Acórdão nº 161/18.2T8NIS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO L… instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Jo…, Jor…, Ma…, I…, A…, R…, Lu…, J…, M…, Mar…, Jos…, MA…, C…, JG…, MA…, JC…, Is…, MG…, AR…, N…, MC…, E…, MF…, AC…, COM… e Ed…, pedindo que: a) autora e chamados sejam declarados proprietários, com exclusão de outrem, do prédio urbano sito na Rua … Póvoa e Meadas; b) os réus sejam condenados a reconhecer que o prédio supra identificado é propriedade da autora e dos chamados; c) seja ordenado o registo de inscrição do prédio referido no artigo 1.º desta petição, em nome da autora e dos chamados na Conservatória do Registo Predial de Castelo de Vide; d) seja ordenada a retificação da descrição predial n.º … – Póvoa e Meadas, por forma a que dela passe a constar que o prédio aí descrito tem a seguinte descrição: Prédio urbano composto por uma casa de habitação de três pisos, com a superfície coberta de 96m2 e a superfície descoberta de 244m2, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, sito na Rua …, freguesia de Póvoa e Meadas, concelho de Castelo de Vide.

Para tanto, alegou, em síntese, que é, conjuntamente com os seus filhos, I…, Ma… e J…, proprietária do referido prédio, sendo que no início do mês de abril de 1995, celebrou um contrato verbal de compra e venda com Jo… representante dos herdeiros de I…, falecida em 04.03.1995, pelo valor de 5.000.000$00, tendo o prédio sido entregue à autora e seu falecido marido, JF…., nessa data.

Mais alegou que desde aquela data a autora e os filhos fizeram as necessárias obras de recuperação e reconstrução do prédio, habilitando-o, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, convictos de que tais atos não lesavam os interesses ou direitos de ninguém e que se tratavam dos seus legítimos proprietários, sendo que tais atos têm vindo a ser praticados há mais de 20 anos.

Requereu ainda o chamamento, como intervenientes principais, dos seus filhos, justificando o mesmo pela necessidade de intervenção de todos os comproprietários para assegurar a sua legitimidade.

Os réus, pessoalmente e regularmente citados, não apresentaram contestação, nem constituíram mandatário.

Por despacho proferido em 18.06.2019, foi admitida a intervenção principal provocada de I…, ML… e J…, os quais, devidamente citados, nada disseram.

Por despachos de 14.10.2019, 15.01.2020 e 21.01.2020, foi a autora convidada a comprovar documentalmente a qualidade de herdeiros dos réus.

A autora veio juntar aos autos certidão de um processo de inventário onde se refere que o dito imóvel nunca chegou a ser partilhado.

Em 20.02.2020 foi proferido despacho no qual, além do mais, se consignou: «(…).

A não contestação dos réus implica uma situação de revelia operante, cuja consequência é a confissão dos factos articulados pelo(s) autor(es). No entanto, o artigo 568.º, alínea d) do Código do Processo Civil exceciona os factos cuja prova exija documento escrito. Assim, apenas poderão ser declarados confessados os factos cuja prova não exija documento escrito.

(…).

» Cumprido o disposto no nº 2 do artigo 567º do CPC, não foram apresentadas alegações.

De seguida, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Nestes termos, pelo exposto e de harmonia com o disposto nos preceitos legais supracitados, julgo a ação improcedente, em consequência, absolvo os réus.

» Inconformada, a autora interpôs recurso desta decisão, finalizando a respetiva alegação com as conclusões que se transcrevem: «1-) Devem ser acrescentados aos factos provados os factos alegados nos artigos 16º e 17º da Petição Inicial, ou seja: - Convictos de que tais actos não lesavam os interesses ou direitos de ninguém; - E que se tratavam dos seus legítimos proprietários.

2-) A Autora veio invocar um modo de aquisição originária da propriedade (artigo 1316º do Código Civil). Nos termos do artigo 7º do Código de Registo Predial, “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define. Isto consubstancia uma presunção juris tantum de que o direito registado pertence ao titular inscrito, ilidível mediante a prova da aquisição originária, através da usucapião.

3-) Dispõe o artigo 1287º do Código Civil que se entende por usucapião a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, que faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação.

4-) A usucapião surge da união de dois elementos nucleares: a posse e o decurso do tempo. A usucapião é um modo de aquisição originária de direitos reais, pela transformação de uma situação de facto, aparente, em situação jurídica, em benefício daquele que exerce a gestão económica da coisa.

5-) A usucapião assenta, assim, na posse, ou seja, no poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real (artigo 1251º do Código Civil).

6-) A posse pode ser titulada ou não titulada, de boa ou de má fé, pacífica ou violenta, pública ou oculta (artigo 1258º do Código Civil).

7-) Os artigos 1294º a 1297º do Código Civil regulam os vários prazos, mais ou menos longos de acordo com a natureza da posse para a aquisição por usucapião de imóveis. O prazo máximo é, actualmente, de 20 anos. Com efeito, melhor dizendo, esse prazo, não havendo registo do título, nem da mera posse, é de 15 (quinze) anos se a posse for de boa fé, e de 20 (vinte) anos se for de má fé (artigo 1296º do Código Civil).

8-) Nos termos do disposto no artigo 1260º, nº 1, do Código Civil, «a posse diz-se de boa fé, quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem».

9-) Por outro lado, a posse que pode conduzir à usucapião tem de ser pública e pacífica, sendo que as características dessa posse (ser de boa ou má fé, sendo titulada ou não, havendo registo ou não) importam para a determinação do prazo para que tenha susceptibilidade de produzir efeitos jurídicos plenos.

10-) Em Abril de 1995, o J…, procedeu à entrega do prédio nos autos à Autora e ao seu marido, que a partir desse momento habitaram no prédio fazendo as obras necessárias de recuperação e reconstrução.

11-) Os actos de exploração e de domínio em causa têm vindo a ser praticados pela Autora e Chamados na convicção de serem donos do prédio em questão, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém e sem violência alguma.

12-) E o prédio em questão entrou na posse da Autora por força de um negócio estabelecido entre o anterior possuidor (J…) e a agora Autora e o seu marido.

13-) A posse em causa foi adquirida tanto por via da alínea a) do artigo 1263º do Código Civil, como pela tradição material ou simbólica da coisa efectuada pelo anterior possuidor.

14-) No caso em apreço a posse é de considerar pública, pois resultou provado que a Autora e os Chamados praticaram os actos correspondentes ao exercício do direito de propriedade à vista e com o conhecimento de toda a gente, tal como ressalta da análise dos elementos constitutivos referidos pelo artigo 1262º do Código Civil.

15-) O Código Civil, no seu artigo 1261º, nº2, considera...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT