Acórdão nº 00523/20.5BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO R. BASTOS MARTINS, UNIPESSOAL LDA., devidamente identificada nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão judicial promanada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que, em 09.12.2020, declarou extinto o presente processo cautelar com fundamento na alínea a) do nº.1 do artigo 123º do C.P.T.A.

Em alegações, a Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) A) Deverá, pelas razões expostas, o efeito regra deste recurso ser alterado atribuindo-lhe efeito suspensivo quanto à decisão recorrida atentos os princípios da boa fé, proporcionalidade e proibição da prática de atos inúteis nos termos, à contrário, dos n.ºs 3, 4 e 5 do art.° 143 do CPTA; B) Ao contrário do doutamente decidido em Sentença a fls. quando um ato seja arguido de causas geradoras de nulidade no quadro de impugnação a intentar em momento em que contra ele já não poderiam ser invocadas eventuais causas geradoras de mera anulabilidade, não está excluída a possibilidade do decretamento da suspensão da eficácia do ato.

C) A R. e aqui Recorrida nem sequer o procedimento administrativo completo e regular conseguiu, até ao presente momento, enviar ao Tribunal ad quo para que permitisse a Recorrente - apesar das tentativas a tal - consultar todos os elementos necessários à interposição da ação principal.

D) A dimensão do contraditório - art.° 3 n.° 3 do CPC aplicável ex vi pelo art.° 1 do CPTA - foi violada , na perspetiva da Recorrente, pelo Tribunal ad quo, ou caso assim não se entenda uma omissão grave - à ausência de resposta cabal aos dois últimos requerimentos da Recorrente, representando uma nulidade processual dado tal omissão ser suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo nula a decisão (surpresa) de julgar extinto o presente processo cautelar com fundamento na caducidade do exercício do direito; E) O que determina uma ampliação da causa de pedir, por parte da Recorrente, com base nesses factos supervenientes; F) A inexistência de contraditório é agravada pela incidência do procedimento administrativo na formação do ato quer no que concerne aos vícios de nulidade invocados quer no que concerne à ausência do PA nos presentes autos; G) O Tribunal ad quo na decisão tomada acaba por violar, inconscientemente, o princípio da tutela jurisdicional efetiva bem como o princípio pro actione consagrado no art.° 7 do CPTA interpretando incorretamente o art.° 58 n.° 1 b) e n.° 3 a) e b) do CPTA fazendo prevalecer o princípio da justiça formal sobre a material; H) Como é dito nos art.° 15 , 16, 17, 18 e 19 da P.I., a A., aqui Recorrente, invoca que o seu pedido de nulidade apresentado apenas foi atendido/decidido parcialmente procedente pela Recorrida, quanto ao exercício do seu direito de audição prévia, sem que esta, contudo, daí retirasse as devidas conclusões.

I) Como se demonstrou o direito ao correto exercício à audiência prévia é qualificável como um direito análogo a direitos, liberdade e garantias, na medida em que a clausula aberta de direitos fundamentais dos artº.s 16 e 17 da CRP não é redutível aos direitos de prestação negativa pelo Estado, mas também aos direitos que exigem uma atuação positiva por parte daquele; J) A interpretação realizada pelo Tribunal ad quo, em sentido contrário, é inconstitucional; K) Por outro lado, e ao contrário do invocado pelo Tribunal ad quo, o ato impugnatório tem uma configuração de cariz sancionatória quer pelos efeitos do seu decretamento quer pela circunstância de na sua base decisória estar indexado o pedido de levantamento de auto de notícia por falta de PGEP aprovado que poderá cominar numa coima; L) A Recorrida ao praticar ato que se traduz no encerramento da atividade avícola - por caducidade do procedimento - precedido do deferimento tácito de pedido da Recorrente quanto à prorrogação desse mesmo prazo (para a continuidade de legalização da sua atividade) enferma de vicio de desvio de poder, cominado com a sanção de nulidade conforme invocado nos arºt.s 12, 13,14, 24, 25 da P.I. e pelo Tribunal ad quo não acolhido; M) Entre o pedido de prorrogação do prazo para continuar com o procedimento de legalização, por parte da Recorrente, e a aceitação tácita indireta e objetiva por parte da Recorrida foi criada, por esta última naquela, - ao abrigo dos princípios confiança, segurança e certezas jurídicas assim como da igualdade, a expetativa da continuidade do procedimento de regularização - fazendo com que a Recorrente continuasse a confiar na administração e a ir ao encontro do peticionado por aquela; N) A procedência do ato administrativo a impugnar (sua eficácia) em clamoroso abuso de direito viola o conteúdo de um direito fundamental previsto no n.° 1 do art.° 61 e alínea c) do art.° 80 da C.R.P.

O) O que por si só determinaria que a sua prática se encontre eivada do vício de nulidade nos termos da aliena d) do n.° 2 do art.° 161 do CPA., pronúncia essa que não existindo fez o Tribunal incorrer em erro de julgamento; P) Deve douta decisão a declarar extinto o processo cautelar ser revogada e em seu lugar proferido Acórdão a determinar a marcação de audiência de discussão e julgamento ou, caso o Tribunal ad quo entenda ter as condições, decisão de mérito a favor da Recorrente atento o pedido cautelar apresentado e o estado dos autos (…)”.

* *Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Ministério da Agricultura produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à extinção do procedimento cautelar.

*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, tendo ainda sustentado a inexistência de qualquer nulidade, por violação do contraditório.

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso.

*Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* * II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se (i) deve ser alterado o efeito devolutivo atribuído ao presente recurso; determinar (ii) se ocorreu uma nulidade processual, por violação do contraditório, bem como (iii) se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito.

Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.

* *III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O Tribunal a quo não fixou factos, em face do que aqui se impõe estabelecer a matéria de facto, rectius, ocorrências processuais, mais relevante à decisão a proferir: A- Por despacho datado de 24.07.2020, o Sr. Diretor Regional de Agricultura e Pescas do Centro determinou o encerramento da exploração avícola, sita na Quinta da (...), freguesia de (...), concelho de (...) e declarou deserto o procedimento de aprovação do Plano de Gestão de Efluentes Pecuários [cfr. documentos juntos com a petição inicial – fls. 1 e seguintes do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]; B- A decisão referida em A) foi comunicada à Requerente pelo ofício da Requerida com a referência OF/1199/2020/ DLAL [cfr. documentos juntos com a petição inicial – fls. 1 e seguintes do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]; C- A Requerente intentou o presente procedimento cautelar no dia 17.06.2020, não tendo, no entanto, tido êxito por motivo de dificuldades informáticas [cfr. documentos juntos com a petição inicial – fls. 1 e seguintes do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]; D- O presente procedimento cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo referido em A) foi finalmente intentado com êxito em 26.08.2018 [cf. carimbo aposto no rosto do requerimento inicial – fls. 1 e seguintes do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]; E- Em 21.12.2020, foi intentada a ação principal de que depende a providência cautelar dos autos [conforme pesquisa informática ao sistema informático SITAF].

E) Em 09.12.2020, o Mmº. Juiz a quo promanou decisão judicial a declarar extinta a presente providência cautelar com base na alínea a) do nº.1 do artigo do artigo 123º do C.P.T.A.

F) Sobre esta decisão judicial sobreveio, em 14.12.2020, o presente recurso jurisdicional [cfr. fls. fls. 1285 e seguintes dos autos [SITAF], cujo teor se dá por integralmente reproduzido].

*III.2 - DO DIREITO Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas no recurso jurisdicionais em análise.

*I- Da alteração do efeito devolutivo do recurso*A primeira questão decidenda consubstancia-se em saber se deve ser alterado o efeito devolutivo atribuído ao presente recurso.

Vejamos.

Quanto ao efeito do recurso, convoque-se que o deriva do nº. 2 do artigo 143º do CPTA: “(…) 2 - Para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos de: a) Intimações para proteção de direitos, liberdades...

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