Acórdão nº 327/21 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução26 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão n.º 327/2021

Processo n.º 245/2019

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., S.A. (a ora recorrente) impugnou, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, o ato de liquidação do “Imposto Especial de Jogo” referente ao mês de setembro de 2013, pedindo a respetiva declaração de ilegalidade.

O processo correu os seus termos naquele tribunal com o número 95/14.0BESNT e culminou na prolação de sentença, datada de 12/03/2018, que julgou a impugnação improcedente.

1.1. A impugnante recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal Administrativo (STA). Das respetivas alegações de recurso consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

20.º) Do que fica dito decorre, assim, que o parâmetro de validade do Decreto-Lei n.º 422/89 e do imposto que com base nele se liquida está na Constituição, pelo que a inconstitucionalidade de que está ferido o referido diploma não pode, sem mais, considerar-se sanada por efeito do contrato que a recorrente celebrou (…).

[…]

22.º) Na verdade:

a) A recorrente contestou uma concreta liquidação do imposto do jogo por considerar que o Decreto-Lei n.º 422/89, ao formular tal imposto, violou os princípios constitucionais da legalidade, da capacidade contributiva, da tributação pelo rendimento real e da igualdade (…);

[…]

38.º) Pois bem, foi ao abrigo dessa autorização legislativa amplamente genérica que o Decreto-Lei n.º 422/89, de 2/12, veio disciplinar/regular o imposto de jogo, modificar as suas taxas, incorrendo, pois, as normas de tal diploma em inconstitucionalidade orgânica, por violação do princípio da legalidade, na sua vertente ou segmento de reserva de lei formal. (…)

39.º) Por isso, a impugnada liquidação do imposto de jogo, na medida em que foi emitida com base em normas inconstitucionais, é ilegal, sendo que, em relação a esta invocada ilegalidade, a sentença nada diz.

[…]

49.º) Concluindo este ponto: as regras do artigo 87.º, n.º 1, alíneas c) e b), do Decreto-Lei n.º 422/89 violam os artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição, pelo que a liquidação impugnada, porque emitida com base nessas normas inconstitucionais, é ilegal.

[…]

60.º) Ora, enquanto presunção, estamos, desde logo, perante uma violação clara do artigo 104.º, n.º 2, da Constituição (…).

[…]

62.º) É, assim, claro que o imposto do jogo viola os princípios constitucionais da capacidade contributiva e do rendimento real (…).

V – Da violação do princípio da igualdade

63.º) Constata-se dos artigos 85.º, 86.º e 87.º da Lei do Jogo que estão fixadas diferentes taxas de imposto para as diversas concessões do jogo e, portanto, para os diversos contribuintes que se dedicar a essa atividade.

64.º) Daqui decorre, assim, que um contribuinte que explora a atividade do jogo numa determinada zona terá, ou poderá ter, uma taxa de tributação superior a um contribuinte que explode a mesma atividade em outra zona.

65.º) Ora, a diferenciação entre contribuintes e a diferenciação entre impostos a pagar tem que ser feita — só pode ser feita — de acordo com a realidade económica demonstrativa da capacidade contributiva e não pela diferenciação, sem mais, sem critérios, com base nas zonas de exploração da atividade, e com a aplicação de diferentes taxas.

66.º) Deste modo, a impugnada liquidação é ilegal, pelo que, também quanto a esta questão, não pode manter-se a douta sentença recorrida, sendo que, ao invés do defendido em tal sentença, essa diferenciação entre os diversos contribuintes não decorre dos contratos de concessão, mas sim da Lei do Jogo.

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.1.1. Por acórdão de 20/12/2018, o STA julgou o recurso improcedente, no essencial, por remissão para o acórdão de 05/12/2018 do mesmo tribunal, proferido no processo n.º 1457/15.

1.2. Desta decisão recorreu a impugnante para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – recurso que deu origem aos presente autos – nos termos seguintes:

“[…]

1.º) Estabelece o n.º 1 do art.º 75.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional, que o recurso se interpõe “por meio de requerimento, no qual se indique a alínea do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo do qual o recurso é interposto” – o presente recurso é interposto nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º.

2.º) Estatui o n.º 2 do mesmo art.º 75.º-A, que “sendo o recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º do requerimento deve ainda constar a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considere violado, bem como a peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade”.

3.º) A ora recorrente deduziu no Tribunal Administrativo e Fiscal [de Sintra] uma impugnação judicial, nos termos do art.º 97.º, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, contra uma liquidação do Imposto Especial de Jogo, referente ao mês de setembro de 2013, liquidação essa emitida pelo Turismo de Portugal, I.P., ao abrigo do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2/12 (Lei do Jogo).

4.º) Nessa impugnação, a recorrente invocou a ilegalidade da liquidação impugnada:

a) Por violação dos princípios constitucionais da capacidade contributiva, do rendimento real e da proporcionalidade;

b) Por a Lei do Jogo, com base na qual foi emitida a impugnada liquidação, ser inconstitucional por violação do princípio constitucional de legalidade, na sua vertente de reserva da lei material;

c) Por violação do princípio constitucional da igualdade;

(cf. Petição Inicial da Impugnação, alegação de recurso para o STA e Acórdão recorrido, onde foram elencadas as questões objeto de recurso).

5.º) Na medida em que o Imposto Especial do Jogo incide sobre o chamado “capital em giro” dos jogos, sem qualquer relação, nem com a receita bruta, nem com o lucro, os princípios constitucionais da capacidade contributiva, da tributação pelo lucro real e da proporcionalidade, que decorrem dos artigos 103.º, n.º 2, e 104.º da Constituição da República Portuguesa, são violados.

6.º) Na medida em que a Lei do Jogo atribui à autoridade administrativa a competência para fixar, para as máquinas de jogo, o “capital em giro”, sobre o qual incide o Imposto Especial do Jogo, há uma violação do princípio constitucional da legalidade ao atribuir-se à autoridade administrativa competência para fixar um dos elementos essenciais do imposto, o que é vedado pela Constituição (art.º 103.º, n.º 2).

7.º) Na medida em que a Lei do Jogo fixa taxas de Imposto Especial de Jogo diferentes para as diversas concessões da atividade do jogo, há uma violação do princípio constitucional da igualdade.

8.º) Tendo o Tribunal Administrativo e Fiscal [de Sintra] julgado improcedente a impugnação judicial, foi deduzido recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo nesse recurso também sido suscitadas as referidas questões de constitucionalidade.

9.º) Concluindo:

a) O presente recurso é feito ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional;

b) A recorrente considera que o Imposto Especial de Jogo, tal como estabelecido na Lei do Jogo, viola os princípios constitucionais da capacidade contributiva, do rendimento real e da proporcionalidade;

c) A recorrente considera que o Imposto Especial do Jogo, tal como estabelecido na Lei do Jogo, viola o princípio constitucional da legalidade, na sua vertente de reserva de lei material;

d) A recorrente considera que o Imposto Especial do Jogo, tal como estabelecido na Lei do Jogo, viola o princípio constitucional da...

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