Acórdão nº 00531/20.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO N., S.A, com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do (i) despacho do Tribunal Administrativo do Porto, datado de 27.11.2020, que indeferiu o requerimento de prova por si produzido, bem como da (ii) sentença promanada nos presentes autos, que indeferiu a providência cautelar requerida.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1. Afirma o tribunal a quo que “A convicção do Tribunal quanto a todos os factos vertidos formou-se se com base na posição expressa pelas partes nos respetivos articulados e na análise do teor dos documentos pontualmente invocados, seja os juntos com os articulados, seja os constantes do processo administrativo armazenado em plataforma One Drive, ao qual o Requerido concedeu acesso através do fornecimento de password (cfr. fls. 1068-1070 dos autos), que não foram impugnados e, por isso, se mostram mais que suficientes para a análise perfunctória que se exige nestes autos.”; 2. Contudo, a verdade é que a Recorrente impugnou, no requerimento junto aos autos com a ref.ª. 007551680, no dia 30-10-2020, “todos os documentos apresentados com a oposição e com o Processo Instrutor impugnados, quanto à sua autenticidade ou veracidade, conteúdo, letra e assinatura e, ainda, quanto aos efeitos, alcance e consequente prova que com os mesmos se pretenda fazer, nos termos dos artigos 415, n° 2 e 444°, n° 1 do CPC, com exceção dos que são da autoria da Requerente ou contêm a sua assinatura (e mesmo quanto a estes, deixam-se impugnados os efeitos, alcance e consequente prova que com os mesmos o Requerido pretenda fazer)”; 3. Pelo que, nos termos do disposto no artigo 374. °, n.° 2, do Código Civil, a prova da veracidade dos documentos cabia ao Município Recorrido, não podendo o tribunal formar a sua convicção em documentos impugnados e cuja veracidade não foi provada pela parte que os apresentou; 4. Ao ter decidido como decidiu, o tribunal a quo decidiu em violação do disposto no artigo 374. °, n.° 2, do Código Civil, e no artigo 615.°, n.° 1, al. d), do CPC, uma vez que fundamentou a sua convicção em documentos cuja veracidade não se encontrava provada pela parte que os apresentou, nulidade que se argui para os devidos efeitos legais; 5. A própria jurisprudência citada pelo tribunal a quo aceita que há situações em que através de decisão do tribunal, o acionamento e o pagamento de garantia bancária deve ser impedido, quando estejamos perante a existência “de fraude ou de violação flagrante das regras da boa-fé.”; 6. Sendo que, desde logo, não há diferença entre o banco garante e a outra parte no contrato base; 7. A má fé ou abuso do direito do beneficiário da garantia bancária deve ser aferida, face ao Requerente da providência cautelar, em função dos atos praticados e dos pressupostos subjacentes ao pedido de pagamento no âmbito do contrato base de empreitada e não em função “de manifesto erro de vontade na formação do contrato da garantia bancária, devido ou não a fraude”; 8. O empreiteiro não tem, nem teria como ter, que alegar ou provar factos inerentes a condutas ocorridas na relação entre o beneficiário e o banco, até porque as desconhece; 9. As situações de abuso de direito, em violação da boa-fé, ocorridas na relação entre o empreiteiro e o dono de obra devem relevar para efeitos de impedirem o acionamento abusivo de garantias bancárias; 10. Assim, a “existência de fraude manifesta ou abuso evidente do beneficiário” não deve ser avaliada em função apenas do contrato de garantia, mas sim em função de todos os pedidos formulados na ação principal intentada pela aqui Requerente, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, sob o processo n.° 956/20.7BEPRT (cf. doc. 1), e da conduta do Município Recorrido no contrato de empreitada, no âmbito do qual, essencialmente, acordou com a Recorrente não acionar as garantias bancárias nem aplicar efetivamente multas ou compensar créditos (como alegado no artigo 57.° do Requerimento Inicial), mas fez o contrário; 11. Acresce que, conforme o alegado pela Requerente, nos artigos 151.° a 153.° do requerimento inicial, verifica-se uma situação de abuso de direito por parte do Recorrido Município na modalidade de desequilíbrio, que também deverá obstar ao pagamento das garantias; 12. Pelo que, deveria o tribunal a quo, proferir sentença a deferir as providências requeridas pela Recorrente, por estarem reunidos os referidos pressupostos para o efeito; 13. Contudo, ao decidir como decidiu, o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 334.° e 762.°, ambos do Código Civil; 14. Só a prova testemunhal e por depoimento de parte permite a prova dos factos (cf. artigo 57.° e 59.° do Requerimento Inicial) referentes, essencialmente, aos acordos alegados entre as partes (de não aplicação e respetiva efetivação de multa, acionamento de GB ou compensação de créditos, com inerente abuso do direito do Município Requerido); 15. A falta de produção da prova testemunhal e por depoimento de parte nos presentes autos traduz-se numa nulidade processual, nos termos do disposto nos artigos 195.°, n.° 1, do CPC, o que aqui se argui para os devidos efeitos, tendo o tribunal a quo violado o disposto no artigo 118.°, n.° 5, do CPTA e 411.°, do CPC (…)”.

*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Município de (...) produziu contra-alegações, que rematou nos seguintes termos:“(…) 1ª - A DOUTA DECISÃO RECORRIDA NÃO É PASSÍVEL DAS OBJEÇÕES QUE LHE MOVE A RECORRENTE, NÃO TENDO VIOLADO OS NORMATIVOS IDENTIFICADOS NAS CONCLUSÕES COM QUE A RECORRENTE PÕE TERMO ÀS SUAS ALEGAÇÕES, ANTES APLICOU CORRETAMENTE O DIREITO (ADJETIVO E SUBSTANTIVO); 2ª- OS DOCUMENTOS JUNTOS COM A OPOSIÇÃO DO RECORRIDO AO PROCEDIMENTO CAUTELAR FORAM NOTIFICADOS À RECORRENTE EM 28.02.2020, QUE DELES TOMOU CONHECIMENTO; 3ª- O PROCESSO ADMINISTRATIVO OU INSTRUTOR FOI NOTIFICADO À RECORRENTE EM 13.05.2020; 4ª - QUER NUM CASO QUER NOUTRO A RECORRENTE NÃO IMPUGNOU TAIS DOCU-MENTOS, 5ª- PELO QUE NÃO PODE CONSIDERAR-SE QUE A TENTATIVA DE IMPUGNAÇÃO, POR JUNTO, “DE TODOS OS DOCUMENTOS” QUE PROMOVEU NO PONTO 14 DO SEU REQUERIMENTO DE 30.10.2010 SEJA VÁLIDA; 6ª- NÃO SÓ PORQUE SEMPRE SERIA EXTEMPORÂNEA, MAS PORQUE CONSTITUI, MANIFESTAMENTE, UM EXPEDIENTE CENSURÁVEL QUANTO À FORMA DE LITIGAR; 7ª - A RECORRENTE TENTA IMPUGNAR TODOS OS DOCUMENTOS, MESMO OS QUE ACEITOU COMO BONS E JUNTOU NO SEU REQUERIMENTO INICIAL, INCLUINDO OS DOCUMENTOS NORMATIVOS DO CONCURSO, A PUBLICAÇÃO DO ANÚNCIO NO DIÁRIO DA REPÚBLICA, O “VISTO” AO CONTRATO DO TRIBUNAL DE CONTAS, ETC.; 8ª - A DOUTA DECISÃO DO TRIBUNAL RECORRIDO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO NÃO MERECE, PORTANTO, QUALQUER CENSURA, 9ª - JÁ QUE SE FUNDOU, PARA CONSIDERAR PROVADOS 17 DOS 21 FACTOS, EM DOCUMENTOS JUNTOS PELA PRÓPRIA RECORRENTE, 10ª- DOIS OUTROS FACTOS, EM DOCUMENTOS NÃO IMPUGNADOS, OFERECIDOS PELO RECORRIDO NA SUA OPOSIÇÃO.

11ª - E OS DOIS RESTANTES PELOS REGISTOS DO TRIBUNAL - COMPROVATIVOS DAS DATAS DE ENTREGA DAS PETIÇÕES INICIAIS DO PROCEDIMENTO CAUTELAR E DA AÇÃO PRINCIPAL; 12ª - COMO CONSTA DOS TEXTOS DAS GARANTIAS BANCÁRIAS, O BANCO, UMA VEZ INTIMADO PELO BENEFICIÁRIO NÃO PODE DEIXAR DE PAGAR AS IMPORTÂNCIAS PEDIDAS, ATÉ À CONCORRÊNCIA DA IMPORTÂNCIA TOTAL GARANTIDA; 13ª- ESTANDO-LHE VEDADO TOMAR EM CONSIDERAÇÃO QUAISQUER OBJEÇÕES, POR VERDADEIRAS QUE FOSSEM, DO GARANTIDO, E OPOR AO BENEFICIÁRIO QUAISQUER RESERVAS OU MEIOS DE DEFESA DE QUE O GARANTIDO SE POSSA FAZER VALER; 14ª - O QUE INVOCA A RECORRENTE, AINDA QUE FALSAMENTE, É UM MEIO DE DE¬FESA CONTRA O RECORRIDO, DE QUE O BANCO NÃO SE PODERIA SOCORRER, MESMO QUE O CONHECESSE; 15ª - MESMO QUE TIVESSE OCORRIDO - O QUE NÃO SUCEDEU - O PRETENSO ACORDO QUE...

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