Acórdão nº 2215/16.0T8OER-A.L1.S3 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (1.ª embargante), BB (2.º embargante), CC (3.º embargante) e DD (4.ª embargante) deduziram, em 05/09/2016, embargos à execução contra eles movida pelo Banco BPI, S.A., Sociedade Aberta, baseada em sentença proferida em ação de impugnação pauliana, para pagamento da quantia de € 74.070,38 resultante de uma livrança avalizada pelo 2.º executado BB, no valor do capital de € 58.673,17, acrescido de juros de mora, à taxa de 4%, desde 22/02/ 2010, alegando, em resumo, que: .

O Banco exequente veio pedir o pagamento da quantia exequenda a quem a não deve, como são AA, CC e DD, os ora 1.ª, 3.º e 4.ª embargantes; .

A sentença dada à execução, proferida na referida ação de impugnação pauliana, não reconhece aqueles embargantes como devedores do exequente, não constituindo, por isso, título executivo contra estes, donde decorre a sua ilegitimidade passiva; .

Por outro lado, o exequente já instaurou também execução contra o ora 2.º embargante BB, que corre termos sob o n.º 13127/10..., para pagamento da mesma quantia, o que se traduz numa situação de litispendência, determinativa da absolvição da presente instância executiva.

.

A 1.ª executada/embargante AA, casada com o avalista e aqui executado BB sob o regime de comunhão de adquiridos, não é subscritora da mencionada livrança, nada devendo ao exequente; .

Além disso, nos termos da sentença exequenda, assiste àquela 1.ª embargante o direito ao usufruto sobre o imóvel, bem comum do casal, cuja doação feita, com reserva de usufruto, aos 3.º e 4.ª embargantes foi ali declarada ineficaz.

Concluíram os embargantes pela procedência dos embargos e pedem a consequente absolvição dos embargantes da instância executiva.

  1. O exequente apresentou contestação a sustentar que: .

    A sentença dada à execução reconhece o crédito do exequente no valor do capital de € 58.673,17, incorporado na livrança avalizada pelo executado BB, a que acrescem os juros de mora vencidos desde 22/02/2010 e vincendos até efetivo pagamento; .

    Com a presente execução, pretende o exequente efetivar o seu direito ao referido crédito mediante a venda ou adjudicação da nua propriedade do prédio que os 3.º e 4.ª executados CC e DD receberam em doação de seus pais, os 1.ª e 2.º executados/embargantes, e que foi declarada ineficaz através da sentença exequenda. .

    Assim, a sentença proferida na ação de impugnação pauliana constitui título executivo bastante para tal efeito, ou seja, para execução do bem em referência no próprio património dos adquirentes.

    .

    Não ocorre a invocada litispendência, já que, no processo n.º 13127/ 10..., não se logrou a penhora de qualquer património do ali executado e aqui 2.º executado/ embargante BB.

  2. Findos os articulados, foi proferido o saneador-sentença de fls. 61-65, datado de 24/04/2018, a considerar que a sentença exequenda não constitui título executivo suficiente contra qualquer dos executados, julgando procedentes os embargos e determinando a extinção da execução.

  3. Inconformado, o exequente/embargado interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do qual foi proferido o acórdão de fls. 85-93, de 14/02/2019, a julgar, por unanimidade, improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida com base nos mesmos fundamentos.

  4. Veio então o exequente pedir revista excecional, sob a invocação de contradição jurisprudencial entre o acórdão recorrido e o acórdão da Relação do Porto, de 23/02/2012, proferido no processo n.º 9272/07.9TBVNG-A.P1, constante de fls. 109/v.º -112, transitado em julgado em 08/03/2012 (fls. 129), tendo a revista sido admitida pela Formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do CPC, conforme acórdão de fls. 132-133, de 19/09/2019. 6.

    Na sequência disso, foi proferido por este Supremo Tribunal de Justiça o acórdão de fls. 141-152, de 29-10-2019, no qual se concluiu que, para a resolução da questão de direito em causa, importava, antes de mais, ao abrigo do artigo 682.º, n.º 2, do CPC, determinar a ampliação da factualidade relevante consubstanciada em factos dados como provados na sentença exequenda em ordem a apurar os termos em que o crédito exequendo foi ali dado como provado ou reconhecido e até como foi contextualizado no requerimento executivo. Em face disso, foi ordenada a baixa do processo ao Tribunal da Relação com vista a providenciar pela junção aos autos de certidões do requerimento executivo e da sentença exequenda e, nessa base, proceder à necessária ampliação de toda a factualidade relevante.

  5. Em cumprimento do assim determinado, foi proferido pela Relação o acórdão de fls. 209-220/v.º, de 17/12/2020, aprovado agora com um voto de vencido, em que, não obstante a ampliação da decisão de facto, se julgou de novo improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.

  6. Mais uma vez inconformado, vem o Banco exequente pedir revista, em primeira linha, em termos normais, dada a existência de um voto de vencido, mas ainda, subsidiariamente e à cautela, a título de revista excecional nos termos já anteriormente deduzidos.

  7. Para tanto, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: 1.ª - A exposição factual vertida no requerimento executivo, refere expressamente que: “Pela sentença de 02.03.2015, transitada em julgado, porque confirmada pelo acórdão da Relação de Lisboa, de 21.02.2016, foi declarada ineficaz em relação ao exequente, na medida da satisfação do seu crédito, sem prejuízo dos direitos que assistam à executada AA - a doação efetuada por essa e pelo executado BB a seus filhos, os executados DD e CC, tendo por objeto o prédio urbano descrito na … Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...05, da freguesia de ..., inscrito na respetiva matriz sob o artigo ….28 O crédito do exequente, tal como reconhecido na sentença em execução, é no valor de € 58.673,17 de capital, incorporado em livrança avalizada pelo executado BB, a tal capital acrescendo juros legais calculados à taxa supletiva vigorante de 4% ao ano, desde 22.02.2010 até efetiva e integral liquidação.

    Visa-se assim, pela presente execução, obter pagamento de tal crédito, pelo produto da venda, adjudicação ou remição do referido prédio.” 2.ª – O exequente pretende, materializando a decisão em que a mesma se fundou, obter pagamento do crédito que subjaz à impugnação pauliana exercitada, sentenciada no título que se apresentou à execução, exclusivamente, através do produto da venda, adjudicação ou remição do prédio objeto da doação impugnada com sucesso.

    1. - No caso, o exequente demandou na execução aqueles contra quem foi sentenciada a impugnação pauliana em causa – como partes legítimas para tornar efetiva a decisão em apreço, e essa poder produzir o seu efeito útil normal, cf. art.º 33.º, n.º 2, do CPC.

    2. – O crédito exequendo sobre o devedor BB é pressuposto, expressamente reconhecido na sentença em causa, para que possa ter lugar a execução sentenciada, nos termos do art.º 616.º, n.º 1, do CC; 5.ª - A medida do interesse do exequente, no caso, é o pagamento do crédito por referência ao qual foram verificados os pressupostos da impugnação pauliana e, em direta decorrência da verificação desses, declarada procedente essa mesma impugnação.

    3. - A sentença dada à execução constitui título executivo e funda-se no reconhecimento do crédito do exequente sobre o executado BB, que emerge de aval aposto por esse em livrança no valor de € 58.673,17, subscrita pela Sociedade de Urbanização e Construção Quinta Nova, Ld.ª, e vencida em 22/02/2010, 7.ª - Crédito esse que, à data da instauração e da sentença da impugnação pauliana, já havia sido título oferecido à execução no Proc. n.º 13127/10...., contra aqueles obrigados cambiários e outro, conforme a matéria dada por provada, sob os n.ºs 6, 7, 8, 22, 23, 24 e 25. 8.ª - Tudo reforçado com a ampliação e certificação da matéria de facto que o acórdão recorrido e as anteriores decisões das instâncias superiores nestes autos incorporaram nos autos.

    4. - Constando daquela sentença expressamente que, à data da instauração e da sentença da impugnação pauliana, já havia o crédito exequendo sido oferecido à execução no Proc. nº 13127/10.... – factualidade confirmada pelos próprios embargantes em 13.º da petição dos presentes embargos, e ora dada como provada, pelo acórdão recorrido -, não é sofismável a existência e exigibilidade desse crédito, nem a sentença dada à execução é (era) omissa ou ambígua sobre esse aspeto.

    5. - Esse crédito emerge de título, com força executiva própria, perfeitamente identificado e mencionado na sentença da impugnação pauliana (e como está agora certificado e provado nestes autos) – e é de valor certo, está vencido em data certa, é exigível e está executado judicialmente (como já estava à data da instauração da ação pauliana e da sentença que a declarou procedente).

    6. – O valor da quantia exequenda dos autos principais, e sua atualização, decorre de um simples cálculo aritmético –, sendo aquele valor já certo, determinado e titulado, à data da prolação da sentença que julgou procedente a ação de impugnação pauliana.

    7. - Foi para reconstituir a garantia patrimonial desse crédito que foi interposta, e que foi declarada procedente a ação de impugnação pauliana cuja sentença aqui se executa.

    8. - Essa decisão permite ao credor executar, no património dos obrigados (que são os executados DD e CC), com vista ao pagamento daquele crédito cuja garantia patrimonial fora prejudicada pela doação impugnada, o imóvel objeto dessa mesma doação.

    9. - É essa execução – a do imóvel doado pelos executados pais aos executados filhos – que se promove nos autos principais, tendo esta execução esse exclusivo e linear objeto, tal como foi expressamente declarado no requerimento executivo inicial e decorre claramente do teor da sentença exequenda.

    10. - Não há qualquer outra sede onde seja possível a execução autónoma do decidido na ação de impugnação pauliana: os donatários não são parte na execução pendente contra o doador...

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