Acórdão nº 02133/20.8BEBRG-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelManuel Escudeiro dos Santos
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*1. RELATÓRIO M., com sinais nos autos, veio ao abrigo do disposto no artigo 644.º, n.º 2, alínea d), do CPC, interpor recurso do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 02/02/2021, que indeferiu a prova requerida com fundamento na sua irrelevância, por considerar que o “registo é constitutivo tanto da hipoteca como da penhora, sendo irrelevantes as circunstâncias não registadas em relação a estas”.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1. Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho proferido, no passado dia 02/02/2021, pelo Meritíssimo Tribunal “a quo”, o qual indeferiu os meios de prova requeridos pela aqui Recorrente.

  1. A questão que se coloca à douta apreciação deste Tribunal de recurso contende, e por ora, exclusivamente, com o supramencionado segmento decisório, isto é, a inadmissibilidade dos meios de prova requeridos pela aqui Recorrente.

  2. A Recorrente apresentou, no passado dia 11/01/2021, o requerimento de resposta aposto na presente motivação, o qual, e por questões de economia processual se dá aqui por integralmente reproduzido, para os devidos efeitos legais.

  3. A presente reclamação contende com um manifesto excesso de penhora efetuado pela “AUTORIDADE TRIBUTÁRIA” sobre dois imóveis da propriedade da sociedade “V., S.A.”.

  4. Entende a Reclamante que o imóvel penhorado e sobre o qual foi designada data para a sua venda, não deverá ter tal destino, e uma vez que, previamente, a “AUTORIDADE TRIBUTÁRIA” já havia procedido à penhora de outro imóvel da “V.” (melhor identificado nos autos), o qual se afigura, manifestamente, suficiente, e atento o seu valor base de venda e os reais ónus que impendem sobre este, para satisfazer o crédito da credora A.T..

  5. Assim, e por forma a comprovar as dívidas que tais bens respondem e a suficiência do primitivo bem penhorado, requereu a Reclamante os meios de prova melhor descritos no já identificado requerimento, e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais.

  6. Porém, entende o Tribunal “a quo” que tais meios de prova em nada vão alterar a situação jurídica registada na Conservatória do Registo Predial, e uma vez que tais ónus têm efeito constitutivo do direito substantivo registado.

  7. Assim, e salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, entende a Recorrente que o referido despacho, enferma de erro de julgamento, uma vez que indeferiu a produção dos meios de prova requeridos pela Reclamante, e não obstante a mesma se afigurar essencial à descoberta da verdade material e boa decisão da causa.

    ISTO POSTO: 9. De harmonia com o disposto no artigo 13.º CPPT, aos juízes dos Tribunais tributários incumbe a direção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer.

  8. O processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o Tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentadas dentro das regras processuais.

  9. E é factual que com a referida prova a Reclamante pretendia provar o por si alegado nos artigos 42.º, 43.º e 44.º da Petição de Reclamação apresentada, e fazer a respetiva contraprova do alegado pela AUTORIDADE TRIBUTÁRIA nos artigos 28.º a 29º da oposição apresentada.

  10. Não obstante, no caso vertente, o julgador, no despacho interlocutório, apreciou a desnecessidade da produção de prova peticionada, antecipando, e salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, um juízo que só após aquela produção poderia e deveria ter realizado.

    VEJAMOS: 13. Antes de mais cumpre salientar que a função básica do registo (dar publicidade aos atos neles inscritos) pode ser perturbada por variadas vicissitudes, que afetem os próprios atos de registo ou as situações materiais subjacentes, criando-se então dilemas cuja solução importa “conferir” ao registo efeitos que se situam para além do seu caráter declarativo.

  11. No caso em concreto, a Reclamante pretende ao requerer os meios de prova em causa, “conferir” ao registo, e aos factos no mesmo apostos um caráter manifestamente declarativo, e atentas as provas irrefutáveis de que os ónus que sobre os mesmos impendem não refletem a verdade do direito substantivo.

    ORA, 15. É factual que a hipoteca constitui uma garantia especial das obrigações e possibilita que o credor seja pago pelo valor de certos bens/coisas imóveis ou equiparados que pertençam ao devedor ou a terceiros.

  12. Assim, a hipoteca apresenta-se como um direito que o credor possui até ao cumprimento total e definitivo do devedor, isto é, o credor pode fazer garantir um crédito futuro por hipoteca (até se mostrar futuramente o crédito cumprido).

  13. Deste modo, uma vez extinta a obrigação que deu causa ao registo da hipoteca, a mesma deixa de garantir o que quer que seja, pois o produto da venda do imóvel apenas poderá ser repartido por aqueles credores que, primeiro reclamarem os seus créditos e segundo possam comprovar a sua existência.

  14. Motivo pelo qual, e independentemente da eficácia constitutiva que o registo da hipoteca possa ter, o Tribunal “a quo” deveria atentar na verdade material e na boa decisão da causa, que é o que a Reclamante pretende demonstrar com a prova requerida.

    ACRESCE, 19. Dispôs o douto Tribunal “a quo” que o registo relativamente às hipotecas tem eficácia constitutiva, porém, e salvo o devido respeito por melhor opinião em contrário, as hipotecas voluntárias, e que incidem sobre os prédios em crise nos presentes autos não produzem tal eficácia, e uma vez que o seu registo traduz-se apenas num requisito de eficácia.

  15. Neste sentido, ISABEL PEREIRA MENDES, Código do Registo Predial, Almedina, 17.ª ed., 2009 (nota ao art. 4.º), p. 155, considerando que: “o registo da hipoteca apenas é constitutivo quando se trate de hipotecas legais e judiciais, enquanto o registo da hipoteca voluntária seria apenas um requisito de eficácia.” 21. Pelo que e neste segmento também importaria a produção da prova requerida.

  16. O que se requer.

    POR OUTRO LADO, 23. Igual raciocínio se fará relativamente às penhoras registadas, as quais desde já não se aceita a posição defendida pelo Tribunal “a quo” de que o seu registo tem eficácia constitutiva, sendo este, e de igual forma um mero requisito de eficácia do direito que se quer ver reconhecido.

    ACRESCE, 24. De acordo com o disposto no art 58.º n.º 1 do Cód. Reg. Predial o cancelamento do registo de penhora, nos casos em que as ações executivas já não estejam pendentes (o que é o caso), faz-se com base na certidão passada pelo Tribunal competente que comprove essa circunstância e a causa.

  17. E caso se trate de cancelamento do registo de penhora nos processos de execução fiscal, como é o caso, é, ainda, necessário comprovar a extinção ou a não existência da dívida à Fazenda Nacional.

  18. Deste modo, a Reclamante ao requerer os respetivos meios de prova (- declarações da AUTORIDADE TRIBUTÁRIA a esclarecer o valor em débito e certidões emitidas pelos Tribunais a atestar a extinção das instâncias executivas e, consequentemente, a inexistência de dívidas por parte da “V., S.A.” às referidas entidades), pretendia a Recorrente que o Tribunal “a quo” apreciasse livremente tal documentação, e por forma, a ser efetuada prova cabal dos factos alegados nos supra referidos arts. 42.º, 43.º e 44.º da Petição de Reclamação apresentada, e contraprova do alegado pela AUTORIDADE TRIBUTÁRIA nos arts. 28.º a 29º da oposição apresentada.

  19. Não obstante o registo das penhoras se encontrarem pendentes, com a prova que a Reclamante pretende ver produzida, este douto Tribunal “a quo”, e em prol da segurança jurídica e da verdade material, poderá livremente concluir pela inexistência de dívida proveniente das penhoras registadas, por parte da Reclamante, perante aqueles concretos credores, e que apenas falta proceder ao cancelamento das mesmas na Conservatória do Registo Predial.

  20. Pois é inelutável que os referidos ónus de hipoteca e penhora se extinguem mediante o cumprimento das obrigações que lhes deram origem, e o bem só responderá pelas reais e válidas obrigações da “V., S.A.”, perante terceiros.

  21. E saliente-se que do que se trata na presente reclamação é de aferir se a penhora efetuada no Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. (...) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 878 registado em nome da “V.” se afigura ou não excessiva e ilegal, em face das penhoras e da hipoteca legal registada a favor da Reclamada no Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o art. 3218 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o n.º 309, e inscritas nas apresentações n.ºs 2308 de 23/08/2016 (hipoteca legal) e n.º 2170 de 09/06/2017 (penhora).

  22. Sendo que se fazendo prova de que as obrigações inerentes aos ónus registados já se encontram pagas, o produto da venda do Prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o...

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