1, alínea g), do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, com a redacção que lhe foi dada pelo art. 1.º do Decreto-Lei n.º 25/2004, de 24 de Janeiro, relativamente ao “estabelecimento do acesso do estaleiro à zona da estrada”.

1.2 A Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor: «I- O presente recurso tem por objecto a sentença recorrida na parte em que declara o licenciamento do estabelecimento do acesso ao estaleiro isento do pagamento da taxa prevista na alínea g), do n.º 1, do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, por força da alínea b), do n.º 3 do mesmo artigo, e consequentemente veio julgar procedente a impugnação intentada pelo Recorrida, anulando, por conseguinte, o acto de liquidação de taxa praticado pela Recorrente.

II- Para concluir nesse sentido, a sentença recorrida baseou-se no pressuposto que, muito resumidamente, se consubstancia, no facto de o Tribunal a quo considerar que a isenção prevista na alínea b), do n.º 3, do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro abrange também o licenciamento do acesso ao estaleiro da empreitada para instalação /implantação das canalizações de águas e esgotos respeitantes a serviços públicos, e não apenas o licenciamento da ocupação privativa (e permanente) do subsolo da zona da estrada por essas canalizações, bem como a utilização privativa (temporária) do solo da zona da estrada para realização dessas obras.

III- A Recorrente considera que a sentença em recurso mal andou ao considerar o estabelecimento do acesso ao estaleiro isento do pagamento de taxa, fazendo uma errada interpretação e aplicação do direito, concretamente do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, entretanto revogado pelo Decreto-Lei n.º 31/2015, de 27 de Abril.

IV- É que sucede que estamos perante duas realidades distintas, a saber, por um lado, as obras para a implantação da tubagem no subsolo da zona da estrada que devem ser licenciadas pela Recorrida, nos termos conjugados dos artigos 6.º, n.º 1, alínea a) e 11.º, alínea c), ambos do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, a pedido da entidade gestora dos serviços públicos de abastecimento de águas e esgotos (o dono da obra), e, por outro lado, o estabelecimento do acesso ao estaleiro à estrada nacional, também ele a licenciar pela Recorrida, nos termos conjugados dos artigos 6.º, n.º 1, alínea b) e 11.º, alínea c) do mesmo diploma legal, a pedido do empreiteiro.

V- A obra para implantação da tubagem no subsolo da zona da estrada foi licenciada pela Recorrida, licenciamento esse que abrange o conjunto das permissões necessárias para a realização da empreitada no que à utilização privativa, ainda que temporária, do domínio público respeita, a saber, não só a ocupação do subsolo da zona da estrada pela tubagem/canalização, como também a ocupação do solo da zona da estrada, por via da regra, a berma, para abertura das valetas com vista à colocação dessas tubagens e para depósito de materiais.

VI- O antedito licenciamento não abrange o estabelecimento do acesso do estaleiro à zona da estrada, ainda que esse estaleiro seja indispensável e indissociável da empreitada, porquanto o acesso ao estaleiro não se confunde com as obras da empreitada.

VII- O pedido de licenciamento das obras para implantação de canalizações de águas e esgotos no subsolo da zona da estrada respeitantes a serviços públicos é feito em momento prévio à adjudicação da empreitada por parte da entidade gestora dos serviços públicos (concessionária de águas ou empresas municipais), pelo que, aquando dessa adjudicação, esse licenciamento já se encontra fechado, devendo qualquer outro pedido necessário à utilização do domínio público rodoviário ser objecto de novo licenciamento, independente do anterior.

VIII- Por força da isenção prevista na alínea b) do n.º 3 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, as obras em causa foram isentas do pagamento da taxa prevista na alínea a), do n.º 1, do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71 que prevê que “pela ocupação do subsolo da zona da estrada” é cobrada a quantia de € 11,38 “por cada metro de extensão de canalização ou aqueduto”.

IX- O pedido de estabelecimento de acesso ao estaleiro à zona da estrada é subsequente ao licenciamento das obras para implantação das canalizações no subsolo da zona da estrada, e inteiramente independente deste, pelo que não está, nem nunca poderia estar, abrangido nem pelo licenciamento em causa, nem, como tal, pela respectiva isenção.

X- É prática contratual corrente a responsabilidade por todos os licenciamentos referentes à instalação do estaleiro ser inteira e exclusivamente do empreiteiro, que contabiliza na sua proposta todos esses custos, pois compete a este último escolher a respectiva localização, não sendo, de todo, necessário ou imprescindível, que o acesso ao estaleiro se faça através de uma estrada nacional, razão pela qual, tendo sido opção do empreiteiro escolher, para o seu estaleiro, um terreno cujo acesso à estrada nacional careça de licenciamento, deve o mesmo respeitar o conjunto dos requisitos legais para o efeito, designadamente o pagamento da taxa prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro.

XI- A isenção prevista na alínea b) do n.º 3 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro é aplicável à taxa prevista na alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo e não à taxa prevista na alínea g) do mesmo número.

XII- Caso o legislador tivesse pretendido estender a isenção aqui em causa, passando a mesma também a abranger o estabelecimento do acesso ao estaleiro da empreitada para implantação das canalizações na zona da estrada, seguramente que o teria escrito expressamente, não fazendo depender, de novo licenciamento, o estabelecimento desse acesso, porquanto, de acordo com as regras e princípios da interpretação e aplicação da lei, consagrados no artigo 9.º, n.º 3 do Código Civil, o intérprete deve presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento correctamente e em termos adequados.

XIII- Razão pela qual, não fazendo a norma em causa qualquer referência ao estabelecimento de acessos no âmbito da empreitada para implantação de canalizações, e sujeitando esse estabelecimento a novo licenciamento, não o incluindo no licenciamento da empreitada em causa, não pode o intérprete presumir que o estabelecimento desse acesso está abrangido pela isenção.

XIV- As normas que estabelecem taxas e as respectivas isenções são normas tributárias, pelo que, o princípio constitucional da legalidade tributária, consagrado também pelo legislador ordinário no artigo 8.º, n.º 1 da LGT, na sua vertente de tipicidade, veda a integração analógica de normas de isenção de taxas (cf. também artigo 11.º, n.º 4 da LGT), embora consinta na sua interpretação extensiva.

XV- A interpretação extensiva pressupõe que, por via interpretativa, se conclua que o legislador “minus dixit qual voluit”, isto é, não podem restar dúvidas que a letra da lei ficou aquém do seu espírito, que o legislador disse menos do que queria e, por isso, há que dar à letra da lei um alcance conforme ao pensamento legislativo, ou seja, in casu, não podem restar dúvidas que quando isentou do pagamento de taxas as canalizações/tubagens de água respeitantes a serviços públicos de abastecimento de água, o legislador também pretendia abranger, no âmbito da isenção, o estabelecimento do acesso ao estaleiro da empreitada para colocação dessa infra-estrutura/equipamento, no subsolo da zona da estrada, o que não se verifica, por se tratar de duas realidades que não se confundem, sendo claramente distintas.

XVI- Não é, assim, possível concluir, com a certeza e segurança exigíveis, que o legislador tenha dito, no caso concreto, menos do que pretendia, pelo que, não é possível fazer uma interpretação extensiva da norma da alínea b), do n.º 3 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro, logo, essa isenção é somente aplicável à taxa prevista na alínea a), do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de Janeiro e não à taxa prevista na alínea g) do mesmo número 1.

XVII- Por tudo isto, a sentença recorrida errou na interpretação e aplicação do direito, razão pela qual, deve ser revogada, e substituída por uma que declare o acto de liquidação de taxa em crise válido.

Nestes termos e nos mais de direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a sentença na parte em que considera o estabelecimento do acesso do estaleiro da empreitada isento do pagamento de taxa e substituída por uma que declare o acto de liquidação de taxa praticado pela Recorrente válido e legal por não haver lugar a isenção de taxa, julgando-se, consequentemente, improcedente a impugnação.

».

1.3 A Recorrida apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor: «A. A douta Sentença...

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