Acórdão nº 00508/05.1BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 24 de Junho de 2020, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou procedente a impugnação judicial movida por S. Lda, NIF (…), com sede em Travessa (…), contra liquidações adicionais de IRS dos anos de 1999 e 2000 e respectivos juros compensatórios nos valores de, respectivamente, 49 029,95 € e 28 724,11 €.

As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: CONCLUSÕES: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento dos Pessoas Colectivas (IRC) relativas aos exercícios de 1999 e 2000 e correspondentes Juros Compensatórios, nos montantes respectivos de € 49 029,95 e € 28 724,11, efectuadas na sequência do procedimento externo de inspecção levado a cabo à impugnante através da ordem de serviço n.° 32930.

B. Considerou o Tribunal a quo que “...uma vez que a Impugnante tinha levantado a questão do erro na quantificação da matéria tributável e esta questão não tinha sido abrangida pela sentença precedente do douto acórdão, determinou-se a pronúncia apenas sobre esta questão. Neste ponto devemos começar por notar que a lei divide o ónus da prova em duas fases/parcelas. Na primeira fase, incumbe à Autoridade Tributária o ónus da prova dos pressupostos do recurso aos métodos indirectos; na segunda, incumbe ao sujeito passivo provar que a quantificação da matéria tributável foi excessiva. V. art. 74.° nº 3 da LGT: (...)”.

C. Continuando: “Ora, resulta dos factos provados que as perdas de fio no processo de transformação do fio em malha são superiores à percentagem utilizada pela AT - em vez dos 2% utilizados pela inspecção, estas perdas rondam os 8 e os 12%.

(...) O coeficiente utilizado baseou-se, conforme ficou provado, única e exclusivamente nas declarações do responsável da Impugnante, sem que tenha havido qualquer procura de um critério objectivo e ajustado à realidade daquele sector de actividade." D. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera que da prova apresentada pela AT não é de extrair a conclusão que serviu de base à decisão proferida, padecendo a mesma de erro de julgamento na matéria de facto e do direito, pelas razões que passa a expender.

E. A factualidade relevante dada como provada e sobre a qual a Mma. Juiz estriba o aliás ilustre decisório é a seguinte: “J. A percentagem de fio perdida no processo produtivo de transformação do fio em malha da Impugnante foi muito superior a 2%, aproximando-se de valores que rondam entre os 8 e os 12% (depoimentos das testemunhas A.); K. No processo produtivo de transformação da malha em cru em malha acabada da Impugnante ocorrem frequentemente ganhos de massa, decorrentes da adição de corantes e outros acabamentos que incorporam a fibra (depoimentos das testemunhas P.); L. A Impugnante ordenava que se fizessem retingimentos das suas malhas ou das malhas de clientes suas com frequência (depoimento de V.); M. Nas guias de transporte era possível verificar-se se a malha enviada era malha de cor ou malha em cru, mas não se seria um primeiro retingimento ou retingimentos subsequentes (depoimento de V.); N. O tipo de malha, cor e outras características do serviço a executar pelas tinturarias sub-contratadas constavam de ordens de serviço, as quais são destruídas passados apenas alguns meses, tendo em conta o elevado volume destas (depoimento de V.);” F. Na nossa modesta opinião, em relação aos factos provados nos pontos J, K, L, M e N, a convicção do Tribunal a quo formou-se quase exclusivamente na prova testemunhal, considerando os depoimentos das testemunhas A., P. e V., como determinantes para a decisão sob recurso.

G. A. e P. que, por trabalharem para as empresas subcontratadas pela impugnante e tendo participação e pleno conhecimento dos métodos produtivos utilizados por si e, consequentemente pela própria impugnante, no entender do Tribunal, provaram que a taxa de perdas seria superior a 2%, cifrando-se entre 8% e 12%, pois existem perdas de massa decorrentes das variações de humidade, o fio larga cotão que não serve no processo produtivo e ainda que as mudanças no tipo de malha - mudança no feitio - levam a perdas decorrentes da adaptação das máquinas à nova configuração.

H. A testemunha P., sendo engenheiro químico com experiência na área dos tingimentos, convenceu o Tribunal que é frequente haver ganhos de malha de massa decorrentes da adição de corantes às fibras da malha no tingimento e ainda de ganhos de humidade que ocorrem nesta fase do processo produtivo. O depoimento de V. foi no sentido do já antes alegado no Relatório de Inspecção quanto ao retingimento de malhas e da impossibilidade de controlar os sucessivos retingimentos a partir das guias.

I. Já em relação à fundamentação utilizada pelos Serviços de Inspecção para efectuar as correcções, o Tribunal desvalorizou os fundamentos invocados, pois estes foram proferidos sem levar em linha de conta um padrão ou norma técnica, baseando-se apenas nas declarações do gerente da impugnante, entendendo o Tribunal que os erros encontrados quer quanto às omissões de vendas de fio e as omissões de compras de malhas, correspondem à normal consequência do desenvolvimento da actividade da impugnante.

J. Concluiu, assim, que resulta dos factos provados que as perdas de fio no processo de transformação do fio em malha, são superiores à percentagem utilizada pela AT. Em vez de 2%, as perdas situam-se entre os 8% e os 12% e, além disso, que também ficou provado que ocorrem ganhos de massa na transformação de malha em cru em malha acabada, resultantes da adição de corantes às fibras, o que é compatível com o que constava na contabilidade da impugnante, demonstrando, estarem erradas as correcções realizadas.

K. Entende a Fazenda Pública, ressalvado o respeito por melhor opinião, que a decisão sob recurso valorizou em excesso os depoimentos das testemunhas A. e P., que por serem colaboradores das empresas subcontratadas, teriam um conhecimento técnico suficientemente forte para pôr em causa as correcções efectuadas pela Inspecção Tributária, L. desvalorizando por completo as declarações do próprio responsável da impugnante, certamente possuidor de um conhecimento técnico específico, capaz de conduzir eficazmente os destinos da impugnante e todo o seu processo produtivo, ainda mais pelo facto de esse processo produtivo estar em parte a cargo de terceiros - empresas subcontratadas.

M. O que não se aceita é que tais declarações, com breve referência no ponto C do probatório, não tenham tido qualquer relevo, pois o responsável pela gestão da impugnante assumiu uma perda de 2%, certamente com base no seu conhecimento técnico, aceitando o Tribunal que a este conhecimento técnico se sobrepunha o das testemunhas ao afirmarem que não era verosímil uma taxa de perdas de apenas 2%, mas sim de 8% a 12%.

N. Trata-se de uma diferença muito significativa para ser desvalorizada pelo Tribunal apenas com base nas declarações das duas testemunhas, sendo que uma delas, P., nem sequer acompanhou o processo produtivo nos exercícios em causa nos autos, mas que apesar disso o Tribunal não considerou “testemunha- perito”.

O. Testemunha essa que, embora o Tribunal considere ter tido um depoimento “com razão de ciência válida e convincente”, certo é que a sua empresa só tratava do processo de tinturaria e acabamento das malhas, do qual apenas teve conhecimento directo a partir do ano de 2004, acabando a testemunha por prestar declarações relativamente às perdas de 2% no processo de tecelagem e relativamente aos anos de 1999 e 2000.

P. Esta mesma testemunha, a instâncias do Representante da Fazenda Pública, cf. gravação referida supra, afirmando que 80% do seu trabalho era prestado à “S.’, não foi capaz de responder à questão colocada sobre que percentagem é que representava o trabalho efectuado pela “Irivo” tendo em conta que a “S.’ recorria ao trabalho de acabamentos de outras empresas. Acabando por admitir não conhecer o processo produtivo de tecelagem/tricotarem.

Q. Também pesou na decisão do Tribunal o facto da testemunha da RFP afirmar que não tinha conhecimentos específicos sobre as normas técnicas aplicáveis e que não fez qualquer estudo de mercado ou qualquer diligência de apuramento de desperdícios.

R. De...

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