Acórdão nº 915/12.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução09 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I.

RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por E........

contra o acto de liquidação de Imposto do Selo (IS) n.° ......., de 11 de Abril de 2007, no montante de 93.932,00€.

Terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A.

Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a Impugnação Judicial, que teve por objeto o ato de liquidação de Imposto do Selo n.° ......., de 11 de abril de 2007, no montante de € 93.932,00.

B.

Ora, entendemos que face à situação fática, atenta a matéria de facto provada e ausência de matéria de facto não provada, deveria ter sido outro o entendimento e jurídico, em conformidade com o invocado em sede do art.3.° da Contestação e respetivamente dos arts. 10.° a 31.° da Informação elaborada pela secção de Justiça Contenciosa da Direção de Finanças de Lisboa, assistindo-se a um errado julgamento sobre os factos provados e a respetiva aplicação do direito.

C.

Entendemos que o Tribunal a quo não valorou corretamente, e conforme referido no facto provado 14), que o ora Recorrido quando adquiriu o prédio em causa a título oneroso já constava uma construção no logradouro que posteriormente adquiriu por usucapião.

D.

Ou seja, ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo ( “Pelo que há que admitir que o Impugnante adquiriu onerosamente tais prédios, como sendo parte dos primitivamente projetados. E que apenas o logradouro foi adquirido por usucapião.(...) ) a aquisição de usucapião, para efeitos fiscais, abrange o logradouro mas também as construções, porque só dessa forma existe uma temporalidade da situação de facto à produção de efeitos do instituto do usucapião.

E.

Logo, é à data da produção de efeitos do usucapião que temos de atentar os factos, pelo que, e conforme decorre dos factos provados 1) e 6), é à data do reconhecimento do usucapião do logradouro, que importa a situação jurídica de facto que exista no mesmo, e irá também ser objeto de tributação, a titulo de uma tributação unitária.

F.

Logo, a tributação, em imposto do selo, terá por referência o logradouro e as construções existentes, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo.

G.

A não ser assim, estamos perante uma desconstrução tributária, que, como no caso dos autos, privilegia fiscalmente quem é abrangido pelo usucapião em detrimento das restantes situações que se pugnam pelo normalidade, em que ocorre uma aquisição onerosa e subsequente registo.

H.

Importa ressalvar, singelamente, que o instituto do usucapião pode-se definir como uma forma originária de aquisição do direito de propriedade sobre um bem móvel ou imóvel em função de haver utilizado tal bem por determinado lapso temporal, contínua e incontestadamente, como se fosse o real proprietário desse bem.

I.

Estamos, então, perante uma utilização, por posse e uso, que se inicia precária e que se transforma numa forma de aquisição do direito de propriedade em virtude da sua utilização e detenção no tempo.

J.

A verdade é que o instituto da usucapião é, um tanto ou quanto, sui generis, desde logo, é um instituto susceptível de gerar dúvidas na comunidade, em geral, quanto à sua bondade, uma vez que poderá interferir com padrões éticos, e a que a respetiva tributação não pode ignorar.

K.

Isto porque, aquele que possui, durante um certo lapso de tempo (desde que a posse seja pública e pacífica), poderá adquirir um direito contra o verdadeiro titular, vindo este, consequentemente, a perdê-lo (total ou parcialmente).

L.

Ora, é isto que entendemos que está em causa, no instituto da usucapião: há alguém (possuidor) que explora o bem, reunindo, para tal, esforços físicos e económicos; ao passo que, do outro lado, temos um proprietário inerte, que não explora o valor económico da coisa, tendo, tal comportamento, repercussões negativas na economia, em geral, regendo aqui a máxima: dormientibus non sucurrit jus.

M.

Se seguirmos o caminho trilhado pelo Tribunal a quo, estamos, a deixar de tributar factos que foram derivados do exercício da capacidade do sujeito passivo que lançou mão do usucapião, favorecendo fiscalmente o recurso a esta figura por inverso às habituais aquisições onerosas, ocorrendo uma manifesta violação do dever fundamental de pagar impostos, assim como da igualdade e proporcionalidade tributária.

N.

Logo, uma vez que a aquisição por usucapião resulta da posse do adquirente e não de qualquer negócio jurídico (oneroso ou gratuito), trata-se de uma aquisição originária pelo que, para efeitos fiscais, o facto tributário só ocorre no momento em que o documento que a titula (de que é exemplo a escritura de justificação notarial) se torna definitivo.

O.

Ou seja, “à data da decisão proferida sobre o [usucapião] (2005/04/14), já o logradouro não existia enquanto tal, por sobre o mesmo se encontrar implantada construção conforme resulta da avaliação efetuada em 2005/01/31, na sequência da entrega, em 2004/11/15, da declaração modelo 1 de IMI pelo recorrente e da informação prestada pelo perito que a efetuou.”, facto procvado 14).

P.

Pelo que, ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo, e ao contrário do que resulta dos factos provados, designadamente 1) a 6) e do 14), à data do respetivo registo do usucapião, o facto objeto de tributação compunha-se no logradouro e nas construções existentes, conforme atentado...

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