Acórdão nº 1074/04.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | MARIA CARDOSO |
Data da Resolução | 29 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO 1. A FAZENDA PÚBLICA veio interposto recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por L... - COMUNICAÇÃO, LDA, contra a liquidação adicional n.°2002 8... no valor global de € 36.792,59 relativa a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), incluindo derrama e juros compensatórios, relativos ao exercício de 1999.
2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial, com a consequente anulação total da liquidação adicional de IRC impugnada n.° 2002 8... incluindo derrama e juros compensatórios, referente ao exercício de 1999, no valor de € 36.792,59.
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A referida liquidação foi emitida na sequência de correções efetuadas em sede de procedimento inspetivo, que se prendem com custos de diversa natureza registados na contabilidade da impugnante e que não foram aceites para efeitos fiscais, nos termos do disposto no artigo 23° do CIRC, designadamente custos com deslocações aos EUA, França e Suíça, custos referentes a "serviços de acompanhamento de produção das edições n.° 33 a 36 da Revista F...", custos relativos à produção em regime de subcontratos da Revista F...", e custos relacionados com a aquisição de senhas de combustível «Cheques Auto».
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Desde logo, no entendimento da RFP e salvo melhor opinião, a douta sentença proferida pelo Tribunal "a quo" encontra-se, inquinada por um vício formal consagrado no artigo 125.°, n.° 1 do CPPT e na alínea d) do n.° 1 do art. 615.° do CPC - aplicáveis ao processo tributário por força do disposto na alínea e) do art. 2.° do CPPT - denominado por vicio de omissão de pronuncia ou vício de "petitionem brevis".
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Nos termos do preceituado no citado artigo 615°, n°.1, al. d), do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento, e "questões", para efeito do disposto no n.° 2 do art. 608.° do CPC, não são aqueles argumentos e razões, mas sim e apenas as questões de fundo, isto é, as que integram matéria decisória, os pontos de facto ou de direito relevantes no quadro do litígio V. Ora, analisada a sentença ora recorrida, verificamos que o douto tribunal a quo conclui pela procedência da impugnação, determinando a anulação total da liquidação de IRC, olvidando de se pronunciar sobre todas as correções efetuadas pela Inspeção Tributária aos custos contabilizados pela impugnante e que concorreram para a emissão da referida liquidação adicional, designadamente sobre os custos relacionados com deslocações aos EUA, França e Suíça e os custos com a aquisição de Auto Cheques, no valor de global 1.898.837$00 (€ 9.471,35), o que acarreta a sua nulidade de acordo com o disposto na al. d) do n°1 do art. 615° do CPC, aplicável por força do art.2°, al. e) do CPPT.
Sem prescindir, VI. Salvo o devido respeito, a douta sentença incorre igualmente em erro de julgamento que resulta não só da incorreta valoração da factualidade assente, como também da errónea interpretação e violação da lei.
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Apurou a AT em sede de procedimento inspetivo que a impugnante contabilizou no exercício de 1999 como custos, as despesas inerentes à produção da Revista F... n.°s 33 a 38, não obstante ter sido a empresa M... a responsável por tais edições e pela venda das mesmas, e que consequentemente obteve os correspondentes proveitos VIII. Entendeu o Tribunal "a quo", na decisório ora em crise, que tendo em conta a atividade exercida pela Impugnante "(...) afigura-se-nos inquestionável que o custo respeitante à transferência para a L...-Comunicação, Lda. da edição da Revista F... está associado à sua atividade", e que “A indemnização atribuída pela ora Impugnante traduziu-se na obtenção, por parte da M... - Agência de Comunicação, Lda., dos proveitos inerentes à edição da revista ora em causa, sem que, contudo, tivesse de suportar os respetivos custos...”: IX. Ora, o facto de as faturas em questão refletirem operações não estranhas ao objeto social da impugnante, não quer isso dizer, só por si, que os factos subjacentes à sua génese estão diretamente relacionados com a atividade da Impugnante.
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Por outro lado, também não foi junto aos autos qualquer documento que permitisse a contabilização de uma indemnização, pelo que, ainda que hipoteticamente indemnização houvesse, sempre teria de haver um documento de suporte - contrato ou fatura emitida pela entidade credora da indemnização e respetivo pagamento.
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Acresce que relativamente às faturas relativas à produção da revista, emitidas pela empresa R..., Lda., (conforme faturas n.° 70, 198 e 562, a fls. 278 e seguintes do RIT), nunca poderiam as mesmas ser emitidas em nome da empresa M... [entidade com a qual a impugnante tinha relações muito especiais - Cfr. alínea 19) do probatório dado como assente], e contabilizadas como custo pela impugnante, entidade estranha à obtenção dos proveitos.
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Ora de acordo com o disposto no artigo 23.° do CIRC, na redação á data dos factos, são dois os requisitos para que os custos ou perdas das empresas sejam dedutíveis do ponto de vista fiscal: que sejam comprovados com documentos emitidos nos termos legais e que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto.
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In casu dos autos, não está apenas em causa a verificação dos requisitos formais exigidos para a comprovação dos custos e cuja violação implica a sanção da indedutibilidade sobre o rendimento, pois tal como acima referido, as faturas emitidas pela empresa R..., Lda. que serviram de suporte aos custos contabilizados pela impugnante foram emitidas em nome da empresa M..., Lda; mas também a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, pois tal como se pode ler no ponto 9 do RIT “(...) na contabilidade da empresa, não constam nenhum registo de proveitos relacionado com esses gastos".
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Da necessidade de comprovação da indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, resulta claro que a lei só contempla os encargos que sejam determinantes para aquele fim. A lei exige, assim, a comprovação da indispensabilidade do custo na obtenção dos proveitos e não apenas a comprovação da possibilidade de obtenção desses proveitos.
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Ora, resulta evidente dos documentos juntos aos autos que o pagamento dos custos de edição das revistas não corresponde a qualquer proveito da impugnante no exercício de 1999, pois, tal como a própria afirma no petitório inicial da impugnação, só a partir de março de 2000 é que passou a faturar a revista à F..., Lda. E mesmo que se atribuísse a tais custos que visam a obtenção de proveitos futuros a classificação de "indemnização", o certo é que sempre teria que se atender ao principio da especialização previsto no artigo 18.° do CIRC.
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Encontrando-se tais custos associados, de forma direta, à obtenção da responsabilidade pela conceção e edição da referida revista, da qual se esperava obter benefícios futuros, e uma vez que tal atribuição de responsabilidade, e consequentes proveitos, apenas se veio a verificar no ano de 2000, então, os custos inerentes a esta apenas poderiam ser contabilizados no mesmo exercício, configurando no exercício de 1999 apenas um custo diferido, não podendo consequentemente ter qualquer influencia na demonstração de resultados.
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Acresce que a comprovação das despesas que a recorrida pretendia ver relevadas fiscalmente recai sobre ela, pois que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca [art.342°, n. °1. do Cód. Civil e 74°, n. °1 da LGT] XVIII. E note-se que contrariamente ao entendimento preconizado pelo douto Tribunal a quo, a Inspeção Tributária em momento algum alicerçou as correções efetuadas no concreto resultado obtido pela impugnante.
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A questão do ónus da prova da indispensabilidade do custo para efeitos fiscais, passa pela sua relevância, face à lei, no caso, da sua qualificação como custo dedutível, em sede do citado art°. 23.° do Código do I.R.C.
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Revertendo ao caso dos autos de primeira instância, a Administração Fiscal pôs em causa a indispensabilidade dos custos suportados pela Impugnante, ora recorrida, carreando ao relatório de inspeção os fundamentos que conduziram à conclusão de que os referidos gastos não são aceites fiscalmente, na medida em que não se enquadram nos requisitos legais previstos no n.° 1 do art. 23.° do Código do IRC, na sua versão em vigor à data dos factos, assim demonstrando os pressupostos constitutivos de direitos que legitimam a sua atuação, na medida em que realizou no procedimento de inspeção prova suficiente para concluir no sentido da não dedutibilidade dos custos.
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Por conseguinte, mal andou o doutro Tribunal de primeira instância ao considerar que os custos supra discriminados são inerentes ao normal desenvolvimento da atividade da Impugnante, e que foram incorridos para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto no mesmo exercício, bem como ao considerar que Administração Fiscal não cumpriu o ónus de prova da verificação dos pressupostos de facto e de direito que a determinaram a efetuar as correções técnicas constantes do relatório dos serviços de fiscalização, XXII. pois que, pelo contrário, o que ficou demonstrado nos autos de primeira instância é que Administração Fiscal cumpriu o ónus que sobre si impendia e que, por seu lado, a Impugnante não logrou provar, nem em sede do procedimento inspetivo nem nos autos de primeira instância, a indispensabilidade dos custos contabilizados para efeitos da sua aceitação como gastos, nos termos do disposto no n.° 1 do art. 23.° do Código do IRC, na sua versão em vigor à data dos factos, tendo sim ficado demonstrado que a...
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