Acórdão nº 00364/20.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução05 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* I Relatório S.

, com os demais sinais nos autos, inconformada com a decisão proferida no TAF de Mirandela, em 22 de dezembro de 2020, através da qual foi decidido “julgar o presente processo cautelar improcedente e, em consequência, recusar o decretamento da providência cautelar”, face ao Processo que havia apresentado contra o IFAP – Instituto de Financiamento de Agricultura e Pescas, I.P., tendente a que fosse suspensa a “decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Diretivo, (...) que determinou a devolução integral da importância de € 240.005,76”, veio em 12 de janeiro de 2021, recorrer da decisão proferida para este TCAN, na qual se conclui: “i. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou improcedente o processo cautelar intentado pela ora Recorrente, e, em virtude disso, determinou a não suspensão da eficácia do ato administrativo proferido pelo Presidente do Conselho Diretivo do IFAP, que determinou a devolução integral da importância de € 240.005,76.

ii. Contudo, com o devido respeito, não pode o Recorrente concordar com o teor e com sentido da sentença recorrida, nem com os fundamentos em que a mesma se louva, porquanto enferma do vício de erro de julgamento e de errónea interpretação e aplicação do artigo 120º do CPTA.

iii. A vexata quaestio do presente recurso prende-se em saber se a Recorrente logrou alegar factos suscetíveis de preencher o requisito do periculum in mora.

iv. O Tribunal a quo deveria ter ponderado os factos dados como provados tendo por base as regras de causalidade adequada e da experiência comum.

  1. Assim, deveria ter ponderado a sua decisão à luz do contexto social e económico atualmente vivido devido à pandemia provocada pela doença Covid-19, nomeadamente, à recessão económica que atinge a economia mundial, semelhante à crise económica do ano de 2008.

    vi. Para além disso, foi o Tribunal a quo excessiva e inaceitavelmente exigente no que se refere à decisão sobre a concretização dos prejuízos que a Recorrente poderá sofrer.

    vii. Com efeito, deveria o Tribunal a quo ter atendido que o único rendimento mensal certo e fixo que a Recorrente aufere é o que advém do exercício das funções de assistente operacional no Agrupamento de Escolas de (...), que ascende ao montante de €613,54.

    viii. Como alegado em sede de requerimento inicial, a Recorrente, não obstante viver em casa da sua mãe, tem encargos fixos com as despesas normais do quotidiano, pois contribui para o pagamento das faturas de água, luz, telefone, alimentação, médicas e medicamentosas que absorvem totalmente o valor do seu único rendimento.

    ix. Acresce que tem dois filhos menores a seu cargo, que implicam o dispêndio de valores com a educação, alimentação, transporte, vestuário, entre outras.

  2. A não ser decretada a providência cautelar sub judice, a Recorrente ficaria em situação de não conseguir sequer sobreviver condignamente, fazendo face a despesas básicas de alimentação, vestuário, luz, água, gás, o que lhe importaria danos totalmente irreparáveis, ou de muito difícil reparação.

    xi. Em suma, caso exista a compressão do rendimento disponível da Recorrente, decorrente da plena execução do ato administrativo em crise, os seus efeitos e suas consequências procedimentais envolverão uma “taxa de esforço” que coloca em causa a possibilidade de a mesma poder satisfazer as necessidades básicas do seu quotidiano.

    xii. Esta eventual redução comportará, inevitavelmente, necessárias e sérias dificuldades na difícil gestão e equilíbrio da sua vivência, pondo em risco ou fazendo perigar a satisfação de necessidades pessoais elementares concretas do mesmo e não lhe permitindo manter minimamente uma qualidade de vida condigna ao nível daquele que era o seu padrão.

    xiii. Face ao exposto, os factos alegados e provados são suficientes para, a partir deles, ser extraída a conclusão da verificação do periculum in mora.

    xiv. Atendendo ao disposto no artigo 149.º, n.º 2, do CPTA, determinando o Tribunal ad quem a procedência do presente recurso, poderá conhecer das questões que viram o seu conhecimento prejudicado em virtude de o Tribunal a quo ter, erroneamente, decidido que o requisito periculum in mora não se mostrava verificado.

    xv. In casu, os demais requisitos constantes no artigo 120.º do CPTA – ou seja, o fumus boni juris e a necessária a imprescindível ponderação de interesses - encontram-se preenchidos.

    xvi. Face a tudo o exposto, deverá o Tribunal ad quem, revogar a sentença recorrida e, em consequência, determinar o decretamento da providência cautelar de suspensão da eficácia do ato administrativo em crise, com as devidas e legais consequências.

    Termos em que, deverá ser a sentença recorrida revogada nos termos expostos, com as legais consequências, e, consequentemente, ser decretada a providência cautelar requerida, com o que será feita sã e costumeira JUSTIÇA! A Entidade Recorrida/IFAP IP veio apresentar as suas Contra-alegações de recurso em 27 de janeiro de 2021, nas quais concluiu: “A. Vem o presente recurso jurisdicional interposto de sentença de 22/12/2020 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que indeferiu a providência cautelar apresentada pela ora recorrente S., que o que “o Tribunal a quo deveria ter ponderado os factos dados como provados tendo por base as regras de causalidade adequada e da experiência comum”, mais concretamente, deveria ter feito a ponderação “… à luz do contexto social-económico atualmente vivido devido à pandemia provocada pela doença Covid-19, nomeadamente, à recessão económica que atinge a economia mundial, semelhante à crise económica do ano de 2008”, entendendo que “…foi o Tribunal a quo excessiva e inaceitavelmente exigente no que se refere à decisão sobre a concretização dos prejuízos que a Recorrente poderá sofrer”.

    1. Salvo melhor opinião, o entendimento da recorrente não é correto, pois, como salienta o Tribunal a quo, “não existe no requerimento inicial uma alegação factual da qual se possa retirar a existência de um perigo de lesão iminente, grave ou dificilmente reparável” e que ““o requerimento inicial apenas contém alegações meramente hipotéticas, vagas, genéricas e conclusivas, que não permitem concluir que o não decretamento da providência cautelar possa originar uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação”.

    2. Ora, não basta um mero juízo de probabilidade da eventual ocorrência de um prejuízo sério para que seja decretada uma providência cautelar, a lei exige que seja feita prova de um fundado receio. (Neste sentido vide acórdão proferido em 14/7/2016, pelo Tribunal Central Administrativo do Sul, no âmbito do Proc. nº 13412/16) D. À ora recorrente mais que invocar que irá ter prejuízos que podem conduzir à sua insolvência, tinha de documentalmente demonstrar que os montantes a recuperar se irão efetivamente traduzir num prejuízo de difícil reparação, ou seja, que a reintegração da legalidade no plano dos factos se perspetiva difícil ou que os prejuízos que sempre se produzirão ao longo do tempo não serão integralmente reparáveis com tal reintegração, no caso de o processo principal proceder.

    3. Razão pela qual, salvo melhor opinião, é totalmente correto o entendimento do Tribunal a quo, de que “o requerimento inicial apenas contém alegações meramente hipotéticas, vagas, genéricas e conclusivas, que não permitem concluir que o não decretamento da providência cautelar possa originar uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação” e consequentemente em “julgar o presente processo cautelar improcedente e, em consequência, recusar o decretamento da providência requerida” F. Face ao exposto, só se pode concluir que o Tribunal a quo ao entender que a ora recorrente não demonstrou minimamente que o decretamento da providência cautelar lhe iria originar uma situação de facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação, faz uma correta interpretação dos factos e aplicação do direito pelo que a sentença recorrida não merece qualquer tipo de censura.

    Nestes termos e face ao exposto, com o douto suprimento de V. Exa, deverá ser negado provimento ao recurso.

    O Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal, notificado em 17 de fevereiro de 2021, nada veio dizer, requerer ou Promover.

    Com dispensa de vistos prévios (art.º 36º, nº 2, do CPTA), cumpre decidir.

    II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, importando verificar se se mostram preenchidos os pressupostos suscetíveis de determinar o preenchimento do requisito do periculum in mora.

    III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte matéria de facto relevante para a apreciação da questão controvertida, cujo teor infra se reproduz: “1.

    No ano de 2011, a requerente candidatou-se junto do IFAP a ajudas no âmbito da ação “Instalação de Jovens Agricultores” do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, doravante PRODER, com a operação nº 020000030178, designada “Plantação de pomares, construções, trator e equipamentos”, tendo a área de intervenção afeta ao projeto sido cedida pelo proprietário J., em regime de comodato (cfr. documento de fls. 1-19 do processo administrativo incorporado de fls. 251-300, 303-352 e 355-453, doravante designado PA; facto admitido por acordo); 2.

    Em 07/08/2012, entre a requerente e o requerido foi outorgado o contrato de financiamento nº 02021664/0, referente àquela operação, com um montante de investimento total de 480.425,52 €, sendo elegível a quantia de 350.010,20 €, dos quais 210.006,12 € correspondem a subsídio não reembolsável (sendo 157.504,59 € referentes a comparticipação comunitária e 52.501,53 € referentes a comparticipação nacional) e 30.000,00 € a prémio de...

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