Acórdão nº 1484/14.5BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMÁRIO REBELO
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTE: FAZENDA PÚBLICA RECORRIDOS: J.......

OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a impugnação judicial apresentada na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que manteve a decisão de indeferimento da reclamação dos actos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS») n.° ....... e de juros compensatórios n.° ....... e n.° ......., referentes a 2008.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: a. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a Impugnação Judicial procedente, e, em consequência, anulou a liquidação dos atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS») n.° ....... e de juros compensatórios n.° ....... e n.° ......., referentes ao ano de 2008, no montante total de €7.122,43, com as legais consequências.

  1. No âmbito do procedimento de inspeção e ao abrigo do dever de colaboração, foi enviada notificação ao ora Impugnante para, querendo, regularizar a sua situação tributária, designadamente, para declarar o montante de € 23.702,38 que auferiu em 2008 a título de “ajudas de custo”, mas que, na verdade, essa quantia “não assume natureza compensatória mas sim remuneratória, estando sujeita a IRS nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 2° do CIRS”.

  2. Com efeito, o ora Impugnante assim fez, em 14/05/2012, entregou voluntariamente uma declaração de substituição (identificada com o número …………… ), na qual declarou que auferiu rendimentos da empresa CMN no montante de € 31.677,14 e que veio dar origem à liquidação n.° ......., que deu valor a pagar de € 7.122,43, em causa nos autos.

  3. A liquidação ora em crise teve por referência os montantes inscritos na declaração de rendimentos de substituição, nos termos do artigo 59.°, do CPPT, e não em qualquer correção oficiosa efetuada pela AT com base em elementos apurados em sede de inspeção, a qual, não teve continuidade com a subsequente entrega da declaração de substituição, por entretanto a situação ter sido regularizada pelo sujeito passivo, em que os montantes em causa foram declarados pelo mesmo, ainda que, eventualmente, tenha entregue tal declaração a contragosto.

  4. Tanto assim é que no despacho proferido no final da ação inspetiva, expressamente se menciona que “foram regularizadas por parte do Sujeito Passivo as inexactidões declarativas detectadas" (ver fls. 71 do PAT) - facto que deverá ser acrescentado aos factos dados como provados.

  5. É certo que a AT notificou o Impugnante para, querendo, regularizar a sua situação tributária, designadamente, para declarar o montante de € 23.702,38 por ter natureza remuneratória, estando sujeita a IRS nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 2° do CIRS”, no entanto, esta notificação em nada altera a natureza da liquidação de IRS resultante da declaração de substituição.

  6. Tendo o Impugnante apresentado voluntariamente a declaração de substituição, a liquidação em causa não poderia deixar de assentar nessa nova declaração do contribuinte e importa ainda salientar que tal declaração continua a presumir-se verdadeira e de boa fé, nos termos do artigo 75.° da LGT.

  7. A presunção legal de veracidade consagrada no artigo 75.° da lei Geral Tributária traduz uma inversão do ónus probatório.

  8. Ao apresentar uma declaração de substituição em conformidade com os elementos que constavam da notificação da AT, tal constituiu manifestação de concordância com o entendimento da AT sobre a natureza do rendimento que havia sido pago como ajudas de custo.

  9. Admitindo, no entanto, que o ora Impugnante entregou a declaração de substituição modelo 3, sem concordar com os valores que mencionou, então deveria ter vindo fazer a competente prova, ilidindo a presunção de veracidade dos dados e elementos mencionados nessa declaração, nos termos do art.° 73.° da mesma LGT, o que não fez.

  10. Contrariamente ao que o tribunal a quo decidiu, cabia ao Impugnante apresentar elementos que demonstrassem que o montante de € 23.702,38 dizia respeito a ajudas de custo, no entanto não foi junta qualquer prova pelo que é forçoso concluir que o Impugnante não ilidiu a presunção de veracidade que recai sobre a declaração de substituição.

  11. Assim, entende a Fazenda Pública que, decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não apreciou corretamente a prova produzida no caso sub judice pois face à prova produzida nos autos o Impugnante não ilidiu a presunção de veracidade e boa-fé da declaração de substituição apresentada voluntariamente por si e era ao Impugnante a quem cabia o ónus da prova, nos termos do artigo 74.° da LGT.

  12. Face ao exposto, a liquidação de imposto sindicada é legal, pelo que se deve manter na ordem jurídica e o tribunal a quo ao ter decidido como decidiu violou os artigos 74.°, n.° 1, e 75.°, n.° 1, ambos da LGT e alínea a) do n.° 1 do artigo 2° do CIRS (na redação à data dos factos), pois deveria ter decidido pela legalidade da liquidação de IRS em causa por o Impugnante não ter ilidido a presunção da veracidade da sua declaração, designadamente por não ter provado que o montante de € 23.702,38 dizia respeito a ajudas de custo como alega.

  13. Assim, deverá ser dado provimento ao recurso, ser revogada a douta sentença recorrida e ser substituída por acórdão que decida pela improcedência da Impugnação Judicial.

    Nos termos supra expostos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente, PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA CONTRA-ALEGAÇÕES.

    A - A sentença ora recorrida determinou a anulação da liquidação adicional de IRS por erro nos seus pressupostos e vício de violação de lei consubstanciado na insuficiência de fundamentação por parte da Recorrente e errónea qualificação dos factos imputados ao RECORRIDO, nomeadamente no que diz respeito à desconsideração dos rendimentos auferidos pelo RECORRIDO, a título de ajudas de custo, por parte da Administração Tributária (AT).

    B - O objecto do recurso apresentado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública impende precisamente sobre as seguintes questões: a. Considera a Recorrente que a liquidação adicional se deverá manter, atendendo a que o montante pago a título de ajudas de custo ao RECORRIDO constitui remuneração proveniente de trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato de trabalho e, nessa medida, é considerado rendimento de trabalho dependente; b. A liquidação adicional de IRS que foi objecto de impugnação decorre directamente da declaração de substituição apresentada voluntariamente pelo Impugnante (aqui RECORRIDO) e não em qualquer correcção oficiosa efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). Assim, cabia ao Impugnante ilidir a presunção de veracidade dos valores que declarou na declaração de substituição.

    C - Alega, ainda, a Fazenda Pública que a entrega da declaração de substituição em conformidade com os elementos que constavam da notificação da AT, “constituiu uma manifestação de concordância com o entendimento da AT sobre a natureza do rendimento que havia sido pago como ajustas de custo".

    D - Importa sublinhar que, conforme resulta da sentença recorrida, nem os serviços de Inspecção Tributária, nem, numa fase posterior, a própria Representação da Fazenda Pública, lograram demonstrar e fundamentar se as quantias percebidas a título de ajudas de custo foram consideradas remunerações porque o seu recebimento tivesse excedido os limites qualitativos e quantitativos consignados na lei, ou por entenderem que as quantias pagas a este título não estavam conexionadas com as deslocações efectuadas pelo Impugnante (aqui RECORRIDO).

    E - É pacífico - e jurisprudencialmente incontroverso - que à Fazenda Pública cabe o ónus da prova, em casos como o que aqui está em causa.

    F - Em sede de IRS, a determinação do rendimento colectável tem por base a Declaração Modelo 3, a qual deve ser entregue pelo sujeito passivo, vigorando, portanto, o princípio da verdade declarativa.

    G - "Preceitua, neste âmbito, o artigo 75.°, n.° 1, da LGT, no sentido de que se presumem verdadeiras as deslocações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei. O princípio da verdade declarativa coloca na esfera de atuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, logo a AT está vinculada a liquidar os tributos com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, a posteriori, ao controlo dos factos declarados".

    H - Recai sobre a AT, ao abrigo do artigo 74.° da Lei Geral Tributária, o ónus de provar a verificação dos requisitos que lhe permitam alterar o rendimento colectável declarado pelo sujeito passivo, apontando os elementos factuais demonstrativos de que as verbas pagas pela entidade empregadora constituem um rendimento do trabalho sem fim compensatório.

    I - Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 11-07-2019, processo 150/05.7BECTB; de 04-06-2020, processo 15/14.1BEALM; e de 16-12-2004, processo 00130/04.

    J - Tendo sido aceite pela AT a efectividade da deslocação, a qual, segundo as regras da experiência comum, implica a criação de gastos acrescidos, incumbia-lhe demonstrar que o montante auferido pelo RECORRIDO a título de ajudas de custo era totalmente independente das deslocações efectuadas por este e das respectivas despesas, representando um ganho real para o trabalhador ou, pelo menos, que esses montantes excediam as despesas normais ao serviço da entidade patronal, o que não logrou fazer, bastando-se com a alegação de meros indícios que em nada contribuem para concluir conforme concluiu.

    L - Conforme a decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul suprarreferida, de 04-05-2020, "para ser clara a...

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