Acórdão nº 1172/05.3BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelMÁRIO REBELO
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTE: FAZENDA PÚBLICA RECORRIDOS: I..........., S.A.

OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de indeferimento da reclamação graciosa deduzida da liquidação de IRC do exercício de 2000, no valor de 184.829,88€, e condenou a Fazenda Pública no pedido de anulação da liquidação de IRC de 2000, na parte respeitante às correcções respeitantes à subcapitalização, aos custos não aceites e aos prejuízos fiscais relacionais com o triénio anterior.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES: «A. A sentença recorrida parte de erro nos pressupostos de facto e de direito, quando subsume a correcção ao excesso de endividamento da impugnante à violação do princípio da livre circulação de capitais consagrado no art.° 56° do Tratado UE, nos termos da interpretação consagrada por Acórdão do Tribunal de Justiça Europeu (processo n.° C-282/12).

  1. Sendo certo que a impugnante veio suportar o pedido de anulações das referidas correcções fiscais suportando-se apenas na interpretação que retirava da disciplina contida no art.° 43° do Tratado UE, atinente ao ‘Direito de estabelecimento’ e jurisprudência comunitária a ele relativo e, subsidiariamente, na alegada violação do art.° 25° da CDT celebrada entre Portugal e França.

  2. Sucede porém que o quadro jurídico em apreciação no Acórdão extensivamente invocado pela sentença impugnada se reporta aos artigos 58°, n.° 4 e 61° do Código do IRC, nas versões plasmadas pelo Decreto-Lei n.° 198/2001 e pela Lei 60-A/2005.

  3. Disposições e redacções posteriores àquelas que estribaram a fundamentação da correcção feita in casu: a saber, o art.° 57°-C do Código do IRC, na versão em vigor em 2000, data da ocorrência dos factos tributários.

  4. E sendo o fulcro daquela pronúncia do Tribunal de Justiça Europeu a existência de um regime jurídico fiscal discriminatório para os encargos decorrentes com a obtenção de crédito junto de uma entidade não residente, cotejado com os encargos do mesmo tipo contraídos junto de entidade residente, reputa-se que tal não tem aplicação face ao quadro legal nacional vigente no ano de 2000.

  5. Com efeito, nesta data o art.° 57°-C do Código do IRC densificava, quanto ao endividamento de um sujeito passivo para com entidade não residente, as regras genéricas definidas para as correcções a efectuar em caso de serem detectadas “relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa, sujeita ou não a IRC”, levando a que “o lucro apurado com base na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações“, como se postulava no art.° 57° do mesmo Código.

  6. Âmbito de aplicação onde se incluíam as relações especiais mantidas com entidades residentes, como resultava da redacção dos n.os 1 e 4 do referido art.° 57° do Código do IRC, sendo defensável que o regime das correcções aí preconizadas era mais gravoso do que o consagrado no art.° 57°-C, pois não estava sujeito aos pressupostos de aplicação e limites objectivos estipulados nesta última norma.

  7. Ficando evidenciado nos autos que a impugnante tinha um endividamento de 28,43 vezes o valor da participação no seu capital próprio da sociedade não residente, patente se torna a não aceitação para determinação do lucro tributável dos juros que contabilizou com o financiamento obtido junto desta, sem que por isso se possa apontar carácter discriminatório face ao Direito Comunitário ou violação da CDT celebrada entre Portugal e França.

    I. O que dita o erro de julgamento da decisão aqui impugnada, na dupla medida em que não só não apreciou as pretensas ilegalidades neste conspecto peticionadas pela impugnante, como veio a ditar a anulação das correcções que resultaram da actuação estritamente vinculada da AT, em obediência à disciplina contida no art.° 57°-C do Código do IRC, suportando-se em apreciação incidente sobre normas legais entradas posteriormente em vigor.

  8. Aponta-se défice probatório e erro de julgamento na sentença proferida pelo Tribunal quando aprecia a legalidade dos custos não aceites fiscalmente, a título de funcionamento dos órgãos sociais, honorários, seguros de acidentes de trabalho e indemnizações por despedimento, pois não foi levado ao probatório o teor da concreta fundamentação usada pela AT para suportar tais correcções como se fez, e bem, nas sentenças proferidas nos processos n.° 23/04.0BELRA e n.° 844/04.4BELRA.

  9. A ter-se cumprido tal desiderato, ficaria evidenciado que a impugnante fez a contabilização dos referidos custos nas sub-contas da Conta 62 do POC (‘Fornecimentos e serviços externos’), suportando-se em documentos internos com as menções “valor estimado para custo dos órgãos sociais”, “provisões para custos do advogado”, “provisões para seguros de acidentes de trabalho” e “provisões para indemnizações por despedimento”.

    L. Donde, nem a correcção da Inspecção Tributária incidiu sobre os valores contabilizados na sub-conta 2739 do POC (‘Outros acréscimos de custos’), nem a própria qualificação feita pela impugnante destes custos (“provisões” ou “valores estimados”) permitiria à AT valorá-los como outra coisa que não provisões não aceites fiscalmente, por falta de enquadramento no numerus clausus do art.° 33° do Código do IRC.

  10. Do mesmo modo, nunca seriam enquadráveis como custos na cláusula aberta que era a al. h), do n.° 1 do art.° 23° do mesmo diploma os “valores estimados”, porquanto não preenchem o requisito essencial vertido no corpo desse n.°1: “serem comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, ou manutenção da fonte produtora”.

  11. Parecendo assim que, menos avisadamente, se confundiu na sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal a admissibilidade das provisões e estimativas de valores espelhados no relato contabilístico do sujeito passivo, com a sua aceitação como provisões constituídas segundo as normas fiscais e, assim, com relevância para o apuramento do lucro tributável.

  12. Adicionalmente, a pronúncia do Tribunal a quo sobre a correcção incidente sobre o valor dos prejuízos fiscais passíveis de serem deduzidos pela contribuinte no exercício de 2000, pecará por excesso e por omissão de pronúncia, cominados com nulidade, de acordo com o estatuído no art.° 125°, n.° 1 do CPPT.

  13. Por excesso, na medida em que se estava a solução a dar a esta questão dependente da resolução de impugnações judiciais interpostas pela firma recorrida, as quais contendiam com as liquidações adicionais de IRC dos anos de 1997, 1998 e 1999, então deveria ter sido decretada a suspensão da instância, por existência de causa(s) prejudicial(is), nos termos dos artigos 269°, n.° 1, al. c), 272°, n.° 1 e 276°, n.° 1, al. c) do CPC.

  14. Por omissão, pois é dado por assente no aresto objecto de recurso que as impugnações respeitantes ao IRC de 1997 e de 1999 já foram decididas e transitaram em julgado, logo nada obstaria a que se quantificasse com rigor o valor de prejuízos fiscais que o Tribunal de 1a instância ajuíza poderem ser deduzidos pela recorrida.

  15. Quantificação essa tanto mais necessária pois, mais não fora, permitiria à Fazenda Pública conformar-se ou reagir contra a condenação na integralidade das custas do processo, vista a latitude de indeterminação que a esse propósito grassa na sentença sob recurso onde, não obstante, veio a obter um vago ganho de causa parcial.

  16. Sendo porém certo que a impugnante, quanto ao IRC de 1999, não viu reconhecida a sua pretensão nesta causa de pedir e só foi a Fazenda Pública condenada em 25% das custas do respectivo processo.

  17. Tudo razões que se ponderam suficientes para conduzir à prolação de um juízo que determine a revogação da decisão aqui recorrida, na parte que se mostre desfavorável à entidade recorrente, condenando a final em custas a pessoa colectiva recorrida e, correspectivamente, confirmando-se a validade do acto tributário objecto de impugnação e menos avisadamente anulado parcialmente pelo Tribunal a quo.

    Nestes termos e nos demais que esse Insigne Tribunal por bem entender suprir, defende a Fazenda Pública que se dê provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a sentença ora impugnada, com o que se fará a sempre pretendida Justiça!» CONCLUSÕES DAS CONTRA-ALEGAÇÕES DA: «

    1. Na Douta Sentença sob recurso veio a considerar-se, e bem, que o regime jurídico da subcapitalização, previsto no art.º 61º, n.º 1 do Código do IRC, não é compatível com o regime de livre circulação de capitais, consagrado no art.º 56º do Tratado da União Europeia (Tratado UE), pelo que não deve ser aplicada a norma legal nacional, em obediência ao primado do Direito Convencional Internacional, imposto pelo art.º 8º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP), decisão esta que nenhum reparo merece.

    2. No domínio dos custos incorridos pela impugnante e desconsiderados pela Administração Tributária, conclui-se, mais uma vez bem, que os mesmos não correspondiam a provisões mas antes a outros acréscimos de custos, dando assim expressão ao princípio contabilístico da especialização do exercício, decisão esta que pelo seu acerto, também ela nenhum reparo merece.

    3. Finalmente, e no que respeita aos prejuízos fiscais dedutíveis no exercício de 2000 pela impugnante, dado que os actos de liquidação de IRC de 1997 e de 1999 foram igualmente impugnados pela I..........., SA (nos processos n.º 23/04.0BELRA e n.º 844/04.4BELRA, respectivamente), vindo aí a obter procedência parcial os seus pedidos anulatórios, terá, nessa estrita medida, tal resultado de ser reflectido no quantitativo dos prejuízos fiscais a deduzir no ano de 2000, sendo que, também nesta sede nenhum reparo merecer a Douta Sentença sob recurso.

    TERMOS EM QUE,  Deve o recurso da recorrente ser julgado de não provado e improcedente, mantendo-se a Douta Sentença proferida sem qualquer alteração, assim se...

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