Acórdão nº 00352/15.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * I Relatório A., SA, devidamente identificada nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão judicial proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que, em 30 de Junho de 2020, julgou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela absolutamente incompetente para a apreciação da presente ação e, consequentemente, absolveu o Réu, aqui Recorrido, Município (...) da instância.
Em alegações, a Recorrente/A.
formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 30/06/2020 (...), e que absolveu o Réu da instância, ao julgar procedente a alegada exceção de incompetência absoluta, por preterição da cláusula arbitral, decidindo: “Em face do exposto, julgo este Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela absolutamente incompetente para a apreciação da presente ação e, consequentemente, absolvo o R. Município (...) da instância.” 2. Salvo o devido respeito, a decisão tomada pelo douto Tribunal a quo consubstancia-se num manifesto erro de julgamento, porquanto: 3. O presente litígio, tal como fora articulado pela Autora, ora Recorrente, prende-se com a falta de pagamento por parte do Município Réu, ora Recorrido, de montantes faturados pela Sociedade Concessionária.
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Os montantes faturados são devidos porquanto o Município (...), na qualidade de utilizador originário, está contratualmente obrigado a pagar os serviços de saneamento e abastecimento de água que lhe são fornecidos, nos termos do contrato de concessão e dos contratos de saneamento e fornecimento outorgados – tudo conforme alegado na PI.
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Resulta das Cláusula 1.ª e 3.ª do contrato de fornecimento de água e das Cláusulas 1.ª e 3.ª do contrato de recolha de efluentes, que a Sociedade Concessionária se obriga a fornecer água ao Município, destinada ao abastecimento público, e a recolher os efluentes provenientes do sistema próprio daquele, sendo a faturação de tais serviços apresentada mensalmente.
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Pelo que, a aqui Recorrente forneceu ao Município Recorrido os serviços de abastecimento de água e de saneamento (recolha e tratamento de efluentes), tendo faturado e exigido cobrança dos preços que foram legalmente estabelecidos.
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Motivo pelo qual, a presente ação administrativa de condenação, intentada pela Sociedade concessionária, é uma ação de cobrança de faturas (neste caso, faturas de serviços e juros de mora) que foram por esta emitidas e que não foram pagas pelo Município (...); 8. Pelo que o presente litígio, tal como foi configurado, preenche a exceção prevista na cláusula 9.ª/3 e 10.ª/3 dos contratos de fornecimento e de recolha de efluentes outorgados entre as partes, uma vez que a presente contenda está relacionada com a falta de pagamento de faturação emitida pela Sociedade Concessionária e não com a interpretação/execução do contrato de concessão.
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Pois que, tendo em consideração a teoria da impressão do destinatário, consagrada no art.º 236º, n.º 1 do CC, e que tão bem foi relembrada pelo douto Tribunal a quo na sentença proferida, sempre se deverá concluir pelo seguinte: 9.1. Nos termos do n.º 3 das cláusulas 9.ª e 10.ª dos contratos celebrados, todas as questões relacionadas com interpretação e execução dos contratos serão submetidas ao Tribunal Arbitral; 9.2. Com exceção das que respeitem à faturação emitida pela Sociedade e ao seu pagamento ou falta dele – como é o caso dos presentes autos! 10. E não pode a defesa apresentada pelo Recorrido, em sede de Contestação, ser pressuposto bastante para a subsunção do presente litígio à convenção arbitragem, porquanto as questões que possam estar relacionadas com a interpretação e execução do contrato de concessão e/ou dos contratos de fornecimento, apenas surgem enquanto “resposta” à cobrança judicial dos valores faturados pela Autora, ora Recorrente – não é o ora Recorrido, enquanto Município Utilizador, que se encontra a impugnar judicialmente o clausulado contratual, pois que este apenas levantou possíveis questões relacionadas com a interpretação/execução do contrato para obstar à pretensão da Autora.
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Tanto que, a defesa apresentada pelo Recorrido, apesar de estar relacionada com a execução do contrato (como sempre iria estar, pois que a própria faturação dos serviços prestados é matéria de execução do contrato!), não se consubstancia numa verdadeira impugnação das cláusulas do mesmo, porquanto o Recorrido limita-se a invocar a errada liquidação dos montantes peticionados, por considerar que deveria ter sido aplicada uma tarifa menor aos serviços prestados, fruto de um alegado “acordo” entre a CIMDT e o Ministério do Ambiente (o denominado “tarifário FETA”).
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Bem como assim, apenas invoca o incumprimento do Contrato de Concessão e, consequentemente, dos contratos de fornecimento e recolha (ou seja, uma exceção ao não cumprimento), para obstar à cobrança dos montantes peticionados – não impugnando qualquer cláusula contratual.
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Ou seja, o Recorrido aceita o clausulado dos contratos celebrados, bem como o contrato de concessão para o qual aqueles contratos remetem, tanto que pagou parcialmente as faturas em litígio.
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Pelo que, a questão decidenda dos presentes autos prende-se, exclusivamente, com a faturação da Sociedade Concessionária, ora Recorrente, ao aqui Recorrido, que se recusa a pagar os valores emitidos e faturados, por considerar que a Recorrente deveria ter aplicado o denominado “tarifário FETA” e por considerar que os termos dos contratos não foram cumpridos pela Recorrente.
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Motivo pelo qual o douto Tribunal a quo sempre deveria ter julgado totalmente improcedente a exceção de incompetência absoluta arguida pelo Recorrido, porquanto é em relação à ação configurada pela Autora, ora Recorrente, mormente na sua exposição de facto e de direito extraída da PI, que a competência material do Tribunal deve ser aferida – Cfr. artigo 5.º do ETAF.
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Discordando-se da tese interpretativa daquele douto Tribunal, quando afirma que, tratando-se de competência absoluta relacionada com o compromisso arbitral, a fixação do objeto da ação deverá ter em consideração todos os articulados apresentados pelas partes, não sendo de aplicar o artigo 5.º do ETAF (firmando tal interpretação nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 09.07.2015 (proc. n.º 1100/12.0TVPRT.G1) e de 08.03.2012 (proc. n.º 1387/11.5TBBCL-B.G1)).
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Salvo devido respeito, considera a Recorrente que aqueles Acórdãos citados não apoiam a interpretação que é levada a cabo pelo Tribunal a quo na sentença proferida, pois que aqueles Acórdãos referem expressamente que na determinação da competência absoluta dever-se-á atender, principalmente, à Petição Inicial apresentada, pois é através da mesma que se delimita o objeto da ação, bem como a causa de pedir.
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Pelo que, não pode a Recorrente conceder que tal normativo (artigo 5.º do ETAF) não possa ser aplicado aos presentes autos, porquanto a determinação da competência material é em tudo semelhante à determinação da competência absoluta aqui discutida (preterição, ou não, da cláusula arbitral), pois que é quanto ao objeto e à causa de pedir que a mesma deve ser fixada.
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Pelo exposto, e porque o presente litígio apenas está relacionado com a faturação de serviços prestados (e respetivos montantes a eles associados, como juros de mora), tudo conforme previsto no contrato de concessão e nos contratos de fornecimento e recolha de...
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