Acórdão nº 00011/17.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução05 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:* Ministério da Administração Interna, na presente acção administrativa intentada no TAF de Braga por M.

(Rua (…)), interpõe recurso jurisdicional de decisão que o condenou “a proceder ao pagamento ao Autor, a título de enriquecimento sem causa, das diferenças remuneratórias entre a categoria de Comissário e Subintendente, desde 27.12.2013 a 01.12.2016, acrescidas de juros à taxa legal”, isto, como se encontra em ressalva de fundamentação “descontado o período que se julgou prescrito em sede de despacho saneador”.

Conclui: a) O Estatuto do Pessoal da Polícia de Segurança Pública, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14/10, procedeu à sua conversão em carreira especial, definindo e regulamentando a respectiva estrutura e regime; b) O conteúdo funcional da categoria de Comissário da carreira de oficial de polícia engloba funções de comando de esquadras, funções de chefia de serviços e coadjuvação e, para o que aqui releva, substituição do comandante de divisão policial; c) As funções desempenhadas pelo Recorrido constavam do elenco do conteúdo funcional da sua categoria de Comissário, nos termos do Anexo I a que se refere o artigo 41.º, do DL n.º 299/2009, de 14 de outubro; d) Da conjugação das normas do n.º s 1 e 3 deste artigo 42.º decorre que os oficiais de polícia não estão impedidos de desempenhar funções de conteúdo funcional diferenciado da categoria de que são titulares, podendo exercê-las naqueles termos; e) Na verdade, segundo o n.º 1 do citado artigo 42.º, o pessoal policial deve, em regra, exercer funções correspondentes ao conteúdo funcional da sua categoria, mas a regra comporta exceções, como decorre expressamente da lei com a inclusão do inciso “em regra”; f) Apesar das funções de Comandante de Divisão Policial serem prosseguidas, por regra, por oficial com a categoria de Subintendente (cfr. Anexo I do Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de Outubro, e artigo 39.º da Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto), no entanto, o conteúdo funcional da categoria de Comissário engloba, também, essas funções, ainda que, em substituição; g) Na situação de grave crise orçamental onde o país se encontrava, com cortes salariais e de pensões na generalidade da população portuguesa, não poderia o Recorrente deixar de cumprir a proibição de atos que consubstanciassem valorizações remuneratórias dos elementos policiais, alterando o seu posicionamento remuneratório, através do seu provimento ou graduação na categoria de Subintendente ou, mais grave, remunerando-o, simplesmente, por esta categoria; h) As normas do n.º s 1 e 2, al, a) do artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010, configuram uma verdadeira exceção à regra do n.º 1 do artigo 42.º do DL n.º 299/2009, por via remuneratória, normas que foram mantidas nas leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.º 20.º n.º 1 da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, art.º 35.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.º 39.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.º 38.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro); i) Enquanto se manteve a situação de gravíssima crise económica e subsequente proibição das valorizações remuneratórias, tem de interpretar-se o conjunto das normas do n.º s 1 e 3 do art.º 42.º do DL n.º 299/2009, conjugadamente com as normas das sucessivas Leis do Orçamento que proibiam a prática de atos que consubstanciem essas valorizações, quando, como no caso, haja fundamento legal para que estas valorizações não ocorram; j) O exercício de funções pelo Recorrido de Comandante de Divisão –, em regra, de conteúdo funcional da categoria de subintendente, mas não exclusivas – na categoria de Comissário e a remuneração por esta categoria, são, também eles, fruto da situação de exceção devida à gravíssima crise orçamental e económica do país; k) A falta de provimento/graduação na categoria de subintendente, por razões de exceção previstas nas Leis do Orçamento e, o exercício de funções pelo Recorrido, corresponde à situação de preenchimento temporário do cargo por falta do respetivo titular, que a doutrina qualifica como “causas de suplência”, não confere o direito à remuneração na categoria superior; l) Valorização remuneratória que, como já referido, estavam, à data, proibidas pelas restrições orçamentais, recorde-se, lei de valor reforçado; m) A interpretação prosseguida está conforme à Constituição, nomeadamente, com os normativos dos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, al. a) da CRP, em conjugação com o princípio da proporcionalidade; n) Com efeito, o princípio “para trabalho igual salário igual”, inscrito no artigo 59.º, n.º 1, al. a) da CRP é conjugado pela doutrina e pela jurisprudência, com o princípio da igualdade do artigo 13.º da Constituição e, por isso, existe nesta confluência, essencialmente, a proibição de diferenciações injustificadas, que, no caso dos autos, não se verificam; o) A decisão da Recorrente, atenta a categoria do Recorrido, as funções de substituição do Comandante, considerando, além do mais, as proibições orçamentais impostas e as diferenças salariais em concreto – longe de traduzirem a negação de garantias de uma existência condigna, como previsto na parte final da al. a) do n.º 1 do artigo 59.º da CRP) –, não viola esse princípio de igualdade ou outro, qualquer, princípio constitucional; p) Sem que, com isso, exista qualquer enriquecimento do Recorrente, nem consequente empobrecimento do Recorrido, pelo exercício funções de conteúdo funcional da categoria diferente da sua, considerando a legalidade da situação; q) Ainda que, por mera hipótese, se considerasse haver enriquecimento, dada a conjuntura económica do país (proibição de valorizações) estamos, certamente, a nosso ver, perante uma verdadeira causa justificativa, aliás, nem o Recorrido, demonstrou, com lhe era devido, a falta de causa justificativa; r) Por outro lado, cabia ao Recorrido a impugnação dos atos de processamento e pagamento efectuados mensalmente (cujos recibos são postos à sua disposição todos os meses) bem como, ação de responsabilidade civil do Estado (contratual ou extracontratual) por essa via, também, não tem lugar a aplicação do artigo 473.º do CC, por força do princípio da subsidiariedade do instituto; s) Quanto aos juros, entende-se que, não havendo lugar ao pagamento da indemnização por enriquecimento sem causa, não são igualmente devidos quaisquer juros, sendo que, a julgar-se que são devidos, o que, de todo o modo não se concede, o seu pagamento apenas teria lugar relativamente às quantias vencidas até à data da citação, a partir dessa data; t) O sentido decisório da sentença ora recorrida, denota, uma apreciação e interpretação manifestamente errónea do direito e das normas aplicadas ao caso em concreto; u) Portanto, a decisão do Tribunal a quo cometeu erro de julgamento, com violação das normas previstas nos artigos As normas dos n.º s 1 e 2, do artigo 42.º do DL n.º 299/2009, em conjugação com as normas dos n.º s 1 e 2, al. a) do artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, e as normas correspondentes das leis do Orçamento do Estado para 2012, 2013, 2014 e 2015 (art.º 20.º n.º 1 da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, art.º 35.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro e art.º 39.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro e art.º 38.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro); as normas dos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, al. a) da CRP em conjugação com o princípio da proporcionalidade, na interpretação que foi feita; as normas do artigo 473.º e ss., do Código Civil; v) Contrário ao julgado, o acto praticado pelo Recorrente foi realizado em conformidade com a lei e o direito não padecendo dos vícios de legalidades que lhe foram assacados na douta Sentença.

Contra-alegou o recorrido, concluindo: I – O presente recurso interposto pelo Réu, ora Recorrente, tem por objecto a Douta Sentença, que o condenou ao pagamento ao Autor, ora Recorrido, por via do instituto do enriquecimento sem causa.

II – Por referência aos elementos constantes nos autos, entende o Recorrido que não poderia o Tribunal “a quo” ter decidido de outro modo, encontrando-se doutamente elaborada e fundamentada a sentença.

III – Resultou dos factos provados que o Recorrido efetivamente, e durante mais de três anos, exerceu funções de Subintendente sem nunca haver sido remunerado como tal.

IV - Determina o artigo 473.º, n.º 1, do Código Civil, que ‘’Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou’’.

V – Como tal, deve a douta sentença do Tribunal “a quo” ser mantida nos seus exactos e precisos termos.

*O Exmº Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art.º 146º, n.º 1, do CPTA, não emitiu parecer.

*Dispensando vistos, cumpre decidir.

*Os factos, fixados como provados pelo tribunal “a quo”: 1.

Por despacho de 1 de março de 2010, do Diretor Nacional da PSP, o Autor foi promovido à categoria de Comissário; 2.

Em 2 de Agosto de 2013 é proferido despacho pelo Comandante Distrital de Braga da PSP, plasmada na Ordem de Serviço n.º 88, com efeitos a 1 de agosto de 2013, o qual determinou que o Autor passou a assumir o Comando da Divisão Policial de Braga da PSP, em regime de substituição – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial:[imagem que aqui se dá por reproduzida] 3.

Nessa sequência, o Autor requereu à Polícia de Segurança Pública, por intermédio da sua Direção Nacional, “que o seu vencimento seja pago valor correspondente à categoria funcional de Comandante de Divisão (Subintendente), com efeitos a 1 de agosto de 2013” – cfr. doc. 2 junto com a petição inicial:[imagem que aqui se dá por reproduzida] 4.

Em 02.03.2016, a Polícia de Segurança Pública notificou o Autor do projeto de indeferimento do pedido de remuneração pela Categoria Superior, e para consequente Audiência Prévia – cfr. doc. 3 junto com a petição inicial: […] 1)As funções exercidas pelo requerente...

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