Acórdão nº 029/19.5BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. O A……….., Procurador da República, identificado nos autos vem, ao abrigo dos arts. 33.º do Estatuto do Ministério Público, 24.º, n.º 1, al. a) ix) do ETAF e 37.º e ss. do CPTA, intentar ação administrativa de impugnação da deliberação da Secção Permanente do Conselho Superior do Ministério Público, proferida em 12/11/2018, e das deliberações do Plenário do Conselho, datadas de 20/11/2018 e de 18/12/2018, todas proferidas no âmbito de procedimento de recrutamento de inspetores do Ministério Público.

  2. Para tanto alega que resulta dos atos impugnados não ter sido selecionado como inspetor, por ter sido preterido por outra magistrada com menos antiguidade, padecendo as referidas deliberações dos vícios de falta de fundamentação e divulgação e concretização prévia dos métodos de seleção, densificação dos parâmetros de avaliação, pontuação e avaliação objetiva e comparativa do mérito dos candidatos, por forma a serem classificados a final por avaliação numérica criando as condições para o afastar do provimento quando o CSMP já conhecia ou poderia conhecer os currículos apresentados por todos os candidatos, impedindo a isenção e permitindo que a Procuradora da República provida em terceiro lugar pudesse sobrelevar pelo seu currículo a maior antiguidade do A..

    E que, dessa forma, foram também ofendidos os princípios da imparcialidade, transparência, publicidade e justiça assim como o direito ao procedimento de recrutamento justo, os princípios da boa-fé, da proteção da confiança, da igualdade no acesso ao exercício de funções públicas e do princípio do mérito, para além da falta de fundamentação.

    O que implica a sua nulidade por ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, a que alude o artigo 161.º, n.º 2, alínea d) do CPA, ou pelo menos anulabilidade por violação da lei.

  3. O CSMP contesta referindo que o procedimento a que respeita a presente ação é um concurso interno de acesso limitado para provimento de três vagas da categoria de inspetor para o Ministério Público.

    E que foram respeitadas as regras e princípios relativos à abertura do concurso, com discriminação e detalhe dos critérios de seleção dos candidatos, como é exigível, e nomeadamente a prévia definição dos critérios de seleção e de graduação.

    Conclui que não ocorreu qualquer ilegalidade e não houve definição pelo CSMP de qualquer critério novo posteriormente ao aviso para avaliação dos candidatos, que se limitou à ponderação dos fatores enunciados, tendo todo o sistema de avaliação ou de classificação final sido definido em momento em que a referida entidade ainda não tinha possibilidade de conhecer os processos de candidatura e respetivos elementos pelo que não foram ofendidos os princípios da transparência, publicidade e igualdade.

    Na verdade, os parâmetros e critérios de ponderação utilizados reconduziram-se a uma mera avaliação curricular, o que é suficiente, atendendo à natureza das funções a desempenhar, não se podendo traduzir tal avaliação numa tarefa automática de recondução dos atributos dos concorrentes a uma pontuação prevista para os mesmos no modelo de avaliação.

    E que a Administração Pública, apesar de exercer um poder vinculado, tem liberdade de escolha dos métodos, critérios e fórmula avaliativa, de entre várias opções possíveis e com articulação entre si dos métodos de seleção legalmente previstos, podendo a Administração determinar os critérios e fatores que densifiquem os métodos de seleção a utilizar e a ponderação com que cada um seja tomado ou na classificação dos candidatos (Ana Neves, Relação Jurídica de Emprego Público, Coimbra Editora, Coimbra, 1999, págs. 164 e 165).

    Conclui que a apreciação efetuada pela Secção Permanente do CSMP e respetiva deliberação é suficientemente explícita, assim como as deliberações do Plenário ora impugnadas, usando um critério adequado, não envolvendo qualquer tratamento de privilégio, injusto ou desigualitário, ofensivo dos princípios e comandos insertos nos preceitos invocados.

    Pelo que improcede a ação.

  4. Foi proferido despacho saneador tendo o A. vindo concluir as suas alegações da seguinte forma: “1) O A. (que esteve em comissão de serviço na Polícia judiciária, chefiando a divisão ……. do País) foi preterido no processo de recrutamento e escolha porque alegadamente não teria tanta (melhor, tão próxima no tempo…) experiência quanto a contrainteressada B……… sendo que, porém, tinha e tem mais antiguidade do que esta, quando os critérios deste recrutamento, que não foram densificados e não beneficiaram de qualquer concretização do seu peso relativo eventualmente decorrentes dessa densificação, eram os constantes do art. 132.º do anterior EMP, valendo todos o mesmo de acordo com a abertura do concurso; 2) O recrutamento de que se trata é, apesar da liberdade que aquele normativo encerra, vinculado pela principiologia geral e especial, de natureza constitucional e procedimental, relativa ao recrutamento e escolha de quem exerce funções para o Estado Português; aliás, para além das referências singelas de que se trata de uma escolha e procedimento interno e simples nada é dito nas alegações sobre a aplicabilidade deste bloco normativo, atrevendo-nos nós a dizer que o Conselho concordará mesmo (e bem!) com a sobredita aplicabilidade da principiologia à natureza do procedimento em causa.

    3) Qualquer interpretação do estatuído no art. 132.º do anterior Estatuto do Ministério Público que permita escolhas deste jaez genérico e abstrato (aliás é o próprio Conselho que refere essa abstração, quase em penitência, aquando da aclaração que fez ao ato impugnado) sem densificação dos critérios legais com referência a menções de avaliação dedicadas aos candidatos, sejam estas de natureza qualitativa ou quantitativa, por forma a objetivamente distinguir, ordenar e graduar os candidatos de per se e de acordo com o seu mérito e, ademais, assim se permitindo que a escolha concreta (a decisão impugnada) seja feita em violação do critério (referimo-nos à singela referência à mitigação aludida quer no ato quer na “aclaração”, quando antes, na abertura do concurso, se dizia que todos os critérios valem o mesmo) por força de uma densificação só feita aquando da escolha (a desconsideração da experiência do A. e a atribuição de maior força à experiência comum da candidata B……….) e não antes de se saber quem são os concorrentes, o torna irrefragavelmente inconstitucional por violação dos sobreditos direitos e princípios referenciados no texto supra.

    4) Sofrendo por estes motivos sempre os atos impugnados, considerando o que de facto vai dito na conclusão antecedente, de vício de violação de lei agravada, a gerar nulidade, por violação dos arts. 2.º, 47.º, n.º 2.º, 266.º, n.º 2 todos CRP e 6.º e 10.º do CPA – cfr. art. 161.º n.º 2, als. d) e g) do CPA.

    5) Não temos qualquer dúvida assim em afirmar que os atos, aos olhos de qualquer juiz do tribunal administrativo, quanto mais aos olhos deste Alto Tribunal, não se podem manter na ordem jurídica.

    6) Quanto à circunstância de o A. não ter atacado os critérios, adiantada nas alegações, o seu desacerto é ostensivo, salvo sempre o devido respeito, porquanto não é singelamente dos critérios legais que o A. se queixa é da sua falta de densificação e depois e concordantemente, queixa-se da não atribuição de um peso relativo entre os mesmos e de uma sua aplicação desconforme à lei! 7) Ou os critérios (por forma a poder-se sustentar uma comparação transparente) são identificados na abertura do concurso tornando a comparação que se empreenderá de juízo claro, objetivo e compreensível (para alegar sem referência à principiologia), ou terá que sê-lo depois, mas antes de se conhecerem os candidatos, como qualquer juiz sabe; tertium non datur! 8) Quanto à classificação de serviço como critério, a qual assim, como sucedeu, não pode ser requisito de admissão e simultaneamente critério de avaliação, nada, uma vez mais, foi densificado a este respeito, necessidade que se impunha até porque existem situações de facto em que não existe classificação, 9) sendo assim que saem novamente violados, para além do art. 132.º, n.º 1 do EMP, o direito ao procedimento de recrutamento justo e o princípio do mérito, ínsitos ao art. 47.º, n.º 2 da CRP, impondo a declaração de nulidade dos atos por afronta ao direito fundamental aí constante (cfr. art. 161.º, n.º 2, al. d) do CPA) ou, no mínimo, a respectiva anulação por violação de lei.

    10) Quanto à experiência, temos, em primeiro lugar, que quando se diz no terceiro ato impugnado claramente que o A. não pode ser selecionado para Inspetor do Ministério Público, tal só pode querer dizer que, afinal de contas, estamos face a um requisito de admissão a concurso.

    11) Ora, para além de se violar o princípio da divulgação atempada e dos demais princípios já repetidos e dos quais aquele emerge, padecem os atos do vício de ilegalidade agravada: é que este requisito de que não pode ser nomeado quem não esteja a exercer concretamente funções de magistrado, não consta da lei (art. 132.º, n.º 1 do EMMP) e comporta uma restrição ao direito do art. 47.º, n.º 2 da CRP, violando a reserva de lei restritiva, nos termos do art. 18.º, n.º 3 da Lei Fundamental, aplicável por estarmos face a um direito, liberdade e garantia (art. 17.º).

    12) Aliás, os atos ao sobrelevar a experiência concreta das atividades correntes do Ministério Público desvalorizando (mal) a vastíssima experiência do A., que, recorde-se, só concorreu na convicção legítima de que esse seu tempo de serviço nunca funcionaria em seu desfavor (daí também a importância de divulgar critérios claros e objetivos quando se abre concurso ou de posteriormente os densificar evitando surpresas), sofre de nova violação de lei, que conduz inexoravelmente à anulação das decisões impugnadas pois que o critério (experiência adequada) e a sua aplicação não poderiam jamais afrontar, ou ter-se-iam no mínimo de coordenar, mormente nos termos das conclusões seguintes, com o estatuído no art. 140.º n.º 5 do...

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