Acórdão nº 0145/20.0BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução26 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A……………, identificada nos autos, não se podendo conformar com os doutos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14 de Janeiro de 2021, e de 25 de Março de 2021, os quais, respectivamente, lhe negaram totalmente provimento ao recurso jurisdicional que havia interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgara totalmente improcedente o recurso contencioso interposto nos termos do art.º 89.º-A, n.º 7 da Lei Geral Tributária (LGT) da decisão do Director Distrital de Finanças de Coimbra, adiante identificada, e lhe indeferiram os pedidos de declaração da nulidade e de reforma do primeiro acórdão, vem deles interpor Recurso de Revista para o Venerando Supremo Tribunal Administrativo (Secção de Contencioso Tributário), ao abrigo do disposto no art.º 285.º do Código de Procedimento e de Tribunais Administrativo (CPPT).

Alegou, tendo concluído:

  1. A recorrente interpõe o presente recurso excepcional de revista, ao abrigo do art.º 285.º do CPPT (na redacção da lei n.º 118/2019 de 17 de setembro), por considerar que os fundamentos que deixa invocados nas suas alegações, integram os dois pressupostos legais de admissibilidade desta espécie de recurso, por estarem em causa a apreciação de duas questões que, pela sua relevância têm uma importância jurídica e social fundamental e, ainda, por a admissão do recurso ser claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

  2. Na sua petição inicial do recurso contencioso a que aludem os n.ºs .ºs 7 e 8 do art.º 89.º-A, n.º 7 da LGT e 146.º-B do CPPT, a ora recorrente elegeu, apenas, como objecto do recurso e do seu pedido de anulação o acto de fixação/decisão de avaliação do rendimento colectável líquido do IRS relativo aos anos de 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015, nos montantes respectivos de €159.379,44, €178.084,26, €1.734,70, €1776,00 e € 7.087,32, de cuja prática pela AT fora notificado, pelo meio indicado no ponto 16 do probatório, ofício n.º 1250, de 19-02-2020, deixando isso bem precisado no alegado logo no inicio da petição inicial, no artigo 1.º do articulado e no pedido de anulação feito no final.

  3. Foi em relação a esse objecto do recurso que a ora recorrente alegou, entre outras causas de pedir, a da falta de fundamentação da fixação afrontada do rendimento colectável, traduzida no relatório dos serviços de fiscalização, entre o mais, pela contraditoriedade existente entre tais montantes de rendimentos e aqueles outros que, no mesmo relatório, foram indicados, a título de manifestações de fortuna, como incrementos patrimoniais sujeitos a tributação autónoma pela Categoria G para os mesmos anos em causa, dos montantes de 292.739,63€, 138.740,24€, 77.706,76€, 162.080,63€ e 211.436,55€, e a causa de pedir da caducidade do direito de fixação do rendimento colectável de IRS relativo aos anos de 2011, 2012 e 2013, por estar ultrapassado o prazo estabelecido nas disposições conjugadas dos n.ºs 1 e 5 do art.º 45.º da LGT relativamente à data de instauração do inquérito criminal (2/10/2018) em que os factos-objecto da investigação criminal se identificava com os factos tributários considerados na fixação contenciosamente recorrida.

  4. Quer a sentença recorrida para o tribunal superior do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 10-10-2020, quer o acórdão agora recorrido do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14 de Janeiro de 2021, que a confirmou, entenderam, erradamente, que o objecto do recurso contencioso em relação ao qual a recorrente formulara o pedido de anulação que se traduzia, tanto na anulação jurídica do acto (despacho do Director de Finanças de Coimbra) que fixou o rendimento colectável para os anos de 2011 a 2015, nos montantes que se mostram identificados na notificação a que alude o n.º 16 do probatório da sentença recorrida, como, também, na anulação das tributações autónomas, cuja matéria tributável foi, também, apurada por métodos indirectos, para os mesmos anos, nos montantes respectivos de € 292.739,63, € 138.740,24, € 195.984,92 e € 289.261,07, tributações essas defendidas no relatório da fiscalização tributária que mereceu a confirmação dos órgãos hierárquicos superiores aos da fiscalização tributária.

  5. A recorrente deduziu o recurso contencioso apenas relativamente à fixação da qual fora notificada (despacho do Director de Finanças de Coimbra), a que alude o ponto 16 do probatório, que procedeu à fixação do rendimento colectável para os anos de 2011 a 2015, nos montantes constantes daquela notificação.

  6. Tal é o sentido que emerge claramente, para qualquer destinatário normal, da alegação ou discurso inicial em que a recorrente se expressa na sua petição inicial: só a fixação do rendimento tributável relativo aos anos de 2011 a 2015, através de métodos indirectos, e nos montantes que são, aí, precisados, é que consta do teor verbal da notificação efectuada, a que alude o ponto 16 do probatório e cujo sentido incumbia à recorrente apreender, como sua destinatária, para efeitos de deduzir a defesa que entendesse dos seus direitos.

  7. Quer a sentença de 1.ª instância, quer o acórdão do TCA Norte, agora recorrido, que a confirmou, conhecem e decidem o recurso contencioso ultra petitum, incorrendo na nulidade do decidido relativamente às ditas tributações autónomas, acima referidas.

  8. Não tendo a recorrente pedido, na p. inicial, no exercício do seu poder dispositivo sobre o direito de acesso aos tribunais e sobre o âmbito a que cinge a defesa dos seus direitos, pronúncia do tribunal sobre a ilegalidade das ditas tributações autónomas que o relatório dos serviços de fiscalização considerou serem devidas, não tem o tribunal de 1.ª ou de 2.ª instância poder jurisdicional para conhecer dessa questão, sendo nula a decisão tomada fora dessa jurisdição.

  9. Face aos termos verbais da notificação efectuada pela AT, a que alude o ponto 16 do probatório, a recorrente não pode ser considerada notificada da existência e, muito menos, do teor de decisão de fixação/avaliação indirecta das ditas tributações autónomas, por banda do Director de Finanças de Coimbra, para os efeitos previstos nos n.ºs 6 a 8 do art.º 89.º-A da LGT e 146.º-B do CPPT, pelo que os actos consequentes que a pressuponham (caducidade do direito de recurso contencioso e acto consequente da liquidação do imposto) padecerão patentemente de ineficácia jurídica, a qual poderá ser sempre alegada quando a AT pretender fazer valer, coercivamente ou não, os direitos cuja fonte resida nessa tributação.

  10. A caducidade é um efeito jurídico extintivo que está previsto na LGT apenas relativamente ao direito de liquidação (art.º 45.º). Tal posição da LGT deve-se ao facto de, apenas, a mesma extinguir a obrigação de pagamento do imposto cujo título formal é constituído pelo acto de liquidação.

  11. Mas, daí, não se distrai que, nos regimes tributários em que a prática do acto de liquidação demande a prévia definição antecedente da matéria colectável sobre a qual ele haja de ser praticado, posterior e subsequentemente, esse acto de liquidação, não possa já ser alegada a caducidade do direito de fixação da matéria tributável, concretizada no respectivo acto-administrativo tributário, obviando, quando ocorra essa caducidade, assim à inutilidade da prática consequente de um acto de liquidação viciado de ilegalidade.

  12. Situando-se o estabelecido no n.º 5 do art.º 45.º da LGT no domínio de um direito subordinado, rigorosamente, aos princípios da legalidade tributária e da legalidade criminal, ambas de foro constitucional (cfr. art.ºs 103.º, n.º 2 e 29.º da CRP), não pode o preceito deixar de ser interpretado, tendo em conta as exigências que tais princípios constitucionais transportam, quais sejam os da certeza e da segurança jurídicas.

  13. O prolongamento do prazo de caducidade do direito de liquidação estabelecido no n.º 5 do art.º 45.º da LGT para as situações de “sempre que o direito de liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal….” prazo supõe, pelos seus termos verbais, axiologia e teleologia, que haja uma total identidade constitutiva, ou de natureza fáctico-jurídica, entre os factos pelos quais foi instaurado o inquérito criminal e os factos que relevam para a prática...

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