Acórdão nº 9748/20.2YIPRT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelNELSON BORGES CARNEIRO
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

RELATÓRIO LEILOEIRA …, apresentou requerimento de injunção contra CARLOS…, pedindo o pagamento da quantia de € 45 355,88 a título de capital, € 1 592,77, a título de juros de mora, e € 153,00 a título de taxa de justiça.

Foi proferida sentença que condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 39 872,31 a título de capital, bem como juros de mora vencidos no montante de € 1592,77, e ainda nos juros vincendos, calculados à taxa de juros comercial aplicável às transações comerciais, atualmente de 8%, desde a data da propositura da presente ação até integral e efetivo pagamento.

Inconformado, veio o réu apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes CONCLUSÕES[3]: A. Entende o ora Recorrente que a MM.ª Juiz do Tribunal “a quo” fez uma apreciação errada da prova produzida, pelo que os factos 5 a 17 e 19 deveriam ter sido julgados não provados e os factos não provados A., B. e C., deveriam ter sido considerados como provados.

  1. Por outro lado, entende o Recorrente que devem ser aditados dois factos ao elenco dos factos provados com a seguinte redação: - “A A. Incumpriu com os serviços que se propôs realizar e com as condições subjacentes à adjudicação da prestação de serviços” - “A A. reteve valores pertencentes a várias massas insolventes o que obrigou o R. a prescindir dos serviços adjudicados, não tendo a A. concretizado as vendas a que se propôs por causas que lhe são imputáveis.” C. A confirmar-se o entendimento do Recorrente relativamente à matéria dos factos supra referidos, o enquadramento legal da matéria factual provada terá que ser diverso do efetuado pelo Douto Tribunal “a quo”.

  2. A Recorrida invoca o pagamento de valores por conta de serviços alegadamente realizados, estando em discussão os termos em que foram adjudicados os serviços da Recorrida, a proposta quanto aos serviços a prestar e a proposta de remuneração, bem como, a efetiva realização dos serviços que alega, pelo que, importa determinar a quem pertence o ónus da sua prova.

  3. De acordo com o disposto no artigo 342º do CC, que estabelece que “àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”.

  4. Ora, invocando a Recorrida que prestou determinados serviços às massas insolventes e que teria de ser remunerada por esses serviços, ainda que não concretizasse as vendas dos bens, teria de comprovar e fazer prova dos termos acordados ou contratados com previsão do pagamento de despesas e encargos caso não fosse concretizada a venda dos bens, uma vez que esses serviços são o facto constitutivo do direito a receber os valores peticionados e que invoca.

  5. No caso concreto os únicos elementos de prova que a Recorrida apresenta são as propostas de prestação de serviços apresentadas e adjudicadas pelo Administrador Judicial, notas de despesas nunca enviadas ao Recorrente e faturas ficcionadas e devolvidas à Recorrida pelo Recorrente, uma vez que este não reconheceu que estes serviços foram prestados.

  6. Acresce que as testemunhas arroladas pela Recorrida não tinham conhecimento dos serviços prestados efetivamente em cada processo identificado nos autos, fazendo uma abordagem genérica aos serviços que a Leiloeira se propõe realizar a cada um dos Administradores Judiciais com quem contrata e descrevendo as funções de cada um na Leiloeira, conforme se demonstrará mais à frente.

    I. Ficou acordado entre as partes que a remuneração e reembolso das despesas da Recorrida far-se-ia exclusivamente pelo resultado das vendas por si promovidas, através da cobrança pela Recorrida aos compradores de uma comissão de 10% sobre o valor de venda dos bens móveis e de 5% sobre o valor de venda dos bens imóveis, aliás, são os termos das propostas apresentadas e aceites e que foram juntas aos autos. E sempre assim foi nos processos em causa e em todos os processos em que o Recorrente foi Administrador Judicial em que a Recorrida foi encarregada da venda e, ainda, noutros processos entregues a encarregados de venda distintos da Recorrida.

  7. Resulta claro e taxativamente quer das propostas apresentadas ao recorrente quer das condições de venda apresentadas pela Recorrida antes dos leilões: “Ao valor da venda é acrescido a comissão de 5% e respetivo IVA referente aos serviços prestados pela Leiloeira do Lena, pagos com a adjudicação”, referindo-se aos bens imóveis, e “Ao valor da venda é acrescido a comissão de 10% e respetivo IVA referente aos serviços prestados pela Leiloeira do Lena, pagos com a adjudicação”, referindo-se aos bens móveis.

  8. A conduta da Recorrida sempre se pautou por práticas impróprias e, até ilícitas, com retenção de valores que pertenciam às massas insolventes, obrigando o Recorrente a recorrer às vias judiciais por forma a recuperar montantes retidos ilicitamente e a suportar custos por forma evitar prejuízos a várias massas insolventes, a título de exemplo mencione-se, como mencionado já nestes autos, ao Processo n.º …86/18.5T8LRA do Tribunal Judicial da Comarca de Leira Juiz Local Cível de Leiria – juiz 3. Assim como o protelar das diligências de venda, não adotando a celeridade que os processos de insolvência impõem. Mais se diga que em muitos processos foi manifesta a inércia da Leiloeira, que protelou no tempo as promoções de venda dos bens, prova bastante são as comunicações juntas como documento 1 (e-mail de 03.12-12, 6.04.11), documento 2 (e-mail de 22.09.11, 14.06.2013,), documento 3 (e-mail 27.06.2012) e documento 5 todos juntos pela Recorrida.

    L. E foi esta conduta que obrigou o Recorrente a prescindir dos serviços prestados pela Recorrida em alguns processos que lhe estavam e estão confiados, não tendo qualquer vínculo com a Recorrida desde 2013, nessa sequência, conforme o Recorrente declarou expressamente, de forma esclarecida e clara, no seu depoimento gravado em ata do dia 02.11.2020 ao minuto 5:37 “não vende por inércia, acabam por se desinteressar do negócio e acabam por não vender foi o que aconteceu nestes casos. A leiloeira deixou de se interessar e deixou o tempo passar sem fazer nada” (…) (Ana Cerqueira …) “esse me recordo”, (António…) ”esse foi porque deixou de querer vender, não quis vender,” (Aurélio…) “nem interveio”, (António José …) “a leiloeira foi contactada no sentido de vender bens apreendidos mas não fez nada, não conseguiu vender, (…) Briobriquete se bem me recordo acabou por ser vendido por outra leiloeira, porque a leiloeira … não arranjou clientes” M. O que contraria a posição do Tribunal quando refere que “acabou o R. por admitir quanto ouvido em declarações de parte. Apesar de inicialmente o R. nas declarações que prestou em audiência ter declarado que a A. não tinha prestado nenhum serviço, quando confrontado com a documentação junta aos autos, acabou por referir que afinal a A., tinha sim prestado serviços (…)” N. Mais referiu o Recorrente ao minuto 9:35 relativamente ao processo da Civigal o Recorrente declara o seguinte “processo muito complexo a leiloeira do lena fez o seu trabalho exceto no que respeita a dois terrenos (…), a leiloeira recebeu em função do que vendeu nesse processo, e recebeu bastante nesse processo, recebeu a sua comissão” e ainda ao minuto 10:20 “A leiloeira não fez rigorosamente nada, é só isso que tenho a dizer”.

  9. Atentas as declarações do Recorrente não se compreende ou sequer se pode aceitar que o Tribunal “a quo” apenas retire dessas declarações que o Recorrente assumiu que a leiloeira prestou os serviços que invoca, mas que não teriam de ser pagos porque se encontravam no risco próprio da atividade das leiloeiras, quando o Recorrente foi claro e preciso a afirmar que houve processos em que não houve qualquer intervenção da Recorrida, sendo certo que o Recorrente prestou depoimento isento e claro quanto às motivações para não prossecução do vínculo contratual com a Leiloeira aqui recorrida, bem como, as condições da adjudicação dos serviços propostos.

  10. Mais referiu o Recorrente ao min 11:00 que “ a partir de determinada altura, penso que foi já em 2013… 2012, 2013, comecei a entregar processos a outras leiloeiras, porque denotei no caso da leiloeira certas situações e a mais grave de todas foi terem feito um leilão em Constância próximo de Abrantes e não terem pago os valores devidos, inclusive tive de meter um processo contra a leiloeira que ganhei em 1ª instância… muito recentemente é que soube o desfecho a sentença, porque eu Sr.ª Dr.ª na apatia da leiloeira, no facto de não pagar o que era devido eu não podia continuar a trabalhar com ela (…)” .

  11. Mais esclareceu o Recorrente que sempre entendeu que os serviços que a Recorrida se prestava a realizar faziam parte dos serviços adjudicados e que sempre seriam pagos nos termos acordados entre as partes.

  12. Ao minuto 27:44 esclareceu os termos em que eram adjudicados os serviços: “Nessa altura era por aceitação de uma proposta. Enviavam uma carta com indicação das condições onde diziam claramente que ganhavam em função das vendas… uma comissão, 10% sobre os bens móveis, 5% sobre os bens imóveis, o que era normal, igual a todas as outras.”, em perfeita coincidência com o depoimento prestado pelas testemunhas.

  13. Não obstante as declarações prestadas pelo Recorrente a MM. ª Juiz optou por desconsiderar as motivações e fundamentos que levaram o Recorrente a prescindir dos serviços da Leiloeira.

  14. A considerar-se, como considerou a Douta Sentença recorrida, que estamos perante um contrato de mandato, não obstante o conceito de justa causa de revogação do mandato de interesse comum surgir no nosso direito como indeterminado, não facultando uma ideia precisa quanto ao seu conteúdo, pode considerar-se como justa causa qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual, todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse...

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