Acórdão nº 401/21 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução08 de Junho de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 401/2021

Processo n.º 1149/2019

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., S.A. (o ora recorrente) impugnou judicialmente o ato de indeferimento de reclamação graciosa da autoliquidação da Contribuição para o Setor Bancário (CSB) referente a 2011, no valor de €1.883.808,75.

O processo correu os seus termos no Tribunal Tributário de Lisboa com o número 498/12.4BELRS e culminou na prolação de sentença, datada de 24/01/2017, pela qual a impugnação foi julgada improcedente.

1.1. Desta decisão recorreu o impugnante para o Supremo Tribunal Administrativo (STA). Das respetivas alegações consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

139. Mas o que está em causa na CSB é coisa diferente: corresponde a uma oneração tributária sobre um facto inteiramente concluído antes da sua entrada em vigor e o que está vedado ao legislador é precisamente atribuir a tais factos passados um valor constitutivo para a definição de um novo regime jurídico ou, pelo prisma simétrico, determinar que a norma inovatória possa ter projeção sobre os ditos factos passados.

140. Aqui chegados, e tendo ficado assente a evidente retroatividade do Regime CSB, cumpre concluir pela respetiva inconstitucionalidade, por violação do princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição e, no plano infraconstitucional, no artigo 12.º, n.º 1, da LGT.

[…]

148. Conforme se demonstrou no âmbito do processo de impugnação judicial e se encontra plasmado na douta sentença recorrida, a base tributável e as taxas da CSB, que são dois dos seus elementos essenciais, foram fixadas pela Portaria n.º 121/2011.

149. Isto quando, por força do princípio da reserva de lei previsto no artigo 165.º, n.º 1, al. i), da Constituição, também designado princípio da legalidade fiscal em sentido formal, o teriam de ser por lei da Assembleia da República ou por Decreto-Lei autorizado do Governo.

[…]

158. Uma interpretação conforme à Constituição exige, necessariamente, a conclusão inversa: a inexistência do regime geral das contribuições financeiras, a que alude o artigo 165.º, n.º 1, al. i), da Constituição, implica que a respetiva aprovação se encontre sujeita ao crivo, mais rigoroso, da Assembleia da República.

[…]

196. Neste contexto, crê o Recorrente que se afigura flagrante a violação do princípio da reserva de lei formal na criação de impostos e contribuições financeiras, que, aliás, constitui um dos pilares do sistema fiscal, como resulta do artigo 103.º, n.os 2 e 3, da Constituição, que impõem a criação dos impostos por lei e que preceituam que ‘ninguém pode ser obrigado a pagar impostos… cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei’.

197. Ao mesmo tempo que, a sufragar-se tal entendimento, se subverte em absoluto o princípio da legalidade fiscal que lhe dá substância, uma vez que, a pretexto da facilitação do processo normativo contra um pretenso pano de fundo de bloqueio da ação governativa (que nenhum Governo sentiu necessidade de ultrapassar, propondo à Assembleia da República um regime geral das contribuições financeiras), se subtraem do crivo parlamentar elementos basilares da CSB, sendo estes apenas muito perfunctoriamente gizados no Regime CSB.

198. O que, e em suma, torna organicamente inconstitucional a Portaria CSB, por violação do princípio da reserva de lei previsto no artigo 165.º, n.º 1, al. i), da Constituição e, consequentemente, determina a anulabilidade da autoliquidação da CSB em crise nos presentes autos.

[…]

199. Por todas as razões avançadas no Capítulo C. ii., entende o ora Recorrente que, mesmo que pudesse ser caracterizada como uma contribuição financeira, o Regime da CSB padeceria de inconstitucionalidade, por violação do princípio da equivalência, ínsito no princípio da igualdade tributária, quando aplicado a taxas e contribuições financeiras.

[…]

201. Mas a CSB estaria condenada ao mesmo resultado – de manifesta inconstitucionalidade das normas em que assenta – se for, como entende o Tribunal de Contas que deve ser, qualificada como um imposto.

[…]

225. Este entendimento torna a CSB absolutamente alheia aos rendimentos auferidos pelos sujeitos passivos, bem como aos respetivos lucros, traduzindo-se, em bom rigor, num imposto que abstrai da capacidade contributiva do sujeito passivo.

226. Razão pela qual, também neste plano, a sua incidência sobre o ora Recorrente se revela manifestamente inconstitucional, por violação não só do princípio da equivalência, se qualificado como uma contribuição financeira, mas também da capacidade contributiva, se qualificado como um imposto, inquinando de forma inapelável a autoliquidação, que também por este motivo haverá sempre de ser anulada.

D. Conclusões:

[…]

III. O regime da CSB padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal, previsto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição.

[…]

XIII. Sucede, porém, que alguns dos elementos essenciais da CSB, designadamente as respetivas taxas e a definição da sua base de incidência, foram aprovados pela Portaria CSB, o que configura uma flagrante violação do princípio da reserva de lei na criação de impostos e contribuições financeiras e implica a declaração da respetiva inconstitucionalidade orgânica, por violação do disposto no artigo 165.º, n.º 1, al. i), da Constituição.

XIV. Contudo, ainda que assim não fosse – o que apenas por cautela e a benefício de raciocínio se admite, sem conceder –, sempre haveria que concluir pela anulabilidade da autoliquidação da CSB em crise, com fundamento na respetiva inconstitucionalidade material.

[…]

XX. Tornando-a assim num tributo sem sinalagma sequer difuso ou potencial, e que, em bom rigor, se traduz num imposto que abstrai totalmente da capacidade contributiva do sujeito passivo.

XXI. Razão pela qual, também neste plano, a sua incidência sobre o ora Recorrente se revela manifestamente inconstitucional por violação do disposto nos artigos 103.º, n.º 2, e 104.º da Constituição, inquinando irremediavelmente a autoliquidação da CSB, que também por este motivo haveria sempre de ser anulada.

[…]

Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e declarando-se a anulabilidade da autoliquidação da CSB do ano 2011, em resultado da declaração da inconstitucionalidade orgânica e material das normas que a regulamentam, por violação do disposto nos artigos 165.º, al. i), 103.º, n.º 2, e 104.º, e ainda do princípio da proibição da retroatividade da lei fiscal previsto no artigo 103.º, n.º 3, todos da Constituição […].

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.1.1. No STA, foi proferido acórdão, datado de 25/09/2019, que negou provimento ao recurso.

1.2. Desta decisão recorreu o impugnante para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – recurso que deu origem aos presentes autos –, nos termos seguintes (transcrição parcial do requerimento de fls. 384/389, que aqui se dá por integralmente reproduzido):

“[…]

1. O Douto Supremo Tribunal Administrativo (‘STA’) pronunciou-se sobre a interpretação do regime que aprovou a Contribuição sobre o Setor Bancário (‘CSB’), constante do artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011 – abreviadamente, ‘RJCSB’),

2. E, bem assim, sobre algumas normas que lhe deram execução e que constam da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março (a ‘Portaria CSB’), na redação originária,

3. Tendo circunscrito a sua análise relativamente ao tema da (in)constitucionalidade do RJCSB e da Portaria CSB à afirmação de que:

‘em relação a tais questões [quer a questão da natureza jurídica da CSB, quer a questão da alegada violação dos princípios constitucionais da legalidade, por violação da reserva de lei formal e por não cumprimento do comando constitucional do artº 103º, nº 2 da CRP] da irretroatividade da lei fiscal e da capacidade contributiva (este enquanto corolário do princípio da igualdade) foi já circunstanciadamente analisada e apreciada a conformidade constitucional dos diplomas que regem a tributação aqui em causa, no acórdão do STA de 19/06/2019, proferido no processo nº 02340/13.OBELRS (0683/17) em julgamento ampliado desta Secção de Contencioso Tributário realizado ao abrigo do disposto no art. 148º do CPTA, em sentido que continua a merecer o nosso acordo e o qual se remete (nº 5 do art. 663º do CPC), julgamento mediante o qual se visa, precisamente, «garantir a uniformidade de jurisprudência perante a possibilidade de decisões de sentido divergente ou, peio menos, com variação substancial do tratamento das questões submetidas e de fundamentação da decisão (...)», dispensando-se qualquer reprodução por se mostrar acessível em www.dgsi.pt”.

4. Concluindo, portanto, que, ‘tendo a Contribuição sobre o Setor Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre Inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime Jurídico, por violação dos princípios constitucionais da legalidade, da não retroatividade, da Igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que a respetiva autoliquidação, também referente ao ano de 2011, não enferma de Ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios’.

5. Tal como resulta do Acórdão Recorrido, na parte supracitada, a fundamentação do mesmo, no que à apreciação da (in)constitucionalidade respeita, foi feita por remissão para o Acórdão do STA de 19 de junho de 2019 (processo n.º 02340/13.0BELRS|0683/17).

6. Neste último, acolheu-se o entendimento de que a CSB é uma contribuição...

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