Acórdão nº 574/09.0BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO A....., Lda., intentou ação administrativa comum contra Refer - Rede Ferroviária Nacional, E.P.E. (atual Infraestruturas de Portugal, S.A.), CP - Caminhos de Ferro Portugueses, E.P., e E.....

, com vista à efetivação de responsabilidade civil extracontratual, pedindo a sua condenação solidária no pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos em virtude do acidente ocorrido com um seu veículo pesado de mercadorias.

Citada, a 1.ª ré apresentou contestação, com defesa por exceção e por impugnação, pugnando pela improcedência da ação.

Citados, a 2.ª e o 3.º réus apresentaram contestação, com defesa por impugnação, pugnando pela improcedência da ação.

A autora apresentou réplica, pugnando pela improcedência da exceção.

Por sentença de 26/11/2015, o TAF de Castelo Branco julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, absolveu o 3.º réu e condenou: (i) a 1.ª ré a pagar à autora a proporção de 70 % relativamente à quantia total de € 97.345,71, ou seja, € 68.141,997, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento; (ii) a 2.ª ré a pagar à autora a proporção de 30 % relativamente à quantia total de € 97.345,71; ou seja, € 29.203,713, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

Inconformada, a 1.ª ré interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem: “1. Entende a recorrente que a correta valoração de toda a prova produzida deverá permitir concluir que os factos praticados pelo operador de circulação da REFER não são suscetíveis de preencher o pressuposto da ilicitude.

  1. Efetivamente, existem meios de prova a serem corretamente valorados, permitem concluir que o acidente ficou a dever-se exclusivamente ao facto de o maquinista da CP ter ultrapassado o limite do resguardo da estação de Vale do Peso, sem ter autorização para tal e ter atingido a passagem de nível.

  2. Pelo contrário, o operador de circulação, na sua conduta, pautou-se pelo cumprimento das normas técnicas de segurança respeitantes à circulação e regulação ferroviária.

  3. Tenha-se em consideração as declarações que o maquinista produziu em 6 de Maio de 2009 perante a comissão de inquérito conjunta entre CP e REFER, juntas ao processo a fls..., e das quais resulta a expressa inequívoca assunção de responsabilidade pela ultrapassagem do limite de resguardo e saída da estação sem autorização.

  4. Tenha-se também em conta o Inquérito realizado pela REFER e pela CP e subscrito por ambas as entidades, junto ao processo como doc. 5 da contestação da ora recorrente que concluiu que “O Maquinista Técnico E.....

    , n° .....

    , pertencente ao depósito de tração da CP — Carga de Entroncamento, deveria ter imobilizado o comboio antes de atingir o limite de resguardo de saída. Não atuou em conformidade, originando o acidente.

  5. Aquela comissão de Inquérito concluiu também que “O operador de circulação J.....

    , (...) com antecedência, atuou o comutador no quadro de comando da PN da estação, para a posição de “Anulação Permanente”, de forma a impedir o desencadeamento indevido de aviso automático à PN, e consequentemente o seu fecho prolongado. Tendo agido em conformidade com as disposições regulamentares previstas no artigo 2.3, do anexo 2 da IGS 7.” (sublinhado nosso) 7. Efetivamente, a IGS 7 (doc. junto ao processo a f Is...) permite que o agente de circulação impeça o desencadeamento do aviso automático por comboios que, embora não atingindo a PN ou só passando por ela mais tarde, atinjam o ponto de origem de aviso, sempre que circulem comboios que tenham estacionamento prolongado na estação.

  6. R.....

    (Funcionário da CP à data responsável pela nomeação da comissão de inquérito e acompanhamento do mesmo), questionado sobre o motivo por que o comboio não parou ao limite de resguardo da estação, respondeu que o maquinista não cumpriu normas que o obrigavam a parar na estação (Cfr. depoimento da testemunha cerca de 1H:17M:49S, 1H:46M:25S e 1H:50M:14S da gravação).

  7. L.....

    (Funcionário da REFER à data responsável pela nomeação da comissão de inquérito e acompanhamento do mesmo), esclareceu porque é que o comboio tinha de parar antes do limite de resguardo. (Cfr. Depoimento da testemunha cerca de 3H:40M:31 5 da gravação).

  8. O mesmo L.....

    , esclareceu também que o procedimento do operador de circulação ao anular o anúncio à PN foi o correto, enfatizando também a obrigatoriedade de paragem do comboio na estação (Cfr. depoimento da testemunha cerca de 3H:44M:37S e cerca de 3H:47M:34S da gravação).

  9. Assim, salvo o devido respeito, da valoração da prova produzida deverá resultar que quando entrou dentro da Estação o maquinista continuou a sua marcha sem realizar a paragem prescrita no horário, ultrapassando os limites de resguardo e não tomando em consideração a indicação dos sinais que informavam que a passagem de nível a jusante se encontrava aberta. (Cfr. depoimento da testemunha J.....

    cerca de 4H:23M:18S da gravação).

  10. A PN encontrava-se aberta porque, anteriormente à passagem do Teco Ibérico na estação, o operador de circulação da REFER tinha procedido à anulação do sistema automático da PN, de forma a impedir o desencadeamento indevido dos sinais de proibição de circulação rodoviária na PN, que se verificaria com a paragem obrigatória do Teco Ibérico na mesma estacão.

  11. Contrariamente ao decidido na douta Sentença, este procedimento permitiria o cruzamento dos dois comboios na Estação de Vale do Peso em segurança, implicando apenas uma paragem mais prolongada do comboio Teco Ibérico.

  12. A diferença entre o acidente e aquilo que teria sido um cruzamento seguro reside unicamente no facto de o comboio ter saído da estação sem para tal estar autorizado.

  13. O procedimento do agente da REFER está de acordo com o estipulado na regulamentação (1057), não lhe sendo imputável o desrespeito das regras e inobservância de informações que foram fornecidas ao maquinista, designadamente por via da sinalização, e que determinavam que este adotasse diferente conduta.

  14. A verdade é que o maquinista dispunha de todos os conhecimentos, quer regulamentares quer da situação de facto que lhe permitiam saber, não só, que jamais poderia sair da estação sem ordens para tal, como também que a PN a jusante se encontrava aberta ao trânsito rodoviário.

  15. Assim, salvo o devido respeito, o agente da REFER não olvidou “que se encontravam em circulação comboios”, pelo contrário, a regulamentação garantia-lhe que, naquelas circunstâncias, não havia nenhum comboio a dirigir-se para a PN.

  16. Não parece ser de exigir ao agente da REFER que antecipasse o incumprimento de normas regulamentares por parte de terceiro que ao seu cumprimento está obrigado no exercício de funções, quando o funcionamento quotidiano do caminho de ferro assenta no cumprimento dessas mesmas normas.

  17. Termos em que, subsumindo a conduta do agente da REFER ao disposto no artigo 9° da Lei 67/2007, deverá resultar da prova produzida que este não incorreu em qualquer ação ou omissão violadora de princípios e regras constitucionais, legais ou regulamentares, nem violou quaisquer regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.

  18. Assim, a sua conduta não preenche a previsão do artigo 9° n°1 da Lei 67/2007, não sendo ilícita a sua conduta e consequentemente não incorrendo em responsabilidade civil.

  19. Não tendo a R. REFER incorrido em conduta ilícita, tendo sido condenada a responder pelos danos que a conduta do seu agente supostamente provocou, nos termos conjugados dos artigos 7º n°1 e 8º n° 1 da Lei n° 67/2007, forçoso será concluir que deverá a mesma ser absolvida.

  20. Ou, ainda que assim não se entenda, deverá a Ré REFER ser condenada a indemnizar numa proporção manifestamente inferior à CP, porquanto, a aceitar-se que há culpa da recorrente, a sua proporção é também muito inferior à da R. CP.

  21. Efetivamente, nem a composição dos comboios, nem o número de operacionais de circulação existentes, nem a dimensão da Estação de Vale do Peso inviabilizavam, conforme se demonstrou supra, um cruzamento seguro dos comboios.

  22. O agente da CP violou de forma grosseira a regulamentação, facto aliás por ele e por testemunha da CP (Eng. R.....

    ) claramente assumido.

  23. Não compreende assim a recorrente que esta oposta postura das RR. Quanto ao cumprimento das normas ferroviárias, valorada pelo Tribunal, tenha permitido uma distribuição de culpa numa proporção de 70% para a REFER e 30% para a CP.

  24. Termos em que deverá a recorrente ser absolvida do pedido, ou caso assim não se entenda, atenta a medida da culpa, ser condenada a indemnizar a A. numa proporção significativamente inferior à da R. CP.

  25. A A. veio peticionar uma indemnização quanto a danos patrimoniais no veículo pesado de mercadorias, de marca VOLVO, com a matricula .....

    , que trazia acoplado o semi-reboque, matrícula .....

    , marca BASCONTRIZ (“semi-reboque’), que sofreram vários danos.

  26. O trator XE foi considerado perda total e vendido como salvado pelo preço de € 6.000,00, tendo ficado paralisado entre 24 de Abril de 2009 e 28 de Janeiro de 2010.

  27. O Tribunal fixou o cômputo indemnizatório computando os danos “em € 24.030,00 (estragos diretos, despesas com reboques e transbordo da carga de cortiça), e (ii) em €73.315,71, a titulo de paralisação (montantes perdidos como contrapartida dos contratos de aluguer que não puderam ser cumpridos e perda de clientela) - tudo no montante de € 97.345,71”.

  28. No entanto, salvo o devido respeito, no que se refere aos danos diretos do veículo (perda total do XE), ao valor da indemnização teria de ser deduzido o valor do salvado recebido pelo A., ou seja € 6.000,00, sob pena de, relativamente a esse montante o A. vir a ser duplamente ressarcido.

  29. Termos em que o valor da indemnização deveria ter sido fixado no montante de € 91.345,71, valor que, aliás, foi o...

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