Acórdão nº 0330/13.1BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | PAULO ANTUNES |
Data da Resolução | 24 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I. Relatório I.1.
Z…………….., com os sinais dos autos, vem interpor recurso por oposição de acórdãos, ao abrigo do disposto nos artigos 280.º, n.º 2 e 284.º, n.º 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário, do acórdão proferido no Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) a 29-1-2015, que julgou improcedente o recurso deduzido da sentença proferida no T.A.F. de Coimbra, confirmando o julgado no sentido da não anulação da venda de imóvel.
I.2.
No requerimento de interposição apresentado a 18-7-2015 suscitou questão prévia, fundada em nulidade insanável do processo de execução fiscal e encontrar-se o decidido em oposição com o acórdão exarado pelo Supremo Tribunal Administrativo em 15-09-2010 no proc. n.º 0661/10.
I.3.
O recurso veio apenas a ser admitido por despacho proferido a 15-5-2020, pelo relator do referido acórdão proferido no TCAN.
I.4.
Em sede de alegações que apresentou na sequência, o referido Z………….. veio a alargar a questão prévia a outras nulidades – falta de citação do cônjuge, e da penhora ter incidido em casa de morada de família – e a substituir o acórdão indicado pelo mais recente, proferido no proc. n.º 0852/17.5BESNT, datado de 04-10-2019, terminando com o seguinte quadro conclusivo: 1) A venda da casa de morada de família pelo órgão de Execução Fiscal, casa que até aos dias de hoje constitui a habitação própria e permanente de Z……………. e do seu agregado, realizada em execução fiscal está ferida de nulidade, por violação do n° 2 do artigo 244° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula por imperativo legal, artigo 5o da Lei N° 13/2016, de 23 de Maio de 2016.
2) E isto, porque a venda da casa de morada de família que constitui exclusivamente a habitação própria e permanente do devedor e do seu agregado familiar em processo de execução fiscal constitui um acto de trâmite que, não um acto administrativo fiscal, pelo que, assim sendo, não é de aplicar o Código de Procedimento e de Processo Tributário.
3) Assim, a venda efetuada da casa de morada de família pertencente a Z…………. inscrita na matriz predial urbana da freguesia de Valongo sob o artigo ………., com o valor patrimonial de 61.010,00 €, é nula, porque celebrada contra disposição legal de carácter imperativo (artigo 294° do Código Civil).
4) Por isso, essa nulidade é invocável a todo o tempo e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal nos termos do artigo 286° do Código Civil e não está sujeita às regras de anulação da venda, nem aos prazos fixados no artigo 257° do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
5) Acresce que, a venda da casa de morada de família está ferida de nulidade, por violação do artigo 244°, n° 2 do C.P.P.T e n° 1 do artigo 65° da Constituição da República Portuguesa e porque celebrada contra disposição legal de carácter imperativo (artigo 294° do Código Civil).
6) Importando ainda referir que, nos termos do artigo 5o da Lei N° 13/2016, de 23 de Maio de 2016, esta lei tem aplicação imediata em todos os processos de execução fiscal que se encontravam pendentes à data da sua entrada em vigor, pelo que estando ainda pendente o processo executivo fiscal em causa e ainda a ação de anulação da venda, em virtude do Recurso interposto pelo Recorrente, é evidente que se aplica esta nova redação do artigo 244° do CPPT ao caso subjudice.
7) O n° 2 do artigo 244° do C.P.P.T., aplicável ao caso sub judice, proíbe a venda do imóvel, constituindo tal venda uma nulidade substantiva, de conhecimento oficioso e que pode ser declarada a todo o tempo, motivo porque também nada obsta à sua invocação agora, também a todo o tempo, por qualquer interessado, nos termos do referido artigo 286° do Código Civil, pelo que sendo essa nulidade aqui invocável, a mesma deverá ser declarada oficiosamente pelo Tribunal Central Administrativo Norte, nos termos do artigo 286° do Código Civil {Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 2a Secção, datado de 04-10-2019, Processo N° 0852/17.5BESNT, Francisco Rothes, Venda, Execução Fiscal, Casa de morada de Família- Nulidade, publicado em www.dgci.pt.).
8) Nesta conformidade, o Recurso interposto tem como fundamento uma Oposição de Acórdãos, servindo agora de Acórdão Fundamento, uma vez que é o mais adequado nesta data dada a distância temporal já decorrida desde 2015 até Outubro de 2020, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 2a Secção, datado de 04-10-2019, Processo N° 0852/17.5BESNT, Francisco Rothes, Venda, Execução Fiscal, Casa de morada de Família- Nulidade.
9) A Oposição de Acórdãos resulta da existência de soluções opostas relativamente à mesma questão de direito.
10) Enquanto no Acórdão recorrido se considera não existir qualquer nulidade ou ilegalidade no processo executivo, afirmando-se até ser irrelevante os trâmites do procedimento executivo que levaram à realização da venda do imóvel, no Acórdão fundamento, pelo contrário, é afirmada a necessidade da realização de tal controlo da legalidade e que esse controlo não deixa de considerar como nulo o ato de venda.
11) Com efeito, entendeu o STA no Acórdão Fundamento, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 2a Secção, datado de 04-10-2019, Processo N° 0852/17.5BESNT, Francisco Rothes, Venda, Execução Fiscal, Casa de morada de Família- Nulidade, que, qualquer que seja a natureza da venda efetuada em processo de execução fiscal, esta não deixa de ter a natureza de um negócio jurídico, o que significa que quando a venda seja efetuada contra disposição de caráter imperativo, a mesma é nula. O que significa que a invocação dessa nulidade não fica sujeita às regras da anulação da venda.
12) Há, assim, nas duas decisões judiciais em apreço, decisões expressas opostas sobre a mesma questão fundamental.
13) Assim, entre o Acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento afirma-se a existência da identidade da questão de Direito e da situação de facto, pois que o Acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento debruçaram-se sobre a nulidade do acto de venda do imóvel casa de morada de família, destinada exclusivamente à habitação própria e permanente do executado e do seu agregado familiar, efectuada em execução fiscal, em violação do n° 2 do artigo 244° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em sintonia com o artigo 65°, n° 1, da Constituição da República Portuguesa, que é nula, porque celebrada contra disposição legal de carácter imperativo (artigo 294° do Código Civil).
14) No Acórdão Fundamento, considerou-se e bem, que o ato de venda em processo de execução fiscal constitui um ato de trâmite e independentemente da natureza da venda efetuada em processo de execução fiscal, esta configura sempre um negócio jurídico, o que significa que quando a venda for efetuada contra disposição de caráter imperativo, é nula.
15) E que, a invocação dessa nulidade não fica sujeita às regras da anulação da venda e aos prazos fixados para a mesma, regime que está previsto apenas para as situações de anulação da venda e não para as de nulidade deste ato.
16) Assim, quando a lei expressamente proíbe, a venda do imóvel está ferida de nulidade substantiva, de conhecimento oficioso e que pode ser declarada a todo o tempo e pode ser invocada a todo o tempo, por qualquer interessado.
17) Ora, o acórdão Fundamento sufraga a tese de que o ato de venda constitui um ato materialmente administrativo e que a venda da casa de morada de família em violação da norma legal que proíbe essa venda constitui uma nulidade invocável a todo o tempo.
18) A venda do imóvel segundo o Acórdão Fundamento é um mero ato de trâmite praticado pela Administração Tributária na qualidade de órgão da execução fiscal, com vista à cobrança coerciva e, afinal, ao pagamento da dívida exequenda, que não foi voluntariamente paga.
19) Com efeito, entendeu o Acórdão Fundamento do STA que, qualquer que seja a natureza da venda efetuada em processo de execução fiscal, esta não deixa de ter a natureza de um negócio jurídico, o que significa que quando a venda seja efetuada contra disposição de caráter imperativo, a mesma é nula. O que significa que a invocação dessa nulidade não fica...
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