Acórdão nº 883/10.6BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO H…..

, (doravante Recorrente) com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a oposição ao processo de execução fiscal n.° ….. e apensos, inicialmente instaurado contra a sociedade devedora originária denominada de “N….., Lda” e contra si revertida, cuja quantia exequenda e acrescidos ascendem a €40.143,55.

A Recorrente, apresentou alegações tendo concluído da seguinte forma: “ A. Verifica-se erro de julgamento da matéria de facto, a qual deve ser reapreciada e alterada, porque constam do processo, elementos de prova que indiciam que certos factos não provados deveriam ter sido decididos como provados, e ainda porque o Tribunal a quo socorreu-se de prova que não deveria ter sido valorada face à patente contradição com a restante prova produzida.

  1. Em primeiro lugar, deveria ter sido dado como provado que RR….. era gerente da devedora originária, tendo em conta os testemunhos de F….., M….., P….., A….. e A….., os quais declararam que nunca presenciaram a Recorrente a exercer funções de gerência ou gestão, porque quem estava encarregue de tais funções era o Sr. R….. (pagamento de ordenados e gestão de relações laborais, gestão da facturação da sociedade e restantes questões financeiras e fiscais, contacto com fornecedores, clientes e bancos, negociação de contratos, sendo também o TOC da sociedade).

  2. Coerentemente, ficou provado que a R. prestou serviços desde 1997, na sociedade devedora originária, exercendo apenas as funções de criativa de imagem, repartindo as suas funções com outros técnicos que eram responsáveis pelo texto do trabalho a concretizar e efectuando a avaliação final do trabalho que iria ser apresentado ao cliente - cfr. factos provados identificados em 18., 19. e 20. da sentença recorrida.

  3. Além do mais, a não gerência de facto da Recorrente é corroborada pelo documento junto como número 6, onde consta que, por R….., A….. e F….., titulares do depósito a prazo nº ….., foi constituído um penhor, a favor do Banco Comercial Português, sobre o mencionado depósito, em garantia do cumprimento da obrigação de pagamento de dez milhões de escudos, proveniente da atribuição de financiamento sob a forma de prestação de uma garantia bancária à sociedade devedora originária.

  4. Deste modo, da análise da certidão comercial permanente, o meio idóneo para a prova de tal facto, bem como da prova produzida nos presentes autos, deveria ter sido dado como provado que R….. era gerente (de facto e de direito) da devedora originária.

  5. Em segundo lugar, deveria ter sido dado como provado que a Recorrente teve um completo alheamento da situação da empresa da qual era sócia, onde entre outros, exercia a sua actividade, sem culpa, por ser apenas gerente de direito e nunca de facto, bem como, deveria ter sido dado como provado a inexistência de culpa da Recorrente na insuficiência do património da devedora originária – considerando os testemunhos de F….., M….., P….., A….. e A…..

  6. Não representa contradição a R. ter afirmado que não exerceu de facto a gerência da sociedade e, simultaneamente, ter afirmado que teve necessidade de aceder à documentação da sociedade, porque tal necessidade da R. e dos outros colaboradores deveu-se a uma situação urgente, devido ao desaparecimento repentino de R….. do contexto da sociedade.

  7. Ora, a reversão de dívidas fiscais apenas é possível contra aqueles que tenham exercido a gerência de facto da sociedade devedora originária.

    I. A douta sentença é igualmente contraditória ao concluir que “não se provou que além das funções de diretora criativa, a Oponente participasse na gestão da empresa” e, simultaneamente, concluir pela improcedência da excepção de ilegitimidade substantiva da R.

  8. Ora, se não se provou que a R. participasse na gestão da empresa e se ficou demonstrado que a única pessoa com poderes representativos e de administração da sociedade devedora era o Sr. R….., o tribunal a quo nunca poderia ter concluído pela improcedência da excepção de ilegitimidade substantiva da R., ou concluído que a R. é responsável pela insuficiência de património da devedora originária.

  9. Assim, se não se provou que, além das funções de diretora criativa, a R. participasse na gestão da empresa, então, logicamente esta nunca poderá ser responsabilizada pela insuficiência no património da devedora originária, nos termos do artigo 24º, nº 1, alínea b) da LGT, existindo uma errónea aplicação do normativo mencionado.

    L. Padecendo a douta sentença de uma insanável contradição, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC, sendo nula, o que desde já se invoca.

  10. Em terceiro lugar, deveria ter sido dado como provado que a Recorrente não tinha conhecimento do valor dos cheques que, segundo a qual assinava “em branco” e a que fim se destinavam – conforme resulta dos depoimentos das testemunhas, nomeadamente, de A….. e P…...

  11. Em quarto lugar, nos termos do artigo 48.º, nº 1 da LGT, o prazo de prescrição do IVA de 2002, começou a correr em 1 de Janeiro de 2003, o prazo de prescrição do IVA de 2003 começou a correr em 1 de Janeiro de 2004, o prazo de prescrição do IVA de 2004 começou a correr em 1 de Janeiro de 2005, o prazo de prescrição do IVA de 2005 começou a correr em 1 de Janeiro de 2006 e o prazo de prescrição de 2006 começou a correr em 1 de Janeiro de 2007.

  12. Contudo, com a citação da reversão quer ao devedor originário, quer à R., ocorrida em 23/12/2009, interrompeu-se o prazo de prescrição (cfr. artigo 49º, nº 1 da LGT), sendo que, nos termos do artigo 49º, nº 3 da LGT, a interrupção tem lugar uma única vez, relativamente ao facto que se verificar em primeiro lugar.

  13. Não existe aplicação subsidiária do disposto no artigo 327º, nº 1 do CC, no presente caso considerando que a prescrição é uma matéria dos contribuintes, sujeita ao principio da legalidade, a garantia da prescrição tem de ser uma realidade alcançável para os contribuintes, não pode ser uma utopia legislativa Q. Consequentemente, a interrupção da prescrição decorrente da citação da R., por reversão, tem efeito instantâneo, inutilizando para a prescrição todo o tempo até então decorrido, iniciando-se a partir dessa data novo prazo, mas não o efeito duradouro de obstar a que o novo prazo comece a correr até ao termo do processo de execução fiscal.

  14. O reconhecimento do duplo efeito (instantâneo e duradouro) à interrupção da prescrição por tempo indeterminado decorrente da citação do executado afigura-se absurdo e inadmissível, violando de modo expresso e incontroverso, as garantias do contribuinte e os princípios da certeza e da segurança jurídica, ínsitos ao princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, pelo que, as mencionadas dívidas de IVA já se encontram prescritas.

    NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO QUE V. EXA. DOUTAMENTE SUPRIRÁ DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E EM CONSEQUÊNCIA SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, SENDO PROFERIDA DECISÃO QUE ABSOLVA A RECORRENTE DA REVERSÃO FISCAL, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.

    Contudo, V. Exas. farão, a habitual JUSTIÇA.” *** A Recorrida optou por não apresentar contra-alegações.

    *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

    *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

    *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Compulsados os autos, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos: 1. Entre 14/12/2004 e 12/01/2008, foram instaurados pelo Serviço de Finanças de Lisboa 8, contra a sociedade N….. LDA., pessoa coletiva n.° ….., os processos de execução fiscal n.° ….. e apensos, para cobrança coerciva de dívidas de IVA, dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 - cfr. fls. 1, 2, 145 a 154 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 2. As liquidações de IVA relativas ao ano de 2002, em causa nos PEF ….. e ….., tiveram como prazo voluntário de pagamento 10/07/2002 e 25/11/2004, respetivamente - cfr. fls. 2, 13 e 146 do Apenso; 3. A sociedade N….. LDA, foi constituída em 1997 e teve registada a sua atividade para efeitos fiscais desde 15/11/1997 até 21/01/2009 - cfr. fls. 5 e 8 do Apenso; 4. Desde a sua constituição, foram designados gerentes da sociedade N….. LDA., os seus três sócios, entre os quais o ora Oponente - cfr. fls. 5 e 6 do Apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 5. A sociedade N….. LDA. obrigava-se pela assinatura conjunta de dois gerentes - cfr. fls. 6 do Apenso; 6. Com data de 09/12/1997 foi elaborada a ata n.° 1 relativa a reunião da assembleia geral da sociedade N….. LDA., ora a fls. 24 e 25 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido. Ali se fez constar que os sócios "R….." a ora Oponente e "A….." renunciaram à gerência da sociedade N….. LDA., com efeitos a partir de novembro de 1997 e que «acordaram todos os sócios diligenciarem para que no mais breve espaço de tempo seja nomeado um gerente que teria que ser proposto e aprovada a sua nomeação pela assembleia geral da sociedade.» - (negrito nosso), cfr. fls. 24 e 25 dos autos; 7. Em 15/05/2006 foi registada na respetiva Conservatória do Registo Comercial, a cessação de funções de membro de órgão social da gerente A….., por renúncia em 10/11/1997 - cfr. fls. 6 do Apenso; 8. Desde 9/12/1997, até à data da extinção da sociedade não foram nomeados outros sócios, aprovados nos termos da decisão constante da ata referida no ponto anterior (cf. ata 1997); 9. Em 21/01/2009 foi cancelada a matrícula da sociedade N….. LDA. - cfr. fls. 6 do Apenso; 10. Em 16/10/2009, após consulta ao sistema informático da DGCI, foi elaborada informação pelo Serviço de Finanças de Lisboa 8, a fls. 4 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; foi proferido despacho para audição...

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