Acórdão nº 761/20.0BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | JORGE PELICANO |
Data da Resolução | 21 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.
O Instituto de Protecção e Assistência na Doença, I.P.
(ADSE), vem interpor recurso da sentença proferida no TAF de Leiria que decretou a providência cautelar de “suspensão da eficácia do acto administrativo consubstanciado no parecer da junta médica da ADSE, proferido em 03.08.2020”, bem assim como a suspensão de eficácia da decisão proferida pelo Director da Escola Secundária de Peniche, que atribuiu à docente F...
, aqui Recorrida, um horário de trabalho lectivo.
Apresentou as seguintes conclusões com as suas alegações de recurso: 1. “Discute-se na presente lide a suspensão da eficácia do parecer da Junta Médica da ADSE, proferido em 03.08.2020, não se conformando o ora recorrente com a Douta Sentença recorrida.
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Salvo o devido respeito que merece, mal andou a Sentença ora recorrida quando entendeu estarem preenchidos os pressupostos legais elencados no n.° 1 e 2 do art.° 120° do CPTA.
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Na verdade, o aqui recorrente entende que o parecer da Junta Médica da ADSE, I.P. não consubstancia um ato administrativo impugnável, inexistindo assim fumus boni iuri que permita o decretamento da providência.
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Entende o recorrente, atendendo à jurisprudência bem firmada sobre a questão, que o parecer médico da ADSE é um ato preparatório, meramente opinativo e sem caráter vinculativo, e que não tem autonomia relativamente à decisão final que vier a ser proferida pela entidade competente, nem dela é destacável e, nesta medida, não é impugnável ou recorrível autonomamente, (cfr. Acórdão de 6 de maio de 1993 do STA, recurso n.° 32759, e acórdão de 05.07.2001, do TCAS proferido no processo n.° 10225/00).
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Alias, o parecer médica da Junta da ADSE não se projeta direta e imediatamente na esfera do particular, nem define a situação jurídica da administração ou do particular, (cfr., neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 1993 do STA, recurso n.° 32215).
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Na verdade, a junta médica da ADSE colabora sim enquanto órgão auxiliar com a entidade empregadora com competência dispositiva na matéria na instrução dos procedimentos de justificação de faltas por doença dos trabalhadores em funções públicas, com a consequência de, em caso afirmativo, retomar plena vigência o dever de assiduidade a que o trabalhador está sujeito e que havia ficado suspenso por força da baixa médica.
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Pois que se um trabalhador, contra o parecer da Junta, não regressar ao serviço, por entender, quiçá com base em outro parecer médico, que ainda não está em condições, do ponto de vista clínico, de retomar o exercício das suas funções, não desobedece à junta, que nenhuma sanção lhe poderá aplicar, mas poderá sim eventualmente violar o dever de assiduidade e incorrer em infração disciplinar ou sofrer outras consequências legalmente previstas para o facto, a verificar e atuar pelo seu competente superior hierárquico.
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Em suma, não obstante o tom injuntivo, quase de uma ordem, em que por vezes é feita a comunicação administrativa pela Junta, enquanto órgão consultivo, à entidade empregadora pública da aptidão do trabalhador para regressar ao serviço, ela tecnicamente não é uma decisão, nos termos do art.° 148 do CPA e do art.° 51 do CPTA, e por isso é inimpugnável.
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A sentença recorrida padece do vício de má interpretação do artigo 153° do CPA fazendo uma incorreta interpretação e aplicação dos termos definidos no art.° 11o, n,°1 e 2 do Decreto Regulamentar n.° 41/90 10. O recorrente entende que os juízos que emanam das juntas médicas são somente juízos técnicos, de natureza médica, formulados conforme regras próprias da ciência médica, que implicam um juízo especializado sobre a matéria, cuja atividade encontra-se inserida na chamada discricionariedade técnica, própria das ciências médicas.
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Nessa medida, não pode o Tribunal - como pretende o Tribunal a quo - sindicar aquele juízo técnico de natureza médica, a menos que se verifique uma situação extrema de erro, ou juízos ostensivamente inconsistentes ou arbitrários, o que não aconteceu no parecer da Junta Médica da ADSE aqui em discussão 12. Na realidade, aconteceu na junta médica de 03.08.2020 que, face à manutenção das queixas e sintomas do foro ortopédico, resultantes de patologia degenerativa e do foro, foi entendimento dos peritos médicos que não se justificava a manutenção da incapacidade temporária absoluta.
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Efetivamente sendo a patologia apresentada pela requerente de natureza crónica, embora limitativa das suas funções não justificativa de incapacidade permanente, foi deliberado o seu regresso ao serviço desempenhando tarefas moderadas, especificando que deveriam ser evitados esforços físicos e situações de grande stress emocional atendendo às patologias apresentadas.
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Por isso para recorrente o parecer da junta médica da ADSE em 03.08.2020 obedeceu a todas as disposições constantes do Decreto Regulamentar n.° 41/90. de 29.11 que lhe são aplicáveis, nomeadamente o disposto no n.° 2 do artigo 11.°.
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Por outro lado, nada na lei exige que a Junta Médica da ADSE se pronuncie sobre cada facto evidenciado pela requerente.
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Também não é suposto que a junta médica da ADSE identifique as tarefas que a requerente pode ou não realizar, porquanto é do desconhecimento completo e total da Junta as tarefas correspondentes ao conteúdo funcional da respetiva carreira efetivamente exercidas, nem resulta do regime legal referido na alínea d) do n.° 2 do artigo 11.° do Dec. Reg 41/90, de 29 de novembro, a identificação discriminativa de tarefas que o trabalhador deve realizar.
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Assim, não se aceita que o Tribunal a quo considere procedente o vício na falta de fundamentação do parecer da junta médica nos termos da parte final do art.° 11° n.° 2 al. d) do Decreto Regulamentar n.° 41/90, 29.11.
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Por fim, a Sentença ora recorrida incorreu em erro na apreciação da prova, que influenciou o julgamento meramente indiciário da providencia cautelar, pois que é inaplicável ao caso a presunção prevista no art.° 351° do Código Civil, como pretende o Tribunal a quo nos pontos T) e U) dos factos provados.
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O ora recorrente entende que os factos referidos nos pontos C), F) e H) não são suficientes para inferir que, com toda a probabilidade, se verificou os factos referido nos pontos T) e U), uma vez que que no caso o Tribunal se socorreu apenas de prova documental, a qual deveria ter sido complementada de prova testemunhal - a qual foi dispensada pela não realização da audiência prévia -, pelo que, não estando verificados os pressupostos do art.° 351 ° do CC, nem resultando tais factos de qualquer outro meio de prova produzido nestes autos, os mesmos devem ser considerados não provados.
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Termos em que está demonstrado que a sentença recorrida padece, assim de erro de julgamento e incorreta aplicação do direito aos factos, violando o disposto na primeira parte do n°1 do artigo 120° do CPTA, e ainda o disposto nos artigos 51.° n.°1 do CPTA, artigos 148° e 153°, ambos do CPA, artigo 11.° do Dec. Reg. 41/90, de 29 de novembro, e artigo 351.° do CC.
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Assim, entende o Recorrente estar a sentença ferida dos vícios que lhe são assacados, devendo ser proferida decisão que julgue improcedente o pedido de adoção da providência cautelar de suspensão do parecer da junta médica da ADSE proferido em 03.08.2020.
Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, que vossas excelências superiormente quiserem suprir, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, com o que, V. Excelências, Senhores Juízes Desembargadores, farão Justiça!”.
* O Ministério da Educação não apresentou alegações.
A Recorrida formulou as seguintes conclusões nas contra-alegações: 1. “A Recorrente não se conformando com a Douta Sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo, apresentou as suas alegações, pedindo que este Venerando Tribunal decida de modo diametralmente oposto ao decidido pelo referido Tribunal e em consequência seja revogada a Douta Sentença ora recorrida.
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Douta Sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz fez a melhor apreciação da prova produzida nos presentes autos e aplicação do Direito aos factos considerados provados nos autos, não apresentando a Recorrente nas suas alegações, por ser manifestamente impossível, qualquer razão de facto ou de direito plausível para sustentar a sua pretensão.
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A Recorrente Instituto de Proteção e Assistência na Doença, I.P,R.
não concordando com a Douta Sentença vem por em causa a referida sentença com os seguintes fundamentos: • A decisão da Junta Médica da ADSE, I.P. consubstancia ou não um ato administrativo impugnável; • Da alegada má interpretação do artigo 153° CPC e do artigo 11° do Decreto Regulamentar n.° 41/90.
• Do alegado erro na apreciação da prova, por inaplicabilidade do disposto no artigo 351° do Código Civil.
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A Argumentação apresentada pela Recorrente Instituto de Proteção e Assistência na Doença, I.P.R.
carece in totum de fundamento ou razoabilidade, pelo que, bem andou o Douto Tribunal a quo quando fundamentou que: “O referido parecer não pode deixar de ser qualificado como um verdadeiro ato administrativo".
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E para tal entendimento baseou e aderiu a sua fundamentação da decisão proferida no Acórdão do TCAS de 05.05.2016, proferido no processo 13143/16, visto que se trata de um caso similar ao que se discute nos presentes autos.
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Ora, o Parecer proferido pela ADSE tem a faculdade de determinar se o trabalhador está ou não apto a regressar ao trabalho, e este tem de se apresentar ao serviço para que não incorra numa falta injustificada, nos termos do disposto no artigo 29° da lei n.° 35/2014 de 20.06.
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Esta pronuncia vincula desde logo o trabalhador que se vê obrigado a comparecer no local de trabalho no dia seguinte.
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Nos termos do disposto no artigo 148° do CPA " Para efeitos do disposto no presente Código, consideram-se atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes jurídico- administrativos, visem...
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