Acórdão nº 3337/15.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente o recurso apresentado contra a decisão administrativa de aplicação da coima proferida no processo de contraordenação nº ..... que correu termos no Serviço de Finanças de Oeiras 2, pela prática da contraordenação prevista no artigo 104.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, e punida pelos normativos 114.º, n.ºs 2, 5, alínea a) e 26.º, nº4, ambos do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “CONCLUSÕES A) À Recorrente foi aplicada no âmbito do Processo Contra-ordenacional n.º .....coima no valor de € 38.569,09, acrescida de custas processuais, pela prática de infracção ao disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, por falta de entrega de pagamento por conta, referente ao período de 2014/07, cujo prazo terminou em 31-07-2014, no montante de € 124.819,09, punível nos termos do disposto na alínea f) dos n.ºs 2 e 5 do artigo 114.º e n.º 4 do artigo 26.º do RGIT.

  1. Julgou o tribunal a quo procedente o recurso de contra-ordenação, com anulação da decisão de aplicação da coima, por concluir “que a Recorrente não cometeu a infracção que lhe é imputada, porquanto a sua conduta não preencheu todos os elementos constituintes da infracção tipificada na alínea f) do n.º 5 do artigo 114.º do RGIT, não tendo sido apurado IRC em falta, verificando-se uma causa de exclusão da ilicitude no tocante à sua conduta omissiva, motivo pelo qual deverá ser absolvida, determinando-se a anulação da coima recorrida.”, aderindo integralmente a entendimento vertido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 19-11-2015, no âmbito do recurso n.º 08920/15.

  2. Salvo o devido respeito, diverge a Fazenda Pública do entendimento vertido na douta sentença, porquanto se mostra a mesma proferida em erro de julgamento de facto e de direito.

  3. Desde logo, pelo que, de acordo com os factos transcritos temos notícia de que o recurso de contraordenação foi apresentado a 29-04-2015, e que teve por objecto a decisão de aplicação à Recorrente de coima no montante de € 38.569,09 proferida por meio de despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Oeiras 2 datado de 20-03-2015, mas não temos notícia nos factos assentes, facto que entendemos pertinente para efeitos da verificação da tempestividade do recurso de contra-ordenação interposto, da data da notificação da decisão de aplicação de coima em análise nos presentes autos à arguida.

  4. Se a Recorrente foi notificada da decisão de aplicação da coima em 30-03-2015, conforme alegado pela Recorrente em sede de petição inicial – vide artigo 14.º da p.i. (vide doc. 3 da p.i.), o término do prazo de 20 dias (n.º 1 do artigo 80.º do RGIT) a 28-04-2015, pelo que, atendendo ao facto constante da alínea H), dos factos assentes, o recurso será intempestivo.

  5. Sendo a caducidade do direito de acção de conhecimento oficioso, uma vez que excluída da disponibilidade das partes, estamos assim perante excepção peremptória de conhecimento oficioso, determinante da absolvição do pedido, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 576.º do CPC ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

  6. Por outro lado, mais divergimos da fundamentação da douta sentença, que apela integralmente a fundamentação constante do citado Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, por entendermos não se mostrar ser tal douto acórdão passível da aplicação pretendida dar pela douta sentença.

  7. Assim, ao contrário do quadro fáctico vertido no citado Acórdão, não estamos nos presentes autos perante um caso de suspensão do pagamento dos pagamentos por conta, mas sim perante o não pagamento do primeiro pagamento por conta referente ao mês de Julho de 2014 no montante de €124.819,09, e mais verificamos que não estamos aqui perante um caso de inexistência de lucro tributável.

  8. Efectivamente, o imposto liquidado pela Recorrente no exercício de 2013, líquido das retenções na fonte, ascende ao montante de €394.165,54, e o imposto liquidado no exercício de 2014, líquido das retenções na fonte, ascende ao montante de € 46.134,52.

  9. E, assim, a consideração feita pelo tribunal a quo no sentido de que, apesar da Recorrente ter tido no exercício de 2014 lucro tributável no montante de € 204.497,93, com uma colecta no valor de € 46.134,52, foi tal valor integralmente consumido pela aplicação de benefício fiscal de igual montante, o que justifica a falta de entrega do pagamento por conta, não tem acolhimento no Acórdão a que apela.

  10. Vejamos que, o acórdão citado em momento algum se refere ao valor da colecta deduzida do valor de qualquer benefício fiscal, como o referido na alínea a) do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC e considerado pela douta sentença, do mesmo se deduzindo antes que pertinente, para efeito de determinação do pagamento por conta a efectuar, é o imposto liquidado com referência ao ano anterior, imposto esse líquido apenas e tão-só das retenções na fonte não susceptíveis de compensação ou reembolso.

  11. Ademais, a obrigação legal de proceder a pagamentos por conta resulta do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, sendo que, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 105.º do CIRC “Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do n.º 1 do artigo 90.º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquidos da dedução a que se refere a alínea e) do n.º 2 desse artigo.”. (realce nosso) M) Pelo que, não poderia a douta sentença apelar a tal norma, e considerar o montante deduzido à colecta pela Recorrente a título de dupla de tributação jurídica internacional a que se refere a alínea a) do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC, para com isso a isentar da obrigação de pagamento.

  12. Por outro lado, podem os sujeitos passivos, nos termos do n.º 4 do artigo 104.º do CIRC, ser dispensados de efectuar tais pagamentos por conta quando o imposto do período de tributação de referência para o cálculo seja inferior a € 200, no entanto, esta norma não é aplicável nos presentes autos por ascender o imposto a considerar ao montante de € 394.165,54.

  13. Podem ainda, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 a 3 do artigo 107.º do CIRC, os sujeitos passivos suspender os pagamentos por conta, mas tal possibilidade está limitada ao terceiro pagamento por conta, desde que o pagamento por conta já efectuado seja igual ou superior ao imposto que seria devido pelo sujeito passivo com base na matéria colectável do período de tributação.

  14. Pelo que, apenas com referência ao terceiro pagamento por conta, nas condições exigidas pela norma, é possível suspender os pagamentos por conta devidos e calculados nos termos do referido artigo 105.º do CIRC, sem que tal omissão se consubstancie na falta de entrega de prestação tributária devida, face à exclusão de ilicitude que deriva do preenchimento dos requisitos vertidos na norma em questão.

  15. Caso contrário, o não pagamento constitui uma infracção tributária punida por força do disposto na alínea f) do n.º 5 e do n.º 2 do artigo 114.º do RGIT, sendo irrelevante, só por si, o facto de que não seja devido a final imposto pelo sujeito passivo obrigado ao pagamento por conta, se não se preencher o circunstancialismo exigido no n.º 1 do artigo 107.º do CIRC.

  16. Resulta, deste modo, da lei, e de forma expressa e peremptória, que a possibilidade de suspensão do pagamento por conta apenas é configurável tendo por referência o terceiro pagamento por conta, nas condições previstas na norma, sendo que a alteração da norma em questão decorreu de alteração introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para o ano de 2013).

  17. Na redacção anterior da norma seria, à data, possível não proceder a qualquer um dos três pagamentos por conta devidos, caso se considerasse verificado o condicionalismo constante da norma legal, sendo que, a partir da referida alteração legislativa tal faculdade foi suprimida, deixando de ser possível suspender ou não efectuar pagamentos por conta em quadro fáctico que extravase o previsto na norma alterada e que aponta para o terceiro pagamento por conta.

  18. Refere-se também o n.º 3 do art.º 107.º do CIRC, para efeito de limitação das entregas a efectuar por conta do pagamento por conta, e apenas, ao terceiro pagamento por conta.

  19. Assim, considerando o disposto no n.º 1 e 3 do artigo 104.º do CIRC e o n.º 1 do artigo 105.º do CIRC, conjugado com a não aplicabilidade ao caso concreto do n.º 1 do artigo 107.º do CIRC, a Recorrente não se poderia ter abstido de proceder ao pagamento por conta, e tal pagamento por conta ascendia ao valor de €124.819,09, uma vez que correspondente a 95% do montante do imposto liquidado – no exercício imediatamente anterior - nos termos do n.º 1 do artigo 90.º do CIRC, repartido por três montantes iguais (€394.165,54 x 95% / 3).

  20. E desta conclusão não sai beliscado o princípio da tributação do lucro real, uma vez que depois de efectuados os primeiro e segundo pagamentos por conta, poderá o contribuinte fazer cessar os pagamentos, não procedendo ao terceiro pagamento por conta nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 107.º do CIRC, atendendo precisamente à matéria colectável do período de tributação, sempre sendo os pagamentos por conta considerados para efeitos de determinação do imposto a pagar a final, conforme disposto no n.º 2 do artigo 104.º do CIRC, o que reitera a tributação pelo lucro real.

  21. Face ao exposto, incorreu pois a Recorrente na prática de ilícito contra-ordenacional por falta de entrega do pagamento por conta devido nos termos dos normativos legais citados, contra-ordenação tipificada na alínea f) do n.º 5 e no n.º 2 do artigo 114.º do RGIT e n.º 4 do artigo 26.º do RGIT.

  22. E, assim, a douta sentença foi proferida em erro de julgamento...

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