Acórdão nº 5223/19.6T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

P. 5223/19.6T8STB.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: (…) Credit intentou contra (…), (…) e (…) a presente acção de impugnação pauliana peticionando que, nos termos do disposto nos artigos 610.º e seguintes do Código Civil, seja declarada a ineficácia em relação à A. do acto de doação efectuado pelos 1º e 2º RR. a favor da sua filha, a 3ª R., à data da doação, menor, registado pela apresentação (…), de 2014-09-15, do prédio urbano, composto por edifício de rés-do-chão e 1.º andar para habitação e logradouro, sito em Quinta da (…), (…), denominado, lote 98, freguesia (…), inscrito na respectiva matriz sob o artigo (…), descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal, sob o número (…). Peticionou ainda que seja ordenado à 3ª R. a restituição do supra referido bem, de modo a que a A. possa executá-lo no património dos RR. na medida do seu credito e bem assim praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei, devendo os RR. ser condenados a reconhecer o sobredito direito de restituição da A.

Alegou, em suma, que pelos 1º e 2º RR. foi doado à 3ª R., sua filha, o único imóvel que detinham livre de ónus de penhora por forma a salvaguardar o imóvel e impossibilitar a cobrança do crédito da A., constituído por montante ainda em dívida de empréstimo contraído pelos 1º e 2º RR. junto da A. Mais alegou que os RR., no próprio dia em que foi cancelada a penhora registada a favor da Fazenda Nacional, registaram a doação em causa a favor da sua filha, com constituição de reserva de uso e habitação a favor dos 1º e 2º RR., deliberadamente dissipando o seu património com vista a eximirem-se às responsabilidades que assumiram perante os credores, visto que nenhum dos dois 1º e 2º RR.. tem outros bens, à excepção de um veículo automóvel do ano de 2005 e do usufruto sobre o prédio supra identificado. Conclui, assim, pela procedência total da presente acção.

Os RR., devidamente citados para o efeito, apresentaram contestação, assumindo efectivamente que fizeram a doação acima referida, mas alegando que nunca pretenderam esconder a doação ou prejudicar os credores evitando a satisfação integral dos seus débitos, continuando a deter o direito de uso e habitação sobre o dito imóvel.

Concluem pela inexistência de qualquer acto que prejudique a A. e, consequentemente, pela improcedência total da presente acção. Invocaram, ainda a prescrição do direito da A., cuja improcedência foi apreciada e decidida em sede de audiência prévia, mantendo-se a regularidade da instância.

Em sede de audiência prévia declarou a A. aceitar a confissão por parte dos RR. quanto à transmissão do bem por doação, mais invocando que os RR. em momento algum alegam que a A. não é detentora do crédito ou que o crédito da A. não é anterior à transmissão, admitindo igualmente tais factos, assim como não indicam a existência de património bastante para fazer face aos créditos do A. concluindo, assim, pela verificação, neste momento, de todos os elementos necessários à prolação imediata de decisão final.

Não foram indicados temas de prova e foi determinado, desde logo, a notificação dos RR. a fim de, querendo, exercerem o contraditório (no que tange à prolação imediata de saneador sentença), não se tendo os mesmos pronunciado.

De seguida, pela Mma Juiz “a quo” foi proferido saneador-sentença, uma vez que já se mostravam carreados para os autos todos os elementos necessários à prolação de decisão final e, por via disso, julgou a presente acção procedente, por provada e, em consequência, declarou a ineficácia em relação à A. do acto de doação efectuado pelos 1º e 2º RR. a favor da sua filha, a 3ª R., registado pela apresentação (…), de 2014-09-15, do prédio urbano, composto por edifício de rés-do-chão e 1.º andar para habitação e logradouro, sito em Quinta da (…), (…), denominado, lote 98, freguesia (…), inscrito na respectiva matriz sob o artigo (…), descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal, sob o número (…). Determinou ainda à 3ª R. a restituição do supra referido bem, de modo a que a A. possa executá-lo no património dos RR., na medida do seu crédito e bem assim praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei para realização integral do seu crédito, condenando os RR a reconhecer o sobredito direito de restituição da A.

Inconformada com tal decisão dela apelou a 3ª R., tendo apresentado para o efeito as usas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões: I. O presente recurso, versa sobre os factos provados, em concreto pontos 11 e 12 e ponto 28.

  1. Foi decidido, por despacho saneador, dar como procedente o pedido formulado pela A.

  2. De acordo, com o ponto 11 dado como assente, corre o processo n.º 2588/13.7TBPTM no Juízo de Execução de Silves, Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca de Faro.

  3. Processo esse, que envolve os mesmos sujeitos processuais do presente processo e que visa recuperar dívida exequenda, por recurso obviamente a custa do património dos devedores.

  4. Repete-se processo de 2013, que corre termos em Silves, tendo a Autora conhecimento integral do património dos RR.

  5. A autora, em 2013, em virtude de incumprimento em contrato, colocou processo executivo, contra os RR. transmitentes.

  6. Tendo na sua posse um titulo certo, liquido e exigível, basta verificar que deu inclusive origem a um processo executivo, que ainda hoje não está finalizado.

  7. Titulo que permitia a autora, de requerer a penhora do imóvel, alvo de impugnação pauliana, IX. Não obstante tal facto, por inoperância ou inercia da autora, ou desinteresse no imóvel, não fez uso do seu direito.

  8. Por sua vez, em 2014, ocorre acto translactivo por doacção para a ora recorrente.

  9. Em 2019, é colocado acção de impugnação pauliana, ou seja, 6 anos depois da acção executiva, requerendo que tal direito lhe fosse procedente.

  10. É sabido, que para que a impugnação pauliana possa prevalecer, é preciso demonstrar que o acto tenha sido realizado com o fim de impedir a satisfação do direito do credor.

  11. Ora tal instituto não pode ser aceite, de animo leve, e quando a Autora, por desinteresse não acautelou o seu direito.

  12. Caso contrário, existiria repetição de processos em tribunais, sobre os mesmos pedidos e sobre o mesmo objeto de litígio.

  13. A autora, já que tinha na sua posse titulo executivo, há aproximadamente 6 anos, com conhecimento do património dos devedores.

  14. A autora, não pode 6 anos após a acção executiva, vir fazer uso de uma acção declarativa, quando a acção executiva preenchia a sua pretensão.

  15. Demonstrou ao longo do tempo, um total desinteresse no imóvel, alvo de impugnação.

  16. Ou seja, veio em 2019, veio fazer uso de um mecanismo declarativo, para um direito já tinha sido obtido executivamente.

  17. É deveras evidente, que a impugnação paulina aquando da sua entrada deveria improceder, quer por não preencher os requisitos da sua admissibilidade, quer pelos motivos acima identificados.

  18. O desinteresse no objecto da lide, inércia e inoperância da autora, não se pode posteriormente sobrepor um processo declarativo a um processo executivo, que lhe permitiu sempre satisfazer o seu crédito.

  19. Pelo exposto, deverá a presente sentença ser alterada, por erro de apreciação da prova, falta de clarividência da prova produzida, e todas das demais questões que o Tribunal “a quo” deveria apreciar, por forma a repor a descoberta da verdade material e, assim, fazer-se inteira e sã Justiça.

Pela A. foram apresentadas contra alegações de recurso, nas quais pugna pela manutenção da sentença recorrida.

Atenta a não complexidade da questão a dirimir foram dispensados os vistos aos Ex.mos Juízes Adjuntos.

Cumpre apreciar e decidir: Como se sabe, é pelas conclusões com que a recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2].

Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável à...

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