Acórdão nº 2268/20.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução20 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório COMISSÃO PARA ACOMPANHAMENTO DOS AUXILIARES DE JUSTIÇA, interpôs recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa de 21.01.2021 que, no processo de intimação para prestação de informações e passagem de certidões contra si instaurado por J...

, intimou a entidade requerida a emitir e a disponibilizar ao requerente certidão da acta da reunião do Conselho Consultivo da Comissão de Acompanhamento dos Auxiliares de Justiça, realizada em 17.09.2020, na parte atinente ao ponto 9 da ordem de trabalhos (“Assuntos inerentes a Agentes de Execução, designadamente a contingentação, as liquidações e outros), no prazo de 10 dias.

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: 1. Requereu o Requerente que a entidade requerida seja intimada a emitir a certidão da ata da reunião do Conselho Consultivo da Comissão de Acompanhamento dos Auxiliares de Justiça realizada em 17/09/2020.

  1. No entanto, a sentença vem a apreciar um pedido diferente, como resulta do objeto do litígio: saber se o requerente tem direito a exigir que a entidade requerida seja intimada a emitir e disponibilizar-lhe a certidão da ata da reunião do Conselho Consultivo (…) no prazo de 10 dias após aprovação da mesma.” 3. Para aí chegar, a decisão incorre em diversos vícios e/ou erros de julgamento ao a. Admitir um inadmissível novo articulado do Requerente b. Apreciar os pressupostos da alteração do pedido e da causa de pedir c. Decidir em violação os pressupostos legais da Intimação.

  2. A tramitação da Intimação consta do art. 107.º do CPTA, aí se prevendo apenas a existência de 2 articulados: o pedido inicial e a resposta.

  3. No entanto, o tribunal a quo aceitou um segundo articulado do Requerente, a que a Requerida se viu forçada a responder, articulado onde, e como em seguida se verá, aquele altera o pedido e causa de pedir.

  4. Em qualquer caso, e independentemente do conteúdo de tal requerimento, o mesmo traduz-se em ato inadmissível por lei e, por tanto, nulo. Ou seja, a decisão assenta num ato nulo, vício que se estende à mesma.

  5. Tal nulidade é de conhecimento oficioso, não estando sujeito a prazo de impugnação pelas partes, e preenche os requisitos previstos no art. 195.º do CPC, aplicável ex vi art. 1.º do CPTA.

  6. No requerimento inicial, o Requerente não intimou a Requerida a informá-lo sobre a existência da ata, como deveria ter feito. Nem sequer apurou previamente de tal existência. Partiu erradamente da sua existência e pediu a intimação da Requerida a certificar tal ato. Limitou-se, pois, a instaurar intimação para passagem de certidão de tal ata.

  7. Confrontado com a inexistência do documento a que dirigiu a intimação, viu-se o Requerente forçado a alterar o seu pedido: de passagem de certidão de ato inexistente, passou ao objeto da intimação a passagem de certidão de ato que viesse a ser proferido.

  8. O Requerente pretendia a emissão de uma certidão cuja emissão fora recusada – ainda que por omissão – da Requerida; agora pretende a emissão e certidão de um ato que ainda anão foi proferido, 10 dias após a sua existência.

  9. O efeito jurídico não só não é o mesmo, como a modificação do pedido sequer seria admissível, nos termos do arts. 265.º, n.º 2, do CPC, aplicável ao caso.

  10. Mas é essencialmente na causa de pedir que se encontra a alteração feita pelo Requerente.

  11. O Requerente alterou efetivamente o “facto jurídico onde sustenta a sua pretensão”, pois de um incumprimento de um dever – emitir a certidão de um ato existente – passa a um simples dever futuro e, naturalmente, não incumprido – emitir a certidão pretendida quando o ato a certificar existir.

  12. Por outro lado, ainda que o efeito pretendido pelo Requerente fosse o mesmo, como se afirma na decisão, mas não se aceita, não deixaria de existir alteração da causa de pedir, não admitida pelo art. 5.º do CPC.

  13. E tal alteração da causa de pedir é tanto mais relevante quanto da mesma resulta que não se verifica o principal pressuposto da intimação: o incumprimento da Requerida.

  14. Tais alterações do pedido e do pedido são inadmissíveis nestes autos, devido ao carácter urgente dos procedimentos cautelares e o seu formalismo processual célere, que não se compadece com o formalismo próprio de uma ação normal, não comportando, nem admitindo, por tal, articulado superveniente, nos termos consagrados no art. 588.º do CPC, nem ampliação ou aditamento do pedido ou da causa de pedir.

  15. Novamente incorre a decisão em nulidade, ao admitir modificações processuais que a lei não admite, assim violando o art. 588.º do CPC. Assim não se considerando, há erro na aplicação do direito, considerando que as alterações nos autos não correspondem a alterações do pedido e/ou causa de pedir, inadmissíveis no processo de Intimação.

  16. No novo pedido formulado pelo Requerente e com base no qual foi proferida a decisão em recurso, não há qualquer incumprimento da Administração quanto à passagem da certidão pretendida, base da Intimação instaurada – como não havia para o anterior pedido–, pois não havendo ainda ato, não há qualquer obrigação de o mesmo ser certificado.

  17. Como assente nos autos, não existe ainda o documento que o Requerente pretende que lhe seja facultado.

  18. Até ser assinada a ata, há apenas um rascunho, um esboço, ou apontamento, que não é um documento administrativo, nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 3.º da 4º da Lei n.º 46/2007, de 26 de agosto, pelo que não é obrigatória a sua certificação.

  19. Isto é, inexistindo ato, inexiste qualquer obrigação de certificação do mesmo, e assim tem sido decidido pela CADA.

  20. E isto é claramente aceite pela decisão, que reconhece a inexistência de obrigação de ser facultada a certidão de um esboço de ata.

  21. Inequivocamente resulta do art. 105.º do CPTA que a Intimação apenas pode ser instaurada e julgada procedente se houver: (i)Falta de satisfação do pedido de emissão da certidão; (ii) Indeferimento do pedido e (iii) Satisfação parcial do pedido.

  22. Ora, o comportamento da Requerida não se inscreve em nenhuma das alíneas, porque esta não estava obrigada à emissão de qualquer certidão, requerida para um ato não existente.

  23. Da mesma forma que a Intimação não se destina a apreciar qualquer decisão tomada, também não se destina a apreciar a omissão de resposta. Se a CAAJ se devia ou não ter pronunciado sobre o pedido do Requerente e ao abrigo de que princípios não é objeto da Intimação. Esta apenas se destina a apreciar um comportamento – incumprimento da obrigação de passar uma certidão - determinar que assim se não continue a proceder.

  24. Ao decidir para além do pedido, a sentença incorre na nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, pois conheceu questões de que não poderia ter tomado conhecimento.

  25. Em manifesta contradição com o reconhecimento da inexistência da obrigação de emissão da certidão e, logo, do não incumprimento da Requerida, a decisão passa a decidir aplicando o art. 610.º do CPC, no que manifestamente se afasta dos pressupostos legais da Intimação.

  26. Não estamos perante um caso de inexigilidade da obrigação, mas de falta de incumprimento pela Requerida, pressuposto legal para o deferimento da Intimação.

  27. Ao decidir como fez, ademais, o tribunal incorreu em nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, caindo na previsão do art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC.

  28. Assim não se considerando, há manifesto erro na aplicação do Direito, fazendo-se apelo a norma do CPC que não é aplicável ao caso, pois a Intimação é para incumprimentos já ocorridos e não para obrigações a constituir no futuro, como decorre do art. 610.º do CPC. Há, pois, violação do art. 105.º do CPTA.

    • O Recorrido nos autos apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da decisão recorrida e concluindo do seguinte modo: A. A decisão recorrida não merece qualquer censura, tendo decidido bem ao intimar a entidade requerida nos termos em que o fez.

    1. Ainda que, no limite, se pudesse considerar que o requerimento apresentado em 07.01.2021 pelo requerente é um “novo articulado”, a norma constante do art. 107.º do Cód. de Processo nos Tribunais Administrativos não tem o poder restritivo que a recorrente lhe pretende atribuir, não proibindo vicissitudes na tramitação processual dos processos de intimação sempre que compatíveis com a sua natureza urgente e célere.

    2. Ademais, do aludido requerimento não resulta qualquer modificação objectiva da instância, que se manteve estável no que diz respeito ao objecto do processo, à pretensão prático-jurídica do requerente (a intimação da entidade requerida para a passagem da certidão) e ao facto jurídico donde emerge a pretensão manifestada (o incumprimento da entidade requerida, que não se resume à mera não passagem de certidão).

    3. Não resulta igualmente dos autos estarmos perante uma decisão que tivesse excedido os poderes de cognição do Tribunal num processo deste âmbito, no qual se inclui necessariamente um juízo sobre os fundamentos que subjazem à não satisfação do pedido de informação não procedimental dirigido à entidade requerida, de forma a proferir uma decisão que, em articulação e obediência aos princípios jurídicos aplicáveis, deve ser a que melhor realize a justiça no caso sub judice, E. O que sucedeu nos presentes autos, não estando a decisão final maculada de qualquer vício atinente à contradição entre esta e os fundamentos ou, sequer, de qualquer erro de aplicação do Direito.

    4. De facto, no que respeita ao primeiro dos vícios apontados pela recorrente (da nulidade da decisão por inadmissível admissão de novo articulada), importa referir que, não obstante o art. 107.º do CPTA, fazer referência a apenas dois articulados, daí não resulta a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT