Acórdão nº 00432/15.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução21 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* I Relatório Águas (...), SA, devidamente identificada nos autos, vem intentar o presente Recurso Jurisdicional da decisão judicial proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que, em 27 de agosto de 2020, julgou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela absolutamente incompetente para a apreciação da presente ação “por preterição de tribunal arbitral” e, consequentemente, absolveu o Réu, aqui Recorrido, Município (...) da instância.

Em alegações, a Recorrente/Águas (...) formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 27/08/2020 (notificada à aqui Recorrente por notificação eletrónica elaborada e certificada em 02/09/2020), e que absolveu o Réu da instância, ao julgar procedente a alegada exceção de incompetência absoluta, por preterição do Tribunal Arbitral, decidindo: “Face ao que vem exposto, julga-se este tribunal incompetente para conhecer a presente ação, por preterição de tribunal arbitral, pelo que absolvo o Réu da instância, nos termos conjugados dos arts. 96.º, al. b), 576.º, n.º 2, e 577.º, al. a), do CPC, aplicáveis por remissão do art. 1.º do CPTA.”.

  1. Salvo o devido respeito, a decisão tomada pelo douto Tribunal a quo consubstancia-se num manifesto ERRO DE JULGAMENTO, porquanto: 3. O presente litígio, tal como fora articulado pela Autora, ora Recorrente, prende-se com a falta de pagamento por parte do Município Réu, ora Recorrido, de montantes faturados pela Sociedade Concessionária.

  2. Os montantes faturados são devidos porquanto o Município (...), na qualidade de utilizador originário, está contratualmente obrigado a pagar os valores mínimos fixados no contrato de concessão e nos contratos de fornecimento – tudo conforme alegado na PI e na Réplica.

  3. Ou seja, os valores mínimos aqui faturados são montantes devidos à Sociedade Concessionária pela prestação dos serviços públicos de abastecimento de água, apresentando-se como o “valor mínimo” estimado e contratado para a prestação daqueles mesmos serviços, sendo cobrados ao Município Utilizador quando este não atinge aquele valor mínimo contratado e enquanto equilíbrio económico-financeiro da concessão.

  4. Pelo que, apenas se poderá concluir que os valores mínimos faturados são o “preço mínimo” fixado e cobrado ao Município Utilizador pela prestação daqueles serviços de abastecimento de água que foram contratados, sempre que o Município, consuma um montante inferior ao que fora contratualmente fixado (i.e., quando a faturação do serviço não atinge os valores mínimos fixados).

  5. Motivo pelo qual a Recorrente, na qualidade de concessionária do Sistema de Abastecimento de Águas (...) de Portugal, tem o direito de faturar e cobrar os valores mínimos previstos no contrato de concessão ao Município Utilizador, ora Recorrido.

  6. Faturação e cobrança que resultam de uma simples operação de subsunção de uma situação de facto ao corpo normativo que enforma os contratos de fornecimento e o contrato de concessão, não sendo necessário proceder a qualquer interpretação do clausulado daqueles mesmos contratos – a sua cobrança resulta clara e evidente e em resultado de uma simples operação aritmética.

  7. Não sendo despiciendo reiterar que o Recorrido e o extinto Sistema, ao qual sucedeu a Recorrente em direitos e obrigações (Sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento de Trás-os-Montes e Alto Douro), celebraram contratos de fornecimento de água e de recolha de efluentes, conforme Docs. 2 junto à PI, que já previam, nos respetivos anexos, os valores mínimos a praticar pela Sociedade Concessionária.

  8. Motivo pelo qual, a presente ação administrativa de condenação, intentada pela Sociedade concessionária, é uma ação de cobrança de faturas (neste caso, faturas de valores mínimos garantidos) que foram por esta emitidas e que não foram pagas pelo Município (...); 11. Pelo que o presente litígio, tal como foi configurado, preenche a exceção prevista na cláusula 9.ª/3 do contrato de fornecimento outorgado entre as partes, uma vez que a presente contenda está relacionada com a falta de pagamento de faturação emitida pela Sociedade Concessionária e não com a interpretação/execução do contrato de concessão.

  9. Pois que, tendo em consideração a teoria da impressão do destinatário, consagrada no art.º 236º, n.º 1 do CC, e que tão bem foi relembrada pelo douto Tribunal a quo na sentença proferida, sempre se deverá concluir pelo seguinte: 12.1. Nos termos do n.º 3 das cláusulas 9.ª e 10.ª dos contratos celebrados, todas as questões relacionadas com interpretação e execução dos contratos serão submetidas ao Tribunal Arbitral; 12.2.

    Com exceção das que respeitem à faturação emitida pela Sociedade e ao seu pagamento ou falta dele – como é o caso dos presentes autos! 13.

    E não pode a defesa apresentada pelo Recorrido, em sede de Contestação, ser pressuposto bastante para a subsunção do presente litígio à convenção arbitragem, porquanto as questões que possam estar relacionadas com a interpretação e execução do contrato de concessão e/ou dos contratos de fornecimento, apenas são apresentadas enquanto “resposta” à cobrança judicial dos valores faturados pela Autora, ora Recorrente e apenas com o objetivo de obstarem ao pagamento dos concretos montantes aqui peticionados – não é o ora Recorrido, enquanto Município Utilizador, que se encontra a impugnar judicialmente o clausulado contratual, pois que este apenas levantou possíveis questões relacionadas com a interpretação/execução do contrato para obstar à pretensão da Autora.

  10. Tanto que, a defesa apresentada pelo Recorrido, apesar de estar relacionada com a execução do contrato (como sempre iria estar, pois que a própria faturação é matéria de execução do contrato!), não se consubstancia numa verdadeira impugnação das cláusulas do mesmo, porquanto o Recorrido limita-se a referir que não paga os montantes faturados: (1) por considerar que a aqui Recorrente incumpriu o contrato de concessão, por não se encontrarem concluídos os investimentos previstos para o Município; (2) por considerar que tal cláusula desvirtua o princípio da efetiva transferência de risco para a concessionária; e (3) por considerar que tais montantes não têm correspondência com o que se encontra fixado no contrato de fornecimento – ou seja, o Recorrido aceita o clausulado dos contratos celebrados, bem como o contrato de concessão para o qual aqueles contratos remetem (tanto que nunca os impugnou).

  11. Pelo que, a questão decidenda dos presentes autos prende-se, exclusivamente, com a faturação da Sociedade Concessionária, ora Recorrente, ao aqui Recorrido, que se recusa a pagar os valores emitidos e faturados, por considerar, grosso modo, que a Recorrente incumpre o contratado.

  12. Motivo pelo qual o douto Tribunal a quo sempre deveria ter julgado totalmente improcedente a exceção de incompetência absoluta arguida pelo Recorrido, porquanto é em relação à ação configurada pela Autora, ora Recorrente, mormente na sua exposição de facto e de direito extraída da PI, que a competência material do Tribunal deve ser aferida – Cfr. artigo 5.º do ETAF.

  13. Discordando-se da tese interpretativa daquele douto Tribunal, quando afirma que, tratando-se de competência absoluta relacionada com o compromisso arbitral, a fixação do objeto da ação deverá ter em consideração todos os articulados apresentados pelas partes (incluindo a contestação do Recorrido), não sendo de aplicar o artigo 5.º do ETAF (firmando tal interpretação nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 09.07.2015 (proc. n.º 1100/12.0TVPRT.G1) e de 08.03.2012 (proc. n.º 1387/11.5TBBCL-B.G1)).

  14. Salvo devido respeito, considera a Recorrente que aqueles Acórdãos citados não apoiam a interpretação que é levada a cabo pelo Tribunal a quo na sentença proferida, pois que aqueles Acórdãos...

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