Acórdão nº 01357/19.5BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO: 1.

Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), vem interpor recurso jurisdicional de revista para este STA, nos termos do art. 150º CPTA, do acórdão do TCAS proferido em 21-01-2021, que julgou procedente o recurso interposto da sentença de 29-08-2019 do TAC de Lisboa _ que havia julgado improcedente a ação intentada por A……………., nacional da Guiné-Bissau, contra o ora Recorrente, em que impugnava a decisão do SEF de 16.07.2019 [que indeferira o seu pedido de proteção internacional, determinando a sua transferência para Itália, por ser o Estado-Membro da UE responsável pela análise do seu pedido, nos termos do Regulamento (UE) 604/2013 do Parlamento e do Conselho, de 26 de junho] _ revogando-a e, em consequência, anulou o ato impugnado e condenou o ora Recorrente a proceder às diligências instrutórias necessárias à preparação da decisão.

2.

Para tanto alegou em conclusão: “1ª – Resulta evidente que o tribunal ad quo na sua ponderação e julgamento do caso sub judice, e refutando a decisão do recorrente, não deu cumprimento às normas legais vigentes em matéria de asilo, mormente no que respeita ao mecanismo de retoma a cargo, ao qual a Itália está vinculada.

  1. - Revela-se, pois, imprescindível a admissão do presente recurso de revista atenta a clara necessidade de melhor aplicação do Direito, face ao entendimento sustentado nos vereditos a quo, 3ª – É evidente que o Acórdão escrutinado na sua ponderação e julgamento do caso sub judice, e refutando a decisão do recorrente, não deu cumprimento às normas legais e não se coaduna com as normas legais vigentes em matéria de asilo acima referenciadas.

  2. – Está in casu, em causa o abalo na confiança jurídica, corolário do princípio da certeza e segurança que se impõe a um Estado de Direito, também, e sobretudo, na aplicação da justiça.

  3. – Como outrossim e diretamente o princípio da legalidade.

  4. – De harmonia com o art.º 18º nº 1 al. b) do Regulamento (UE) 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 junho, e o artº 37º, nº 1 da Lei de Asilo, o ora recorrente procedeu à determinação do Estado-Membro responsável pela análise do pedido de asilo, procedimento regido pelo art.º 36º e seguintes da Lei nº 27/2008, de 30 de junho (Lei de Asilo), tendo, no âmbito do mesmo sido apresentado, aos 27/07/2018, um pedido de retoma a cargo às autoridades italianas, o qual foi tacitamente aceite, atento o estatuído no nº 2 do art.º 25º do Regulamento Dublin.

  5. – Consequentemente e vinculadamente, por despacho do diretor nacional do ora recorrente proferido aos 16/07/2019, nos termos dos arts. 19º A, nº 1 a) e 37º nº 2 da citada Lei, foi o pedido considerado inadmissível e determinada a transferência do requerente para Itália, Estado-Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional nos termos do citado Regulamento, motivo pelo qual o Estado Português se torna apenas responsável pela execução da transferência nos termos do art.º 29º e 30º do regulamento Dublin.

  6. – O ora recorrente deu início ao procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de asilo, que culminou com o apuramento de que essa responsabilidade pertence à Itália (cfr. art.º 13º, nº 2 do citado Regulamento (UE) 604/2013 e art.º 37º, nº 1 da Lei nº 27/2008 (Lei de Asilo), impondo a lei como consequência imediata (vinculada) que fosse proferido o ato de inadmissibilidade e de transferência.

  7. – “Estamos, portanto, perante um ato estritamente vinculado, sendo que a validade dos atos praticados no exercício de poderes vinculados tem de ser feita em função dos pressupostos de facto de direito fixados por lei, ou seja, pela confrontação da factualidade dada como provada com a consequência jurídica imediatamente derivada da lei (…) é a própria Lei 27/2008, de 30 de junho, que no seu artigo 37º, nº 2, lhe impunha a atuação levada a efeito” (cf. Acórdão do TCA Sul de 19/01/2012, proc. nº 08319/11).

  8. - A alegação do requerente, desacompanhada da apresentação de um mínimo de elementos objetivos, é insuficiente para considerar demonstrada a existência de falhas sistémicas no procedimento de asilo italiano que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante, ou que, dadas as particulares condições do A. a transferência implica um risco sério e verosímil de exposição do A., a um tratamento contrário ao artigo 4º da CDFUE.

  9. – Nos presentes autos inexiste qualquer indício que permita concluir pela existência de falhas sistémicas no procedimento de asilo Italiano, único óbice para que Portugal não proferisse a decisão o de transferência ora impugnada.

  10. – Com efeito, relativamente às condições de acolhimento no Estado-Membro responsável, a Itália encontra-se vinculada pela Diretiva 2013/33/UE, do Parlamento e do Conselho, de 26 de junho de 2013, a qual estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional.

  11. - Em conformidade com a confiança mútua entre os Estados-Membros no âmbito do Sistema Europeu comum de Asilo (SECA), existe uma forte presunção que as condições materiais de acolhimento a favor dos requerentes de protecção internacional nesses estados-Membros serão adequadas, com respeito pelo Direito da União e pelos direitos fundamentais.

  12. - Ao contrário do pugnado pelo douto acórdão recorrido, o procedimento de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional (que culminou com o apuramento de que essa responsabilidade pertence à Itália) antecede e fundamenta que o pedido apresentado seja considerado inadmissível e seja determinada a transferência da analise do pedido.

  13. – Contrariamente ao que o douto acórdão refere, ao ora recorrente não restava outra solução que não fosse propalar a competente decisão de inadmissibilidade e de transferência, a qual não padece de qualquer vício de facto ou de direito.

  14. – Estabelece o artº 3º, nº 2, do Regulamento 604/2103, que, “Caso seja impossível transferir um requerente para o Estado-membro inicialmente designada responsável por existirem motivos válido para crer que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes nesse Estado-Membro, que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante na aceção do art.º 4º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o Estado-Membro que procede à determinação do Estado-Membro responsável prossegue a análise dos critérios estabelecidos no capítulo III a fim de decidir se algum desses critérios permite que outro Estado-Membro seja designado responsável.” 17ª – Estabelece o arº 17º, nº 1, do referido regulamento que “Em derrogação do artigo 3º, nº 1, cada Estado-Membro pode decidir analisar um pedido de proteção internacional que lhe seja apresentado por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida, mesmo que essa análise não seja da sua competência por força dos critérios definidos no presente regulamento.” 18ª – E nos termos do art.º 4º da CDFUE “Ninguém pode ser submetido a tortura, nem a tratos ou penas, desumanos ou degradantes.” 19ª – O douto Acórdão recorrido ao considerar a Ação procedente e condenar o ora Recorrente no dever de reconstruir o procedimento, mormente “…a realização pelo SEF de uma entrevista complementar ao autor, a fim de este esclarecer o exacto período em que esteve em Itália, nomeadamente a data em que saiu desse país, a data em que teve de sair do campo em que se encontrava alojado, bem como as razões em que assentou a ordem de saída do campo (se tal ocorreu por ter sido indeferido o pedido de protecção internacional, por outra razão ou se não lhe foi indicado qualquer motivo), sem prejuízo da realização pelo SEF de outras diligências que se mostrem pertinentes, maxime a solicitação à Itália - ao abrigo do art. 34º n.ºs 1, al. a), e 2, als. d) e g), do Regulamento (UE) n.º 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Junho de 2013 - de informação sobre o local e o período em que o autor teve alojamento fornecido pelas autoridades italianas, a data de apresentação do pedido de protecção internacional, a decisão tomada, respectiva data e eventual recurso interposto e decisão tomada no mesmo.”...

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