Acórdão nº 02072/12.6BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações Fazenda Publica, vem recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls. 147 a 182 do SITAF, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A……………, S.A., melhor identificada nos autos, contra o ato de liquidação adicional de IVA de 2008, no valor de € 125.793,05, acrescidas dos correspondentes juros compensatórios, na importância de € 14.121,53, o que perfaz a quantia global de € 139.914,58.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 194 a 224 do SITAF; A) É objeto deste recurso a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 13 de março de 2020, proferida nos presentes autos, que julgou parcialmente procedente a Impugnação Judicial.

  1. O recurso respeita, assim, à sentença proferida nos autos na parte em que decidiu não assistir razão à ora Recorrente, a saber: (I) taxas de IVA, relativamente às correções das taxas aplicáveis aos produtos sem glúten (doces e geleias ................, cujo valor da correção), Bebidas “................” (diversos sabores) e sumos “................”. (II) Falta de fundamentação do produto “sumos ................”; (III) Indemnização por garantia indevida.

    Vejamos: C) Resulta dos autos que a Impugnante tinha como atividade o comércio por grosso não especificado de produtos alimentares, bebidas e tabaco.

  2. No período de 2008, a Impugnante transacionou os produtos abaixo elencados, à taxa reduzida de IVA de 5% (taxa aplicável à data dos factos), por ter considerado que os mesmos se enquadravam nas verbas seguintes da Lista I Anexa ao Código do IVA: - Produtos sem glúten (doces e geleias “................”) – verba 1.13 da Lista I anexa ao Código do IVA; - Bebidas “................” (com diversos sabores) e sumos “................ “– verba 1.12 da Lista I anexa ao CIVA; - …………… ES 250 GR- Verba 1.4.1 da Lista I anexa ao CIVA; - Molho ………..200 M – Verba 1.4.1 da Lista II anexa ao CIVA.

  3. No período de 2008, a Impugnante transacionou os produtos abaixo elencados, à taxa reduzida de IVA de 5% (taxa aplicável à data dos factos), por ter considerado que os mesmos se enquadravam nas verbas seguintes da Lista I Anexa ao Código do IVA.

  4. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI201000223 de 30/04/2010, a Impugnante foi objeto de uma ação de inspeção externa, de âmbito geral que incidiu sobre o exercício de 2008, com o objetivo de apuramento da situação tributária do sujeito passivo, bem como a obtenção de um grau de segurança aceitável, sobre se as demonstrações financeiras e as declarações fiscais entregues refletem o cumprimento das obrigações tributárias inerentes.

  5. Em 27/02/2012, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária (RIT), da qual resultaram correções aritméticas relativamente às Taxas de IVA aplicáveis (cfr. Capítulo III.2 - Imposto em Falta- Imposto sobre o Valor Acrescentado do RIT).

  6. Na sequência do aludido RIT, foram emitidas as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, ora em crise.

  7. Inconformada com tais liquidações, a ora Impugnante apresentou Reclamação Graciosa, o qual foi deferida parcialmente.

  8. Nessa sequência foi apresentada Impugnação Judicial.

  9. Como é sabido, o IVA é o imposto mais harmonizado da União Europeia e carateriza-se fundamentalmente por ser um imposto indireto de matriz comunitária plurifásico que visa tributar todo o consumo em bens materiais e serviços, abrangendo na sua incidência todas as fases do circuito económico, desde a produção ao retalho, repercutindo-se o mesmo no consumidor final.

  10. Este imposto caracteriza-se essencialmente como um típico imposto indireto, que incide sobre cada uma das transações ou prestações de serviços e permite “aos sujeitos passivos desonerarem-se do encargo do imposto suportado a montante e assegurando que a tributação incida, em cada etapa do circuito económico, sobre o valor acrescentado, sendo suportada, principalmente, pelo consumidor final” (JOÃO CANELHAS DURO, “Dedução de IVA, Regularizações e Revisão da Autoliquidação”, Cadernos IVA2015, p. 327).

    Cada sujeito passivo líquido imposto, à taxa legal aplicável, sobre as suas vendas ou prestações de serviços, fazendo-o acrescer ao valor tributável constante das faturas que emite aos seus clientes.

  11. Conforme resulta do RIT, a partir da listagem de produtos fornecida pela Impugnante em sede de procedimento inspetivo foram verificadas as taxas de IVA aplicadas, tendo os SIT concluído que, relativamente a alguns produtos teria sido liquidado IVA a uma taxa incorreta, em face ao disposto no artigo 18.º do Código do IVA, conjugado com as listas anexas ao mesmo diploma legal.

  12. Como sumariza o TCA Sul, no Acórdão n.º 603/12.0BELRA, de 17-10-2019 “(…) o relatório da inspeção é um documento autêntico que, quando devidamente fundamentado e desde que baseado em critérios objetivos, faz fé pública relativamente aos factos que integra (cfr. artigo 76.º, n.º 1, da LGT), gozando de força probatória plena no que concerne aos factos que refere como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora (…)”.

  13. Salvo o devido respeito, na sentença proferida, a Meritíssima Juiz limitou-se apenas e tão só, a emitir uma sentença “economicista”, isto é, uma decisão onde apenas de uma forma simples e sintética foram apreciadas algumas das questões sem ter em conta todos os elementos constantes dos autos, deixando de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as que iremos dar nota de seguida.

  14. Quanto às correção relativas à taxa de IVA aplicável aos produtos sem glúten (doces e geleias ................), conforme refere e bem, a Meritíssima Juiz na sentença “(…) a lista I do CIVA prevê taxativamente os produtos que podem beneficiar da taxa reduzida do IVA, não sendo passível de uma interpretação extensiva, pelo que todo o produto que não seja contemplado, de forma inequívoca na referida lista, não pode beneficiar da taxa reduzida de IVA.”(realçado nosso).

  15. De acordo com a fundamentação vertida no RIT, para que um determinado produto seja enquadrado nalguma das Listas Anexas ao Código do IVA é necessário a qualificação legal deste produto.

  16. Entende a Impugnante que tais produtos são enquadrados na verba 1.13 da Lista I anexa ao Código do IVA, que contemplava à data a seguinte redação “(…) produtos dietéticos destinados à nutrição entérica e produtos sem glúten para doentes celíacos”, uma vez que basta que o produto seja apropriado para doentes celíacos e mencione que é isento de glúten para beneficiar da taxa reduzida de IVA.” S) Segundo os STI só estão reunidos os requisitos para enquadramento na verba 1.13 da Lista I anexa ao Código do IVA os produtos que “no âmbito das competências atribuídas à Direção Geral de Saúde (DGS), pelo artigo 3.º do DL n.º227/99, de 22/07, forem considerados por esta entidade (…), como produtos destinados à alimentação especial, designadamente aos doentes celíacos ou à nutrição entérica.” T) Contudo, a sentença considerou seguindo assim o entendimento da Recorrida expresso nos seguintes termos “(…) a rotulagem dos produtos em apreço assume a ausência de glúten, incluindo por via da contaminação. Os produtos em epígrafe são adequados ao objetivo nutricional pretendido e são comercializados com a indicação de que correspondem a esse objetivo.”, sendo assim no seu entender enquadrável na verba 1.13 da Lista I anexa ao Código do IVA (taxa de 5%).

  17. Salvo o devido respeito por quem assim pensa, tal conclusão não tem aqui cabimento como se demonstrará de seguida.

  18. Em 2008, dispunha a verba 1.13 da Lista l, anexa ao Código do IVA (bens e serviços sujeitos a taxa reduzida), em conjugação com o disposto na alínea a) do n.º1 do artigo 18.º do Código do IVA, que estão sujeitos à taxa reduzida de 5% as transmissões de “produtos dietéticos destinados à nutrição entérica e produtos sem glúten para doentes celíacos”.

  19. E certo que o que sejam estes produtos, não pode resultar de uma qualificação arbitrária dos seus produtores ou comerciantes, já que têm em vista satisfazer necessidades específicas e próprias de pessoas, com determinadas restrições alimentares e que carecem de especial proteção quanto à comercialização dos produtos que lhe é permitido consumir, em função da sua condição de saúde. Sendo que nada impede que os mesmos sejam também consumidos pelos demais consumidores.

  20. Foi neste contexto que o Decreto -Lei n.º 227/99 de 22 de junho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º285/2000, de 10 de novembro, veio regular o regime jurídico aplicável aos géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial, transpondo para a ordem jurídica nacional, a Diretiva n.º 96/84/CE, determinado assim as regras a aplicar na comercialização destes produtos, designadamente, no que diz respeito à indicação dos seus ingredientes, características objetivo nutricional dos mesmos e obrigação de notificação à Direção-Geral de Saúde.

  21. Como se faz constar do seu preâmbulo “(…) Assim, por razões de proteção da saúde dos consumidores, procede-se ao aperfeiçoamento do regime jurídico aplicável aos géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial, introduzindo novas regras de comercialização e colocação no mercado que permitam um melhor controlo, avaliação e comprovação da qualidade dos produtos, e à redefinição das entidades com competência para velar pela observância do disposto no presente diploma de acordo com as alterações de leis orgânicas entretanto ocorridas”.

  22. Em conformidade com o citado diploma torna-se obrigatória a indicação das substâncias ou ingredientes no rótulo das embalagens destes géneros alimentícios, devendo ainda ter a indicação de produtos destinados à nutrição entérica ou a doentes celíacos. Tal obrigatoriedade inclui também a sua declaração às instâncias...

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