Acórdão nº 188/21 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Abril de 2021

Data08 Abril 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 188/2021

Processo n.º 997/2020

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam, em conferência, na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Veio a recorrente A. apresentar reclamação, ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, da decisão sumária n.º 753/2020, que concluiu pelo não conhecimento do recurso.

2. Releva para melhor compreensão da presente reclamação que o recurso é incidente de ação declarativa que a ora recorrente instaurou contra B., no âmbito da qual, por sentença proferida em 1.ª instância, a ação foi julgada totalmente improcedente e o réu absolvido dos pedidos, sendo, inversamente, a reconvenção julgada parcialmente procedente e, em consequência, a autora condenada a pagar ao réu as quantias de € 100.000,00, a título de cláusula penal, e de € 10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora.

Desta sentença interpôs a autora recurso para o Tribunal da Relação do Porto. Notificado, sustentou o réu, no que ora releva, a extemporaneidade do recurso. Respondendo, a autora pugnou pela tempestividade do recurso que interpôs e, subsidiariamente, invocou a ocorrência de justo impedimento. Foi então proferido despacho que não admitiu, por extemporaneidade, quer a arguição de justo impedimento, quer o recurso interposto para a relação.

Inconformada, a autora apresentou reclamação da parte do despacho que não admitiu o recurso e interpôs recurso do segmento do despacho que indeferiu o justo impedimento. Apreciando este recurso, o Tribunal da Relação do Porto, por via de acórdão prolatado em 22 de outubro de 2020, confirmou a decisão.

3. O recurso, deduzido ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, toma como objeto formal esse acórdão e peticiona a apreciação de inconstitucionalidade «por ofensa aos princípios constitucionais consagrados nos arts. 2º, 18º e 20º da Constituição da República, [d]a última parte da citada norma do nº 2 do art. 140º do CPC, ou, e, [d]a norma criada pelas instâncias e que arranca da interpretação daquela, consistente e no sentido de exigir à A./apelante que, juntamente com a apresentação do requerimento de interposição de recurso e do requerimento de apresentação das alegações no dia imediatamente seguinte à cessação do evento que causou o justo impedimento, apresente também o requerimento de invocação desse mesmo justo impedimento, sob pena de não ser admitida a prática do ato de interposição de recurso de apelação».

4. A decisão sumária reclamada afastou o prosseguimento do recurso e o seu conhecimento, por inverificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade interposto. Lê-se na decisão:

«6. No caso dos autos, no tocante à questão reportada à norma contida na última parte do n.º 2 do artigo 140.º do Código de Processo Civil (CPC), importa desde já afastar o conhecimento do recurso, por inverificação do pressuposto de prévia suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido (alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º e n.º 2 do artigo 72.º, ambos da LTC). Com efeito, percorrendo a motivação do recurso apresentado ao Tribunal da Relação, verifica-se que a recorrente não suscitou, perante o tribunal recorrido, a inconstitucionalidade da identificada norma on its face, mas de uma interpretação, que aponta à decisão recorrida e considera extraída do referido preceito legal, o que basta para determinar a ilegitimidade formal da recorrente para o recurso.

7. Quanto à pretendida apreciação do n.º 2, última parte, do artigo 140.º do CPC, interpretado «no sentido de exigir à A./apelante que, juntamente com a apresentação do requerimento de interposição de recurso e do requerimento de apresentação das alegações no dia imediatamente seguinte à cessação do evento que causou o justo impedimento, apresente também o requerimento de invocação desse mesmo justo impedimento, sob pena de não ser admitida a prática do ato de interposição de recurso de apelação», resulta claro do enunciado adotado que não se mostra formulado verdadeiro questionamento normativo, dirigido a controlar a conformidade de um ato do poder normativo com parâmetros constitucionais; trata-se, antes, de procurar neste Tribunal uma nova instância de controlo do mérito da decisão judicial, em si mesma. Com efeito, com remissão para as particularidades do caso que entende verificadas (como avulta da indicação como elemento a “apresentação do requerimento de interposição de recurso e do requerimento de apresentação das alegações no dia imediatamente seguinte à cessação do evento que causou o justo impedimento”) e para o juízo de inadmissibilidade do recurso de apelação, o que a recorrente pretende é discutir o acerto do juízo do tribunal a quo, decorrendo o vício da opção jurisdicional adotada no plano da interpretação e subsunção do direito infraconstitucional às circunstâncias específicas do caso.

Ora, conforme referido, o Tribunal Constitucional não tem competência para sindicar o mérito ou a bondade das próprias decisões recorridas, ainda que questionados na perspetiva da sua conformidade com normas ou princípios constitucionais, estando-lhe vedada a revisão do modo como os demais tribunais interpretam e aplicam o direito infraconstitucional.

Assim, por inidoneidade do seu objeto, cumpre também quanto a esta questão afastar o conhecimento do recurso.

7.1. Acresce que, ainda que assim não fosse, sempre haveria que concluir pelo não conhecimento do recurso de constitucionalidade neste particular, por inverificação dos pressupostos específicos da via mobilizada.

Com efeito, em coerência com o que foi inscrito no requerimento de interposição do presente recurso, a recorrente não suscitou perante o tribunal recorrido, de forma processualmente adequada, uma questão de inconstitucionalidade normativa, idónea a ser conhecida (artigos 70.º, n.º 1, al. b), e 72.º, n.º 2, ambos da LTC), pelo que, também no tocante à questão em análise, sempre careceria de legitimidade processual para a interposição do recurso. Na verdade, se atentarmos na argumentação recursória, com tradução nas conclusões formuladas nas alegações apresentadas ao Tribunal da Relação, constata-se que a recorrente avança com o sentido do direito ordinário que tem como correto (16.ª, 21.ª e 31.ª conclusões), mobilizando no percurso hermenêutico também princípios com assento constitucional, censura o que qualifica de «interpretação restritiva feita pelo tribunal “ a quo” do estipulado no n.º 2 do art.º 140º do CPC» (38.ª conclusão) e conclui que «o despacho recorrido violou e, ou, interpretou erradamente (…) o conjugadamente disposto nos arts.º 2º, 18º, 20º da Constituição e arts. 2º e 140º, nº 2 do CPC.» (45.ª conclusão). Trata-se, assim, e com clareza, de dirigir a censura...

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