Acórdão nº 264/17.0T8TVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 264/17.0T8TVR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Competência Genérica de Tavira Apelante: (…) Apelados: (…), (…), (…) Sumário do Acórdão (da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC) (…) *** Acordam os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte: I – RELATÓRIO (…) e (…) vieram intentar a presente acção declarativa constitutiva, sob a forma de processo comum, contra (…), (…) e (…), pedindo que: - Se reconheça e declare que os Autores têm direito de preferência na compra do prédio rústico composto por terra de cultura com árvores, denominado (…), com a área de 17.640 m2 sito em (…), inscrito atualmente na matriz predial rústica sob o artigo (…), da união das freguesias de (…) e (…), concelho de Tavira, anteriormente inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (…), da freguesia de (…), concelho de Tavira e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/19890913 da referida freguesia e concelho, feita pelo 3.º Réu através da escritura pública de compra e venda referida em 6.º da petição inicial e assim o direito de os Autores haverem para si o referido prédio, passando estes a ocupar o lugar do Réu comprador; - Se ordene que na Conservatória do Registo Predial de Tavira se proceda ao averbamento, através do qual os Autores se substituam na inscrição que ali consta a favor do adquirente o, ora 3.º Réu.

Para tanto, alegaram, em síntese, que os Autores foram habilitados como herdeiros de (…), falecido a 11/03/2017, cuja herança permanece indivisa e da qual fazem parte os prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos (…), (…), (…), e o prédio misto cuja parte rústica está inscrita na matriz sob o artigo (…), todos da União das freguesias (…) e (…), acrescentando que aqueles três prédios rústicos e a parte rústica deste prédio misto, confrontam com o prédio rústico denominado (…), com a área de 17640 m2, sito em (…), descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/19890913, da freguesia de (…) e que por escritura de compra e venda outorgada a 05/04/2007 a 1ª Ré (…), com o consentimento prestado pelo 2º Réu (…), marido, vendeu ao 3º Réu (…) o referido prédio descrito na CRP de Tavira sob o n.º …, pelo preço de € 40.000,00 (quarenta mil euros), não possuindo este Réu, então, qualquer prédio que confrontasse com o mesmo.

Mais alegaram que os Réus vendedores não lhes deram conhecimento de que iriam proceder à venda, nem lhes comunicaram o preço, nem qualquer outro elemento do negócio, tal como o comprador não lhes deu qualquer conhecimento do negócio que projectava.

Disseram ainda que a área dos seus prédios é inferior à área da unidade de cultura fixada para a região, que é de 8 hectares e o mesmo sucede com a área do prédio vendido, sendo certo que apesar de o 3º Réu, (…), ser proprietário do prédio misto descrito na CRP de Tavira sob o nº …/20011112, da freguesia de (…), cuja parte rústica confronta com o referido prédio que lhe foi vendido, a parte rústica do primeiro tem uma área inferior à área dos seus prédios que confrontam com o prédio vendido, rematando que pela preferência eles Autores obtém a área que mais se aproxima da unidade de cultura fixada para a zona.

* Os Autores procederam ao depósito do preço no valor de € 40.000,00, bem como a quantia, que invocaram, relativa às despesas de escritura, registo e impostos atinentes ao negócio de compra e venda, no total de € 43.095,00 (quarenta e três mil e noventa e cinco euros).

* Citados todos os RR, apenas os Réus (…) e (…) vieram contestar a acção, defendendo-se por excepção e por impugnação, concluindo pela sua improcedência e consequente absolvição do pedido.

Alegaram, em síntese, que deram conhecimento aos Autores da sua intenção de venda do prédio pelo preço e nas condições em que o venderam ao 3º Réu e que aqueles, nesse instante, informaram-nos de que não pretendiam adquiri-lo.

Mais acrescentaram que os AA não gozam do direito de preferência na alienação, pois o 3º Réu é proprietário do prédio descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/20011112, da freguesia de (…), confinante com o prédio alienado.

Realizou-se a audiência prévia, na qual os Autores ofereceram resposta à matéria de excepção alegada pelos RR que contestaram, tendo ainda sido proferido despacho saneador, dispensando-se, porém, a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova.

* Comprovado, entretanto, o óbito da Co-Autora (…), foi promovido o respectivo incidente de habilitação de herdeiros, tendo o Autor (…) sido habilitado, como sucessor da falecida, para prosseguir a demanda em sua substituição.

* Procedeu-se à realização de audiência de julgamento, a que se seguiu a prolação da sentença, da qual consta o seguinte dispositivo: “III- Decisão Pelo exposto, com estes fundamentos, julga-se a presente acção improcedente, por não provada, e, em sua consequência, absolvem-se os Réus do pedido formulado pelos Autores.

Custas da acção a cargo dos Autores, face ao decaimento – artigo 527.º, nºs 1 e 2, do NCPC.

Registe e notifique.” * Inconformado veio o Autor apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação, nele exarando as seguintes conclusões:

  1. Face à prova produzida e perante os factos provados em 30 a 34 entende-se que o ponto 36 dos factos provados foi incorretamente julgado.

  2. Na realidade, o facto provado em 32 refere: “32. Uma parte do prédio descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/20011112, da freguesia de (…), é composta por terra de cultura com 12 amendoeiras, com 19903 m2”.

  3. O facto provado em 33 refere: “33. Outra parte do prédio descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/200011112, da freguesia de (…), é composta de moradia, com piscina, destinada a habitação, com acessos, estacionamento e jardim, com a área total de 2327 m2”.

  4. E o facto provado em 36 refere que: “36. A parte do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º …/20011112, da freguesia de (…), referida no ponto 33, tem o valor de € 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros).” E) Como resulta da descrição nele existe implantada uma moradia, piscina, acessos, estacionamento jardim e cultura arvense.

  5. Tal como se escreveu na Sentença Recorrida, “A convicção positiva do tribunal a respeito da realidade dos factos enunciados nos pontos 8, 11, 14, 18, 19, 24, 25, 32, 33, 34 e 36 dos factos provados, sustentou-se no relatório pericial realizado nos autos (fls. 199 a 221), incluindo os seus anexos, articulado ainda com os levantamentos topográficos juntos pelos Autores a fls. 171 e 172, que a perícia confirmou serem representativos da realidade que retratam. O relatório pericial surgiu fundamentado, sustentado na perceção do perito quanto à realidade daqueles prédios, e nos documentos a que acedeu, convincente, por isso.” G) Todavia, analisado o relatório pericial de fls. 171 e 172, verifica-se que o perito subscritor do mencionado relatório, referindo-se ao prédio misto do R. (...), considera na última folha que se pensa ser a folha 221, além do mais, que: “Valor das Partes que o integram: Como acima se demonstrou o prédio misto, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.º (…), da união das freguesias da (…) e (…), concelho de Tavira, descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/20011112, composto a parte rústica por terra de cultura com 12 amendoeiras, e a parte urbana por um prédio com 2 pisos e piscina, pertencente ao réu (…) foi valorizado com as melhorias nele introduzidas e o seu valor atual deverá rondar: € 750.000,00”.

  6. Ou seja, do trecho transcrito no ponto antecedente, retira-se, desde logo, que o tribunal a quo considerou apenas o valor da parte urbana, desconsiderando o valor total das partes que integram o prédio misto, e isso decorre da leitura do texto do facto dado como provado em n.º 36, em evidente contradição face ao que resulta do teor do relatório de fls. 199 a fls. 221 incluindo os seus anexos, os quais configuram, exata e justamente, a prova de que o Tribunal a quo se socorreu para proferir a decisão atinente a este ponto da matéria factual.

  7. Entende o apelante, sempre com a merecida vénia, que o concreto ponto de facto enumerado no aludido ponto 36 está incorretamente julgado, ou seja, deveria ter uma redação diversa daquela que consta da sentença, devendo ser modificado nos termos seguintes: J) “O prédio misto, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.º (…), da união das freguesias da (…) e (…), concelho de Tavira, descrito na CRP de Tavira sob o n.º …/20011112, composto a parte rústica por terra de cultura com 12 amendoeiras, e a parte urbana por um prédio com 2 pisos e piscina, pertencente ao réu (…), tem o valor de € 750.000,00.” K) Por outro lado, antes de se decidir como se decidiu, importava saber se o R. (…) era ou não titular do direito de preferência, o que passava, essencialmente por saber se o seu prédio é rústico.

  8. O prédio que foi vendido tem natureza rústica (factos provados em 21 a 29 dos factos provados – sendo que o facto provado em 22 está duplicado em 27), mas o prédio do R. (…) está descrito na Conservatória competente como prédio misto (vide facto provado em 30 da sentença com apoio probatório nos documentos 19, 20 e 21 juntos à petição inicial).

  9. Ora, o que interessava era a efetiva agricultação e não a simples potencialidade não explorada.

  10. O artigo 1380.º, n.º 1, do Código Civil confere um direito de preferência com eficácia “erga omnes”, aos donos de prédios rústicos confinantes, desde que um deles tenha área inferior à unidade de cultura – artigo 21.º da Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto.

  11. Trata-se de um direito legal de aquisição que depende da verificação dos requisitos enunciados no citado artigo, cujo ónus da prova incumbe aos que se arrogam titulares do direito de preferência, por se tratar de factos constitutivos desse direito – artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.

  12. A lei civil não conhece o conceito de prédio misto. O prédio misto é um tertium genus, já que os prédios devem...

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