Acórdão nº 2981/19.1T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | MARIA JO |
Data da Resolução | 17 de Junho de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACÓRDÃO I- RELATÓRIO 1. M… intentou contra D… acção declarativa pedindo que:
a) Se declare que o regime de bens do casamento que vigorou entre a Ré e G… é o da comunhão geral de bens; b) Se declare a Ré e o filho da Autora G… como sendo proprietários em comum da fração autónoma identificada em 5º do presente articulado e objeto da escritura de compra e venda datada de 5 de maio de 2011, em que a Ré interveio como compradora, condenando-se, em consequência, a Ré a reconhecer a herança aberta por óbito de G… como proprietária desse prédio; c) Se determine que seja averbada a alteração do regime de bens do casamento à inscrição predial relativa à Ap. 2317, de 2011/05/05, relativo à fração autónoma descrita na Conservatória do Registo Predial de Lagos, sob o n.º … da freguesia Lagos (Santa Maria), concelho de Lagos, no sentido de constar que o sujeito ativo, a aqui Ré, era casada no regime da comunhão geral de bens com G…; d) Se determine, consequentemente, a Autora como herdeira de G…, no que concerne ao prédio identificado em 5.º do presente articulado”.
Alegou, para tanto e em síntese, ser mãe de G…, falecido em 2017 no estado de casado com a Ré com quem havia contraído matrimónio em 2001, no Canadá.
Mais alegou que durante a constância do casamento, i.e. em 2011, a Ré havia adquirido uma fracção autónoma que identifica, sita em Lagos, onde também declarou expressamente que ela e o referido G… eram casados no regime de separação de bens, e na qual só a mesma Ré comprava a referida fração autónoma.
Após o decesso de G…, a Ré, no dia 13 de Abril de 2018, compareceu no escritório do Notário Dr. Johannes Wilhelmus Mol em Amesterdão, Holanda, para a outorga da escritura de Habilitação de Herdeiros e referiu ser casada com o referido G… sob o regime da comunhão geral de bens, conforme determina o direito holandês.
E se assim é, por consequência, o bem (imóvel) que adquiriu, ainda na constância do casamento com o filho da Autora, pertencia à esfera jurídica de ambos os cônjuges, sendo um bem comum do casal e não um bem próprio da Ré, como quis fazer crer perante o Notário-Oficial Público, nos termos do artigo 1732º, do Código Civil.
Argumentou ainda que a Ré quis subtrair esse imóvel da esfera jurídica do filho da Autora, criando a aparência com a sua falsa declaração perante o Notário que o imóvel seria apenas seu e não também do seu cônjuge, isto é, bem comum do casal.
Entende, por isso, ser a dita escritura pública de compra e venda nula na parte em que diz ao regime de bens do casamento declarado pela Ré e esta condenada a restituir ao acervo da herança de G… metade do imóvel acima identificado, nos termos do disposto no artigo 286º do Código Civil.
Contestou a Ré, admitindo ter casado com Gregório Rodrigues no Canadá não obstante terem, ambos, a sua residência na Holanda, residência essa que mantiveram nesse país até ao decesso do seu marido ocorrido em 2017.
Por consequência, as normas do direito Holandês/Países Baixos são as aplicáveis, quer no que respeita à determinação do regime de bens do casamento, quer no que diz respeito à sucessão.
Admitiu ter ocorrido uma menção errónea na escritura de compra do apartamento dos autos e na declaração do óbito para efeitos do imposto de selo, pois o regime de bens vigente entre ambos era efectivamente da comunhão geral, mas tal questão revela-se de todo em todo inútil pois à luz do direito holandês é a única herdeira do filho da Autora.
Julgada a causa, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a Ré da integralidade dos pedidos[1].
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É desta sentença que a Autora recorre, formulando, na sua apelação, as seguintes conclusões: “1. A recorrente considera incorretamente julgado o constante na alínea i), dos factos provados, pois o tribunal a quo não colheu com segurança toda a prova produzida, designadamente as declarações da recorrente e das testemunhas P…, C…, A… e R…; 2. Face à prova produzida, houve da parte do tribunal a quo, uma má ou incorreta apreciação da prova; 3. O filho da recorrente e marido da recorrida com quem esta última casou no dia 22 de Agosto de 2001, em Ontário, Canadá, faleceu em Portugal (país onde residia e trabalhava à data da sua morte) no dia 22 de Dezembro de 2017, pelo que, aplica- se à sua sucessão as regras previstas no Regulamento (UE) n.º 650/2012, de 04/07 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Julho de 2012.
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O ato jurídico da União denominado Regulamento, previsto no § 2 do artigo 288.ºdo TUE, manifesta três características fundamentais: tem carácter geral; é obrigatório em todos os seus elementos; e diretamente aplicável em todos os Estados-Membros.
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A vigência direta dos regulamentos na nossa ordem jurídica constitucional resulta diretamente do artigo 8.º, nºs 3 e 4, da Constituição da República Portuguesa.
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O artigo 21.1 do RES submete as sucessões causa mortis à residência habitual do falecido no momento do óbito. Determina, portanto, um fator de conexão objetivo.
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Em face dos depoimentos prestados (…) (…), deveria ter sido considerado como provado na alínea i), dos factos provados, o seguinte: “Antes do falecimento e à data deste, a residência habitual do falecido Gregório Nuno de Jesus Rodrigues, marido da Ré, situava-se na Rua Principal, Burgau, Luz, Lagos, Portugal.”.
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O Mmo. Juiz a quo não fez uma valoração correta da prova, tendo ido na modesta opinião da recorrente pelo caminho mais fácil para decidir esta questão complexa, agarrando-se apenas aos documentos juntos pela recorrida, tais como declarações fiscais e registos municipais de cidadão da UE, para concluir que a residência habitual do falecido G…, era nos Países Baixos, quando em termos objetivos e factuais o mesmo há algum tempo residia e vivia em condições análogas às dos cônjuges com outra pessoa na casa desta, sita em Burgau, em Portugal, e trabalhava com carácter de permanência há algum tempo também em Portugal (na empresa denominada B…, Lda.), estando já separado de facto da recorrida há algum tempo.
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A determinação do Estado da última residência habitual do falecido G… não depende de fatores tais como o fato de ser legal ou ilegal, coincidir ou não com o domicílio fiscal ou que aquele se encontre inscrito no registo municipal dos Paises Baixos como cidadão da UE. A...
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