Acórdão nº 0856/06.3BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Representante da Fazenda Pública, Recorrente nos autos à margem referenciados, notificada do Acórdão proferido em 28 de janeiro de 2021 pelo Tribunal Central Administrativo Sul e com ele não se conformando veio, nos termos do disposto no artigo 285.º Código de Processo e de Procedimento Tributário (CPPT), interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo.

Alegou, tendo concluído: “a) Entende, a FP, que o acórdão recorrido incorreu em erro de interpretação e subsunção dos factos e do direito - em clara violação de lei substantiva -, o que afeta e vicia a decisão proferida, tanto mais que assentou e foi fruto de um desacerto ou de um equívoco no que tange à consideração dos custos contabilizados pela ora Recorrida, porquanto, defende que as quebras de mercadorias inerentes à atividade desenvolvida por empresas do setor e estando as mesmas, in casu, suportadas pelos documentos identificados no probatório, e devidamente corroborada pela prova testemunhal, está, comprovadamente, demonstrada a efetividade do custo e a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, subsumindo-se, assim, no nº 1 do artigo 23º do CIRC.

b) In casu, o presente recurso é absolutamente necessário para uma melhor aplicação do direito, porquanto, em face das características do caso concreto, existe a possibilidade de este ser visto como um caso-tipo, não só porque contem uma questão bem caracterizada e passível de se repetir no futuro, como a decisão da questão suscita fundadas dúvidas, o que gera incerteza e instabilidade na resolução dos litígios; c) Quanto ao mérito do presente recurso entende, a FP, que estamos perante uma “situação limite” que, pela sua gravidade e complexidade justifica a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa para uma melhor aplicação do direito, vejamos porquê: d) Concluiu, doutamente, o Tribunal “a quo” que “destinando-se os bens que integram o activo imobilizado à realização de operações de afluxo de valores positivos ao rédito da empresa, a perda material desses bens, seja a que título for, designadamente por furto ou roubo, não pode deixar de relevar, pelo seu valor líquido (art.º23.º, alínea g), do CIRC), como realidade «indispensável para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora” – vd. Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 00005/04, de 12.03.2015.

e) E por assim ser, tal é quanto baste para se assumir o custo em questão como dedutível para efeitos fiscais nos termos do artigo 23.º do CIRC, estando o mesmo devidamente suportado e mostrando-se indispensável para a manutenção da fonte produtora, devendo, nessa medida, a correção ser anulada por padecer de erro sobre os pressupostos, conforme decidido pelo Tribunal a quo”.

f) Infere-se do que supra se expôs que o objeto do presente recurso consiste em apurar se a liquidação adicional de IRC, no montante de € 111.198,60 (inclui juros compensatórios) relativa ao exercício de 2003, deve permanecer na ordem jurídica da Recorrida, ou ao invés, deve ser anulada conforme decidiu pelo douto Acordão do Tribunal “a quo”.

g) A Recorrida foi objecto de uma acção inspectiva na sequência da qual não foram aceites como custos fiscais os valores correspondentes à conta 6935 – mercadorias inutilizadas, no montante global de € 312.703,13, que haviam sido inscritos no exercício fiscal de 2003.

h) Defende a Recorrida que esse é o valor dos produtos obsoletos ou estragados que não estavam em condições de ser comercializados e foram destruídos, constituindo, por isso uma perda do exercício de 2003, que reúne os pressupostos de dedutibilidade para determinação do lucro tributável, previstos nas normas dos artigos 23.º e 42.º do Código do IRC.

i) Por seu turno a FP não pondo em causa a indispensabilidade de tais custos para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, entende que eles não se encontram comprovados, já que a Recorrida, apenas, apresentou documentos internos, sem intervenção documentada de qualquer entidade externa e sem prévia comunicação aos serviços da AT.

j) Defende o douto Acórdão recorrido que firmou a sua decisão tendo por base o exame crítico dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo tributário, não impugnados, tudo conforme discriminado nos vários parágrafos do probatório, na posição assumida pelas partes nos seus articulados e informações oficiais, complementada com a prova testemunhal produzida nos autos.

k) Em primeiro lugar e quanto ao depoimento das testemunhas, aquelas, em momento algum comprovaram que, efectivamente, conferiram, elaboram qualquer relação anexa aos autos de inutilização das mercadorias que foram inutilizadas, ou em que dias, ou meses, eventualmente, esse abates tinham ocorrido.

l) Limitaram-se a corroborar o que, inicialmente, tinha sido escrito na petição inicial, ou seja, esclareceram aquele que, eventualmente, seria o procedimento interno relativamente ao abate dos produtos absoletos ou estragados.

m) Ou seja, o conhecimento do testemunho não foi directo, mas sim de ouvir dizer, se não vejamos: n) Não foram confrontadas com aqueles autos de inutilização de modo a que, no mínimo, pudessem confirmar que tenham estado presentes nos abates daqueles produtos em particular pois que são estes o objeto da correcção, o que, aí sim, denotaria conhecimento direto dos factos que aqui se procuravam apurar, nem as mesmas sequer confirmaram por sua livre iniciativa que marcaram presença naqueles dias em particular e em momento algum afirmaram impressivamente que aqueles produtos em particular foram conferidos.

o) A testemunha B……………. refere ao minuto 21 da gravação é que assistiu a algumas destruições, porém, em momento algum referiu que se recorda das destruições, ainda que fosse, por algum motivo em particular.

p) À pergunta se havia alguma forma de haver desvios dos produtos, a testemunha afirma que não acredita, ou seja, não diz que não é possível, apenas que não acredita, e afirma ao minuto 22 e 05 segundos impressivamente que não pode afirmar a 100%, embora não acredite que pudessem haver quaisquer fugas.

q) A mesma questão colocada à testemunha C…………….. obteve a seguinte resposta ao minuto 34: "não tinham pessoas dessa natureza''.

r) Relativamente ao facto 11 levado ao probatório e, contrariamente ao que aí é enunciado, em momento algum esta testemunha logrou afirmar de forma expressa, que tenha marcado presença naqueles dias em particular e, que tenha assistido aqueles processos de destruição em particular.

s) Em suma as testemunhas revelaram um discurso marcadamente geral e abstracto sem um único facto concreto.

t) Aliás, o depoimento das testemunhas só vem comprovar que, efectivamente os autos de inutilização juntos pela Recorrida não merecem qualquer credibilidade, uma vez que, não há ninguém que comprove que tenha estado presente nos mesmos e que produtos absoletos tenham sido inutilizados.

u) Aliás, como facilmente se comprova, pelas assinaturas ilegíveis, ou seja, se quiséssemos questionar alguém que servisse de testemunha abonatória para a Recorrida, não teríamos ninguém que tivesse testemunhado com grau de certeza o predito abate (vide pontos 5, 7 e 9, constantes a fls. 13, 14 e 15 do Acórdão) porém, foram todos dados como provados no Acórdão recorrido.

v) À luz do artigo 74.º, n.º 1 da LGT - O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque – ora, tendo presente todos os documentos carreados para...

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