Acórdão nº 00471/20.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução23 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO S. LDA., devidamente identificada nos autos, vem interpor RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datado de 05.02.2021, e promanado no âmbito da ação de contencioso pré-contratual por esta intentada contra o MUNICÍPIO (...), também com os sinais dos autos, que julgou a presente ação improcedente, e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1- A douta sentença recorrida dispensou a produção de prova testemunhal por considerar que dos articulados das partes «não se vislumbra que deles conste a alegação de factos com relevância para a decisão da causa que careçam da produção de prova testemunhal, porquanto são alegados factos cujo pilar probatório assenta no conjunto de documentos juntos aos autos e que constam do processo administrativo.» 2- A Recorrente considera que o douto Tribunal a quo não deveria ter dispensado a produção de prova testemunhal, tendo em conta a alegação da Recorrente, e tendo por pressuposto o cerne da matéria controvertida no processo; 3- A Recorrente apresentou alegação expressa na petição inicial de que apenas teve conhecimento no dia 28/09/2020, de que o Júri do Procedimento havia decidido pedir esclarecimentos à Autora, quando constatou, por consulta ao fluxo do processo através da plataforma eletrónica, que o Réu/Recorrido havia proferido despacho de adjudicação.

4- Foi relativamente à falta de notificação, que a Recorrente imputou a ilegalidade os atos de aprovação do relatório final e de adjudicação.

5- Para decidir pela dispensa da produção de prova testemunhal, o douto Tribunal a quo não apreciou toda a argumentação aduzida pela Recorrente na petição inicial, nomeadamente quanto ao quanto à alegação da Autora/Recorrente de que não recebeu a notificação para prestar esclarecimentos, sendo que foi para demonstrar esse facto que a Recorrente apresentou testemunhas.

6- A produção de prova testemunhal por parte da Recorrente destinava-se, precisamente, a ilidir o suporte documental que foi junto pelo Réu/Recorrido, que apenas poderia, quanto muito, evidenciar o envio através do documento com a referência PT1.RECEIPT.38342077, mas não a receção do mesmo por parte da Autora/Recorrente.

7-Na fundamentação da dispensa de produção de prova testemunhal, o Tribunal a quo não fez qualquer menção à posição expressa pela Autora/Recorrente nos presentes autos, nomeadamente a afirmação categórica de que não rececionou a comunicação para prestar esclarecimentos.

8- O Tribunal a quo, incorretamente, deteve-se apenas na prova documental, numa clara subversão da prova testemunhal, e sem que tenha fundamentado ou justificado tal decisão de forma rigorosa, não tendo analisado a matéria que efetivamente estava controvertida no processo.

9- O indeferimento da utilização de meios de prova (in casu, da produção de prova testemunhal) não é uma prerrogativa incondicionada do Mm.° Juiz, e impende sobre este um dever acrescido de fundamentação, que não foi concretizado.

10- A Autora/Recorrente teria possibilidade de, através da produção de prova testemunhal, demonstrar o que alegou nos artigos art.° 15.° a 22.° da petição inicial.

11- A Autora/Recorrente juntou através do documento 4 da sua petição inicial, um print screen alargado de todas as datas e todas as notificações efetuadas pela Vortal, que abrangia o período de 27/07/2020 a 25/09/2020, através do qual se verifica que não se encontra qualquer notificação referente ao pedido de esclarecimentos e ao relatório preliminar.

12- A prova testemunhal teria sido essencial para confirmar a alegação da Autora, ora Recorrente, quanto à não receção da notificação, pois as evidências resultantes do documento 4 junto pela Autora/Recorrente, e dos documentos juntos pelo Réu/Recorrido, quanto à notificação da Recorrente, apresentam dados contraditórios.

13- Deveria o Tribunal a quo ter considerado controvertida a matéria da notificação da Autora, devendo ser ordenada a baixa do processo à primeira instância para que Portal seja aberto um período de produção de prova testemunhal sobre os factos indicados nos artigos 15.° a 22.° da petição inicial da Autora.

14- O Tribunal a quo não se pronunciou quanto a factos alegados pela Autora, ora recorrente, nos artigos 21.°, 22.°, 23.°, 24.°, 31.°, 34.°, 36.° e 37.° da petição inicial da Autora/Recorrente.

15- A Autora/Recorrente, colocou à apreciação do Tribunal a quo a sua alegação quanto à não notificação do relatório e, nomeadamente, o documento 4 junto com a petição inicial, do qual deflui que não se encontra elencada a notificação do pedido de esclarecimentos.

16- A douta sentença recorrida, não se debruçou sobre a referida alegação, não tendo tomado qualquer posição quanto ao documento 4 junto com a petição inicial da Autora, que foi indicado como demonstrativo da alegação apresentada pela ora recorrente quanto à falta de notificação.

17- A sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, nos termos do disposto art.° 615.°, d) do CCP e art.° 608.° do CPC, aplicáveis ex vi do art.° 1.° do CPTA.  18- A recorrente não se conforma com a interpretação dos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08 levada a cabo na douta sentença recorrida, no que concerne às regras legais impostas ao funcionamento das plataformas eletrónicas, nomeadamente no que se refere às notificações e comunicações entre os intervenientes.

19- A douta sentença recorrida deu como provado no ponto 20 do facto assente / provado que a “VORTALgov”, informou a Autora/Recorrente através de e-mail de 01/10/2020, de que a publicação dos relatórios preliminar e final, e consequente pedido de esclarecimentos, é feita por mensagem, pelo que a notificação dos mesmos aparece no Gestor de Mensagens na plataforma Vortal. A notificação de publicação das listas de concorrentes e propostas é gerada no Megafone, mas não o teve em conta este facto na apreciação de direito.

20- Uma correta concatenação do procedimento instituído e assumido pela Vortal no que concerne à forma das notificações - sistema "Megafone", demandaria que o Tribunal a quo concluísse que, sendo esse o procedimento instituído para efeitos das disposições conjugadas dos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08, e tendo sido comprovado pela Autora/Recorrente que o mesmo não lhe foi comunicado por essa via que não foi dado cumprimento às exigências legais dos artigos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08.

21- Pelo que deveria o douto Tribunal a quo ter considerado que a notificação à Autora, ora recorrente, não cumpriu com o disposto nos art.° 24.°, 30.° e 61.° da Lei n.° 96/2015, de 17/08 (…)”.

* Notificada da interposição do recurso jurisdicional, o Recorrido produziu contra-alegações, que rematou nos seguintes termos: “(…) 1. O presente recurso, interposto pela Autora S. Lda., tem por objeto o despacho saneador sentença de 05.02.2021 proferido pela M. Juiz a quo, que julgou totalmente improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos apresentados pela Autora.

  1. A entidade Recorrida discorda de toda a motivação de facto e de direito que sustenta as alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, porquanto assenta em fundamentos que carecem manifestamente de sustentação legal, subscrevendo na íntegra o entendimento plasmado na douta sentença recorrida.

  2. Pretendia a Autora, ora Recorrente, com a prova testemunhal requerida na sua petição inicial, fazer prova de um facto negativo, isto é, de que não foi notificada do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e relatório final do júri do procedimento concursal em apreço nos presentes autos, pretendendo, como refere nas suas alegações de recurso, ilidir o suporte documental que foi junto pelo Réu.

  3. A prova documental, por comparação à prova testemunhal, é uma prova mais fidedigna, autêntica, segura e fiel. Há factos que apenas se provam através da prova documental, na medida em que existindo documentação que o comprove, de nada serve eventual prova testemunhal sobre os mesmos factos, pois não poderá a prova testemunhal, de forma alguma, abalar a prova documental apresentada sobre os mesmos factos.

  4. Exemplo disso mesmo são as notificações efetuadas por via eletrónica, as quais ficam registadas no respectivo servidor, dando origem à emissão dos respetivos recibos de envio e de receção, como é o caso das notificações efetuadas no âmbito do procedimento concursal em causa nos presentes autos.

  5. Havendo prova documental bastante - e cuja autenticidade não foi colocada em causa pela Autora ora Recorrente - de que a Recorrente foi notificada do pedido de esclarecimentos e dos relatórios preliminar e final no âmbito do presente procedimento concursal, é completamente inócuo qualquer prova testemunhal que venha contrariar a prova documental existente das notificações efetuadas.

  6. O Recorrido fez prova do facto positivo, ou seja, fez prova de que a Recorrente foi notificada do pedido de esclarecimentos, do relatório preliminar e do relatório final. E efetuou essa prova através de prova documental. A rainha das provas. Desta forma, a eventual prova testemunhal requerida pela Recorrente sobre os mesmos factos revelava-se totalmente inútil, desnecessária, irrelevante e dispensável.

  7. Cabe ao juiz ordenar as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade, podendo indeferir a prova requerida pelas partes, quando considere que as mesmas se revelam desnecessárias. In casu, face à indiscutível e inequívoca prova documental existente nos autos relativa às notificações efetuadas à Recorrente, era totalmente desnecessária e dispensável a prova testemunhal requerida pelas partes, na medida em que os factos controvertidos entre as partes se encontram sobejamente provados...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT