Acórdão nº 01045/19.2BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1. RELATÓRIO B…………., Ldª, com sede no lugar de ………, Alvarenga, Arouca, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (TAF) processo cautelar contra o INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P.

, IFAP, previamente à acção administrativa entretanto interposta e apensa aos presentes autos peticionando: “a declaração de nulidade ou, caso assim não se entenda, a anulação do acto administrativo que determinou a improcedência do pedido de alterações da candidatura apresentada pela Requerente e declarou o incumprimento dos objectivos previstos na operação aprovada e as obrigações assumidas e, consequentemente, determinou a devolução integral do apoio financeiro auferido, no valor de €640 475,06”*Por decisão do TAF de Aveiro, após despacho de antecipação do juízo sobre a causa principal, datada de 3 de Junho de 2020, a presente acção administrativa especial foi julgada improcedente e, em consequência, absolvido o requerido dos pedidos formulados pela requerente na acção principal.

*A A./recorrente apelou para o TCA Norte e este, por acórdão proferido a 16 de Outubro de 2020, negou provimento ao recurso.

*A recorrente, B………………, inconformada, interpôs o presente recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: «I. Enquadramento e admissibilidade do recurso A.

Nos termos da sentença proferida nos presentes autos, e que foi integralmente confirmada pelo Acórdão recorrido, a providência cautelar instaurada pela Recorrente e a ação administrativa entretanto interposta foram julgadas improcedentes, tendo o Recorrido sido absolvido dos pedidos formulados.

B.

Em face da decisão recorrida, e do disposto no artigo 150º, do CPTA (em especial dos fundamentos aí estabelecidos para admissão do recurso), são nove as questões que a Recorrente entende consubstanciarem significativa relevância jurídica e sobre as quais a Recorrente entende ser essencial a apreciação pelo Supremo Tribunal Administrativo para uma melhor aplicação do direito (e porque sobre ela existiu um manifesto erro de julgamento de direito pelo Acórdão recorrido): (a) Tendo em conta que cabe às partes o ónus de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir, e do dever de o juiz, na sentença, conhecer todas as questões que lhe cumpra conhecer, está o Tribunal obrigado a declarar provados ou não provados os factos essenciais alegados pela Autora para o conhecimento do fundamento (ou ausência de fundamento) da causa de pedir e do pedido? (b) A centralização numa única entidade da prestação de serviços e do fornecimento de bens que uma empresa gestora de uma exploração agrícola (que visa a produção de suínos) sempre teria de adquirir: i.

tem por efeito retirar a essa empresa a natureza de empresa gestora de uma exploração agrícola? ii.

implica uma alteração na natureza da candidatura? (c) Se, e em que termos, o contrato de integração pecuniária celebrado entre a Recorrente e a empresa C…………..– Pecuária, Unipessoal, Lda. converteu a Recorrente de empresa gestora de uma exploração agrícola (com produção e comercialização de suínos) em empresa prestadora de serviços? (d) Em que termos pode a alteração resultante do contrato celebrado com a empresa C………….. – Pecuária Unipessoal, Ldª., ser considerada de tal forma relevante que “desvirtua, por completo, os pressupostos da candidatura tal como esta foi aprovada”, não permitindo executar o projeto aprovado? (e) Em que termos pode um investimento previsto, mas executado em pavilhões distintos, ainda que na mesma exploração e com a afetação do mesmo valor, ser considerado uma alteração substancial da operação que afete a sua natureza, os seus objetivos ou as condições de realização, de forma a que, se considere existir uma ausência total de correspondência entre o valor que serviu de base aos pedidos de pagamento e as obras realizadas? (f) Em caso de inexistência de sistema que permite a apresentação de projetos de alterações, é legítimo considerar o projeto incumprido sem que seja dada oportunidade ao investidor de formular um pedido de alterações? (g) Atendendo a que o pedido de apoio apresentado pela Recorrente foi aprovado em 21 de outubro de 2015, e tendo a funcionalidade de PALT no Portal do PDR ficado operacional apenas no dia 09 de julho de 2017, com que legitimidade poderia o Recorrido considerar o pedido de alterações de projeto apresentadas pela Recorrente intempestivo por já ter aprovado alterações de projetos a outras entidades beneficiárias? (h) Estando em causa alterações que, se previstas no momento da candidatura, não implicavam alteração na avaliação da mesma, as mesmas consubstanciam uma violação disposto no artigo 10º, nº 2, al. a), do Decreto-Lei nº 159/2014, de 27 de outubro, bem como o artigo 11º, nº 1, al. a), da Portaria nº 230/2014, de 11 de novembro? (i) Tendo, no essencial, o projeto objeto de candidatura sido executado – o que é admitido inclusivamente pelo Recorrido – é proporcional a obrigação de devolução da totalidade do montante? C.

Cada uma destas questões, autonomamente considerada, revela-se de importância fundamental, quer pela sua relevância jurídica, quer pela sua relevância social, e a pronúncia do Tribunal é essencial para uma melhor aplicação do direito.

D.

Desde logo, está em causa uma matéria tão importante como a utilização e aplicação de fundos comunitários, revestindo absoluta importância a definição clara dos critérios que podem conduzir à obrigação de devolução dos mesmos.

E.

Além dessa relevância, trata-se de matéria que, pela quantidade de apoios atribuídos, pode ser replicada em muitas situações distintas, justificando-se, também por isso, a sua admissão por este Tribunal.

F.

Acresce que, numa perspetiva jurídica, é importante saber se os candidatos a Programas de Desenvolvimento Rural financiado pelos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), podem apresentar alterações ao projeto aprovado, sem que as mesmas constituam uma alteração substancial da sua natureza, dos seus objetivos ou das condições de realização, e em que termos e circunstâncias podem essas alterações ser admitidas.

G.

A resposta às questões colocadas condiciona não só todo o PDR2020, como também todos os programas futuros implementados com recurso a fundos comunitários, designadamente na forma como a entidade pública responsável pelo acompanhamento e fiscalização dos programas (no caso, o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P.) tratará as candidaturas e os candidatos.

H.

Quanto à primeira questão – tendo em conta que cabe às partes o ónus de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir, e do dever de o juiz, na sentença, conhecer todas as questões que lhe cumpra conhecer, está o Tribunal obrigado a declarar provados ou não provados os factos essenciais alegados pela Autora para o conhecimento do fundamento (ou ausência de fundamento) da causa de pedir e do pedido – tanto a sentença como o acórdão recorridos optaram por desconsiderar – ao ponto de nem sequer terem tomado posição – os factos alegados pela Autora e que consubstanciam (parte d)a causa de pedir da ação.

I.

Ignorando por completo os fundamentos – de facto e de direito – da ação interposta pela Autora, ora Recorrente, a sentença e acórdão recorridos optaram por se pronunciar – considerando provados ou não provados – apenas sobre os factos que, no seu entender, seriam suficientes para fundamentar a decisão que optaram por tomar, ignorando que a procedência dos fundamentos de direito invocados pela Autora estava dependente da prova de determinados factos que as referidas decisões optaram por ignorar.

J.

Por outro lado, nos presentes autos o erro do Acórdão recorrido é de tal forma manifesto que a intervenção do douto Supremo Tribunal Administrativo é absolutamente essencial para uma melhor aplicação do direito.

K.

A segunda questão – a centralização numa única entidade da prestação de serviços e do fornecimento de bens que uma empresa gestora de uma exploração agrícola (que visa a produção de suínos) sempre teria de adquirir tem por efeito retirar a essa empresa a natureza de empresa gestora de uma exploração agrícola e implica uma alteração na natureza da candidatura? – é uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, reviste-se de importância fundamental.

L.

Estamos no âmbito da execução de projetos apoiados por fundos comunitários, estando em causa saber se, nesse âmbito, uma determinada opção, privada, não condicionada pela aprovação da candidatura, é suscetível de alterar a natureza da exploração e, consequentemente, de colocar em causa o apoio concedido. Ou seja, está em causa determinar se podem ser impostos limites, não expressos na decisão de aprovação da candidatura, cuja violação determina a obrigação de devolução do montante concedido.

M.

A terceira questão – se, e em que termos, o contrato de integração pecuniária celebrado entre a Recorrente e a empresa C…………. – Pecuária, Unipessoal, Ldª. converteu a Recorrente de empresa gestora de uma exploração agrícola (com produção e comercialização de suínos) em empresa prestadora de serviços? – é, assume-se, uma aplicação ao presente caso da questão suscitada no ponto anterior.

N.

De facto, e no caso concreto, verifica-se que apesar de a Autora, ora Recorrente, não ter violado qualquer condição estabelecida na aprovação da candidatura com a celebração do referido contrato de integração, foi considerado, de forma manifestamente errada, que a celebração desse contrato, por si só, era condição para imposição da obrigação de devolução do montante por alegadamente impor uma mudança de natureza no papel do promotor.

O.

A verdade é que a celebração desse contrato, ainda que possa afetar a rentabilidade da exploração, não implica qualquer alteração nos objetivos da candidatura. Acrescente-se que, mesmo com a celebração do referido contrato, a remuneração auferida pela Recorrente...

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