Acórdão nº 02359/14.3BEPRT 0758/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 2359/14.3BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela apresentada na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa que deduziu contra a autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) relativa ao ano de 2014.

1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor: «I. O presente recurso vem interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, a qual declarou totalmente improcedente a impugnação judicial; II. Sucede, desde logo, que a Decisão de Indeferimento padece do vício de falta de fundamentação, razão pela qual deve ser anulado, em cumprimento do disposto no artigo 77.º da LGT; III. Ainda que assim não fosse, e independentemente da concreta natureza que se impute à CSB em crise, tal facto não altera o respectivo enquadramento no que respeita à sujeição deste tributo ao princípio da reserva de lei formal, contido no artigo 165.º, n.º 1, al. i), da Constituição; IV. Isto porque, contrariamente ao que subjaz à Douta Sentença recorrida, quer os impostos, quer as contribuições financeiras, estão sujeitos ao princípio da legalidade em sentido formal, o que significa que os respectivos elementos essenciais (a saber, a base de incidência, as taxas, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes) têm necessariamente de ser aprovados por Lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei autorizado do Governo; V. Porém, alguns dos elementos essenciais da CSB, designadamente as respectivas taxas e a definição da sua base de incidência, foram aprovados pela Portaria CSB, o que configura uma flagrante violação do princípio da reserva de lei na criação de impostos e contribuições financeiras, e implica a declaração da inconstitucionalidade orgânica dos artigos os artigos 4.º, 5.º e 6.º da Portaria CSB, por violação do disposto no artigo 165.º, n.º 1, al. i) da Constituição; VI. Ademais, a CSB padece de inconstitucionalidade indirecta pela circunstância de a Portaria CSB – mais concretamente, o respectivo artigo 6.º – violar o Regime CSB, este último aprovado por uma lei de valor reforçado (o artigo 141.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011), por violação do disposto no artigo 112.º, n.º 3, da Constituição; VII. Contudo, ainda que assim não fosse – o que apenas por cautela e a benefício de raciocínio se admite, sem conceder –, sempre haveria que concluir pela anulabilidade da autoliquidação da CSB em crise, com fundamento na respectiva inconstitucionalidade material; VIII. É que a CSB, face ao disposto nos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, bem como nos artigos 4.º e 5.º da Portaria CSB, falha inapelavelmente o teste da bilateralidade potencial, o que, viola, desde logo, o princípio da equivalência, com assento no artigo 13.º da Constituição, porquanto não decorrem do respectivo pagamento, para o Recorrente, quaisquer benefícios, sequer eventuais ou difusos; IX. Mais: também se for qualificada como um imposto, como defende o Tribunal de Contas, os artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB, bem como os artigos 4.º e 5.º da Portaria CSB violam o princípio da capacidade contributiva como corolário do princípio da igualdade tributária, previsto no artigo 103.º da CRP, na medida em que se encontra estruturada de um modo absolutamente alheio a tais critérios; X. Razão pela qual, também neste plano, a sua incidência sobre o Recorrente se revela manifestamente inconstitucional por violação do disposto no artigo 103.º, n.º 2, e 104.º da Constituição, inquinando irremediavelmente a autoliquidação da CSB, que também por este motivo haveria sempre de ser anulada; XI. Em paralelo, a autoliquidação da CSB, tal como resulta do disposto nos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Regime CSB revela-se ainda desconforme com o artigo 1.º do Primeiro Protocolo à CEDH, por articulação com o artigo 14.º da CEDH, e indirectamente com o artigo 8.º, n.º 2, da Constituição, por manifesta inexistência de quaisquer prestações públicas presumíveis ou potenciais cuja provocação ou aproveitamento sejam seguros numa óptica de grupo para o Recorrente; XII. Por fim, e a título subsidiário, importa concluir que a alteração da taxa da CSB, operada pela Portaria n.º 64/2014, de 12 de Março, é ilegal por violação do disposto nos artigos 12.º da LGT e 12.º do Código Civil; XIII. Sendo ainda declarada a inconstitucionalidade do artigo 1.º da Portaria n.º 64/2014, de 1 de Março, que alterou o artigo 5.º da Portaria CSB, por violação do princípio da proibição da retroactividade da lei fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição; XIV. Isto porque, em concreto quanto à CSB do ano de 2014, é forçoso concluir que o agravamento da taxa está a agir sobre um facto passado (ocorrido em 2013); XV. O que configura um flagrante problema de retroactividade autêntica de normas, proibido pela CRP; XVI. E implica a anulabilidade da autoliquidação da CBS de 2014 indevidamente paga, sendo a mesma restituída ao Impugnante, acrescida de juros indemnizatórios, ao abrigo do disposto no artigo 43.º da LGT; XVII. Requerendo-se ainda a reforma da Douta Sentença recorrida quanto à condenação em custas, de forma a dispensar-se a totalidade do pagamento da taxa de justiça remanescente nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, por não estar em causa uma situação de especial complexidade, nos termos previstos no artigo 530.º, n.º 7, do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, al. e), do CPPT.

XVIII. Pois ao não dispensar a totalidade do pagamento da taxa de justiça remanescente, o Tribunal a quo fixou a taxa de justiça estritamente em função do valor da acção, o que, por manifesta falta de correspectividade entre os serviços que foram concretamente prestados pelo Tribunal a quo e a taxa de justiça que o Impugnante, ora Recorrente, suportará – atenta, aliás, a confessada remissão para a posição adoptada em jurisprudência anterior do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto –, violou o disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, tal como interpretado à luz do princípio da proporcionalidade e do direito de acesso à justiça, respectivamente com acolhimento constitucional nos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, segunda parte, e 20.º da Constituição.

Termos em que, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a Douta Sentença recorrida, e declarando-se a anulabilidade da autoliquidação da CSB do ano de 2014, em resultado da declaração da inconstitucionalidade orgânica e material das normas que a regulamentam, por violação do disposto nos artigos 165.º, n.º 1, al. i), 103.º, n.º 2, e 104.º, e ainda do princípio da proibição da retroactividade da lei fiscal previsto no artigo 103.º, n.º 3, todos da Constituição, com a necessária restituição do montante de € 31.622.219,54 indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal em vigor.

Devendo ainda a sentença ser reformada quanto a custas, sendo dispensado o pagamento da totalidade da taxa de justiça remanescente, nos termos conjugados dos artigos 6.º, n.º 7, do RCP, 530.º, n.º 7 do CPC, e artigos 2.º, 18.º, n.º 2, segunda parte, e 20.º, todos da Constituição, Pois só assim se fará a costumada JUSTIÇA!».

1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento senão na parte respeitante à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Isto, depois de enunciar e analisar detalhadamente as questões a apreciar, com a seguinte fundamentação: «[…] 2. Análise das questões As questões relativas à natureza e conformidade com a Constituição do tributo em causa nos autos já foram objecto de apreciação em inúmeros acórdãos deste tribunal, os quais têm adoptado o entendimento sufragado no acórdão de 19 de Junho de 2019 (processo n.º 2340/13.0BELRS 0683/17), proferido em julgamento ampliado do recurso (artigo 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos - CPTA), e o seu teor posteriormente reiterado na jurisprudência que se lhe seguiu 1. [1Ac. de 06-05-2020, proc. 02921/17.2BEPRT Ac. de 06-05-2020, proc. 0576/12.0BEPRT 0477/14 Ac. de 12-02-2020, proc. 02273/16.8BELRS Ac. de 05-02-2020, proc. 02993/15.4BELRS 0542/18 Ac. de 05-02-2020, proc. 02923/12.5BELRS 0736/17 Ac. de 05-02-2020, proc. 02631/16.8BELRS Ac. de 08-01-2020, proc. 0386/17.8BEMDL Ac. de 17-12-2019, proc. 02708/16.0BEPRT Ac. de 30-10-2019, proc. 01270/14.2BELRS 0781/17 Ac. de 25-09-2019, proc. 0498/12.4BELRS 0494/18 Ac. de 08-05-2019, proc. 0407/18.7BALSB Ac. de 18-09-2019, proc. 02883/16.3BELRS 01261/17 Ac. de 11-09-2019, proc. 02697/13.2BEPRT 0436/17 Ac. de 11-07-2019, proc. 02666/16.0BELRS 01066/17 Ac. de 11-07-2019, proc. 02133/14.7BELRS 0382/17 Ac. de 11-07-2019, proc. 0251/14.0BEFUN 0299/17 Ac. de 03-07-2019, proc. 02132/14.9BELRS 0308/18 Ac. de 03-07-2019, proc. 02135/15.6BEPRT 0901/17 Ac. de 19-06-2019, proc. 02340/13.0BELRS 0683/17.

] Nessa medida iremos analisar em primeiro lugar as questões suscitadas especificamente nestes autos e posteriormente as que têm sido objecto de apreciação na referida jurisprudência.

2.1 O Recorrente começa por invocar a falta de fundamentação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que alicerça no facto de a decisão final não ter sido acompanhada da informação dos serviços que serve de suporte a essa decisão.

Como resulta da sentença recorrida, a referida informação foi comunicada ao Recorrente...

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