Acórdão nº 01511/07.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCarlos de Castro Fernandes
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I – E., S.A. (Recorrente), veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual se julgou improcedente os embargos de terceiro que deduziu no presente processo de execução fiscal.

No presente recurso, a Recorrente formula as seguintes conclusões: 1.

Vem o presente Recurso interposto da sentença de fls. que julgou improcedentes os embargos deduzidos pela ora Recorrente e, consequentemente, decidiu pela manutenção da penhora das obrigações emitidas pela embargante em 1989 e depositadas na conta de valores mobiliários n.º (...) do Banco (...), titulada pela C. Lda.

  1. Considerou aquele decidendo não ter resultado demonstrado que a embargante, conforme ónus que sobre si impendia, tivesse visto lesada ou ofendida a sua posse, ou qualquer direito incompatível com a penhora, para efeitos do disposto no art.º 324.º/1 Código Civil.

  2. E fundamentou a sua decisão da forma seguinte: "Segundo alega a embargante, todos os créditos titulados pelas obrigações por si emitidas foram reclamadas no processo de reclamação de crédito, bem como todos os créditos da C. sobre a Embargante, tendo ficado sujeitos às medidas de recuperação homologadas judicialmente, as quais foram integralmente cumpridas, e por isso, encontram-se liquidados.

    "Ora, da leitura atenta do requerimento de reclamação de créditos apresentada pela C. Lda, em 05/09/1997, no âmbito do processo de recuperação e junto aos autos, no seguimento do despacho de 09/12/2012, não é possível extrair essa conclusão.

    "Com efeito, da informação nela contida o Tribunal não conclui que os créditos referentes às obrigações emitidas pela embargante, depositadas na conta bancária penhorada, foram efectivamente reclamados pela executada, que foram abrangidos pelas medidas de recuperação aplicadas, que foram integralmente cumpridas e que encontram pagas." "Também da prova testemunhal produzida não é possível concluir o alegado pela embargante, sendo certo que, sobre ela impende o ónus da prova da lesão ou ofensa da posse ou do seu direito, ao abrigo do disposto no art.º 324.º, n.º 1 do CC." 4.

    E o Tribunal Recorrido suporta a sua decisão no facto de não resultar, quer do requerimento de reclamação de créditos da C., quer da prova testemunhal produzida, suporte da alegação da embargante.

  3. E já em sede de "motivação da matéria de facto", a sentença recorrida considerara, após análise da prova testemunhal produzida, que "dos documentos constantes dos autos não é possível concluir que a conta bancária penhorada nos autos é constituída por títulos de crédito que já não titulam qualquer dívida por a mesma se encontrar extinta." 6.

    O Tribunal a quo fez errada apreciação da prova carreada para os autos.

  4. A alegação da embargante supra vertida, encontra-se integralmente suportada documentalmente.

  5. Desde logo, importa evidenciar que a emissão de obrigações está sujeita a registo (cfr. alínea 1) do nº 1 do artigo 3º do Código de Registo Comercial).

  6. E, cfr. resulta da certidão permanente com o código de acesso nº 112-7052-5301 - que dispensa a apresentação da certidão em papel, nos termos do nº 5 do artigo 75º do Código de Registo Comercial -, no ano de 1987, a ora Recorrente procedeu à emissão de 200.000 obrigações, em títulos ao portador de 5, 10 e 50, os quais foram agrupados em duas series (A e B) de 100.000 obrigações cada uma, no valor nominal de Esc. 1.000$00, emissão essa registada sob a Ap. 03/19880219.

  7. No ano de 1988, a Embargante procedeu à emissão de 200.000 obrigações, em títulos ao portador de 10, 50 ou 100, os quais foram agrupados em duas series de Esc. 100.000.000$00 cada uma, emissão essa, registada sob a Ap. 02/19890203. (cfr. mesma certidão permanente).

  8. No ano de 1989, a ora Recorrente procedeu à emissão de 250.000 obrigações ao portador no valor nominal de Esc. 1.000$00 cada uma, emissão essa registada sob a Ap. 06/19900322. (cfr. certidão permanente) 12.

    Da mesma certidão resulta que a embargante só procedeu à emissão de obrigações nos anos de 1987, 1988 e 1989.

  9. A certidão comercial da embargante encontra-se junta aos autos como Doc 1 oferecido com os Embargos.

  10. Daquele documento, e com relevância para prova da alegação da Embargante, podemos concluir que a embargante emitiu obrigações no ano de 1987, no valor de 200.000$00 cfr ap. 03/19880219 e que a embargante emitiu obrigações nos anos, e apenas nos anos de 1987, 1988 e 1989, no valor global de 650.000$00 cfr aps. 03/19880219, 02/19890203 e 06/19900322.

  11. Se atentarmos na fundamentação de facto da sentença recorrida., resulta do n.º 4 da mesma que "No âmbito do processo de recuperação de empresa o gestor judicial apresentou o relatório de fls. 59 a 68 dos autos, no qual consta, entre o mais, o seguinte: Fazendo jus ao princípio da igualdade de tratamento de todos os credores "par conditio creditorium" opta-se por medida que irá atingir por igual a totalidade dos credores privilegiados e comuns, traduzida por uma reformulação do passivo através da redução de 70% dos créditos segundo esquema a seguir indicado: No Período de pagamento não correrão juros de qualquer espécie sobre os créditos reformulados, beneficiando a empresa de isenção de juros vincendos, bem como dos juros vencidos sobre os créditos aprovados que serão expurgados do serviço da dívida (...) O período de carência será de dois anos a contar do trânsito em julgado da sentença homologatória da deliberação da Assembleia de Credores. (...) Amortização parcial das dívidas e juros As dívidas deverão ser amortizadas num prazo dilatado e sem pagamento de juros (art.º 88.º, n.º 1, b), da forma que se segue: C. Limitada — dívida de esc. 660.947.439$00 Pagamento em 10 anos, com dois de carência, de 30% da dívida (...) Empréstimos para obrigações Esc. 650.000.000$00 e juros de 211.334.206$00 Pagamento em 10 anos, com dois de carência, de 30% da dívida (..." 16.

    E o n.º 5 da fundamentação de facto da sentença acrescenta: "Por deliberação unânime da Assembleia de Credores, de 27/02/1998, foi aprovado o relatório do Gestor Judicial, excepto no que respeita aos créditos do Estado e Segurança Social cfr fls 69 e ss. dos autos..." 17.

    Sob o n.º 6 dá o Tribunal a quo como provado que: "por sentença de 01/04/1998 foi homologada a deliberação da Assembleia de Credores referida no ponto anterior - cfr fls. 71/73 dos autos" 18.

    Sob o n.º 7 que "em 07/02/1999 teve lugar a Assembleia de Credores na qual foi aprovada a cessação das medidas de recuperação da empresa por cumprimento das mesmas, cfr fls. 78 e 79 dos autos".

  12. E sob o n.º 9 considerou provado que "Por sentença de 20/02/1999 foi homologada a deliberação da Assembleia de Credores aludida na alínea anterior." 20.

    Em suma, conforme resulta do relatório considerado sob a alínea D) da matéria assente, o relatório do Gestor Judicial contemplou uma rúbrica relativa a "Empréstimos para obrigações Esc. 650.000.000$00 e juros de 211.334.206$00", sujeita a pagamento de 30% da dívida, com dois anos de carência.

  13. E, conforme resulta dos pontos 6, 7 e 8 da mesma fundamentação de facto, aquele relatório veio a ser aprovado pela Assembleia de Credores por deliberação, posteriormente, homologada por sentença.

  14. Da análise comparada da certidão de registo comercial da ora Recorrente com a demais factualidade reconhecida como assente pela sentença recorrida, podemos e temos de concluir que: 23.

    Todos os créditos titulados por obrigações emitidas pela Embargante ora recorrente, foram reconhecidos no processo de Recuperação da mesma.

  15. Tendo sido sujeitas às medidas de recuperação homologadas judicialmente, 25.

    As quais foram integralmente cumpridas.

  16. Na verdade, não pode colher o argumento usado pela sentença recorrida para suportar a falta de prova da alegação de que os créditos inerentes às obrigações penhoradas foram abrangidos pelo plano de recuperação, porque as mesmas não constam do requerimento de reclamação de créditos apresentado pela C..

  17. Com o devido respeito, nem tinham de constar !!! 28.

    Conforme resulta do disposto no n.º 1 do art.º 44 do CPEREF "Os credores, ainda que preferentes, que pretendam intervir na assembleia devem reclamar os seus créditos, se antes o não houverem feito..." 29.

    A reclamação dos créditos visa apenas assegurar a participação do credor reclamante na Assembleia de credores.

  18. A falta de reclamação não extingue nem afecta o crédito do respectivo titular, apenas o impede de participar na assembleia, com as consequências daí decorrentes.

  19. E a análise da legitimidade da participação da Cruz Lider na Assembleia de Credores no Processo de Recuperação da ora Recorrente, mostra-se, nesta fase e contexto, prejudicada.

  20. Decisivo para a decisão da causa é tais créditos terem sido reconhecidos e terem as medidas de reestruturação incidido sobre os mesmos, independentemente de "por quem" e "sob que forma" foram levados ao processo.

  21. Ora, a inclusão daqueles créditos no relatório do Gestor Judicial resulta provada.

  22. A incidência da aprovação pela Assembleia sobre aqueles créditos resulta provada.

  23. A sua abrangência pela sentença homologatória resulta provada.

  24. Pelo que, tais factos, alegados pela embargante, deveriam ter integrado a fundamentação de facto da sentença recorrida.

  25. Acresce que, embora tal não fosse sequer determinante para a boa decisão da causa, a embargante fez também prova da liquidação da totalidade das suas obrigações emergentes das medidas de recuperação homologadas.

  26. Todos os créditos da C., designadamente aqueles que decorriam da titularidade das obrigações emitidas nos anos de 1987, 1988 e 1989, foram reduzidos a 30% desse valor no processo de recuperação da embargante ora recorrente - cfr pontos 4, 5 e 6 da matéria julgada como provada.

  27. E para o respectivo pagamento foi fixado o prazo de 10 anos, com dois anos de carência.

  28. Ora, foram juntos aos autos pela ora...

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