Acórdão nº 1879/14.4BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, (DRFP) veio interpor recurso jurisdicional dirigido a este Tribunal tendo por objeto a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por J....., na sequência da prolação de despacho de indeferimento do pedido de revisão do ato tributário apresentado contra as liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) referentes aos anos de 2003, 2004 e 2005, no valor global de €2.979.504,83.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “ Conclusões I - A revisão da matéria tributável por métodos indirectos tem um procedimento específico e exclusivo que é o que consta do art. 91º da LGT, e não outro, onde só uma comissão de revisão poderá apreciar tal matéria, nomeadamente a apreciação de qualquer injustiça grave ou notória.

II - A revisão oficiosa da matéria tributável prevista no art. 78º da LGT se refere apenas e só à matéria tributável fixada por outros meios, que não os métodos indirectos.

III - Assim, nos termos deste último preceito legal, os sujeitos passivos de imposto podem pedir a revisão oficiosa dos actos tributários com fundamento em qualquer ilegalidade e a revisão da matéria tributável que não seja fixada por métodos indirectos e com fundamento em injustiça grave ou notória, que se considera ser a injustiça inequívoca e ostensiva ou que tenha resultado de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade, desde que tal não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.

IV - Quanto a uma eventual ilegalidade do acto tributário, o prazo para pedir a sua revisão oficiosa é o da reclamação administrativa, que nos parece ser o prazo de 15 dias referido no art. 162º (actual 191º) do CPA, dado que o nº 1 do art. 78º da LGT não remete expressamente para o regime da reclamação graciosa, sendo que este prazo se mostra manifestamente excedido, dado que o recorrente foi citado em 18/06/2008 e o pedido de revisão foi apresentado em 18/06/2012.

V - Quanto a uma eventual injustiça grave ou notória na fixação da matéria tributável por métodos directos, o prazo para pedir a revisão da matéria tributável é de 3 anos constante no nº 4 do art. 78º da LGT, mostrando-se igualmente o pedido de revisão oficiosa manifestamente excedido, dado que tal prazo findou em 31/12/2011.

VI - E mesmo que o pedido de revisão oficiosa do cálculo da matéria tributável fosse apresentado no prazo legal, a revisão desta não seria possível à luz da lei, dado que a revisão do cálculo da matéria tributável por métodos indirectos só poderia ser feita pela comissão de revisão a que se refere ao art. 91º da LGT e o prazo do pedido para tal, a ser efectuado pelo gerente da sociedade, ora recorrido, já há muito caducou.

VII - Por outro lado, também não nos parece, de todo, que a tempestividade do pedido da revisão oficiosa poderá ser fundamentada com a alegação de que a reclamação graciosa interrompeu o prazo do pedido de revisão, nos termos do nº 7 do art. 78º da LGT, dado que este preceito legal se refere única e exclusivamente à interrupção do prazo limite de 3 ou 4 anos para a administração tributária poder rever o acto tributário ou a matéria tributável e não à interrupção do prazo de apresentação do pedido de revisão oficiosa, pelo que a apresentação da reclamação graciosa pelo recorrente não é susceptível de interromper o prazo de apresentação do pedido de revisão oficiosa.

VIII - Restaria ainda a susceptibilidade de o acto tributário ou a matéria tributável vir a ser revista por iniciativa da administração tributária no prazo de 4 anos ou a todo o tempo se o tributo não tiver sido pago, sendo que tem sido entendido, mormente por alguma jurisprudência, que os sujeitos passivos podem suscitar a revisão oficiosa nesse prazo abrindo aqui uma nova via contenciosa.

IX - No entanto, no caso concreto destes autos não nos parece que tal revisão oficiosa seja já admissível, pois o certo é que dos autos não resulta qualquer ilegalidade ou qualquer erro imputável aos serviços ou qualquer injustiça grave e notória tanto na determinação da matéria tributável por métodos directos (que o recorrente nem sequer alegou) e indirectos (esta por o pedido já ter caducado) em sede de IVA e de IRC como na emissão dos correspondentes actos tributários de liquidação adicional por parte da administração fiscal.

X - O que resulta manifesto, isso sim, é erro imputável ao comportamento negligente do ora recorrido, primeiro na qualidade de gerente da aludida sociedade por não ter efectuado o pedido de revisão do cálculo da matéria tributável por métodos indirectos no prazo que dispunha para o efeito nos termos do art. 91º da LGT e depois na reclamação graciosa não ter sequer contestado a decisão e motivos por que a administração tributária optou pela aplicação dos métodos indirectos (e apenas vir aqui contestar ilegalmente e fora de prazo apenas o cálculo da matéria tributável por métodos indirectos já antes firmado como caso resolvido) e não ter sequer impugnado judicialmente o seu indeferimento no prazo legal e, aliás, nem sequer o ter feito com a abertura de uma novo prazo contencioso com o indeferimento do recurso hierárquico oficiosamente instaurado pela administração fiscal.

XI - Ora, tendo-se firmado já há muito tempo casos resolvidos, tando quanto à decisão definitiva referente à fixação da matéria tributável por métodos indirectos como quanto à própria decisão de opção pela aplicação dos métodos indirectos e directos, o que resulta do comportamento do ora recorrido com a apresentação do pedido de revisão oficiosa é que veio abusar do uso dos meios procedimentais constantes da lei com o único fito exclusivo de vir a abrir uma nova via contenciosa, pois bem sabia que a matéria tributável e os actos tributários daí resultantes já muito antes se tinham constituído como caso resolvido e, como tal, não mais susceptíveis de impugnação administrativa ou judicial, pelo que o pedido de revisão oficiosa se deve considerar intempestivo.

XII - A não ser assim, deixaria de haver qualquer segurança jurídica nas decisões da administração fiscal, as quais, aliás, por absurdo, poderiam sempre vir a ser substancialmente impugnadas administrativamente ou judicialmente a todo o tempo enquanto não estivessem pagas.

XIII - Por outro lado, refere também o tribunal a quo que, sendo da responsabilidade da AT a indicação dos meios de defesa na citação, esta deveria ter convolado a reclamação graciosa em pedido de revisão oficiosa ou convidar o recorrido a requer a convolação, nos termos do nº 4 do art. 37º do CPPT.

XIV - Ora, como acima já se disse, os únicos meios de reacção imediatos obrigatoriamente a constar da citação para efeitos da contestação das liquidações são os apenas constantes do nº 4 do art 22º da LGT, ou seja, a reclamação graciosa e a impugnação judicial e não outros e, por outro lado, a convolação nunca seria admissível, uma vez que estavam em causa os métodos indirectos a dirimir por outra via legal (art. 91º da LGT) que não a revisão oficiosa, acrescendo que a norma legal invocada pelo tribunal se destina ao julgador e não à administração fiscal, pelo que tal norma não tem aqui cabimento.

XV - Assim, pelos motivos acima expostos, sendo o pedido de revisão oficiosa intempestivo, deveria ser a impugnação judicial do indeferimento daí resultante ser igualmente intempestiva por caducidade do prazo para a sua apresentação, absolvendo-se a Fazenda Pública do pedido, nos termos do nº 3 do art. 576º do CPC, pelo que não andou bem o tribunal a quo ao decidir a tempestividade do pedido de revisão oficiosa e da consequente impugnação judicial.

XVI - Quanto ao fundo da questão, diz o tribunal a quo, em suma, que a AT não observou o princípio do inquisitório ao não ter diligenciado junto do TOC da sociedade em causa nos autos para ter acesso aos documentos necessários antes de se decidir pela aplicação dos métodos indirectos, pelo que não se encontram reunidos os requisitos para a sua aplicação, nos termos dos arts. 88º, al. a) e 97º, nº 1, al. b).

XVII - Ora, a AT fez todas as diligências necessárias para o apuramento da verdade fiscal como lhe competia, nomeadamente notificando por pelo menos duas vezes, em 14/02/2007 e 22/03/2007, o ora recorrido na qualidade de gerente da sociedade para apresentar os documentos necessários para o apuramento da matéria tributável e este não apresentou os documentos solicitados e nem sequer requereu nesta fase, como lhe competia nos termos legais, o adiamento dos prazos que lhe foram concedidos para tal.

XVIII - Só veio a requerer tal adiamento dos prazos na fase da audição prévia por 30 dias, sendo que nesta fase não era possível tal adiamento uma vez que se mostraria ilegal face ao preceituado no art. 60º da LGT e art. 60º do RCPIT, dado que a inspecção tributária estava obrigada a terminar o procedimento inspectivo no prazo de 10 dias.

XIX - Por outro lado, não está provado nos autos que o recorrido tenha solicitado os documentos ao TOC e que este não os tenha entregado, nomeadamente que o recorrido tenha apresentado qualquer denuncia à Ordem dos TOC ou intentado qualquer ordem judicial para o efeito.

XX - Pelo que se encontravam reunidos os requisitos para o recurso à aplicação dos métodos indirectos, nos termos das normas invocadas.

XXI - Refere também o tribunal a quo o excesso na quantificação da matéria tributável porque no ano de 2003 foram apurados mais de sete milhões de euros e em 2004 e 2005 foram apurados apenas duas centenas e dezenas de milhares de euros, respectivamente.

XXII - Ora, a inspecção tributária apenas se poderia basear, como de resto o fez, no quantitativo apurado nas facturas discriminadas em cada ano e apurar a média apenas e só relativamente a esse ano, não o poderia fazer de outro modo, nem extrapolar as facturas de um ano para outro, face aos princípios contabilísticos...

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