Acórdão nº 02505/10.6BEPRT 0458/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I - RELATÓRIO 1. A………… propôs no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [de ora em diante TAF do Porto], em 1 de Setembro de 2010, acção administrativa especial, contra o Município do Porto, com vista à declaração de nulidade ou anulação da deliberação da Câmara Municipal do Porto, de 4 de Maio de 2010, que lhe determinou a aplicação da sanção disciplinar de demissão.

  1. Por sentença de 21 de Dezembro de 2012, o TAF do Porto julgou a acção procedente e anulou a referida deliberação da Câmara Municipal do Porto.

  2. Inconformado, o Município do Porto recorreu da sentença do TAF do Porto para o TCA Norte. O A. e aqui Recorrente interpôs recurso de apelação subordinado daquele acórdão do TCA Norte, na parte em que julgou não verificados diversos vícios que haviam sido imputados pelo Autor ao acto impugnado.

    O TCA Norte, por acórdão de 4 de Abril de 2017, embora tenha negado provimento ao recurso interposto pelo Município do Porto, revogou a decisão do TAF do Porto na parte em que tinha considerado verificada a prescrição do direito de instaurar a acção disciplinar. Além disso, por considerar que a sua decisão era favorável ao Recorrido, não conheceu do pedido de recurso subordinado por ele apresentado, qualificando-o, de resto, como pedido de ampliação do âmbito do recurso em sede de contra-alegações.

  3. É desse segmento decisório do acórdão do TCA Norte que o A. veio interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, a qual foi admitida por acórdão de 4 de Maio de 2017, essencialmente, pelas seguintes razões: “[…] Tendo em conta que pelo menos uma das questões identificadas pelo Recorrente - a possibilidade do Tribunal, motu próprio, convolar um articulado de recurso subordinado (artigo 633.° do CPC) num pedido de ampliação do objecto do recurso (artigo 636.° do CPC) - é de relevante importância jurídica a justificar, por si só, a admissão da revista - tanto mais quanto é certo que no articulado de recurso subordinado havia suscitado questões de inconstitucionalidade do art.° 42.° do ED/84 e do art.° 37.° do actual ED e havia questionado que o dirigente máximo do serviço fosse o Presidente da Câmara, questões que não foram conhecidas - ter-se-á de concluir que se verificam os requisitos de admissão do recurso […]”.

    5 – A A. e aqui Recorrente, apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] 1. O presente recurso justifica-se, a título excepcional, dada a importância fundamental das questões jurídicas e sociais que estão em causa, sendo claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

  4. A primeira questão jurídica consiste em saber se é ou não processualmente admissível ao Tribunal recorrido convolar um articulado de recurso subordinado (artigo 633.º do CPC) num pedido de ampliação do objecto do recurso (artigo 636.º do CPC).

  5. A Segunda questão jurídica que se coloca no caso dos autos é saber se o Autor que tenha invocado diversas causas de invalidade contra o acto administrativo impugnado e obtido vencimento em algumas delas que impedem a renovação do acto, está ou não impedido de apresentar recurso subordinado relativamente às demais questões que tenha decaído, prevenindo, assim novo decaimento (interpretação e âmbito de aplicação do artigo 141.º, n.º 2 do CPTA em conjugação com o artigo 633.º do CPC).

  6. A terceira questão jurídica relevante é saber se a recusa do Tribunal recorrido em apreciar o recurso subordinado deduzido pela parte vencedora, mas que decaiu em alguns causas de invalidade, com fundamento em que a acção foi julgada procedente, constitui ou não verdadeira denegação de justiça e violação do direito de acesso aos tribunais e tutela efectiva (artigo 20.º, n.º 1 e 4 da CRP e 2.º do CPTA), quando o acto foi meramente anulado, podendo ser renovado.

  7. Tais questões revelam-se de natureza processual geral e têm capacidade para se colocarem em inúmeros casos futuros de processos de impugnação, não sendo conhecidas decisões ou orientações jurisprudenciais sobre esta matéria e tratando-se de aplicação de sanções disciplinares revestem inegável importância fundamental (vd. artigo 142.º, n.º 3, alínea b) do CPTA).

  8. O processo disciplinar em causa envolve 63 arguidos que foram sancionados com penas disciplinares, estando pendentes nos tribunais várias acções administrativas, sendo que o Supremo Tribunal Administrativo já admitiu recurso de revista em caso em tudo idêntico ao dos presentes autos (Revista n.º 46/15-11, Acórdão do STA de 3/02/2015).

  9. Atenta a clareza de redacção do disposto no artigo 141.º, n.º 2 do CPTA, o facto de o recurso ter sido admitido e não ter sido rejeitado pelo M.º Senhor Juiz Desembargador Relator, e ainda dado que o Tribunal não invocou qualquer norma processual que lhe permita convolar o recurso apresentado para outro meio processual, a recusa em conhecer do mérito do recurso exige uma melhor aplicação e definição do direito para casos futuros.

  10. Os pressupostos de direito em que assentou a decisão recorrida para dar como não verificada a prescrição do direito de instaurar o processo disciplinar, mostra-se errados e vão mesmo contra a Jurisprudência dos Tribunais Administrativos e Fiscais, pelo que se afigura necessária uma melhor aplicação do disposto no artigo 4.º, n.º 2 e 5 do ED/84, nomeadamente, esclarecendo em que medida deve haver um “conhecimento formal” dos órgãos executivos, qual a “relevância jurídico- disciplinar” de factos que servem para dar início a um processo criminal ou até que ponto, havendo dúvidas, deve a Administração instaurar processo de inquérito, averiguações ou sindicância para efeito de suspender o prazo prescricional.

  11. A questão da prescrição, na medida em que impede a renovação do acto punitivo e contende com o processo de 63 funcionários, exige também assim uma melhor aplicação do direito, sendo o presente recurso admissível ao abrigo do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.

  12. No que respeito aos fundamentos do recurso propriamente dito, com a decisão recorrida o Tribunal a quo desde logo errou ao considerar que o Autora, ora recorrente, não ficou vencido e que obteve uma decisão totalmente favorável.

  13. Na verdade, quer em primeira instância, quer na 2.ª instância, tem de se considerar o Autor, ora recorrente, vencido por ter decaído em diversas causas de invalidade que alegou contra o acto impugnado e que eram susceptíveis de impedir ou limitar a renovação do acto punitivo, incluindo a questão da prescrição.

  14. Razão pela qual violou o Tribunal a quo a letra e o espírito do artigo 141, n.º 2 do CPTA, que deveria ter aplicado e refere claramente que ““Nos processos impugnatórios, considera-se designadamente vencido (…) o autor que, tendo invocado várias causas de invalidade contra o mesmo acto administrativo, tenha decaído relativamente à verificação de algumas delas, na medida em que o reconhecimento, pelo tribunal de recurso, da existência dessa causa de invalidade impeça ou limite a possibilidade de renovação do acto anulado.” 13. Com a decisão recorrida, ao contrário do que nela vem referido, o Autor ficou prejudicado, pois o Réu não está agora impedido, tendo obtido vencimento na questão da prescrição, de prosseguir o processo disciplinar e emitir novo acto punitivo – circunstância que o Acórdão recorrido reconhece – o que não acontecia antes (fls. 31 da decisão recorrida).

  15. Não é processualmente admissível, nem está previsto, a convolação do recurso subordinado em pedido de ampliação do objecto do recurso principal – pelo não devia o Tribunal a quo aplicar ao caso dos autos o disposto no artigo 636.º do CPC, mas sim o artigo 633.º do CPC.

  16. Assim decidindo, o Tribunal a quo violou ainda o princípio do dispositivo e do contraditório, consagrados no artigo 3.º, n.º 1 e 3 do CPC, já que não foi requerida qualquer ampliação e o Autor não foi ouvido previamente à decisão tomada.

  17. Ao recusar apreciar o recurso subordinado, tendo o autor inegável interesse na sua apreciação e legitimidade, a decisão recorrida denegou justiça, violou o direito do autor de acesso aos tribunais (artigo 20.º, n.º 1 e 4 da CRP) e à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º da CRP e 2.º do CPTA).

  18. O Autor tem direito processual, nos termos dos artigos 633.º do CPC, 20.º, n.º 4 e 2.º do CPTA, de apresentar os recursos que entenda necessários e adequados à protecção dos seus legítimos interesses e direitos e que sobre eles recaia uma decisão justa, mediante um processo equitativo sobre a sua pretensão.

  19. ...

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