Acórdão nº 1221/16.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução18 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A......

, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 21/04/2020, que no âmbito da ação administrativa de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa instaurada pelo Ministério Público, julgou a ação procedente e determinou o arquivamento do processo conducente ao registo da nacionalidade.

* Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões, já sintetizadas, que infra e na íntegra se reproduzem: “A- O aqui recorrente nasceu já em território Português, nessa época uma Província Ultramarina. E com descendência Portuguesa pois o seu avô materno é Português de origem, de nome V.......

B- No dia 20 de Maio de 2005, à mais de 15 anos casou com S......, de Nacionalidade Portuguesa.

C- O recorrente tem uma relação muito forte com Portugal, primeiro porque nasceu ainda em território Português, e depois duplamente porque casou com uma Cidadã Portuguesa, e tem um filho igualmente com a Nacionalidade Portuguesa. Questões que se encontram provadas nos presentes autos.

D- Convive o recorrente com todo o seu agregado familiar e amigos todos eles de origem Portuguesa.

E- Tem uma efectiva e inequívoca ligação à comunidade Portuguesa, com uma identificação cultural e sociológica muito forte com Portugal, só a circunstância de ainda não ser Português e de pleno Direito é que lhe está, isso sim, a criar uma grande angustia. A unidade familiar Portuguesa sempre existiu.

F- Estão preenchidos e provados todos os requisitos para que lhe seja atribuída a Nacionalidade Portuguesa.

O Direito G- A única questão suscitada na Petição Inicial do Digno Magistrado do Ministério Publico, e tida em consideração na douta Sentença. Não pode ser motivo objetivo e de direito, para a não atribuição da Nacionalidade.

Pois, H- Está provado que efetivamente o aqui recorrente nenhuma condenação tem que seja igual ou superior a três anos de prisão. que possa ser invocada para a oposição nos termos da alínea b) do art° 9° da Lei 37/81, e com as actuais redacções dadas pela Lei nº 2/2006 de 17/04 e art° 5° e artº 56 nº 2, alínea b) do DL nº 237-A/2016 de 14/12.

Nem as molduras penais em abstrato lhes correspondem sequer a tais limites.

I- Os certificados de registos criminais emitido pela autoridade Suíça não consta sequer essa possibilidade e alcance das medidas das penas. E em Portugal o Certificado de Registo Criminal está sem qualquer registo, aliás desde sempre.

J- A douta Sentença não pode alicerçar e vir invocar essa questão na sua decisão. O que constitui com todo o respeito a Sentença uma violação de Lei expressa.

M- A Jurisprudência dos Tribunais Administrativos mais recente apela à necessidade de conciliação entre a Lei da Nacionalidade e o instituto da reabilitação legal, atribuindo relevância positiva à reabilitação legal e judicial, possibilitando a aquisição da nacionalidade ao estrangeiro reabilitado, solução mais conforme ao direito constitucional à aquisição da nacionalidade e à efectivação do direito subjectivo à reabilitação.

N- No presente caso temos inclusive uma total ausência de condenações em pena iguais ou superiores a 3 anos, num requisito vinculativo absoluto para a aquisição de nacionalidade.

O- Existe uma tendência Jurisprudêncial actual no sentido de admitir inclusivamente o cancelamento do registo criminal (legal e/ou judicial) para o fim de aquisição de nacionalidade portuguesa.

P- Neste sentido, a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, na qual destacamos o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 331/2016, no âmbito da fiscalização concreta, igualmente perante a decisão do TACL da aplicação da norma da Lei Nacionalidade que impõe como requisito a ausência de antecedentes criminais em crimes puníveis com penas iguais ou superiores a 3 anos, (que mesmo assim não é aqui o caso, pois nenhuma pena chega sequer a esse limite) considerou a referida norma inconstitucional quando entendida em sentido absoluto, ou seja, de impedir a valoração, em toda e qualquer situação, de outras circunstâncias associadas à condenação, designadamente a dispensa de pena. Isto porque o disposto no n.º 4 do artigo 30.º da CRP implica, portanto, uma proibição de o legislador consagrar critérios legais nos termos dos quais decorra, de uma forma automática, a perda de direitos civis, profissionais ou políticos, em virtude da pena aplicada" (cfr. Acórdão, citado).

Q- Deste Acordão se infere, para o caso que interessa, que o requisito da Lei da Nacionalidade referente aos antecedentes criminais não opera isoladamente, tendo de ser conjugado com outras normas e institutos, portanto também com o instituto da reabilitação.

R- O que nos leva em síntese a concluir que são esmagadores os argumentos favoráveis inclusivamente ao cancelamento provisório do registo criminal cujo fim seja a aquisição de nacionalidade.

S- A Lei da Nacionalidade carece de enquadramento na unidade do sistema jurídico, não podendo ser interpretada isoladamente ou de modo desgarrado. Terá de ser resolvida no quadro superior da ordem jurídica, em obediência aos princípios de Direito Internacional acolhidos na ordem jurídica interna, à Constituição e à lei ordinária.

T- A douta Sentença aqui recorrida, violou os diversos princípios integradores destes três graus de ordenamento, ao optar pela interpretação que vede em absoluto a possibilidade de cancelar provisoriamente o registo criminal para fins de aquisição de nacionalidade por decorrência automática dos efeitos de uma condenação.

Note-se mais uma vez que o aqui recorrente nem sequer tem uma condenação igual ou superior a 3 anos.

U- A douta Sentença, aqui recorrida, viola alguns princípios Constitucionais, desde logo, o que proíbe que qualquer pena envolva como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos (artigo 30.º, n.º 4, da CRP).

V- O Direito da aquisição da nacionalidade sofreu também evolução no direito ordinário passando a ser entendido como um poder vinculado do Estado e não discricionário, sendo obrigação do Estado não privar da cidadania qualquer indivíduo que com ele ''tenha uma ligação efectiva" (como é aqui patente o presente caso) legalmente prevista.

X- Portugal é um Pais que se pode orgulhar, de ser tolerante e integrador, e de não praticar a; exclusão, reprimir e afastar, quem o procura. Por razões históricas, já que houve épocas em que Portugal soube receber, e ser recebido quer em África quer na Europa.

Z- O ora candidato à Nacionalidade Portuguesa, sempre crê na Justiça, e que ele não será pois uma excepção.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente, devendo ser atribuída a aquisição da nacionalidade portuguesa ao cidadão - A.......

* O Ministério Público, ora Recorrido, notificado, veio contra-alegar o recurso, assim tendo concluído: “1. O Tribunal a quo actuou correctamente ao ordenar o arquivamento do processo conducente ao registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais; 2. Tal decisão decorre directamente da observância pelo Tribunal, da legislação aplicável que determina a recusa da concessão da nacionalidade portuguesa em determinadas situações; 3. Concretamente, estabelecendo o artº 9º, al. b), 1ª parte, da Lei da Nacionalidade, um fundamento para a recusa de concessão da nacionalidade Portuguesa consistente na prática de crime que, segundo a lei portuguesa, é punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, pelo que os ilícitos pelos quais o Recorrente foi condenado na Suíça preenchem esse fundamento, tornando-se pessoa indesejável para obter a nacionalidade portuguesa, ainda que o recorrente argumente em sentido contrário sem todavia fazer qualquer tipo de prova nesse sentido, de resto, inexistente nos autos; 4. Ora sendo a decisão do Tribunal, ora posta em crise, legitimada pelo quadro legal vigente à data dos factos não pode ser-lhe imputada qualquer falha susceptível de fundamentar uma decisão diversa; e, 5. Mostrando-se a decisão devidamente fundamentada de facto e de direito, com referências claras...

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