Acórdão nº 01719/20.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução09 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A., Lda., com sede na Rua (…), instaurou acção de contencioso pré-contratual contra o Município (...), com sede na Rua (…), impugnando a deliberação da Câmara Municipal, datada de 10/08/2020, que determinou a exclusão das propostas por si apresentadas aos Lotes 1 e 2, no âmbito do concurso público para a empreitada designada “Reabilitação Energética dos Empreendimentos Prof. Carlos Alberto Mota Pinto – Pedroso e Rosa Mota – (...)”, bem como a adjudicação do Lote 1 à proposta da concorrente “J., Lda.” e a não adjudicação do Lote 2, por exclusão de todas as propostas.

Pediu: a) a nulidade, ou caso assim não se entenda, a anulação dos actos de exclusão das propostas por si apresentadas para os lotes 1 e 2, o acto de adjudicação do lote 1 à entidade “J.”, o acto de não adjudicação do lote 2, por terem sido excluídas todas as propostas apresentadas, bem como todos os actos consequentes, incluindo os respectivos contratos, se entretanto, celebrados; b) a condenação do Réu na admissão e adjudicação das propostas da Autora para os lotes 1 e 2; c) a condenação do Réu a abster-se de celebrar o contrato adjudicado à entidade “J.” ou, caso o contrato já tiver sido celebrado, a abster-se de praticar qualquer acto de execução do mesmo; e d) a anulação do contrato que tiver sido celebrado com o Réu para o lote 1. Identificou, como Contra interessadas: 1 - J., Lda., com sede na Rua (…); 2 - R., S.A., com sede na Rua (…); 3 – D., Lda., com sede na Rua (…); 4 – T., Lda., com sede na Rua (…); 5 N., Lda., com sede na Rua (…); e 6 – P., Lda., com sede na Rua (…).

Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a acção e: a) Anulado o acto de exclusão das propostas apresentadas pela Autora aos Lotes 1 e 2; b) Anulado o acto de adjudicação do Lote 1 à proposta apresentada pela CI J., bem como o contrato celebrado entre o Réu e a CI, caso o mesmo já tenha ocorrido, e, consequentemente, anulados todos os actos subsequentes; c) Anulado o acto de não adjudicação do Lote 2, por terem sido excluídas todas as propostas aí apresentadas; e d) Condenado o Réu a readmitir as propostas da Autora aos Lotes 1 e 2, bem como a adjudicar-lhe os respectivos contratos de empreitada concursados.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu Município formulou as seguintes conclusões: A.

Vem o presente recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que, no âmbito do concurso público para a contratação de uma empreitada com dois lotes (lote 1 e lote 2): (i) anulou o ato de exclusão das propostas da Recorrida aos lotes 1 e 2; (ii) anulou o ato de adjudicação do lote 1; (iii) anulou o ato de não adjudicação do lote 2; e (iv) condenou o ora Recorrente a readmitir as propostas apresentadas pela Recorrida aos lotes 1 e 2 e a adjudicar os referidos lotes às suas propostas e a celebrar os respetivos contratos.

B.

A sentença recorrida padece de vários erros de julgamento de direito, pois deveria o Tribunal a quo ter julgado a ação totalmente improcedente, mantendo os atos de adjudicação do lote 1 e de não adjudicação do lote 2, uma vez que os mesmos respeitam as disposições legais e regulamentares invocadas pela sentença recorrida.

C.

Em primeiro lugar, incorre a sentença num erro de julgamento de direito, ao entender que os atos de exclusão das propostas da Recorrida aos lotes 1 e 2 e, consequentemente, os atos de adjudicação/não adjudicação dos referidos lotes, padecem de um vício de violação de lei, em concreto, das alíneas n) e o) do n.º 2 do artigo 146.º, e bem assim, da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º, ambos do CCP.

D.

Na verdade, tais propostas não poderiam deixar de ter sido excluídas pelo Recorrente, pois o conteúdo dos planos de trabalhos apresentados pela Recorrida é manifestamente insuficiente para cumprir as exigências vertidas no CCP e nas peças do procedimento.

E.

O plano de trabalhos (em sentido amplo) é constituído por quatro elementos, a saber: (i) um plano de trabalhos em sentido estrito, ou seja, um diagrama com a fixação da sequência e dos prazos de execução de cada uma das espécies de trabalhos; (ii) um plano de mão-de-obra com a especificação dos meios humanos que serão alocados à execução de cada uma das espécies de trabalhos; (iii) um plano de equipamento com os equipamentos ou meios materiais alocados à execução de cada uma das espécies de trabalhos; (iv) e um plano de pagamentos, em que o empreiteiro indica, em função dos preços unitários e da sequência e prazo em que os trabalhos serão executados, a forma como o dono da obra procederá aos pagamentos.

F.

Além de ser um instrumento essencial para a fiscalização e acompanhamento dos trabalhos, o plano de trabalhos revela-se, ainda, essencial para um conjunto de decisões que devem podem ser tomadas no decurso da execução de uma empreitada de obras públicas.

G.

A ser necessária a execução de trabalhos complementares da mesma espécie, a alínea a) do n.º 1 do artigo 373.º do CCP determina a aplicação dos prazos parciais de execução, previstos no plano de trabalhos para essa espécie de trabalhos.

H.

O plano de trabalhos serve ainda, por exemplo, para determinar as consequências decorrentes da suspensão parcial de uma frente de obra (cfr. n.º 2 do artigo 298.º do CCP), permitindo saber qual o período de prorrogação de prazo que será necessário e que meios humanos/equipamentos deixam de estar afetos à obra, enquanto a suspensão se mantiver.

I.

De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 361.º do CCP e da alínea d) do ponto 10.2 do Programa do Concurso, o plano de trabalhos em sentido estrito, o plano de mão-de-obra e o plano de equipamentos deveriam apresentar todas as “espécies de trabalhos” previstas no mapa de quantidades e ser compatíveis entre si, sob pena de exclusão da proposta.

J.

Os planos de equipamentos e de mão-de-obra apresentados pela Recorrida não têm por referência quaisquer “espécies de trabalhos”, limitando-se a apresentar uma listagem dos equipamentos/meios humanos que serão empregues em cada um dos diversos meses da execução do contrato.

K.

No caso dos dois planos de equipamentos e de mão-de-obra apresentados pela Recorrida, a discussão não se centra, pois, em saber se os trabalhos neles identificados correspondem, ou não, a “espécies de trabalhos”, nos termos e para os efeitos do artigo 361.º do CCP e da alínea d) do ponto 10.2 do Programa de Concurso, porquanto não foram aí identificadas quaisquer espécies de trabalhos.

L.

A sentença encerra, assim, um claro erro de julgamento, quando conclui, em face do conteúdo dos planos em apreço, que os mesmos consideram a afetação dos meios humanos e equipamentos aos meses de execução do contrato e às “espécies de trabalhos”; erro esse, que inquina todo o seu sentido decisório.

M.

São erradas todas as conclusões que o Tribunal a quo extrai após esse erro de julgamento, e que são uma decorrência do reconhecimento de um conteúdo da proposta da Recorrida que não corresponde à realidade, vertida nos factos dados como provados.

N.

Não corresponde, assim, à matéria de facto dada como provada que exista uma absoluta correspondência entre os planos que compõem o plano de trabalhos em sentido amplo, ou que é possível à fiscalização da obra verificar diretamente quantos recursos humanos estarão a cada momento afetos a cada “capítulo” de trabalhos, conforme se refere na sentença recorrida O.

Saber quais os meios humanos e equipamentos que serão afetos a cada um dos meses de execução da empreitada não é suficiente para cumprir o exigido no Programa do Concurso ou no artigo 361.º do CCP.

P.

Não existe uma compatibilização entre os diversos elementos que integram o plano de trabalhos em sentido amplo, se o plano de equipamentos e o plano de mão-de-obra identificam os meios por referência aos meses de execução da empreitada, sem qualquer referência aos trabalhos em que os mesmos serão utilizados, e o plano de trabalhos em sentido estrito planeia a obra por capítulos do mapa de quantidades.

Q.

Não é possível, através da análise dos planos de mão-de-obra e de equipamentos apresentados pela Recorrida, saber que meios humanos e equipamentos serão afetos à execução daquilo que a mesma qualifica como “espécies de trabalhos” nos seus planos de trabalhos em sentido estrito, pois em cada mês de execução da obra serão executadas várias das “espécies de trabalhos” em simultâneo.

R.

Os planos de mão-de-obra e de equipamentos não permitem, assim, a cabal fiscalização da obra e a aplicação do regime respeitante à execução de trabalhos complementares da mesma espécie, entre outros fins que o plano de trabalhos em sentido amplo cumpre durante a execução de uma empreitada de obras públicas.

S.

Se é certo que tal seria suficiente para excluir as propostas da Recorrida, a verdade é que os seus planos de trabalhos em sentido estrito também não respeitam o n.º 1 do artigo 361.º do CCP e a alínea d) do ponto 10.2 do Programa do Concurso, já que não contemplam todas as espécies de trabalhos.

T.

Os planos de trabalhos em sentido estrito apresentados pela Recorrida versam apenas os “grandes capítulos de trabalho” indicados no mapa de quantidades, que incluem trabalhos muito diferentes e dotados de verdadeira autonomia.

U.

Ainda que se entenda que o conceito de “espécies de trabalhos” não se confunde com cada um dos artigos do mapa de quantidades, facto é que o mesmo não pode simplesmente corresponder aos capítulos deste mapa de quantidades, sob pena de o plano de trabalhos se revelar absolutamente imprestável para os fins a que se destina.

V.

A posição sustentada pela Recorrida, quando levada ao limite, faria com que o concorrente apenas tivesse de apresentar no seu plano de trabalhos em sentido estrito uma linha contínua, a qual respeitaria à execução de todos os trabalhos, sem cuidar de indicar os prazos parciais, rendimentos e meios humanos e equipamentos com que se propõe executar cada um...

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