Acórdão nº 260/21 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

3.ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em que é reclamante A. e reclamada B., S.A. (que sucedeu a C., S.A.R.L.), a primeira interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento, além do mais, no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada pela sigla LTC) do acórdão, proferido em conferência, por aquele Supremo Tribunal em 17 de dezembro de 2020 (fls. 167-176) que indeferiu a reclamação apresentada de despacho do Relator de 21 de outubro de 2020 (fls. 142-148) que, por seu turno, indeferiu a reclamação e confirmou o despacho reclamado que não admitiu a revista interposta pela ora reclamante.

2. É este o teor da decisão recorrida para este Tribunal (fls. 167-176):

«Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça:

No âmbito dos autos de execução para pagamento de quantia certa que C. S.A.R.L., moveu a A. e outros, na sequência de reclamação dos executados, na qual vieram invocar a prescrição do crédito e de juros e questionar a liquidação feita pela exequente e após vários desenvolvimentos processuais, veio a ser proferido o seguinte despacho:

"Quanto ao requerimento dos executados de 28.03.2019:

Alegam os executados que não foi feita interpelação para a resolução do contrato de mútuo, tendo a exequente optado pela sua execução imediata.

Por isso, os montantes reclamados a título de juros remuneratórios aquando da instauração da presente execução são ilegais e indevidos, por nem sequer serem exigíveis à luz da normas e princípios mencionados, caindo por terra os €60.704,46 peticionados a esse título. 

Terminam pugnando, a final, pela iliquidez da divida, por não ter sido dado cumprimento ao ordenado nos respetivos despachos tornando a quantia reclamada inexigível e admitem somente a existência de capital em dívida no valor de €46.710,60, considerando as normas citadas, os cálculos e documentos apresentados pelos Executados.

A exequente pronunciou-se, defendendo que a dívida exequenda é certa, líquida e exigível, devendo os valores peticionados no requerimento executivo manter-se nos seus exatos termos.

Apreciando:

A defesa pelos executados, através do requerimento que ora se aprecia, de iliquidez e inexigibilidade da dívida versa matéria que deveria ter sido, em sede e tempo próprios, alvo de instauração de embargos de executado (nos termos previstos nos artigos 729.0 a 731. ° do Código de Processo Civil).

Não o tendo feito no momento temporal certo, preclude o direito dos executados de os executados embargarem atualmente.

Deste modo, as considerações atinentes à exigibilidade da dívida exequenda não podem ser acolhidas.

Aliás, essa mesma asserção poderá ser extraída do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, a saber: "A executada já não pode discutir os termos da liquidação indicada na petição executiva, salvo mostrando que existiu um erro de cálculo sempre retificável, porque a Executada nada disse no prazo da oposição à execução, o que implica aceitação da liquidação "

Pelo exposto, tendo os executados tentado apresentar matéria de oposição à execução nesta execução sem respeitar a forma e o tempo próprios para o efeito, o seu requerimento de 28.02.2019 terá de ser indeferido por falta de fundamento legal.

Notifique e comunique "

Na sequência e no âmbito de apelação da executada A., a Relação de Coimbra, sem voto de vencido, apenas revogou parcialmente a decisão recorrida, no sentido de determinar o abatimento à quantia exequenda do montante de 4.547.90 €. Na sequência do pagamento extrajudicial efetuado a 18 de janeiro de 2018. 

Inconformada, interpôs a executada/apelante recurso de revista normal.

Todavia, na Relação, por despacho da respetiva Relatora, a revista não foi admitida. nos seguintes termos:

"A Executada/Apelante vem, por requerimento de 19.06.2020, interpor RECURSO DE REVISTA do Acórdão proferido por este tribunal em 18 de fevereiro de 2020, na parte em que não revogou a decisão recorrida, ou seja, na parte em que confirmou a decisão da primeira instância.

Tratando-se, nesta parte, de uma situação de dupla conforme - decisão que confirma, sem voto d evencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na Ia instância - o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça só se encontra previsto nas situações excecionais das alíneas a) a c) do n° 1 do artigo 672°, do CPC (artigo 671°, n° 3, CPC).

Assim sendo, não se admite o recurso de revista interposto pela Executada/Apelante, por inadmissibilidade legal.

Custas a suportar pela recorrente (artigo 7.º, n° 2, RCP) "

Mais uma vez inconformada, interpôs a recorrente reclamação, pugnando pela admissão da revista.

Alegou, para o efeito e em resumo, que inexiste dupla conforme uma vez que a apelação foi julgada parcialmente procedente, não havendo confirmação integral da decisão e uma vez que os fundamentos do acórdão da Relação "não são fundamentalmente idênticos ao do decidido pela primeira instância"

E, subsidiariamente, em caso de inadmissibilidade da revista normal, veio requerer que o recurso seja admitido como revista excecional. invocando para o efeito os requisitos a que aludem as alíneas a) e b) do artigo 672° do CPC. 

Subidos os autos, pelo Relator, foi proferida decisão, na qual se indeferiu a reclamação, sendo confirmado o despacho reclamado (do Relator da Relação-) que não admitiu a revista.

*

De novo inconformada, veio a reclamante apresentar reclamação para a conferência, pugnando uma vez mais pela admissão da revista, como revista normal ou como revista excecional.

Para o efeito reafirma a inexistência de dupla conforme, pelo facto de a apelação ter sido julgada parcialmente procedente e pelo facto de os fundamentos invocados pelas instâncias não serem fundamentalmente idênticos.

E diz ainda que o facto de o recurso ter sido interposto como revista "normal", não impede a sua admissão/convolação como revista excecional, cabendo a sua admissão à formação a que alude o n.° 3 do art. 672° do CPC, sendo que cumpriu os respetivos requisitos específicos, designadamente, para efeitos do cumprimento do artigo 672° n.° 2 a) e b) do C.P.C, indicando na reclamação as razões pelas quais considera que as questões suscitadas na apelação são necessárias para uma melhor aplicação do direito e assumem uma particular relevância social.

A parte contrária veio tomar posição no sentido do indeferimento da reclamação.

Cumpre decidir:

No despacho do Relator, a reclamação contra a não admissão (na Relação) da revista foi indeferida nos seguintes termos:

"]) Nos termos do disposto no n° 3 do artigo 671° do CPC, a menos que em causa esteja uma situação em que o recurso é sempre admissível (do n° 2 do artigo 629° do mesmo diploma) - o que não é o caso dos autos, nem sequer tal foi invocado - a revista apenas pode ser admitida como revista excecional, desde que sejam invocados e julgados verificados pela Formação a que alude o n° do artigo 672° do CPC, os requisitos a que aludem os n°s 1 e 2 deste artigo, quando a Relação confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão da Ia instância.

2) Conforme supra referido, a Relação, com exceção de uma pequena parte, confirmou a decisão da Ia instância, sem voto de vencido - sendo que a revista interposta pela ora reclamante (apenas como revista normal) incide precisamente sobre a parte do acórdão da Relação que confirmou o decidido pela 1" instância.

Coloca a reclamante a questão da existência do obstáculo da dupla conforme à admissão da revista no que respeita à parte do acórdão recorrido que confirmou a improcedência das pretensões formuladas.

Todavia, sem razão, na medida em que, nessa parte, existe confirmação e é sobre ela que incide a revista - conforme tem sido entendido pacificamente na jurisprudência, designadamente na jurisprudência deste Tribunal.

Sobre esta questão da existência de dupla conforme quando o recorrente viu a sua situação "melhorada " vide Acórdãos do STJ (in Sumários dos Acórdãos do STJ):

De 17-10-2019, in Revista n.° 7223/12.8TBSXL-A.L1.SI:

"Porque o espirito da lei é o de restringir o acesso ao STJ quando as instâncias decidiram no mesmo sentido e sem fundamentação essencialmente diferente, à situação de absoluta conformidade das decisões é de equiparar aqueloutra em que a parte descontente vê a sua situação melhorada com a decisão da 2." instância, caso em que igualmente se deve dar como existente a dupla conforme

De 21-02-2019, in Revista n. ° 1589/13.0TVLSB-A.L1.SI:

"I - Consagra-se no art. 671°, n.° 3, do CPC a regra da "dupla conforme", a qual estatui a inadmissibilidade do recurso de acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1." instância. (...) IV - Apresentando-se a decisão da Relação, no que toca à quantificação dos danos patrimoniais sofridos pelo autor como mais favorável do que a da 1." instância, dado que aquela os fixou em € 80 000,00 e a Relação em € 90 000,00, verifica-se, igualmente, nesta parte, uma situação de dupla conforme, impeditiva da admissibilidade do recurso de revista interposto pelo autor, porquanto se a improcedência total da apelação obstaria à interposição do recurso, então também a sua improcedência parcial não pode deixar de produzir, por idêntica razão, o mesmo efeito impeditivo.

- E de 27-09-2018, in Revista n, ° 634/15.9T8A W. G1-A.S1:

"I - Prevalece actualmente na jurisprudência do STJ a tese segundo a qual é de equiparar à dupla conforme os casos em que o acórdão da...

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