Acórdão nº 17009/18.0T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução06 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, instaurou acção declarativa com processo comum contra PARTNERS2U SCI – Sociedade Consultoria ao Investimento Lda, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe uma indemnização pelos prejuízos a determinar em sede de julgamento, em valor não inferior a € 205.579,00, acrescido de juros legais e de um valor a título de lucros cessantes calculados a uma taxa de juro não inferior a 2% ao ano.

Alegou para tanto e em síntese, ter celebrado com a Ré um contrato de consultadoria para investimento que não foi cumprido. Em primeiro lugar porque nunca teve acesso a uma plataforma, depois porque os investimentos propostos e por si efectuados não eram adequados ao seu perfil de investidor. Por fim, porque a alocação de activos era desajustada para esse mesmo perfil, seja pela alocação de activos e pela natureza dos mesmos. E, por fim, porque quando a cotação de um desses activos desceu exponencialmente não foi tempestivamente avisado e por causa disso perdeu a quantia peticionada.

A Ré contestou por impugnação, pedindo a sua absolvição do pedido.

Tramitados os autos, e realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Inconformado, apelou o Autor para o Tribunal da Relação ....., mas sem sucesso, pois que aquele Tribunal confirmou inteiramente a sentença absolutória da Ré.

Interpôs então revista excepcional, que foi admitida pela Formação a que alude o nº 3 do art. 672º do CPC.

O Recorrente remata a sua alegação recursiva com as seguintes conclusões: O presente recurso de revista excepcional deve ser admitido por estarem causa questões cuja apreciação pelo Supremo Tribunal de Justiça são claramente necessárias para uma melhor aplicação do Direito dos Valores Mobiliários, a saber: i) o reconhecimento dentre os diversos deveres dos intermediários financeiros, dos diversos deveres de informação, distinguindo os deveres de informação periódicos de outros deveres de informação, de natureza pontual ou imediata, em cumprimento dos deveres que decorrem dos princípios e regras de conduta que vinculam a actividade da intermediação financeira, em particular, o dever de actuação como (elevada) diligência e de protecção dos legítimos interesses dos clientes, entreoutros, e dodever de informação sobre alterações significativas quanto aos instrumentos financeiros objecto do investimento – cfr. o disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 304.º e no n.º 4 do artigo 312.º-B do CVM, na redacção anterior à transposição da DMIF II.

1.1. A relevância jurídica da adequada interpretação desse dever de informação sobre alterações significativas é essencial para aferir da existência de ilicitude para efeito da responsabilidade civil do intermediário financeiro perante o cliente-investidor, devendo as mencionadas normas jurídicas ser interpretadas e aplicadas consoante a natureza do serviço de investimento em instrumentos financeiros em concreto, sendo que na prestação do serviço de consultoria por uma sociedade de consultoria para investimento, qualificada como intermediário financeiro, in casu, a Recorrida-Recorrida: i) o dever resulta agravado, dado a consultoria constituir o único serviço (nuclear) da atividade da sociedade, e ii) mais agravado no caso de o serviço de consultoria não ser prestado de modo isolado, descontinuado, mas numa base continuada com explicitação de uma obrigação de acompanhamento, iii) obrigação de acompanhamento que não é cumprida pela prestação de uma informação através de um relatório ou extracto mensal que replica as informações sobre a quantidade e cotação dos instrumentos financeiros do cliente-investidor que lhe é prestada pelo intermediário financeiro que presta a esse cliente-investidor o serviço de registo e depósito de instrumentos e a quem são dirigidas pelo cliente-investidor as ordens de transacção por si geradas com base na consultoria prestada.

  1. Consequentemente, não é conforme ao Direito dos Valores Mobiliários, em particular, às normas que conformam a intermediação financeira – cfr. artigos 289.º e segs. do CVM -, a interpretação realizada pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação ....., confirmando a douta Sentença da 1.ª instância, segundo a qual a Recorrida, sociedade de consultoria para investimento, cumpriu os seus deveres de informação perante o Recorrente, quanto ao dever de informação das alterações abruptas de descida, subida e descida de cotações de várias das suas obrigações (adquiridas pelo Recorrente em execução de conselho da Recorrida) ter ficado cumprido com o envio de um extracto mensal que, como dado como provado, apenas informava o Recorrente da cotação das obrigações numa dada data, não reflectindo as ditas variações, não refletindo a elevada volatilidade ocorrida durante operíodo aque oditaextracto periódico se referia, nãotendo permitido ao Recorrente tomar qualquer decisão de desinvestimento, limitando as perdas que veio a sofrer.

    2.1 Da boa interpretação e aplicação dos deveres dos intermediários financeiros ao caso concreto, em particular, o dever de os intermediários financeiros orientarem a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado – cfr. o n.º 1 do artigo 304.º do CVM, na redação pré-transposição da DMIF II -, o dever de os intermediários financeiros observarem os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência – cfr. o n.º 2 do artigo 304.º do CVM na redação pré-transposição da DMIF II -, bem como o dever (expresso) quanto ao dever de informação no caso de alteração significativa na informação anteriormente prestada sobre os instrumentos financeiros, estabelecido no n.º 4 artigo 312.º-B (quanto ao momento da prestação da informação), deve conduzir à conclusão da violação grave do dever de informação que incumbia à Recorrida e que foi geradora dos prejuízos sofridos pelo Recorrente, devendo aquela ser condenada no pagamento do pedido de indemnização deduzido pelo Recorrente.

    (…) Deve ser julgado do procedente o pedido deduzido pelo Autor e Recorrente na sua petição inicial e cujo provimento de lhe negado pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação ......

    Contra alegou a Recorrida pugnando pela não admissão da revista excepcional e se assim se assim não entender pela improcedência do recurso.

    Na decisão que admitiu a revista excepcional, ponderou a Formação: “(…).

    Considerando que é questionado o modo como foi integrado o dever de informação no âmbito de um contrato outorgado entre as partes, não pode ignorar-se que se encontram pendentes de decisão diversos recursos extraordinários para uniformização de jurisprudência que, embora de contornos não inteiramente coincidentes, giram em torno dos pressupostos da responsabilidade civil do intermediário financeiro, mais concretamente sobre o dever de informação, para além do nexo de causalidade entre a atuação do intermediário e os resultados negativos do investimento realizado em produtos financeiros.

    No caso, tratar-se-á de um contrato de consultoria para investimento financeiro, mas em que também se colocam questões de semelhante índole em torno do conteúdo e do cumprimento do dever de informação, o que justifica uma intervenção deste Supremo Tribunal de Justiça.

    Com efeito, pese embora o interesse particular do A. em aceder ao terceiro grau de jurisdição, não deixa de ser visível um...

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