Acórdão nº 0321/19.9BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | PAULO ANTUNES |
Data da Resolução | 12 de Maio de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I. Relatório I.1. A…………….., na qualidade de ex-sócia da sociedade B……….. LDA., melhor identificadas nos autos, vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, exarada em 30/06/2020, que julgou improcedente a oposição deduzida contra à execução fiscal n.º 1333201901002210, referente ao pagamento da quantia de € 192.485,98, relativa a IVA e juros compensatórios dos períodos 2014 03T, 06T, 09T e 12T, juros de mora e custas.
I.2.
Apresentou alegações que terminou com o seguinte quadro conclusivo:
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A ora recorrente discorda da douta sentença recorrida, entendendo que, face ao direito aplicável, incorreu a M.ma Juíza “a quo” em errónea interpretação e aplicação do Direito.
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Estando a sociedade notificanda extinta à data da emissão das demonstrações das liquidações e demonstrações de acerto de contas, as notificações destes atos deveriam ter sido emitidas em nome da ex-sócia e não dirigidas à sociedade extinta.
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A extinção do registo de pessoa coletiva determina o fim da personalidade jurídica (artigo 5º do CSC a contrario) e, consequentemente, o fim da personalidade tributária.
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Nos termos do artigo 16º, n.º 3 da LGT, os direitos e os deveres das entidades sem personalidade jurídica são exercidos pelos seus representantes, ao caso a ex-sócia da sociedade extinta, aqui recorrente.
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Sucede que, tal como consta dos autos, as demonstrações das liquidações e de acertos de contas foram emitidas em nome da sociedade dissolvida e não em nome da aqui recorrente, daí que não pode a mesma considerar-se notificada dos atos tributários.
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Por outro lado, a instauração da execução contra a executada “B………, Lda.”, e não contra a aqui recorrente, reconduz-se à cobrança coerciva contra quem não tem legitimidade para ser executada, uma vez que se extinguiu a personalidade jurídica da sociedade aquando do cancelamento da matrícula, pelo que, a sociedade dissolvida e cancelada que foi citada para a execução sempre terá de ser considerada parte ilegítima.
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A douta sentença recorrida padece de errónea interpretação da lei, ao determinar que a dívida é exigível à aqui recorrente, com fundamento no artigo 147º, n.º 2 do Código das Sociedade Comerciais, e com fundamento numa interpretação extensiva do disposto no n.º 3 do artigo 155º do CPPT.
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Em primeiro lugar, porque não consta dos factos provados que as demonstrações das liquidações de imposto tenham sido notificadas à ora recorrente ao abrigo de tal normativo, nem consta que a citação para a execução fiscal se encontra fundamentada no n.º 2 do artigo 147º do CSC.
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Em segundo lugar, a douta sentença recorrida não pode determinar a improcedência do pedido alicerçada numa norma legal que não consta dos atos da AT para determinar a exigibilidade da dívida à aqui recorrente.
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Ademais, na douta sentença recorrida nada consta quanto à partilha, de que forma foi efetuada, se houve bens partilhados ou adjudicados à aqui recorrente e qual o seu valor, pelo que a omissão desta factualidade não permite determinar a responsabilidade tributária solidária e ilimitada da aqui recorrente.
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Acresce que, imputar à aqui recorrente a responsabilidade da dívida apurada pela AT após a extinção da sociedade, com base no n.º 2 do artigo 147º do CSC, no sentido de estabelecer uma responsabilidade tributária solidária e ilimitada da ex-sócia é inconstitucional, material e organicamente, por violação do princípio da igualdade e por violação do princípio da legalidade tributária na vertente de reserva de lei e da tipicidade, nos termos do disposto nos artigos 103º n.º 2 e 165º, n.º 1 alínea i) da Constituição da República Portuguesa.
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A douta sentença recorrida incorreu ainda em erro de julgamento quanto à questão da perfeição e eficácia das notificação dos atos tributários, na medida em que entendeu como recebidas as notificações das liquidações de imposto e acerto de contas, com base no facto de as mesmas terem sido depositadas no recetáculo postal do destinatário, através de cartas enviadas através da modalidade de envio postal o “Registo Simples”.
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É entendimento jurisprudencial do STA que a expressão “carta registada” do n.º 3 do artigo 38º do CPPT não tem correspondência com a modalidade de “registo simples” disponibilizada pelos serviços postais dos CTT – Correios de Portugal, S.A., e a interpretação desta norma noutro sentido “afectaria a garantia da protecção jurisdicional eficaz do destinatário, em violação das exigências decorrentes do nº 3 do art. 268º da CRP e do princípio constitucional da proibição da indefesa, ínsito no art. 20º em conjugação com o nº 4 do art. 268º da CRP.” O) No caso dos autos, as notificações das liquidações e acertos de conta não foram efetuadas por carta registada, como prescreve o n.º 3 do art.º 38º do CPPT, pelo que a douta sentença recorrida incorreu em errado de julgamento da matéria de Direito, ao considerar como válidas e eficazes as notificações das liquidações por carta enviada através da modalidade “registo simples” dos CTT, porquanto a AT não pode beneficiar da presunção da perfeição da notificação porquanto a esta modalidade de envio não corresponder um efetivo registo postal registado.
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A douta sentença recorrida não pode manter-se na ordem jurídica, por errónea aplicação e interpretação do disposto nos artigos 16º, n.º 3 da LGT e 147º n.º 2 do CSC, norma esta que padece de inconstitucionalidade material e orgânica, por violar o princípio da igualdade e por não ter sido precedida de autorização legislativa, e ainda por erro de julgamento na aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 38º do CPPT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, julgando procedente a oposição.
I.3.
Não houve contra-alegações.
I.4.
Recebido o recurso interposto, foram os autos remetidos ao STA, no qual o exm.º magistrado do Ministério Público (MP) emitiu o parecer que a seguir se reproduz: “1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Leiria que julgou improcedente a Oposição deduzida contra a execução instaurada para cobrança da quantia em dívida no montante de €192.485,98 euros, relativa a IVA e juros compensatórios do ano de 2014.
A Recorrente insurge-se contra o assim decidido por considerar que o tribunal” a quo” incorreu em “errónea interpretação e aplicação do direito”.
Entende a Recorrente que tendo as liquidações sido emitidas em nome da sociedade já extinta “não pode considerar-se a mesma notificada dos atos tributários” e por outro lado aquela sociedade é parte ilegítima na ação, por falta de personalidade jurídica e tributária.
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