Acórdão nº 02197/15.6BEALM de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | PAULO ANTUNES |
Data da Resolução | 12 de Maio de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I. Relatório.
I.1.
A………… – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado, melhor identificada nos autos, vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, exarada em 22/11/2019, que julgou improcedente a impugnação que intentara do acto tributário de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), relativo ao ano de 2012, no valor de € 149.976, 25.
I.2.
Formulou alegações que terminou com o seguinte quadro conclusivo: A.
A Sentença recorrida deverá ser objecto de revogação em virtude de um manifesto erro de julgamento; B.
Com efeito, no âmbito da impugnação judicial, o Recorrente imputou diversos vícios à liquidação, indicando como questões a decidir: i. A falta de fundamentação da liquidação, porquanto, em nenhum momento, lhe foram dadas a conhecer as razões de facto e de Direito pelo qual foi fixado o coeficiente de localização utilizado para determinação do VPT dos prédios, pelo que a notificação, aquando da liquidação de IMI impugnada nos autos, da motivação de facto e de Direito por que o coeficiente de localização e, consequentemente, o VPT, foi fixado naquele concreto valor, seria indispensável naquele momento (i.e. notificação da liquidação); ii. A ilegalidade do regime de avaliação, em virtude da publicação dos coeficientes de localização em local diverso do Diário da República e por acto legislativo que não o adequado, resultando na violação dos princípios constitucionais de legalidade, tipicidade e da reserva de Lei formal; e, subsidiariamente, iii. O excesso da matéria colectável apurada tendo em conta o estado dos terrenos em questão e o valor de aquisição dos mesmos, manifestamente inferior ao VPT apurado pela Autoridade Tributária.
C.
Estas causas de pedir encontram-se correctamente delimitadas pela Douta Sentença recorrida, quando, no ponto I – Relatório – menciona que o ora Recorrente “Defende, em síntese, que se verifica: - A falta de fundamentação da liquidação, pela absoluta ausência de justificação do coeficiente de localização de 1,1 aplicado; - A ilegalidade do regime de avaliação porquanto os coeficientes concretamente utilizados não estão fixados na lei, mas apenas em portaria, pelo que a definição do valor patrimonial tributário mediante parâmetros e coeficientes determinados e publicados de outra forma que não a legalmente prevista – em Diário da República e sob a forma de Lei em sentido formal e material – viola os princípios e normas legais e constitucionais; - O excesso do valor patrimonial tributário para efeitos da liquidação em crise”.
D.
Tendo o seu alcance sido claramente percebido pelo Tribunal a quo, ao referir que “Nos artigos 44.º a 72.º da Petição Inicial, a Impugnante questiona, em suma a utilização do coeficiente de localização de 1,1 nas notificações dos actos de avaliação, por, na sua tese, não constar delas qualquer indicação das razões por que foi fixado esse coeficiente e não outro.
Nos artigos 73.º a 92.º da petição inicial, a Impugnante, em resumo, suscita a questão da legalidade (e inconstitucionalidade) do regime de avaliação, pois os coeficientes de localização aplicados em concreto não foram publicados sob a forma legal – em Diário da República e sob a forma de Lei em sentido formal e material.
Dos artigos 93.º a 96.º da petição inicial extrai-se que a Impugnante considera manifestamente excessivo o valor patrimonial dos prédios em causa face ao real valor de mercado dos mesmos.” E.
Sucede que, aquando do julgamento de Direito, a Douta Sentença recorrida limita-se a referir que “todos os vícios apontados pela Impugnante radicam na avaliação efectuada aos prédios por esta adquiridos e não em vícios próprios do acto de liquidação de IMI em si mesmo”; F.
Inexistiu, portanto, uma qualquer análise, ainda que mínima, sobre as causas de pedir invocadas pelo Recorrente, decorrente do facto de o Tribunal a quo ter julgado a pretensa inimpugnabilidade do acto de liquidação como uma questão prejudicial ao objecto do litígio; G.
Não obstante, foi já decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo no seu Acórdão n.º 0312/15, de 29 de Março de 2017, que “se o bem foi avaliado e lhe foi atribuído um valor, pode [o Contribuinte] impugnar esse acto de avaliação e impugnar o tributo que venha a ser liquidado com base nessa avaliação.” (destaque e sublinhado nossos); H.
Ora, sucede que, conforme resulta claramente identificado do introito da p.i., o Recorrente vem “deduzir impugnação judicial contra o acto tributário de liquidação de Imposto sobre Imóveis (“IMI”), relativo ao ano de 2012, constante dos documentos de cobrança n.ºs 2012 433064303, 2012 433064403 e 2012 433064503”; I.
Pelo que, desde logo, o motivo de recurso à via judicial fica muito claro: a Impugnação apresentada tem por objecto a ilegalidade da liquidação de IMI de 2012, com fundamento em diversos vícios, a saber: falta de fundamentação da liquidação, a ilegalidade do regime de avaliação e o excesso do valor patrimonial tributário, e não o acto tributário de avaliação do valor patrimonial dos imóveis, ao contrário do que parece pretender sustentar o Tribunal a quo na sua Douta Sentença; J.
Por outro lado, também o Tribunal Central Administrativo, no seu Acórdão n.º 07753/14, de 29 de Junho de 2017, também já se pronunciou no sentido de que “I. A impugnação dos actos de fixação dos valores patrimoniais depende do prévio esgotamento dos meios graciosos previstos no procedimento de avaliação (n.º 1 e 7 do art. 134.º do CPPT) II. Não depende da realização de 2.ª avaliação de prédio prevista no art. 76.º, n.º 1 do CIMI a impugnação do acto de fixação dos valores patrimoniais em sede de 1.ª avaliação quando o que está em causa é a determinação do regime jurídico aplicável na avaliação do imóvel, ou seja, quando a impugnação se fundamenta na discordância dos pressupostos legais e do regime jurídico em que a realização da avaliação assentou.” (destaque e sublinhado nossos); K.
Ora, como indicado na Douta Sentença recorrida, onde se menciona que “[n]os artigos 73.º a 92.º da petição inicial a Impugnante, em resumo, suscita a questão da legalidade (e inconstitucionalidade) do regime de avaliação, pois os coeficientes de localização aplicados em concreto não foram publicados sob a forma legal – em Diário da República e sob a forma de Lei em sentido formal e material.”, a ilegalidade do regime de avaliação é um dos vícios que o Recorrente assaca à liquidação em crise e que não foi objecto de análise; L.
Com efeito, o Recorrente sustenta ainda que não estando demonstrado que a Autoridade Tributária tenha alguma vez notificado o ora Recorrente da fundamentação, legalmente exigível, das razões de facto e de Direito que presidiram à fixação, em concreto, do coeficiente de localização e, consequentemente, do VPT, não pode deixar-se de concluir pela falta de fundamentação da liquidação impugnada, na medida em que a fundamentação externada não permite ao Recorrente saber como foi alcançado o VPT dos prédios que serviu de base à liquidação em crise; M.
Subsidiariamente, sustentou, ainda, o Recorrente que, considerando o estado actual dos terrenos em questão, os quais não lograram obter qualquer valorização desde a data da sua aquisição, é evidente o exagero do VPT considerado para efeitos da liquidação em crise, pelo que deverá a mesma ser considerada ilegal e, em consequência, objecto de anulação; N.
Sucede que, entendeu o Tribunal a quo que o Recorrente apenas poderia ter invocado os vícios que imputa à liquidação, em sede de impugnação do acto de avaliação, e desde que tal impugnação tivesse sido precedida do pedido de segunda avaliação, invocando, para tal, o previsto no art.º 76.º, n.º 1, e 77.º do Código do IMI, bem como com o disposto no art.º 134.º, n.ºs 1 e 7 do CPPT; O.
A interpretação formulada pela Douta Sentença recorrida no sentido de que, não tendo sido requerida uma 2.ª avaliação e não tendo sido impugnado o concreto acto de avaliação, não poderia o Recorrente ter impugnado a liquidação de IMI em crise nos autos nos termos em que o fez, revela um manifesto erro de julgamento, em virtude de uma aplicação errónea do Direito; P.
Com efeito, não se pretendeu impugnar o acto de avaliação, mas sim a própria liquidação de IMI, pelo que estamos perante vícios imputáveis à própria liquidação de IMI e não ao acto de fixação do VPT subjacente a esta liquidação, sendo que tais vícios poderiam e deveriam ter sido conhecidos pelo Tribunal a quo no âmbito da impugnação judicial; Q.
Face a tudo o exposto, não poderia a Douta sentença recorrida ter decidido pela inimpugnabilidade da liquidação de IMI em crise nos autos em virtude da argumentação aduzida pelo Recorrente; pelo contrário, impunha-se que tivesse analisado tal argumentação; R.
Neste sentido, a Douta Sentença recorrida aplicou erroneamente ao caso sub judice o art.º 134.º do CPPT, conjugado com os artigos 76.º, n.º 1 e 77.º do Código do IMI, isto porque a argumentação invocada pelo Recorrente, no sentido da ilegalidade do regime de avaliação dos prédios, poderia ter sido aduzida em sede de impugnação do próprio acto de liquidação, e não apenas em sede de impugnação do acto de avaliação precedida do pedido de segunda avaliação dos...
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