Acórdão nº 02577/12.9BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução28 de Abril de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.- Relatório Vem interposto recurso jurisdicional pela AUTORIDADE TRIBUTÁRIA e ADUANEIRA, visando a revogação da sentença de 27-03-2020, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A……………..

, melhor identificado nos autos, mantendo o acto de liquidação de IRS, mas determinando a anulação da liquidação de juros compensatórios e ordenando a restituição do montante indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios, à taxa de 4%, contados desde a data do pagamento indevido até ao processamento da nota de crédito.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Autoridade Tributária e Aduaneira as seguintes conclusões: A.

Conforme resulta da douta sentença recorrida, o Tribunal a quo, apesar de ter decidido a manutenção do ato de liquidação de IRS, determinou a anulação da liquidação de juros compensatórios e ordenou a restituição do montante pago, acrescido de juros indemnizatórios; B.

Não pode a Fazenda Pública conformar-se com a anulação da liquidação de juros compensatórios e, bem assim, com a condenação na restituição do montante pago, acrescido de juros indemnizatórios, porquanto entende existir erro de julgamento, dado que da prova produzida e levada aos autos da presente impugnação, não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida, atendendo às razões que passa a expender; C.

Conforme resulta do disposto no artigo 35.º da LGT, a responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de uma situação em que exista uma dívida de imposto (que serve de base ao cálculo dos juros) verificados os seguintes pressupostos: 1 – Actos ou omissões que levem a um atraso na estruturação de uma liquidação; ou 2 – Não pagamento de imposto que deva ser efectuado antecipadamente (sem prévia notificação do sujeito passivo pela administração tributária); ou 3 – Não pagamento de imposto que foi retido ou que deveria ter sido retido e entregue à administração tributária; ou 4 – Reembolso superior ao devido 5 – Atraso na liquidação ou entrega do imposto ou reembolso indevido imputáveis ao contribuinte, isto é, quando exista nexo de causalidade entre a actuação do contribuinte e aquele atraso ou reembolso; 6 – Que o retardamento ou reembolso seja imputável ao contribuinte a título de culpa (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, IV Volume, Áreas Editora, 6.ª edição, 2011, pág. 235); D.

Quanto aos pressupostos para a emissão da liquidação de juros compensatórios a Meritíssima Juiz a quo não teve dúvidas em afirmar que “se verificou um retardamento na liquidação de imposto” e que “se verifica o nexo de causalidade entre o comportamento do Impugnante e o retardamento da liquidação do imposto.”; E.

Contudo, considerou que quanto à imputabilidade ao contribuinte, a título de culpa, do retardamento, “(…) não é possível formular um juízo de censura à atuação do impugnante, não resultando provado nos autos, nem tendo sido demonstrada pela AT, que o enquadramento dado pelo mesmo, à situação em apreço, tenha sido propositado ou intencional, ou que sequer tenha havido má-fé da sua parte, antes decorrendo de diferente entendimento quanto ao enquadramento legal dos rendimentos em causa.”; F.

Não pode a Fazenda Pública conformar-se com tal conclusão, padecendo a douta decisão recorrida de erro de julgamento; COM EFEITO, G.

Para que o sujeito passivo deva juros compensatórios exige-se um nexo de causalidade adequada entre o seu comportamento e a falta de recebimento pontual da prestação, sendo que a conduta do sujeito passivo deve ser censurável a título de dolo ou negligência, devendo, em todo o caso, indagar-se se a culpa está ou não excluída em concreto (Conforme refere sobre esta matéria o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, ob. cit. pág. 146 e ss.) e sendo que a desculpabilidade ou razoabilidade, em termos de um contribuinte normal ou médio, do critério adoptado, em divergência com o Fisco, mesmo que erróneo, afasta a culpa, cfr. acórdão do STA, de 18.02.1998, P. nº 22325; H.

Considera ainda a jurisprudência que a culpa pode e deve ser excluída quando se mostre, à luz das regras de experiência e das provas obtidas, que o contribuinte atuou com a diligência normal no cumprimento das suas obrigações fiscais, considerando, assim, que não são devidos juros compensatórios quando o retardamento da liquidação se ficou a dever, por exemplo, a compreensível divergência de critérios entre a AT e o contribuinte quanto ao enquadramento e/ou qualificação de determinada situação tributária (como, por exemplo, a nível de custos fiscais) ou a erro desculpável do contribuinte (cfr. acórdão do STA, de 11.10.2011, p. n.º 04163/10); I.

Uma vez aqui chegados, importa referir que não ignorando a jurisprudência invocada na douta decisão judicial recorrida, que aliás supra igualmente se invocou, entende a Fazenda Pública que a Meritíssima Juiz a quo efetuou uma errónea interpretação e aplicação da mesma nos presentes autos; J.

Conforme resulta da douta decisão recorrida, entendeu a Meritíssima Juiz a quo que a atuação do contribuinte, tendo ficado a dever-se a diferente entendimento quanto ao enquadramento legal dos rendimentos em causa, afastava a formulação de um juízo de censura. Ora, salvo melhor opinião, não cremos ter sido esse o entendimento que se mostra vertido, entre outros, no acórdão do STA, de 11.10.2011, p. n.º 04163/10; K.

Desde logo, porque grande parte dos litígios existentes entre os contribuintes e a AT se reconduzem a divergências de interpretação ou enquadramento legal, e nem por isso as liquidações de juros compensatórios, a que eventualmente haja lugar, padecem de ilegalidade, nem tal circunstancialismo obsta à formulação de juízo de censura no caso em que os contribuintes optam por omitir rendimentos auferidos; L.

Acresce que, conforme resulta da jurisprudência invocada, não basta uma mera divergência de critérios entre a AT e o contribuinte quanto ao enquadramento e/ou qualificação de determinada situação tributária para que seja excluída a culpa do contribuinte, é, ainda, necessário que tal divergência seja “compreensível”, circunstância que a Meritíssima juiz a quo não tomou em consideração; M.

No caso dos autos, certo se tornava concluir que a atuação do Impugnante, traduzida na não declaração de rendimentos auferidos em determinado ano, é reprovável.

N.

Com efeito, todo o “homem médio” tem conhecimento de que o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares incide sobre os rendimentos auferidos em determinado ano e que os mesmos devem ser declarados, dentro dos prazos legalmente estabelecidos, à AT para efeitos de liquidação de imposto; O.

Acresce que a dúvida sobre a sujeição de determinado rendimento a tributação também não se afigura natural ou compreensível, considerando que o Impugnante tinha conhecimento de que uma terceira entidade, in casu a Seguradora, tinha qualificado os rendimentos em causa como rendimentos da categoria A de IRS; P.

Para além disso, o Impugnante não sustentou ou alicerçou o seu entendimento sobre a não sujeição a imposto numa qualquer informação oficial da AT ou numa eventual declaração da sua entidade patronal, ou até numa interpretação veiculada pela doutrina ou pela jurisprudência sobre tal matéria, que o pudesse ter induzido em erro; Q.

Em face do circunstancialismo dos presentes autos, outra não pode ser a conclusão que não a de que por facto a si imputável foi retardada a liquidação do imposto devido, uma vez que a omissão de declaração dos rendimentos em causa não se mostra compreensível ou desculpável, mas sim reprovável, sendo, pois, devidos, pelo Impugnante, os juros compensatórios liquidados; R.

Mostrando-se devida a liquidação de juros compensatórios, inexiste qualquer erro imputável aos serviços, pelo que não se mostram devidos quaisquer juros indemnizatórios; S.

Em face do exposto, ao não ter o Tribunal a quo considerado que a liquidação de juros compensatórios se mostrava devida, por se mostrarem reunidos todos os requisitos legais para o efeito e que por não se verificar qualquer erro imputável aos serviços não se mostravam devidos quaisquer juros indemnizatórios ao Impugnante, incorreu em erro de julgamento por inadequada valoração da matéria de facto e errónea interpretação e aplicação dos dispositivos legais aplicáveis, nomeadamente dos artigos 35.º e 43.º da LGT, erro com o qual não pode a Fazenda Pública conformar-se, devendo a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que determine a total improcedência da impugnação.

Termos em que com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogada a sentença ora recorrida e substituída por outra que determine a total improcedência da impugnação, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! Não houve contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso, no seguinte parecer: “O presente recurso vem interposto pela Fazenda Pública visando a reapreciação da decisão proferida em 27/03/2020 que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A………….., nos termos da qual, apesar de manter o acto de liquidação de IRS questionado, determinou a anulação da liquidação de juros compensatórios e ordenou a restituição do montante indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios, à taxa de 4%, contados desde a data do pagamento indevido até ao processamento da nota de crédito.

São as conclusões da Alegação da Recorrente que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontram nos autos os elementos necessários à sua consideração (cf. artº 635º nº 4 do CPC, ex vi...

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