Acórdão nº 2759/05.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “H…..”, contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), sobre relativo ao ano de 2000, e respetivos juros compensatórios, no valor global de €14.019,82.

A Recorrente, veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem: “Vem o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida em 2020-02-14, no processo n.º 2759/05.0BELSB, que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida pela H….., Lda., NIPC ….., sobre a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada da liquidação adicional de IVA n.º ….., no valor de €11.514,47 (onze mil, quinhentos e catorze euros e quarenta e sete cêntimos), relativa ao ano de 2000, e as liquidações de juros compensatórios n.º ….., no valor de € 1.064,24 (mil, sessenta e quatro euros e vinte e quatro cêntimos), relativa ao período de 2000/04, n.º ….., no valor de € 820,34 (oitocentos e vinte euros e trinta e quatro cêntimos), relativa ao período de 2000/06, n.º ….., no valor de € 581,42 (quinhentos e oitenta e um euros e quarenta e dois cêntimos), relativa ao período de 2000/07, e n.º ….., no valor de € 39,35 (trinta e nove euros e trinta e cinco cêntimos), relativa ao período de 2000/11.

  1. A douta sentença concluiu que o ato tributário não se encontra suficientemente fundamentado, julgando a impugnação procedente e determinando a anulação da liquidação adicional de IVA, relativa ao ano 2000, e das liquidações de juros compensatórios.

  2. A RFP não se pode conformar com o entendimento vertido na douta sentença recorrida, por entender que o ato tributário se encontra devidamente fundamentado, reclamando um juízo distinto do formulado pelo Tribunal a quo.

  3. O dever de fundamentação dos atos consta do n.º 3 do artigo 268.º da CRP, tendo sido materializado no procedimento administrativo no artigo 153.º do CPA. Em sede de procedimento tributário, o direito à fundamentação foi materializado no artigo 19.º e concretizado no artigo 21.º ambos do CPT, e, posteriormente, no n.º 1 do artigo 77.º da LGT.

  4. A Jurisprudência e a Doutrina têm entendido que a fundamentação deve ser expressa, clara, suficiente e congruente. A título de exemplo, invoca-se, por todos, a jurisprudência constante do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 1226/13, de 2014-09-10, disponível em www.dgsi.pt.

  5. A fundamentação do ato, deve, então, ser expressa, clara, congruente, suficiente e, naturalmente, contemporânea do ato. Ou seja, deve conter a explicitação das razões de facto e de direito que motivam o ato (os pressupostos tidos em conta pelo autor do ato), não podem ser confusas ou ambíguas e o conteúdo do ato tem de ter uma relação lógica com os fundamentos invocados.

  6. Cumpre chamar a atenção que o ato perante o qual se suscita a suficiência da fundamentação é a liquidação adicional de IVA n.º ….., no valor de € 11.514,47 (onze mil, quinhentos e catorze euros e quarenta e sete cêntimos), relativa ao ano de 2000, pelo que a fundamentação constante do relatório do procedimento inspetivo deve refletir as razões de facto e de direito que estão na origem das correções.

  7. Analisando a matéria de facto dada como provada, encontra-se transcrito no facto C) parte da fundamentação do relatório que aqui nos interessa.

    I. À cautela, caso V. Exas. entendam que somente a parte do relatório transcrita para a douta sentença pode relevar em sede instrutória, alega-se, desde já, a insuficiência da base instrutória, uma vez que a informação constante a fls. 91 do relatório do procedimento inspetivo se afigura pertinente para apreciar a suficiência da fundamentação do ato.

  8. Em sede de IVA, foram propostas três correções no relatório do procedimento inspetivo: (i) IVA indevidamente deduzido relativo a custos não aceites fiscalmente, constante do ponto III.3.1.1 do relatório do procedimento inspetivo, (ii) IVA indevidamente deduzido contido em documentos com elementos do artigo 35.º do Código do IVA em falta, constante do ponto III.3.1.2 do relatório do procedimento inspetivo, (iii) IVA deduzido em excesso, constante do ponto III.3.2 do relatório do procedimento inspetivo.

  9. Relativamente à correção referida no parágrafo (i) anterior, alega-se que esta correção não está suficientemente fundamentada porque não contém a indicação da norma legal nem as razões pela consideração do IVA como indevidamente deduzido, cf. fls. 15 da sentença.

    L. Discorda-se, respeitosamente, do vertido na sentença porque a razão pela desconsideração do IVA suportado pela Impugnante reside no facto de os custos relativos à operação não terem sido aceites em sede de IRC, conforme consta a fls. 86 do relatório.

  10. A razão pela qual os custos relativos às operações não terem sido aceites em sede de IRC consta dos pontos .2.1.1.5, III.2.1.1.8 e III.2.1.1.12.1 do relatório do procedimento inspetivo, para os quais se remete no ponto III.3.1.1.

  11. Em segundo lugar, discorda-se respeitosamente da douta sentença porque é indicado que a correção se fundamenta na alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA, cf. fls. 91 do relatório.

  12. Na opinião da RFP, a correção no valor de € 9.588,98 (nove mil, quinhentos e oitenta e oito euros e noventa e oito cêntimos) de IVA suportado pela Impugnante cuja dedutibilidade não se aceita, encontra-se suficientemente fundamentada.

  13. Relativamente à correção referida no parágrafo (ii) supra, relativa a IVA indevidamente deduzido, o ponto III.3.1.2 –Contido em documentos com elementos do art.º 35.º do CIVA em falta do relatório explica que foram contabilizadas as faturas n.º 10, n.º 18 e n.º 28, emitidas pelo fornecedor E….., sem a especificação concreta dos serviços prestados, em violação do disposto no n.º 5 do artigo 35.º do Código do IVA. Assim, nos termos do n.º 2 do artigo 19.º do Código do IVA, o IVA no valor de € 423,98 (quatrocentos e vinte e três euros e noventa e oito cêntimos) não é dedutível, cf. fls. 87 do relatório do procedimento inspetivo.

  14. Finalmente, quanto à correção referida no parágrafo (iii) supra, afirma-se na douta sentença que não é indicada a norma legal que fundamenta a correção nem o porquê da correção.

  15. Respeitosamente, discordamos. Existem dois motivos patentes no relatório para efetuar a correção.

  16. O primeiro motivo indicado é o facto de 14/16 (catorze dezasseis avos) do IVA suportado não ser dedutível porque 14/16 (catorze dezasseis avos) do custo também não foi aceite para efeitos de IRC, cf. pontos III.2.1.1.8, III.3.1.1 e III.3.2 do relatório do procedimento inspetivo, constantes a fls. 27, 28, 86, 87 e 88 do mesmo.

  17. Sendo dedutível somente 2/16 (dois dezasseis avos) do IVA suportado pela Impugnante, cf. Pontos III.3.2 constante a fls. 87 e 88 do relatório.

  18. O segundo motivo indicado é o facto de a Impugnante ter apurado o pro rata de 27% (vinte e sete por cento) para o ano de 2000, pelo que, dos 2/16 (dois dezasseis avos) de IVA suportado pela Impugnante e considerado dedutível, apenas 27% (vinte e sete por cento) são efetivamente deduzidos.

    V. A fundamentação legal da correção consta a fls. 91 do relatório do procedimento inspetivo, podendo ler-se que a correção se fundamenta na alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º e no n.º 1 do artigo 23.º ambos do Código do IVA.

  19. Nestes termos, na opinião da RFP, a correção no valor de € 1.501,52 (mil, quinhentos e um euros e cinquenta e dois cêntimos) de IVA suportado pela Impugnante cuja dedutibilidade não se aceita, encontra-se suficientemente fundamentada.

    X. Em face do exposto, a fundamentação do ato tributário é expressa, constante a fls. 86, 87, 88 e 91 do relatório do procedimento inspetivo, sendo complementada com a fundamentação constante a fls. 23, 27, 28 e 52 do relatório do procedimento inspetivo; é clara, sendo os fundamentos da decisão compreensíveis para o destinatário médio; é suficiente, constando do relatório todos os elementos que motivaram as correções; e é congruente, dado que a liquidação adicional de IVA espelha as correções propostas no relatório.

  20. Nestes termos, a exigência de fundamentação constante do artigo 77.º da LGT, nos termos requeridos pela jurisprudência e pela doutrina, encontra-se verificada.

  21. Acresce, ainda, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo há largos anos que tem entendido que, sendo atingido o objetivo pretendido pela lei, a preterição de formalidade essencial “degrada-se” em mera irregularidade, deixando de constituir fundamento para a anulação do ato, cf. os acórdãos proferidos nos processos n.º 10457, de 1991-06-26, n.º 17940, de 1994-05-18, n.º 21228, de 1997-06-11, n.º 16376, também de 1997-06-11, cujos sumários se encontram disponíveis em www.dgsi.pt.

    AA. O facto de a Impugnante deduzir a presente impugnação judicial com os fundamentos que apresenta, é sinal que conhece os fundamentos da liquidação adicional de IVA.

    BB. O objetivo pretendido pelo artigo 77.º da LGT, de dar a conhecer os fundamentos do ato tributário para que o contribuinte possa conformar-se com o ato ou discutir a sua legalidade, encontra-se verificado.

    CC. Ainda que se entendesse estar o ato indevidamente fundamentado, como concluiu a douta sentença ora recorrida – o que não se concede -, o ato não deveria ser anulado.

    DD. A douta sentença recorrida enferma, assim, de erro na aplicação do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 77.º da LGT, não merecendo, por isso, a sua confirmação, EE. Devendo ser substituída por outra decisão que conheça do mérito da causa, e, em conformidade, julgue a presente impugnação judicial improcedente.

    Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o presente recurso e revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que conheça do mérito da causa e julgue a presente impugnação judicial improcedente, como é de Direito...

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