Acórdão nº 1071/18.9T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACÓRDÃO I – RELATÓRIO 1. H… intentou contra A… acção declarativa com processo comum, para investigação de paternidade, ao abrigo do disposto no artigo 1869º do Código Civil, pedindo que seja declarado que a autora é filha do réu.

Para tanto, invocou, em síntese, que nasceu em 04-05-1972, a sua mãe faleceu em 21-10-2015 e apenas antes da sua morte esta lhe confirmou que o réu era o seu pai.

Regularmente citado, o réu contestou invocando a caducidade do direito da A., por desde Setembro de 2014 a mesma saber que o R. seria o seu pai, e impugnou o demais alegado.

Julgada a causa foi proferida sentença que julgou verificada a excepção de caducidade do direito de propor a acção e, em consequência, absolveu o réu A… do pedido formulado por H….

  1. Inconformada, dela recorreu a Autora, concluindo a sua apelação nos seguintes termos : “I – DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO 1 - Das declarações prestadas pela ora Recorrente em sede de declarações de parte (gravação 20190919151740_2787897_2871728, nomeadamente nos trechos que se situam de 2:13- 6:40; de 7:15- 10:30; 11:42- 12:48; 13:30- 14:08), pela testemunha I… (gravação 20190919144530_2787987_2871728, especificamente no trecho entre 3:15- 10:52), pela testemunha M… (gravação 20190919150535_2787897_2871728, mais especificamente no trecho entre 2:29 – 3:30 e 7:38-9:33), pela testemunha A… (gravação 20201008142124_2787897_2871728, trecho entre 31:44-36:46), e pela testemunha J… (gravação 20201008150011_2787897_2871728 -2:47-3:25) resulta provado que a Recorrente apenas teve certezas sobre a identidade do seu pai em Outubro de 2015.

    2 - Antes disso, a Recorrente tinha suspeitas a levaram a encetar as diligências necessárias não só para encontrar tal pessoa, mas para, essencialmente,confirmarem se aquela pessoa era, de facto, o pai da Requerida. A explicação para a contratação do Dr. A…, em Setembro de 2014, para encontrar uma pessoa determinada está, assim, plenamente justificada, não implicando, contudo, que, à data da sua contratação, ou mesmo depois de este ter encontrado aquele que se sabe agora ser o pai da Recorrente, tivesse esta certezas sobre se aquele homem era, de facto, o seu pai.

    3 - Relativamente ao depoimento da testemunha A… (que, no fundo, foi o depoimento utilizado pelo tribunal para fundamentar a sua convicção quanto aos factos aqui em análise), importa sublinhar que, não obstante tal testemunha afirmar ter sido contactada em Setembro de 2014, por I…, para tentar encontrar o pai da sua esposa, aqui Recorrente (o que, de resto, corresponde à verdade), não resulta de tal facto, como, aparentemente, o tribunal entendeu resultar, que a Recorrente tivesse já, em tal data, a convicção de que aquela pessoa era o seu pai.

    4 - Como resulta dos depoimentos supra indicados, o nome que foi facultado ao Dr. A… resultou das pesquisas feitas pelo marido da Recorrente que, tendo como ponto de partida o primeiro nome do Réu, a data de nascimento da Recorrente e a zona em que a sua mãe estava à data da concepção daquela. Mas não havia qualquer certeza quanto ao facto de aquela pessoa ser efectivamente o seu pai. Não havia nenhuma informação da parte da sua mãe, que se escusava sempre a falar do assunto. Não havia nenhuma confirmação da parte do seu pai – que, de resto, contestou os presentes autos.

    5 - A testemunha foi contratada para encontrar uma pessoa, tendo-lhe sido facultado o nome completo da mesma. A Recorrente nunca negou tal facto. Mas considerar que tal facto implica dar como provado, como fez o tribunal a quo, que esta sabia, em Setembro de 2014, que o Recorrido era seu pai é, com todo o respeito, avaliar incorrectamente a prova produzida.

    6 - E, mais do que isso, ainda que admitamos que o Dr. A… estava, naquela data, convicto de ser o Recorrido o pai da Recorrente, tal facto não poderia, por si, implicar que o tribunal considerasse como provado o referido facto, pois que a convicção relevante, para tais efeitos, é, apenas e tão somente, a da aqui Recorrente. E ficou provado, através das declarações de parte da Recorrente e das declarações das testemunhas I… e M…, que apenas em Outubro de 2015 teve a Recorrente confirmação, por parte da sua mãe, de que o seu pai era o ora Recorrido.

    7 - E o mesmo se diga relativamente à testemunha J…, amigo do Recorrido, que afirmou que, tendo acompanhado o Recorrido á reunião havida com a testemunha A…, no âmbito da qual falou ao telefone com a Recorrente, referiu que este, quando saiu, lhe disse, muito transtornado, que tinha uma filha em Angola.

    8 - O facto mais relevante dos presentes autos está provado: o Recorrido é o pai da Recorrente (conforme facto provado n.º 2), sendo, consequentemente seguro assumir que, quando contactado pelo Dr. A…, o Recorrido soube, pelas datas, locais e pessoas envolvidas, que era, de facto, o pai da Recorrente. E também podemos assumir que tenha partilhado tal facto, e a angústia e consternação que o mesmo implicava para si, com o amigo que o havia acompanhado a tal reunião.

    9 - Daí a utilizar tal desabafo e tal convicção para considerar como provada a convicção de uma terceira pessoa (a ora Recorrente) vai uma grande distância.

    10 - Assim, face a tudo o que ficou exposto, nomeadamente face à prova produzida através das declarações de parte da Recorrente e das testemunhas I… e M…, deve o facto provado n.º 3 (“Desde Setembro de 2014 que a autora sabia que o réu era seu pai”) transitar para os factos não provados e o facto não provado n.º 4 (“A autora apenas teve convicção segura de que o réu era o seu pai em Outubro de 2015, quando M… o confirmou e mostrou papel com nome daquele”) transitar para o elenco dos factos provados.

    11 - Já relativamente ao facto provado n.º 4 (“em 07/11/2014, a autora disse ao réu que era filha dele”) deve também o mesmo transitar para o elenco dos factos não provados.

    12 - E tal alteração funda-se nas declarações prestadas pela ora Recorrente em sede de declarações de parte (gravação 20190919151740_2787897_2871728, trecho entre 11:42- 12:48), pela testemunha I… (gravação 20190919144530_2787987_2871728, especificamente no trecho entre 15:30- 17:56) e pela testemunha A… (gravação 20201008142124_2787897_2871728, trecho entre 8:44-10:37)).

    13 - De facto, resulta claro da prova acabada de especificar que o telefonema existiu mas nenhum dos intervenientes no mesmo afirmou, em momento algum, que a Recorrente tenha dito ao Recorrido ser sua filha.

    14- Nem a Recorrente nem a testemunha I… afirmam tal facto. O Dr. A… não ouviu o telefonema, conforme por si admitido, pelo que não poderia nunca atestar tal facto, nem, consequentemente, o tribunal fundar a sua convicção nas suas declarações. O Recorrido não prestou declarações.

    15 - Quanto ao depoimento da testemunha J…, amigo do Recorrido, utilizado pela sentença recorrida para motivar a sua convicção, a testemunha limitou-se a relatar o desabafo do amigo que acabara de falar com aquela que sabia ser sua filha, o que não implica que esta tivesse a mesma convicção, até porque, como demonstrado, nunca o Recorrido lhe confirmou tal facto.

    16 - Pelo que, mais uma vez, não deveria a convicção do tribunal ter-se fundamentado nos testemunhos daqueles que, tendo contactado directamente com o Recorrido, percepcionaram, ainda que este nunca o tenha admitido, que, de facto, se tratava do pai da Recorrida.

    17 - Face ao exposto, deverá o facto provado n.º 4 (“em 07/11/2014, a autora disse ao réu que era filha dele”) transitar para o rol dos factos não provados.

    18 - Alterados os factos provados e não provados em conformidade com o supra exposto, temos que, ainda que tivesse o nome completo do Recorrido desde Setembro de 2014, a Recorrida não sabia que o Recorrido era seu pai desde tal data, apenas tendo obtido tal conhecimento ou certeza em Outubro de 2015, quando a sua mãe, pouco tempo antes de morrer, lhe confirmou o nome completo do mesmo. Não tinha, portanto, a Recorrente certezas ou sequer desconfianças fortes passíveis de desencadear o decurso do prazo de caducidade previsto no n.º3 do artigo 187º.º do CC.

    19 - No termos da al. b) do n.º 3 do artigo 1817.º acção de investigação da paternidade pode (ainda) ser proposta nos três anos posteriores ao conhecimento, pelo investigante, após prazo referido no n.º 1, de factos ou circunstâncias que justifiquem a investigação.

    20 - Entendeu o tribunal a quo que a Recorrente sabia, desde Setembro de 2014, que o Recorrido era seu pai. Tal como...

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