Acórdão nº 0997/12.8BEBRG 0182/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução10 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Processo n.º 997/12.8BEBRG (Recurso Jurisdicional) Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 29-08-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por A………… no presente processo de OPOSIÇÃO relacionado com o Processo de Execução Fiscal nº 0450200501079549, instaurado pela Fazenda Pública contra “B…………, Lda.”, e contra ele revertido, para cobrança de créditos de IRC, referentes a 2003, e legais acréscimos no montante global de € 33.361,83.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) I.

Por douta sentença, datada de 29.08.2017, foi julgada procedente a Oposição à execução, por prescrição das dívidas tributárias e, em consequência, extinto o processo executivo.

II.

Para fundamentação da douta sentença fez constar o seguinte: “(…) “Porém, o Tribunal Constitucional, no Acórdão n° 362/15, Processo n° 760/14, relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Pedro Machete, publicado no DR n° 186, II Série, de 23/9/2015, julgou inconstitucional„ por violação do artigo 165°, n.º 1, alínea i), da Constituição, a norma do artigo 100º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.

III.

Seguindo a jurisprudência recente do Tribunal Constitucional, considerou que “na contagem do prazo de prescrição não pode atender-se ao período em que o processo de execução fiscal esteve apenso ao processo de falência.” IV.

Concluindo assim que “o prazo de oito anos contado desde 1/1/2004, relativo aos créditos fiscais referentes a 2003, esgotou-se em 1/1/2012, antes de levada a cabo a citação do Oponente, que só teve lugar em 10/5/2012 e, V.

Consequentemente os créditos fiscais ora em execução, referentes a 2003, não podem ser exigidos ao Oponente, mas tão só à devedora originária, tendo de proceder a oposição.” VI.

A Fazenda Pública não se pode conformar com a douta decisão do tribunal a quo que entendeu não aplicar o artigo 100º do CIRE como causa suspensiva da prescrição, imputável ao devedor subsidiário.

VII.

Discorda a Fazenda Pública desta decisão, porquanto, com o devido respeito, o TC não decidiu que a declaração de insolvência da devedora originária não constitui facto suspensivo da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário.

VIII.

A decisão do TC consubstanciou-se no seguinte: “(…) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 165º, n.º 1, alínea i), da Constituição, a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário; (…)” IX.

Foi esta a decisão proferida pelo TC e não outra, contrariamente ao que defende o tribunal a quo.

X.

Esta decisão constitucional foi proferida num processo em concreto, na sequência de um conjunto de alegações específicas, só produzindo efeitos nesse mesmo processo, carecendo de força obrigatória geral.

XI.

E o douto Tribunal a quo aplica-a como se a mesma tivesse força obrigatória geral, comportamento com o qual a Fazenda Pública não se pode conformar.

XII.

Tanto assim é que, na petição inicial (doravante, p.i.) de Oposição à execução fiscal, alega o Oponente, aqui recorrido, que as dívidas em questão já prescreveram tendo decorrido desde o facto tributário até à data da presente notificação, mais de oito anos.

XIII.

Em momento algum, o Oponente, ora recorrido, alegou a inconstitucionalidade do artigo 100º do CIRE, a sua não aplicação ou não extensão dos seus efeitos relativamente a si enquanto devedor subsidiário.

XIV.

E a este respeito, a sentença recorrida nada diz. Limita-se a, sem mais, desconsiderar o artigo 100º do CIRE no cômputo do prazo de prescrição, com fundamento na conclusão de que a declaração de insolvência não constitui causa suspensiva da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário, afirmando sufragar a posição assumida pelo TC no Acórdão n.º 362/2015, de 09.07.2015.

XV.

Mas inexiste decisão do TC, com força obrigatória geral, que declare a inconstitucionalidade orgânica do artigo 100º do CIRE.

XVI.

Ao desconsiderar a declaração de insolvência da devedora originária como causa suspensiva da prescrição, extensível ao devedor subsidiário, declarando, em consequência, a prescrição das dívidas tributárias e a extinção do processo executivo, o tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação dos artigos 100º do CIRE, 48º e 49º da Lei Geral Tributária (LGT) e 321º, n.º 1 do Código Civil (CCiv).

XVII.

No Acórdão n.º 362/2015, de 09.07.2015, no qual o tribunal a quo sufraga a sua sentença, o TC decidiu julgar a inconstitucionalidade orgânica do artigo 100º do CIRE quando interpretado no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.

XVIII.

O artigo 100º do CIRE dispõe: “A sentença de declaração de insolvência determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor, durante o decurso do processo.” (sublinhados nossos) XIX.

Este normativo não contende com o regime de suspensão da prescrição das dívidas tributárias, consagrado nos artigos 48º e 49º da LGT, porquanto, não é especificamente dirigido às dívidas tributárias, antes, abrange todos os credores, tendo em vista a melhor satisfação possível dos seus créditos, constituindo este o objetivo precípuo do processo de insolvência.

XX.

Esta norma legal não configura nenhum regime inovatório. Constitui corolário de um princípio geral segundo o qual a prescrição se suspende durante o período de tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito. É o que resulta do artigo 321º, n.º 1 do CCiv.

XXI.

Tal princípio geral vale também no direito tributário. Encontrando-se o titular do direito impossibilitado de lançar mão da execução fiscal, entender-se que contra ele correriam os prazos de prescrição seria uma solução adversa aos mais elementares princípios da justiça e da boa-fé.

XXII.

Por isso, tal como sucedeu na situação tratada no Acórdão do TC n.º 280/2010, “nenhum motivo existe também aqui para uma intervenção parlamentar, quando o que está em causa é igualmente a definição de uma solução jurídica exigida pela própria lógica do regime de insolvência e que se encontra justificada à luz de um princípio geral de direito (artigo 321.º, n.º 1, do Código Civil)”. Vide, neste sentido, Acórdãos do STA de 05.12.2012, proferido no âmbito do processo n.º 01225/12 e de 18.06.2014, proferido no âmbito do processo n.º 0119/14.

XXIII.

O artigo 100º do CIRE não visa direta e imediatamente os créditos tributários, antes se caracteriza como uma solução própria do processo de insolvência, razão pela qual, não interfere com matéria garantística de reserva de lei fiscal prevista no artigo 103º, n.º 2 da, CRP.

XXIV.

Neste sentido se pronunciou o próprio TC na decisão na qual a sentença a quo se sufraga, onde escreve: “(…) Ponto é que a disciplina do artigo 100.º do CIRE não visa direta e imediatamente os créditos tributários, mas a generalidade dos créditos sobre a massa insolvente, apresentando-se como uma solução imposta pelo caráter universal da execução em que se tende a traduzir o processo de insolvência e pela necessidade de assegurar no âmbito do mesmo a igualdade entre os...

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